O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, informou nesta quarta-feira (2) que autorizou a abertura do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. O pedido é assinado por dois juristas, Hélio Bicudo e Miguel Reale Junior, além da advogada e professora da USP Janaina Paschoal e representantes de movimentos contra a corrupção.
Entenda a seguir os argumentos:
CRIMES
Segundo os juristas, Dilma cometeu crimes de responsabilidade previstos na Constituição e na Lei de Responsabilidade Fiscal:
1) Atos contra a probidade na administração
- não tornar efetiva a responsabilidade dos seus subordinados, quando manifesta em delitos funcionais ou na prática de atos contrários à Constituição;
- proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo.
2) Atos contra a lei orçamentária;
- ordenar ou autorizar a abertura de crédito em desacordo com os limites estabelecidos pelo Senado Federal, sem fundamento na lei orçamentária ou na de crédito adicional ou com inobservância de prescrição legal;
- deixar de promover ou de ordenar na forma da lei, o cancelamento, a amortização ou a constituição de reserva para anular os efeitos de operação de crédito realizada com inobservância de limite, condição ou montante estabelecido em lei;
- deixar de promover ou de ordenar a liquidação integral de operação de crédito por antecipação de receita orçamentária, inclusive os respectivos juros e demais encargos, até o encerramento do exercício financeiro;
- ordenar ou autorizar, em desacordo com a lei, a realização de operação de crédito com qualquer um dos demais entes da Federação, inclusive suas entidades da administração indireta, ainda que na forma de novação, refinanciamento ou postergação de dívida contraída anteriormente.
3) Atos contra o cumprimento das leis e das decisões judiciais;
4) Crime contra a guarda e legal emprego dos dinheiros públicos:
- contrair empréstimo, emitir moeda corrente ou apólices, ou efetuar operação de crédito sem autorização legal;
Petrobras
Para os juristas, Dilma não agiu como deveria para punir supostas irregularidades. O documento a ex-ministra Erenice Guerra, envolvida na Operação Zelotes; Graça Foster, ex-presidente da Petrobras; e os ex-diretores da estatal Nestor Cerveró e Jorge Zelada. "A Presidente agiu como se nada soubesse, como se nada tivesse ocorrido, mantendo seus assistentes intocáveis e operantes na máquina de poder instituída, à revelia da lei e da Constituição Federal", dizem os juristas.
Segundo o pedido, houve uma "maquiagem deliberadamente orientada a passar para a nação (e também aos investidores internacionais) a sensação de que o Brasil estaria economicamente saudável e, portanto, teria condições de manter os programas em favor das classes mais vulneráveis". "Durante todo o processo eleitoral, Dilma negou que a situação da Petrobras, seja sob o ponto de vista moral, seja sob o ponto de vista econômico, era muito grave", afirmam os juristas.
Segundo os autores, a "máscara da competência fora primeiramente arranhada no episódio envolvendo a compra da Refinaria em Pasadena pela Petrobras". "A presidente da República era presidente do Conselho da Estatal e deu como desculpa um equívoco relativo a uma cláusula contratual."
O que diz o governo: Dilma tem dito que defende as investigações da Operação Lava Jato e a punição exemplar dos envolvidos cuja culpa seja comprovada. "Não se pode pegar a Petrobras e condenar a empresa. O que nós temos de condenar são pessoas. Pessoas dos dois lados: os corruptos e os corruptores. Eu acredito que a questão da Petrobras é simbólica para o Brasil. É a primeira investigação efetiva sobre corrupção no Brasil que envolve segmentos privados e públicos", afirmou Dilma (leia mais).
Lula
Ainda conforme o pedido, a Operação Lava Jato "jogou luz sobre a promíscua relação havida entre o ex-presidente Lula e a maior empreiteira envolvida no escândalo, cujo presidente já está preso, há um bom tempo". "Não há mais como negar que o ex-presidente se transformou em verdadeiro operador da empreiteira, intermediando seus negócios junto a órgãos públicos, em troca de pagamentos milionários por supostas palestras, dentre outras vantagens econômicas."
"Os contornos de crime de responsabilidade ficam mais salientes, quando se verifica que Lula é muito mais do que um ex- Presidente, mas alguém que, segundo a própria denunciada, lhe é indissociável e NUNCA SAIU DO PODER", diz o pedido.
O que diz o governo: "Em todo o mundo, reis, príncipes, presidentes e ex-presidentes sempre viajaram para defender no exterior os interesses de seu país", disse Dilma, em defesa de Lula. (Leia mais).
TCU
"Cumpre, ainda, chamar atenção para o grave fato de o governo Federal ter tentado constranger o TCU, por meio de estranha entrevista coletiva de três Ministros de Estado, em plena tarde de domingo!", dizem os juristas, referindo-se ao pedido de afastamento contra um dos ministros do TCU, antes da decisão sobre as pedaladas fiscais.
