Por Paula Paiva Paulo


Presença de facções criminosas cresce 46% na Amzônia Legal

Presença de facções criminosas cresce 46% na Amzônia Legal

O número de mortes violentas intencionais caiu 6,2% na Amazônia Legal, mas ainda é 41,5% maior do que a média nacional, revelou nesta quarta-feira (11) a 3ª edição do estudo "Cartografias da violência na Amazônia", do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em parceria com o Instituto Mãe Crioula (IMC).

➡️ A Amazônia Legal é formada por nove estados: Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e por parte do Maranhão, num total de 772 municípios. A área foi delimitada em 1953 por uma lei federal com o objetivo de criar políticas para o desenvolvimento socioeconômico da região.

O estudo analisou o triênio de 2021 a 2023. No ano passado, 8.603 pessoas morreram violentamente na região, contra 9.096 mortes em 2021. A taxa de mortes violentas na Amazônia Legal é de 32,3 a cada 100 mil habitantes, enquanto a média nacional é de 22,8/100 mil habitantes.

🚨 O índice mais violento da Amazônia Legal – e do Brasil – é o do Amapá: 69,9/100 mil habitantes.

A queda nas mortes segue uma tendência nacional. Além disso, segundo os pesquisadores do estudo, a diminuição também se deve ao domínio de facções criminosas. Onde há a presença de mais de uma e disputa entre elas, os índices de violência observados são mais altos.

"Em parte, a redução na taxa pode ser explicada por um crescimento no número de municípios que estão, por assim dizer, dominados, ou que tenham presença de apenas uma facção. Nesse sentido, cresceu muito a influência do Comando Vermelho na região. São 130 municípios em que encontramos evidências de presença apenas do Comando Vermelho", disse o coordenador de projetos do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, David Marques.

Em 2023, o estudo identificou um crescimento de 46% na presença de facções criminosas na Amazônia Legal. Agora, dos 772 municípios, ao menos 260 tem registros desses grupos criminosos.

Disputa de territórios e violência

A Amazônia Legal é uma região estratégica para as organizações criminosas. O Brasil faz fronteira com os três principais países produtores de cocaína do mundo: Colômbia, Bolívia e Peru. "Além de ser vizinho desses países, o Brasil também é um grande mercado consumidor, e é um hub logístico dessa cadeia transnacional de produção de drogas", analisa Marques.

➡️ A disputa pelas rotas do narcotráfico se soma a antigos conflitos fundiários e disputas de terra para a exploração do solo, do desmatamento ao garimpo. Em comum: o controle armado destes territórios.

Os crimes também se sobrepõem e se conectam. O narcotráfico tem usado, inclusive, as cadeias produtivas da madeira e do ouro para lavagem de dinheiro. Diferentemente da cocaína e da maconha, estes são produtos potencialmente legais.

"Esse processo tem se aprofundado na região amazônica, em diferentes áreas. A gente viu, por exemplo, o contexto do assassinato do Dom Phillips e do Bruno Pereira ali na região do Vale do Javari. São atores que têm a ver com o narcotráfico e também com a exploração ilegal de pescado", explica o coordenador do Fórum.

➡️O estudo também aponta uma relação direta entre a degradação ambiental e a violência. Os pesquisadores destacam nove vetores de desmatamento - corredores de expansão econômica que levaram violência em sua esteira. Os que causaram mais danos ambientais, de acordo com os pesquisadores, são as rodovias Cuiabá-Santarém e a Transamazônica.

"São setores de desenvolvimento econômico pensados por uma prática predatória. Os vetores acompanham o avanço da fronteira econômica, a questão do pasto, da soja, do desmatamento ilegal. Na medida em que essas fronteiras econômicas avançam, elas avançam sobre as áreas de preservação, sobre reservas indígenas, e passam a ocorrer disputas pelo mesmo território", analisa o pesquisador sênior do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e diretor-presidente do Instituto Mãe Crioula, Aiala Colares Couto.

