Há um contraste gritante em "Mulher-Hulk: Defensora de heróis", nova série da Marvel que estreia nesta quinta-feira (18).
Por um lado, graças ao carisma gigantesco da protagonista, a atriz Tatiana Maslany ("Orphan Black"), e a um roteiro afiado, é uma das coisas mais engraçadas feitas pelo estúdio, entre cinema e TV. Por outro, a empresa entrega aqui a computação gráfica mais perturbadoramente malfeita de sua bem-sucedida história.
Ao longo dos quatro primeiros episódios, liberados para a imprensa, o público é jogado de um lado para o outro entre piadas cheias de metalinguagem, participações especiais e um questionamento profundo sobre o que há de tão errado nos efeitos visuais que recriam a super-heroína verde.
Cada um dos nove capítulos da temporada vai ser lançado toda quinta na plataforma de vídeos Disney+.
Assista ao trailer de 'Mulher-Hulk'
Está no sangue
Na série, Maslany interpreta Jennifer Walters, uma advogada aparentemente comum, que – assim como seu primo Bruce Banner (Mark Ruffalo) – divide seu corpo com uma versão verde e musculosa de si mesma após um acidente.
Ao contrário de seu parente mais famoso, no entanto, a personagem não se transforma em um monstro descontrolado após a transformação, mantendo a consciência desde a primeira vez.
A habilidade pode parecer um ótimo começo para quem deseja se tornar um super-herói, mas não é tão bem recebida pela protagonista, que passa a ter dificuldades para equilibrar sua antiga carreira com os novos poderes.
Mark Ruffalo e Tatiana Maslany em cena de 'Mulher-Hulk: Defensora de heróis' — Foto: Divulgação
O inverso do avesso
O desequilíbrio de "Mulher-Hulk" é gritante desde o primeiro episódio. A química excelente entre Maslany e Ruffalo faz da estreia o melhor dos quatro episódios iniciais com alguma folga – com aquela que deve ser a melhor cena pós-créditos de todo o Universo Cinematográfico Marvel (MCU, na sigla em inglês).
Ao mesmo tempo, também é o capítulo que gera mais incômodo com a transformação da personagem de carne e osso para a computação gráfica responsável por seu alter ego.
Em contraste com o Hulk de Ruffalo, um modelo que teve 15 anos de evolução e aperfeiçoamento ao longo de inúmeros filmes, os defeitos da "jovem" gigante esmeralda ficam ainda mais gritantes.
Artificial, inconstante e desproporcional em diversos momentos, mas não todos, ela é uma espécie de anti-"vale da estranheza" – termo usado para descrever o fenômeno moderno da estranheza causada em humanos ao ver algo irreal que se assemelha demais à realidade.
Tatiana Maslany, Ginger Gonzaga e Drew Matthews em cena de 'Mulher-Hulk: Defensora de heróis' — Foto: Divulgação
A verdadeira heroína
O sentimento infelizmente nunca é superado. E talvez até piore com o passar do tempo (uma cena em que a heroína rebola com a rapper Megan Thee Stallion deve assombrar os pesadelos de muitos pelos próximos meses).
É difícil de entender como ou por que o resultado foi aprovado: seria de se imaginar que a protagonista merecia um pouco mais de carinho por parte do estúdio.
Por sorte, o incômodo não é suficiente para acabar completamente com o produto final. Com a experiência de alguém que já interpretou cerca de 14 personagens diferentes em seu trabalho mais conhecido, Maslany não se deixa intimidar pelo humor ligeiro e até um pouco rasteiro (no bom sentido) do roteiro.
Tatiana Maslany em cena de 'Mulher-Hulk: Defensora de heróis' — Foto: Divulgação
Juntos, texto e atriz são responsáveis por sustentar a famosa "quebra da quarta parede", quando a personagem olha para a câmera e conversa diretamente com o público. Há, sim, uma inevitável comparação com "Fleabag", mas a inspiração da série vem de um celebrado arco dos quadrinhos na qual a protagonista fazia o mesmo, muitos anos antes de Phoebe Waller-Bridge ou de outro herói metalinguístico da Marvel, o Deadpool.
A linguagem não chega a ser revolucionária ou até mesmo uma grande inovação, mas também se encaixa de forma quase imperceptível na trama.
Apoiada por um elenco não tão conhecido, mas também muito competente no gênero, Maslany salva piada a piada – e com seu carisma gigante – um projeto quase condenado ao fracasso por um lado técnico sofrível.
Certamente uma inversão notável para um estúdio tão conhecido por produções irretocáveis, mas muitas vezes genéricas.