"Existe a tese de que nada haveria contra a Presidente da República. No entanto, os escândalos que se sucedem, de há muito, passam próximos a ela, não sendo possível falar em mera coincidência, ou falta de sorte. A Presidente da República faz parte desse plano de poder. E os Poderes constituídos precisam, nos termos da Constituição Federal, agir."
O que diz o governo: Dilma disse que recebeu o pedido com "indignação". "São inconsistentes e improcedentes as razões que fundamentam esse pedido. Não existe nenhum ato ilícito praticado por mim, não paira contra mim nenhuma suspeita de desvio de dinheiro público", acrescentou.
"Não possuo conta no exterior, nem ocultei do conhecimento público a existência de bens pessoais. Nunca coagi, ou tentei coagir instituições ou pessoas na busca de satisfazer meus interesses", afirmou a presidente (Leia a íntegra).
Decretos sem autorização
Conforme o pedido, Dilma fez editar, nos anos de 2014 e 2015, "uma série de decretos sem número que resultaram na abertura de créditos suplementares, de valores muito elevados, sem autorização do Congresso Nacional", na ordem de R$ 18,4 bilhões.
Segundo os autores, Dilma tinha conhecimento de que a meta de superávit primário prevista na LDO não estava sendo cumprida desde 2014, pois foi o próprio governo quem apresentou o projeto de lei pedindo a revisão da meta, uma "confissão de que a meta não estava e não seria cumprida". Mas, mesmo assim, expediu os decretos sem a autorização prévia do Legislativo.
"É clara, portanto, a realização de crime de responsabilidade no presente caso diante da literalidade dos artigos supracitados, pois houve efetiva realização de abertura e operação de crédito, além de contração de empréstimo ao arrepio da lei", diz o pedido.
"Não bastasse o ocorrido no ano de 2014, a mesma conduta da denunciada foi praticada no ano de 2015", alega o documento. Segundo os juristas, os decretos de 2015 exibiam um superávit "artificial", pois já se sabia que a LDO não seria cumprida. Naquele contexto, houve uma revisão da meta fiscal por projeto de lei. "Idênticas as condutas nos anos de 2014 e 2015!", diz o documento.
"Inegável, portanto, que a infringência às leis orçamentárias é patente, contumaz e reiterada."
O que diz o governo: a defesa entregue ao TCU soma mil páginas. Segundo a Advocacia Geral da União, a sistemática de publicação dos decretos ocorreu em diversos anos, não tenho sido questionada pelo TCU até então e que as que as contas públicas de 2014 foram impactadas por uma realidade econômica que evoluiu de maneira "imprevisível". Entenda
Pedaladas
O pedido também cita as chamadas pedaladas fiscais (entenda) que, segundo os juristas, caracterizam crime de responsabilidade. Essa prática se deu "a partir de adiantamentos realizados pela Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil, em diversos programas federais de responsabilidade do Governo Federal". Sendo controladas pela própria União, estariam impedidas por lei de emprestar ao governo.
"Essa conduta revela que os princípios inspiradores de Maquiavel estão presentes no Governo Federal, na medida em que os fins justificaram os meios, pois o objetivo único e exclusivo das “pedaladas” foi, e ainda é, forjar uma situação fiscal do país que inexiste, sem o temor de afrontar a lei para chegar ao resultado esperado", diz o documento.
Conforme os juristas, "os empréstimos foram concedidos em afronta ao art. 36 da Lei de Responsabilidade Fiscal, que proíbe a tomada de empréstimo pela União de entidade do sistema financeiro por ela controlada". "Caberia à Presidente Dilma Rousseff, como superior hierárquica do Governo Federal, agir para que essa ilegalidade fosse cessada, o que não fez. Valendo recordar que fora alertada por várias autoridades, ainda no curso de 2014 e também em 2015."
"A este respeito, cumpre lembrar que a Presidente é economista e sempre se gabou de acompanhar diretamente as finanças e contas públicas. Aliás, durante o pleito eleitoral, assegurou que tais contas estavam hígidas", argumentam os juristas. "A situação resta ainda mais grave, quando se constata que todo esse expediente fora intensificado durante o ano eleitoral, com o fim deliberado de iludir o eleitorado. Daí ser possível falar em verdadeiro estelionato eleitoral."
O que diz o governo:
Dilma já entregou a defesa das pedaladas ao TCU. O governo, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), do Ministério do Planejamento e do Banco Central, reconheceu que os atrasos nos repasses aconteceram nos últimos anos, mas acrescentou que trata-se de uma “prática antiga”, registrada também no governo Fernando Henrique Cardoso, e defendeu que as “pedaladas fiscais” não são operações de crédito. Entenda
Pedido
Condenação à perda do mandato e inabilitação para exercer cargo público pelo prazo de oito anos. "É o que ora se requer! E não só os denunciantes que assim solicitam, representantes de 45 (quarenta e cinco) movimentos sociais subscrevem esta denúncia."