'As mulheres conhecem o DIU, mas ouvem falar muito mal', diz médica
Mariana Viza é médica ginecologista e descobriu fazendo vídeos na internet uma maneira de falar sobre o dispositivo intrauterino, conhecido popularmente como DIU. Ele é um dos métodos contraceptivos disponíveis no Sistema Único de Saúde.
A médica viaja pelo Brasil para realizar mutirões de inserção do dispositivo. Em Ariquemes e Buritis, cidades do interior de Rondônia, 107 DIUs foram colocados em mulheres entre 17 e 49 anos em três dias de mutirão acompanhado pela equipe do Profissão Repórter.
A médica ginecologista Mariana Viza viaja pelo Brasil para realizar mutirões de inserção do dispositivo intrauterino — Foto: Profissão Repórter
“Existe uma demanda, porque o estado de Rondônia e a região Norte têm as maiores taxas de morte materna do país. Sabendo desse dado, a principal atitude é a contracepção. Porque a gestação não planejada, ela caminha lado a lado com a morte materna. É uma relação direta”, diz.
O DIU de cobre é o principal dispositivo intrauterino disponibilizado pelo SUS. Ao ser introduzido, o cobre é liberado e cria um ambiente hostil, inflamando a camada interna do útero. Isso impede o encontro do espermatozóide com o óvulo.
“O DIU é reversível e tem um baixo custo. A gente glamuriza muito a laqueadura, mas é uma cirurgia. E a taxa de falha do DIU e da laqueadura são semelhantes. Então, já cai por terra aquela ideia de que só a laqueadura que é método de longa duração. As mulheres conhecem o DIU, mas ouvem falar muito mal. É muita fake news”, diz.
O DIU de cobre é o principal dispositivo intrauterino disponibilizado pelo Sistema Único de Saúde — Foto: Profissão Repórter
Combater notícias falsas sobre o método contraceptivo é a primeira coisa que Mariana faz ao chegar no mutirão. Com uma linguagem diferente da técnica usada pelo médicos de forma geral.
“Se você chega com uma linguagem técnica, ainda mais com uma população que é mais simples, você distancia as pessoas. E a linguagem tem que aproximar”, explica.
Durante os mutirões, além de colocar o DIU, Mariana treina médicos que não sabem fazer o procedimento. A falta de médicos capacitados para colocar o DIU nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) faz com que o tempo de espera das mulheres aumente.
Com uma linguagem diferente da técnica usada pelo médicos de forma geral, a médica Mariana Viza combate notícias falsas sobre o método contraceptivo — Foto: Profissão Repórter
Impasse técnico
O Conselho Federal de Medicina defende que apenas médicos realizem o procedimento. “Eu não posso ensinar um enfermeiro a colocar. Consultei três advogados para saber sobre isso e eu poderia perder meu CRM”, conta Mariana.
O CRM é o número de inscrição no Conselho Regional de Medicina. E sem ele não é possível exercer a profissão. Tanto o conselho federal quanto os conselhos regionais de medicina defendem que a inserção do DIU seja realizada apenas por médicos.
“É um ato médico. Se você ultrapassa qualquer orifício do corpo humano atingido órgãos internos, são considerados procedimentos invasivos. Na inserção do DIU, nós podemos ter algumas complicações: perfuração do útero; inflamações de trompa e ovário. E isso é uma complicação que um médico está apto a resolver. Porém, outras especialidades não”, diz Mario Antônio Filho, coordenador de ginecologia do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP).
Durante os mutirões, além de colocar o DIU, Mariana treina médicos que não sabem fazer o procedimento — Foto: Profissão Repórter
Em nota, o Ministério da Saúde faz a mesma recomendação. Diz que “não é da competência do enfermeiro a inserção do DIU”.
O Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) discorda que esse procedimento seja realizado exclusivamente por médicos. “Os enfermeiros que atuam na Saúde da Família e nas Unidades Intermediárias de Saúde estão habilitados. Inserção do DIU por enfermeiro e por médico, quando ambos são qualificados, a qualidade é alta. Não há diferença. A diferença há quando não temos uma qualificação eficaz”, diz Herdy Alves, da comissão de saúde da mulher do Cofen.
Em Buritis, onde o Profissão Repórter acompanhou o mutirão de inserção de DIU, o secretário de Saúde do município defende a realização do procedimento por enfermeiros capacitados.
“Qual o papel da Secretaria Municipal de Saúde e da saúde pública em si? É cuidar da saúde da população. Nós temos no município um médico na parte ginecológica. Ele é um profissional que atende no município por 20 horas. Se eu não posso contar com a mão de obra do enfermeiro, com certeza esse trabalho a gente não poderia fazer”, diz Adelson Ribeiro Godinho, secretário de Saúde de Buriti/RO.
Assista à reportagem completa abaixo:
Ginecologista viaja pelo Brasil para difundir o uso de dispositivo intrauterino