Aparentemente teremos temporadas de "Black Mirror" para todo o sempre sendo lançadas pela Netflix. Esta mais recente, a quinta, trouxe alguns episódios bem medianos (ou dois medianos e um ruim), o que tristemente tem virado meio que tendência da série que começou lá em 2011 no canal britânico Channel 4 como uma das coisas mais legais e inovadoras da TV.
Neste belíssimo post, eu e meu colega Braulio Lorentz, editor de Pop & Arte aqui do G1, nos juntamos para fazer um ranking de todos os episódios das cinco temporadas da série criada e escrita por Charlie Brooker, incluindo os dois especiais, do melhor para o pior (na nossa opinião, claro, desculpe qualquer coisa e por favor não se ofenda, pode xingar nos comentários, se for com educação). Pra saber: T significa temporada e E, episódio. Vamos lá (pode haver pequenos spoilers na descrição do episódio, nada grave, não):
1º - White Christmas – T1, episódio especial. Esse especial de Natal com quatro histórias bem bizarras que se interligam tem consciências manipuladas, consciências escravizadas por sua versão de carne e osso, bloqueio nas redes sociais que serve pra vida real e o sempre presente implantezinho cerebral deixando outros terem acesso ao que você enxerga e ouve: “Black Mirror” clássico, na melhor das formas, com reviravolta no final e Jon Hamm brilhando.
2º - The Entire History of You – T1E3 - Todo mundo tem um implante no cérebro com acesso a todas as memórias. É possível ver e exibir replays do que já rolou na sua vida. E isso vira combustível para paranoia geral. O uso desmedido do gadget conduz a trama, um “isso é muito Black Mirror” raiz. Tecnologia rima com agonia em roteiro certinho, que deve virar filme.
O ator Toby Kebbell em cena de 'The Entire History of You' — Foto: Divulgação
3º - White Bear – T2E2 - É da fase em que a série deixava a gente muito, muito perturbado. Crime, castigo e sadismo dão o tom na história de uma mulher que acorda sem memória e tem que fugir de atiradores enquanto pede ajuda a pessoas que apenas assistem a tudo impassíveis, filmando a cena com celulares em punho. No fim, a constatação de que aquele tipo de diversão nem seria um futuro tão impossível assim. De dar frio na espinha.
black mirror white bear — Foto: Divulgação/Netflix
4º - The National Anthem – T1E1 - O primeiro episódio de “Black Mirror” não deixou dúvida de que essa série não era qualquer coisa: uma princesa da família real inglesa é sequestrada e, como resgate, o primeiro-ministro britânico precisa ter relações sexuais com um porco ao vivo na televisão. A discussão sobre se ele devia ou não fazer o que foi pedido pelo sequestrador toma conta do país, com a pressão das redes sociais e dos programas de TV fazendo um triste retrato do nosso tempo.
5º - San Junipero – T3E4 - O melhor da fase Netflix. Tem cores, trilha e acessórios anos 80, em uma pegada meio “série de algoritmo”. Mas vai bem além dessa superfície “Stranger Things” da dramédia romântica LGBT. A química do casal formado pelos personagens de Gugu Mbatha-Raw e Mackenzie Davis já seria o bastante, mas a discussão sobre terapia, avatares, vida após a morte e realidade virtual mostram a força do episódio.
6º - Hang the DJ – T4E4 - É da mesma família “Black Mirror fofo” de San Junipero, embora menos complexo. Resume em 51 minutos o infortúnio de adultescentes em busca do grande amor. No “Tinder do futuro”, Frank e Amy vivem idas e vindas. Não fosse o final um pouco frustrante, poderia estar ainda acima na lista.
Cena do episódio 'Hang the DJ' — Foto: Divulgação
7º - Nosedive – T3E1 - Abriu a primeira temporada da Netflix, com uma história de premissa óbvia, mas muito bem contada. O mundo vira uma rede social na qual geral avalia geral. E a quantidade de estrelinhas te dá regalias ou até te bota na prisão. As reviravoltas no roteiro (com temas como ética e moral) fazem lembrar “The Good Place”. Não é à toa: o criador Michael Schur escreve o roteiro com Rashida Jones.
8º- Be Right Back – T2E01 - Um novo serviço permite que um clone robô do seu ente querido morto seja criado. Mas o resultado é um pouco decepcionante para Martha, que perde a paciência com seu novo amorzinho Ash, vivido por um impassível Domhnall Gleeson. Mesmo sendo um pouco monótono e sem o clima quase sempre agoniante que faz parte do DNA da série, dá uma subida no ranking por gerar debates pós-episódio.
9º - USS Callister –T4E1 - Um programador de games genial e sádico prende dentro de um jogo hiper-realista uma espécie de clone das pessoas de quem ele não gosta. Tirando que o DNA da nossa saliva contém inclusive nossas memórias e personalidade, mas sei lá, é o futuro, quem somos nós pra dizer que não vai ser assim. Bem divertido.
Osy Ikhile, Jimmi Simpson, Milanka Brooks, Michaela Coel, Cristin Milioti e Jesse Plemons em cena de 'Uss Callister' — Foto: Divulgação/Netflix
10º - Black Museum - T4E6 – O final da quarta temporada se destacou com a história da mulher que visita uma espécie de museu do crime, e o dono do local vai contando as histórias das peças em exposição, com várias referências a episódios anteriores. Ainda tem um final ótimo.
Douglas Hodge e Letitia Wright em cena de 'Black Museum' — Foto: Divulgação/Netflix
11º - Men Against Fire – T3E5 - Os implantes cerebrais tão presentes em tantos episódios aqui são usados para que soldados participem de um genocídio sem sofrer crises de consciência nem transtorno pós-traumático: os seres humanos alvos da matança aparecem para eles como baratas gigantes a serem exterminadas. Tecnologia a serviço do pior da humanidade.