Interiorização da violência

As disputas de territórios transformaram cidades pequenas e pacatas em algumas das mais violentas do país. É o caso de Santana, no Amapá, e Sorriso, em Mato Grosso.

As organizações criminosas provocaram a interiorização da violência. Dos 50 municípios mais violentos da Amazônia Legal, há apenas uma capital - Macapá. (veja lista abaixo)

Em primeiro lugar está Cumaru do Norte, no sudeste do Pará. Localizada na área rural, a cidade tem cerca de 14 mil habitantes e uma taxa de 141,3 mortes a cada 100 mil habitantes. Cumaru do Norte nasceu em torno de um garimpo, que até hoje é o principal motor da cidade. O município também é parte da Terra Indígena Kayapó.

"O que está acontecendo hoje? As cidades pequenas se transformaram em espaços de disputas. São cidades com crimes ambientais, disputas de terra, cidades que estão sendo incorporadas às rotas do tráfico de drogas e de outras atividades ilegais, enfim, tem toda uma diversidade de atividades ilegais que agora tem nessas cidades menores a base da sua operação", disse Aiala.

Veja a lista com as 10 cidades mais violentas da Amazônia Legal:

Posição Cidade Taxa média por 100 mil hab (2021-2023)
1 Cumaru do Norte (PA) 141,3
2 Abel Figueiredo (PA) 115,5
3 Mocajuba (PA) 110,4
4 Novo Progresso (PA) 102,7
5 Nova Santa Helena (MT) 102,3
6 Iranduba (AM) 102,3
7 Calçoene (AP) 100,8
8 São José do Rio Claro (MT) 100,1
9 Nova Maringá (MT) 96,5
10 Floresta do Araguaia (PA) 93,2

Sustentabilidade?

🗺️ Em 2025, Belém irá sediar a COP 30 – a conferência do clima das Nações Unidas, quando os holofotes do mundo se voltarão para a região.

Para os pesquisadores do estudo, o controle do crime na região não é só um problema de segurança pública. É também um entrave para a eficácia de implementação de novas bioeconomias e estratégias de financiamento climático.

"Com essa relação entre narcotráfico e crimes ambientais, nós sabemos que isso torna muito mais difícil alcançar o modelo de desenvolvimento sustentável, considerando inclusive que todas essas contradições que se apresentam na região hoje são resultado de modelos de desenvolvimento econômico que deram errado e que precisam ser repensados, senão, não alcançaremos a tal da sustentabilidade", analisou o pesquisador sênior do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e diretor-presidente do Instituto Mãe Crioula, Aiala Colares Couto.

Veja outros destaques do estudo:

  • Violência contra a mulher: Em 2022, 691 mulheres foram assassinadas nos estados da Amazônia Legal, contra 629 em 2023. No caso dos feminicídios, o número manteve-se praticamente estável, passando de 236 vítimas em 2022 para 228 no último ano. Apesar da queda, a taxa de feminicídio é 21,4% acima da média nacional.
  • Uma análise do Sistema de Cadastro Ambiental Rural (CAR) mostrou que mais de 20 mil imóveis rurais estão em terras indígenas ou áreas de proteção ambiental. Destes, 8.610 propriedades rurais estão ilegalmente sobrepostas a Terras Indígenas (TI) e 11.866 propriedade rurais ilegais em áreas de unidades de conservação.
  • Estudo mostra a relação entre o número de pistas de pouso e as áreas garimpadas. O estado de Roraima possuía 218 pistas de pouso identificadas em 2021, considerando regulares e irregulares.
  • Ser indígena na Amazônia é mais perigoso do que fora dela. A região é responsável por 56% das vítimas indígenas de todo o país e abriga 51% da população indígena em território brasileiro, segundo o Censo de 2022.
  • A apreensão de cocaína cresceu na Amazônia Legal em 2023.

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