"Não vai ter Copa"? Por pura curiosidade, faço uma expedição às areias da praia de Copacabana no fim de tarde deste domingo, 15 de junho. Pela primeira vez desde 1950, o Rio ia ser palco de um jogo de Copa do Mundo: Argentina x Bósnia, no Maracanã.

Uma multidão ocupa todos os espaços na areia, diante de uma tela gigante que, daqui a pouco, transmitirá o jogo. A maioria: argentinos, é claro.

Bósnios, chilenos e turistas de procedência incerta formam comitês minoritários nesta versão tropical-futebolística de uma assembleia da ONU.

Enquanto o jogo não começa no Maracanã, a bateria da Mangueira sobe ao palco. É covardia: a percussão explode no ar, irresistível.

Há momentos bonitos: o puxador canta "Exaltação à Mangueira" – com aquela letra que diz "todo mundo te conhece ao longe/ pelo som do teu tamborim/ e o rufar do teu tambor". Quem não conhece passa a conhecer: embalados pela bateria avassaladora, torcedores repentinamente transformados em sambistas dançam sob uma imensa bandeira argentina que de repente alguém desfraldou ao pé do palco.

O puxador ataca com um dos sambas-enredo mais bonitos da Estação Primeira de Mangueira: aquele que homenageou Dorival Caymmi. De novo, a letra soa sugestiva: "o mundo se encanta / com as cantigas que fazem sonhar". 

Penso: ninguém esperava, mas "o mundo se encanta" com esta Copa brasileira. O clima é de festa, congraçamento, futebol, tango, samba e paixão por uma disputa que mobiliza multidões pelo planeta.

Sob as bênçãos de uma noite clara, Copacabana assiste a um improvável mistura de samba e tango: logo depois, para agradar a torcida argentina, o sistema de som toca “La cumparsita”.

Termina a parada musical. O telão passa a mostrar imagens do Maracanã, ao vivo. Os argentinos, majoritários, deliram quando veem as primeiras imagens dos jogadores ainda no túnel do estádio.

Fazem coro para acompanhar a introdução do hino argentino – que, como se sabe, é belíssima e arrebatadora.

Começa o jogo. A torcida acompanha como se estivesse no estádio. (A Argentina, como se sabe, venceria por 2 a 1.) Imagino: não apenas para um estrangeiro, mas também para brasileiros, deve ser uma experiência marcante acompanhar um jogo de seleção ali. É preciso ter disposição, claro, para encarar filas, desconforto, sol no rosto – mas não é todo dia que acontece algo assim.

Um comentarista americano, deslumbrado com o que viu até aqui, escreveu no Twitter: "Se a Copa do Mundo no Brasil vai ser assim, todas as Copas deveriam ser no Brasil".

As próximas Copas não serão, com certeza, no Brasil, mas não é exagero dizer que a proposta entusiasmada do comentarista americano não soaria absurda nem aos ouvidos dos nossos mais dedicados "rivais"  – os argentinos que, ao som da bateria da Mangueira, dançavam sob a bandeira branca e azul-celeste nesta noite de junho em Copacabana.