O Congresso pediu nesta quarta-feira (27) ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino que libere o pagamento das emendas parlamentares, bloqueado desde agosto por determinação do magistrado. Agora, segundo parlamentares ouvidos pelo g1, o Congresso vai esperar a liberação das emendas para votar o Orçamento do ano que vem — o que tem que ser feito até o final de dezembro.
O parlamento argumenta que cumpriu o pedido da Corte ao criar novas regras para a execução dos gastos.
Uma petição, elaborada pelas Advocacias da Câmara e do Senado, solicita que "seja reconhecido o cumprimento das determinações de modo a autorizar a retomada da execução orçamentária das emendas impositivas individuais e de bancada".
Os pagamentos das emendas estão parados pois Dino exigiu mais transparência no processo. Caberá agora ao magistrado liberar os recursos se concordar com projeto aprovado pelo Congresso, que foi sancionado nesta terça-feira (26), sem mudanças, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
"Há obras e serviços já realizados, mas cujo pagamento encontra-se suspenso, gerando graves prejuízos a terceiros de boa-fé. Há também obras e serviços paralisados por suspensão de pagamentos, a ensejar prejuízo a particulares e ao interesse público", diz o ofício enviado ao STF nesta quarta.
Projeto das emendas parlamentares vai para sanção
As emendas são indicações de gastos, reservados dentro do Orçamento, para deputados e senadores investirem em seus redutos eleitorais, na forma de obras e projetos.
Dois senadores da base e um da oposição ao governo Lula afirmaram nesta quarta-feira (27) ao g1 que o ministro vai desbloquear as transferências, mas com pequenas ressalvas à proposta aprovada.
Um desses congressistas, que é governista, se reuniu com o ministro do STF na última sexta-feira (22). De acordo com ele, Dino sinalizou que o projeto "atende a 80%" do que foi solicitado. "Na hora que oficiar, ele [Dino] vai resolver e despressurizar, vai liberar", disse.
Outro parlamentar da base confirmou. "Ele deve aceitar o que aprovamos, com ressalvas", afirmou.
Senadores vêm dizendo ao longo da semana que, enquanto a questão das emendas não for resolvida, não vão avançar no Congresso a votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e nem do Orçamento- a Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2025.
A LOA estima receitas e prevê as despesas públicas, contém todos os gastos do governo para o próximo ano. A LDO, que orienta o Orçamento a partir da política fiscal e das metas para a dívida, deveria ter sido aprovada antes do recesso parlamentar, até 17 de julho, mas foi adiada e a tramitação está bem atrasada.
O presidente Lula sancionou nesta terça o projeto do parlamento. E, em seguida, a Comissão Mista de Orçamento (CMO) divulgou cronograma de votação das duas leis. LDO até dia 10/12 e LOA até 12/12.
Mas senadores insistem que os projetos do Orçamento só vão avançar após Flávio Dino desamarrar a execução das emendas.
O líder do governo no Senado, Otto Alencar (PSD-BA), declarou nesta terça que a análise tanto da LDO quanto LOA só vai desenvolver depois da liberação dos pagamentos. Ele disse ainda que até a regulamentação da reforma tributária, que está no Senado, depende do desbloqueio das transferências.
Congressistas relatam que estão sendo pressionados pelos prefeitos pela falta de recursos para conclusão de obras. Eles explicam que as novas regras só vão valer a partir do ano que vem, que a lei não pode retroagir. Também pontuam que não vão acatar a possibilidade de bloqueio dos recursos reservados para as emendas.
Até parlamentares da base reclamam da demora para solucionar os pagamentos. "Ele [Dino] vai fazer crítica porque agora é confessor de Deus, porque ele nunca foi político, nunca liberou emenda", ironizou um governista.
Assim como criticam os da oposição. "O governo enviou últimos recursos em junho, os municípios estão com agua passando do nariz já, sufoco danado, obra parada, fornecedor sem receber, empreiteiro sem receber. Eu acho que só vai avançar mesmo de fato alguma coisa depois que o governo normalizar essa conversa com o Congresso, de começar a fazer pagamentos. Não pode adiar muito senão vai adiar tudo, e o Orçamento não vai ser votado este ano", disse Zequinha Marinho (Podemos-PA).
"Governo está com uma má vontade, quer mandar outro projeto para bloquear emendas. Congresso não vai recuar daquilo que ele conquistou. A gente chega aqui carregado pelo voto. Quem busca voto, tem que ter prestígio, e o prestígio é a obra sair. A lei é pra resolver a pendência que o Dino criou, espero que ele não se meta mais, não invada mais", complementou o senador.
O líder do União, Efraim Filho (PB), também reforçou que a lei não vai abarcar as emendas deste ano. "Se continuar interrompendo, é jogo de perde perde. É ruim para todo mundo: Congresso, governo e STF. O que foi feito aqui garante os princípios de transparência e rastreabilidade. Bloqueio não tem nada a ver com transparência e rastreabilidade. Continuaremos sem aceitar bloqueio. E não vai retroagir, é para frente", disse o líder.
Entidades, como Transparência Brasil, Transparência Internacional Brasil e Associação Contas Abertas, questionam a efetividade da proposta argumentando que a distribuição das indicações "não obedece a critérios técnicos". Pelo texto, os padrinhos das emendas de comissão, por exemplo, continuam desconhecidos.
Novas regras
O que diz, em linhas gerais, lei sancionada sobre emendas:
Emendas de comissão
Nesta modalidade, o governo não tem obrigação de pagar os recursos indicados pelos parlamentares. Mas o valor das emendas de comissão vem sendo inflado nos últimos anos, pois elas são uma forma de influência da cúpula do Congresso sobre o dinheiro distribuído entre os parlamentares. São usadas ainda para negociar aprovação de propostas de interesse do governo. Essas indicações são derivadas do chamado orçamento secreto, que o STF tornou inconstitucional.
Pela lei sancionada nesta terça, essa modalidade vai corresponder a R$ 11,5 bilhões do orçamento em 2025 e nos anos seguintes o valor será corrigido pela inflação. Ao menos metade do dinheiro terá de ser destinado para ações e serviços de saúde.
Os líderes partidários vão sugerir, dentro de cada comissão, o destino dos valores, que será deliberado e aprovado pela maioria do colegiado. Esse tipo de indicação seguirá sem a digital do parlamentar, ou seja, o autor da emenda continuará sendo a comissão, o que impossibilita rastrear qual deputado ou senador exerceu sua influência sobre os gastos.
Emendas impositivas
As emendas que o governo tem obrigação de pagar, as impositivas, vão crescer acima da inflação ao longo dos anos, mas terão de cumprir os limites de aumento de despesas previstos no arcabouço fiscal. A reserva no Orçamento de 2025 para esta modalidade é de R$ 39 bilhões.
Dentro dessa classificação de emenda, cujo pagamento é obrigatório, cada bancada estadual terá direito a 8 indicações de gastos em projetos estruturantes, como grandes obras. Os parlamentares do mesmo estado terão de decidir conjuntamente os investimentos, sem individualizar as transferências.
No caso das emendas individuais, a principal mudança é em relação às emendas de transferência especial (também conhecidas como "emendas Pix"). A maior alteração é a obrigação de indicação ao órgão de transparência do governo a conta corrente em que os recursos serão depositados. Cada estado ou prefeitura beneficiada com a emenda deverá prestar contas, em até 30 dias, do recurso recebido aos tribunais de conta estadual ou municipal.