12º - Fifteen Million Merits – T1E2 - Em um futuro distópico, o povo vive em cubículos sendo bombardeado por propaganda na TV. Também é preciso pedalar bicicletas ergométricas para geração de energia. A única chance de sair dessa é um reality show de calouros. Um homem e uma mulher tentam a sorte nesta espécie de “The Voice” do mal. Merece crédito por ter revelado Daniel Kaluuya, depois visto em “Corra!” e “Pantera Negra”.
13º - Playtest – T3E3 - Um desempregado aceita ser cobaia de uma nova tecnologia numa empresa de videogames, mas uma aparente falha no funcionamento do implante em sua nuca o faz enfrentar uma realidade virtual enlouquecedora com seus piores pesadelos.
14º - Bandersnatch – episódio especial interativo - Quer coisa mais black mirror que um episódio de “Black Mirror” em que você decide os rumos da história, incluindo dizer sim ou não para um aparente suicídio e escolher se o personagem principal deve ou não matar um membro da família? Realidade (realidade?) e videogame se misturam para dar a impressão, talvez falsa, de que a gente controla alguma coisa.
Fionn Whitehead em cena de 'Bandersnatch', o episódio interativo — Foto: Divulgação
15º - Smithereens - T5E2 - É o melhor de 2019, o que não quer dizer tanta coisa. Um motorista de aplicativo sequestra um estagiário para conseguir falar com o CEO de uma famosa rede social. É um bom filme de ação e suspense com a vida hiperconectada como pano de fundo, graças aos bons personagens de Topher Grace (Silicon Valley na veia) e Andrew Scott (tão magnético quanto em “Fleabag”). Como episódio de “Black Mirror”, fica um pouco aquém, principalmente pelo final superbatido.
16º - Hated in the Nation – T3E6 - O que a crise ecológica provocada com a morte das abelhas pelo mundo tem a ver com uma série de assassinatos de gente odiada nas redes sociais é o que guia esse episódio, que traz discussões interessantes embora não tão originais sobre a disseminação do ódio pela internet.
17º - Shut Up and Dance – T3E3 - O episódio segue um dia da vida de um garoto (Alex Lawther, desconcertante) que tem seu computador hackeado. Ele é chantageado e obrigado a seguir instruções meio bizarras para que um vídeo íntimo não seja revelado. É mais um episódio em que a tecnologia é uma parte menor na história, sem a pegada distópica da série. Histórias mais impactantes e incríveis acontecem na vida real mesmo.
18º - Striking Vipers - T5E1 - A coisa mais diferentona deste episódio é o fato de ele ter sido gravado em São Paulo. Mas a cidade não tem importância alguma para a trama, sobre amigos que se reencontram e reforçam sua relação por meio de um game com imersão nível hard. Todo personagem é meio bunda mole e pouquíssimo desenvolvido. Temas interessantes como sexo virtual, gênero, “existe traição se você é um avatar?” são, infelizmente, subaproveitados.
Anthony Mackie em cena de 'Striking Vipers' gravada no viaduto Santa Ifigênia, em São Paulo — Foto: Reprodução/Netflix
19º - Metalhead – T4E5 - Aparentemente, a humanidade está sendo dizimada por robôs em forma de cachorro. Climinha apocalíptico num episódio meio sufocante filmado em preto e branco. Não é uma obra-prima, mas até que é ok.
Maxine Peake em cena de 'Metalhead' — Foto: Divulgação/Netflix
20º - Arkangel – T4E2 - Dirigido por Jodie Foster, mostra uma mãe que bota uma babá eletrônica dentro da cabeça de sua filha, para saber tudo o que ela faz e “protegê-la”. A atitude drástica é justificada pelo fato de quase ter perdido a criança. Além de ser moralista e óbvio, a mamãe da história toma todas as decisões erradas possíveis. É uma pena ver uma premissa OK virando um filmeco indie de câmera nervosa e atuações caricatas.
Rosemarie DeWitt em cena de 'Arkangel' — Foto: Divulgação/Netflix
21º – Rachel, Jack and Ashley Too - T5E3 - E de repente “Black Mirror” virou uma série pra passar nos domingos de manhã na TV aberta... Uma cantora pop escravizada pela tia má sedenta por dinheiro e sucesso tem como aliadas uma garotinha tímida e reprimida e sua irmã roqueirinha revoltada – além de uma boneca superinteligente. Bobinho até dizer chega. Com participação especial de Miley Cyrus.
22º - The Waldo Moment – T2E3 - A premissa é comum demais, já vista na vida real em casos como o do Macaco Tião candidato à prefeito do Rio em 1988 ou um humorista ganhando a eleição presidencial ucraniana em 2019. No episódio, um comediante fracassado faz sucesso dando voz e movimentos a um urso de desenho animado chamado Waldo. Mordaz, o personagem entrevista autoridades e acaba virando político. Dura 43 minutos, mas deveria durar 3.
23º - Crocodile – T4E3 - A personagem principal ganha o prêmio de personagem mais idiota da história de “Black Mirror”: para esconder um segredo do passado que pode prejudicar bastante sua vida, uma arquiteta bem sucedida, mãe de família, morando numa casa deslumbrante de repente se transforma numa espécie de serial killer de testemunhas. Nada faz sentido. É de chorar de desgosto - especialmente porque podia muito ter sido um episódio bom.
Andrea Riseborough em cena de 'Crocodile' — Foto: Divulgação/Netflix