Popstars brasileiros realmente cantam bem? Veja análise de especialistas
Você provavelmente já ouviu algum popstar brasileiro soltando a voz na rádio, no YouTube ou na sua playlist favorita e pensou:
"Será que ele desafinou? É possível fazer sucesso sem saber cantar muito bem?"
A resposta não é tão simples: as exigências vocais mudam a depender do gênero musical. O funk, por exemplo, não requer muitas transições entre grave e agudo. É mais falado do que cantado. Já o sertanejo pede um pouco mais de "metal" na voz, um canto com mais variação.
Essas explicações são da fonoaudióloga Adriana Bezerra e do professor de canto Rafael Dantas. O G1 conversou com esses e outros profissionais da voz para analisar as técnicas de oito artistas brasileiros presentes nas listas de mais ouvidos.
Outros fatores podem influenciar o jeito como se canta. Marília Mendonça, segundo eles, passou a controlar melhor a respiração depois de perder peso. Já Gusttavo Lima, eles avaliam, é beneficiado por cantar sempre sorrindo.
Cantoras como Anitta e Luísa Sonza, que coordenam música e dança nos shows, precisam ter mais domínio de respiração e preparação corporal, ensina Rafael: "Somos atletas da voz. Ela trabalha um monte de músculos. Se não malha essas musculaturas, vai ficar prejudicada."
— Foto: Divulgação e G1
Dá para alterar a voz no estúdio?
No processo de gravação de uma música, as vozes dos artistas geralmente passam por ajustes nas etapas de edição e mixagem de som, após o registro em estúdio. Coordenar essa operação é trabalho do produtor musical.
“Antigamente, o sucesso dependia mais do talento vocal porque as gravações eram feitas em formato analógico, em fitas, e era muito mais difícil corrigir. Os músicos tinham que ser muito bons para gravarem sem errar”, explica Eduardo Pepato. Ele é um dos produtores mais requisitados do sertanejo e trabalha com Marília Mendonça, Henrique & Juliano, entre outros.
“É claro que, depois da gravação, há os shows, em que é preciso cantar bem para manter o sucesso. Por isso, é possível o artista chegar ao sucesso sem cantar tanto. Mas, para manter, ele depende mais da voz", diz o produtor.
Papatinho, produtor de Anitta, Ludmilla e Gabriel O Pensador, acrescenta outro elemento: o Auto-Tune. A ferramenta digital criada no fim dos anos 90 afina até as vozes mais desajeitadas, mas passou a ser usada como elemento estético, uma espécie de instrumento musical, principalmente no rap, dance pop e funk.
"Muita gente que sabe cantar usa como forma de mudar o timbre da voz, até nos shows, por uma questão criativa. Quem critica o autotune tem uma visão muito pequena."
Preparador vocal: todo mundo tem
Lucas Lucco e Pabllo Vittar gravam juntos em estúdio — Foto: Felipe Flores
Gislaine Matos, preparadora vocal de Gustavo Mioto, Felipe Araújo, Lucas Lucco, Thiago Brava, Zé Felipe e outros, diz que “sucesso é uma sequência de muitos fatores, entre eles cantar".
“Muitos brasileiros reclamam do cenário musical hoje. Com certeza, existem pessoas que são mais artistas do que cantores."
A preparadora vocal conta que já teve que fazer um curso com lições mais simples. Foi o jeito encontrado para preparar um novo artista com menor domínio vocal. Embora não cite nomes, diz que “é uma pessoa querida do público”.
“Na época, muitos cantores estavam cantando muito bem e já se destacando no mercado. E ele chegou com uma possibilidade bem menor, porque não cantava o mesmo tanto. Porém foi criado em cima dele uma identidade vocal de forma expressiva. E ele tinha outros fundamentos, como beleza e carisma. Isso fez um pacote completo, que trouxe um resultado maior e diferenciado”.
Janaína Pimenta, que trabalha com Ivete Sangalo, Milton Nascimento e Luan Santana, concorda que uma boa voz não é vital para alcançar o sucesso:
"Precisa cantar bem, sim, mas não é só isso. Ele precisa ter carisma e uma estratégia na carreira dele. São muitos pontos que precisam ser olhados."
"Existem cantores que não tem a voz melhor do mundo, mas tem alguns recursos, como o melodyne, por exemplo, que conserta isso no estúdio. Mas haverá um momento que ela vai passar aperto. A verdade sempre vem à tona", afirma Janaína.
"Cantar é uma coisa, encantar é outra. Quando a gente canta, eu posso pegar uma pessoa que não seja afinada, que não tem o menor talento e conseguir afiná-la. Isso não quer dizer que a voz dela encantará."