Diplomatas do Itamaraty avaliaram que o CEO global do Carrefour, Alexandre Bompard, tentou criar um "factoide" contra as negociações do acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia ao anunciar que a rede não compraria mais carne importada do bloco.
O anúncio foi feito no último dia 20, em carta enviada por Bompard ao presidente do sindicato dos agricultores franceses, Arnaud Rousseau, num cenário de protestos na França contra o fechamento do acordo. Produtores franceses entendem que a medida, se implementada, pode prejudicar a produção local. Nesta terça-feira (26), porém, o Grupo Carrefour publicou uma retratação.
O acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia é discutido desde 1999. Em 2019, as negociações foram concluídas e, desde então, se iniciou a fase de revisão dos termos. O fechamento do acordo, contudo, ainda não aconteceu.
Isso porque, entre outros motivos, parte da Europa, por exemplo, foi incluído um documento adicional com novas exigências na área ambiental e eventuais sanções, o que foi visto como uma "ameaça" por parte do governo brasileiro.
Além disso, do lado brasileiro, por exemplo, o presidente Lula passou a querer discutir o tema das chamadas compras governamentais (compras que o governo faz de produtos brasileiros e que são vistas por críticos como protecionismo).
Na diplomacia brasileira, a avaliação é que a França sempre se mostrou resistente ao acordo. O próprio presidente Emmanuel Macron, por exemplo, já chamou os termos de "antiquados".
Diante desse cenário, a avaliação interna no Itamaraty é que o anúncio do Carrefour, agora retratado, não prejudica o andamento das negociações entre os dois blocos. Isso porque, reforçam os diplomatas, quem negocia em nome da União Europeia é a Comissão Europeia, atualmente presidida por Ursula von der Leyen, que se diz a favor do acordo.
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Parlamento do Mercosul
O senador Nelsinho Trad (PSD-MS), presidente da Representação Brasileira no Parlamento do Mercosul, divulgou nota na qual disse avaliar que o movimento na França prejudica as negociações e, diante disso, chamou uma reunião entre os demais integrantes brasileiros do Parlasul.
"Essas ações prejudicam as negociações doa cordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia, contradizem o espírito de cooperaç~çao e as bases do comércio justo que têm orientado o diálogo entre os blocos", afirmou Trad.
"O Brasil e os demais países do Mercosul têm demonstrado compromisso com padrões rigorosos de sustentabilidade e conformidade com normas internacionais. [...] É importante destacar que o impacto desses boicotes vai além do setor produtivo do Mercosul, afetando também consumidores e a confiança mútua construída nas negociações", acrescentou.
Segundo a assessoria de Trad, o senador também está em contato com parlamentares europeus para discutir o assunto.
No próximo dia 9 de dezembro, haverá sessão do Parlasul, e a expectativa é que Nelsinho Trad paute o tema para debate.
Reação do setor produtivo
A GloboNews apurou que a avaliação entre integrantes do Palácio do Planalto e dos ministérios da Agricultura e das Relações Exteriores é que a reação do setor produtivo brasileiro, anunciando boicote à rede enquanto não houvesse retratação, foi "necessária".
Isso porque, entenderam esses integrantes do governo, se não houvesse uma resposta "firme", outros países da União Europeia poderiam passar a questionar a carne brasileira e dos demais países do Mercosul, gerando "efeito cascata".
Segundo os dados da Associação Brasileira de Indústrias, a União Europeia corresponde a 3,39% das exportações de carne bovina brasileira. Do total exportado ao bloco, a França representa 0,66%, segundo o Ministério da Agricultura.