Cenas de 'Olhos que condenam' — Foto: Divulgação
Volta e meia é feito um filme sobre a pena de morte. Quase sempre, contra. O roteiro segue basicamente a mesma linha: um inocente é preso, condenado e, se executado, o público é levado à conclusão óbvia de que não há como reparar o erro.
Há filmes sobre episódios reais e históricos, com repercussão mundial, como os casos Sacco & Vanzetti e Julius & Ethel Rosenberg. E há outros, de ficção, tão ou mais eficazes quando bem feitos, honestos, convincentes, verossímeis.
Em que categoria se situa um filme, ou melhor, uma série em quatro capítulos como “Olhos que condenam”, completando um mês na Netflix? Reconta uma história real, fala de condenação de inocentes, prova como são frequentes os erros da Justiça, mas, não sendo sobre pena de morte, nos faz pensar nela como se fosse. E se a mulher estuprada e agredida no Central Park tivesse morrido, tornando ainda mais grave a acusação aos cinco adolescentes presos?
A resposta está logo no início do segundo capitulo, quando a mãe de um dos acusados e uma amiga veem uma entrevista na televisão. O entrevistado é apresentado como “o bilionário mais excêntrico de Nova York”, está confortavelmente instalado no topo de sua torre, olha de cima para o grande parque onde o crime aconteceu. Para provar que realmente odeia os acusados, pede para eles a pena de morte.
O bilionário vais mais longe: por 85 mil dólares, publica nos jornais da cidade anúncios de página inteira em defesa da volta da pena capital, não aplicada em Nova York desde 1963.
Mais adiante, na mesma televisão, as duas mulheres ficam sabendo o que o bilionário pensa sobre se atribuir ao racismo a prisão dos cinco:
“Um negro pode pensar que não tem vantagens (nos Estados Unidos), mas, na verdade, hoje em dia, eu mesmo, se estivesse começando, adoraria ser um negro instruído, pois acredito que eles levam muita vantagem sobre os brancos”.
Há motivos para acreditar que, em 1989, quando deixou claro o que pensava, o bilionário excêntrico não tivesse alguma ambição política. Ou, tendo, por mais otimista que fosse, não se visse morando na Casa Branca. No entanto, é lá que ele está, pensado da mesma forma e fazendo seguidores.
O caso dos “Cinco do Park” (título original da série, que a realizadora Ava Marie DuVernay preferiu mudar para o original “When they see us”), é dos mais impressionantes da história americana recente, pelo papel que teve nele uma promotora perversamente ambiciosa, uma polícia desumanamente corrupta e um sistema imperdoavelmente falho. No meio de tudo isso, lugar para a pena de morte.
Definidor foi ator Joshua Jackson (intérprete na série do papel de advogado defesa Mickey Joseph), ao ser perguntado por Oprah Winfrey, uma das produtoras de “Olhos que condenam”, o que tinha aprendido com a experiência:
“O que aprendi sobre Justiça é que ela tem o nome errado.”