O deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) criticou a "intervenção" na Câmara promovida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que decidiu afastá-lo do mandato parlamentar e da presidência da Casa legislativa.
A decisão sobre o afastamento foi tomada, na madrugada desta quinta-feira (5), pelo ministro Teori Zavascki e confirmada, por unanimidade, pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) nesta tarde.
"Há pontos muito graves que têm que ser colocados com muitos detalhes. Não justificaria. Isso é parte de uma intervenção clara e nítida que foi feita no poder legislativo", disse o deputado afastado em entrevista à imprensa na residência oficial da Câmara. Segundo ele, o ministro Teori admitiu durante o seu voto que não há previsão para o que foi decidido.
"Não renuncio a nada, nem ao mandato nem à presidência. Vou recorrer", afirmou.
Cunha afirmou ainda que está sofrendo uma retaliação. "Estou sofrendo e vou sofrer retaliação pelo processo de impeachment." "Não diria que liderei o impeachment, cumpri minha função", disse ele sobre o início da tramitação do processo.
Para Cunha, essa "retaliação" se dá porque o PT quer levá-lo ao "banco dos réus na companhia deles". "Mas isso vai acabar quarta-feira que vem", declarou.
Sem acusações
Indagado se o STF o "persegue" em razão da decisão desta quinta, o peemedebista disse que não faria acusações.
"A ação [pedido de afastamento dele] foi movida pelo procurador-geral da República e, obviamente, o que quero dizer aqui é que eu duvido que os outros dez ministros que não o relator [Teori] tenham lido no detalhe o contraditório [a defesa de Cunha no processo]", afirmou (veja no vídeo abaixo).
Ele comparou a sua condição com a do senador Delcídio do Amaral (sem partido-MS), que foi preso por tentar atrapalhar as investigações da Lava Jato. "Delcídio teve prisão decretada e não teve o mandato suspenso", afirmou Cunha.
Urgência
Em alguns momentos da entrevista, Cunha questionou a "urgência" do STF de julgar seu pedido de afastamento, o que, para ele, causa "estranheza" por ter ocorrido "logo após" a Câmara votar o processo de impeachment da presidente Dilma.
Ao afirmar que não pode deixar de "estranhar" o julgamento desta quinta, Cunha disse contestar "com muita veemência" alguns pontos apresentados pelos ministros da Corte e enfatizou a "desavença grande" com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, autor do pedido de afastamento, em razão do que ele chamou de "atos anormais".
"Se tinha urgência [em votar o pedido de afastamento], porque levou-se seis meses para analisar a liminar [o pedido]?", indagou (veja o vídeo abaixo).
Para Cunha, pedido do procurador é "absurdo" e tem vários pontos que podem ser questionados. "Os fatos elencados, aqueles 11 fatos [apresentados por Janot], assimilados pelo ministro relator, são fatos absolutamente contestáveis e o mérito de cada ponto não foi devidamente debatido com o devido respeito ao contraditório", acrescentou.
'Constrangimento'
Cunha também foi questionado sobre se acredita que causa "constrangimento" à Casa permanecer no mandado mesmo após se tornar réu no Supremo e diante da decisão desta quinta.
Ele não respondeu diretamente ao questionamento, mas disse que essa pergunta deve ser feita à presidente Dilma Rousseff na semana que vem, após o Senado decidir sobre o processo de impeachment dela – se o plenário optar pelo andamento do processo, ela deverá ser afastada por até 180 dias.
Dilma
Cunha também aproveitou parte da entrevista para fazer críticas diretas à presidente Dilma Rousseff e ao PT.
Diante da repercussão política sobre o afastamento de Cunha, que ocorreu na manhã desta quinta –, Dilma comentou o caso e disse "antes tarde do que nunca". Ela, contudo, disse lamentar que o peemedebista só tivesse sido afastado após ter comandado "na cara de pau" o processo de afastamento dela.
Ao mencionar as declarações da presidente, Cunha afirmou: "Na quarta-feira que vem, eu poderei dizer a mesma coisa. Antes tarde do que nunca, porque o Brasil vai poder se livrar do PT".
Conselho de Ética
Cunha disse que nunca interferiu nos trabalhos do Conselho de Ética."Temos um presidente do Conselho de Ética de moral duvidosa, que efetivamente buscou um holoforte." Ele disse que o presidente do conselho, deputado José Carlos Araújo (PR-BA), cometeu uma série de erros que, quando foram reparados, a imprensa considerou como manobras.
O deputado afastado citou como exemplo a inclusão de um deputado do seu bloco partidário para a eleição da relatoria do conselho, o que seria proibido pelas normas.
Votação no STF
Acompanharam Teori os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli e Cámen Lúcia, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. Quase todos afirmaram se tratar de uma medida "excepcional".
Teori atendeu a um pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que afirmou que o afastamento era "fundamental" para o garantir o "regular funcionamento das instituições sem embaraços ou condutas espúrias", ante o risco do deputado praticar "novos ilícitos".
O pedido da PGR não inclui a cassação do mandato de Cunha, decisão que só pode ser tomada pelo plenário da Câmara, formado por 513 deputados.
O afastamento pedido, no entanto, vale por tempo indeterminado, até o procurador-geral e o ministro considerarem que já não existe mais risco de interferência do deputado no caso.
Com o afastamento de Cunha, assumiu a presidência da Câmara o deputado Waldir Maranhão (PP-MA), vice-presidente da Casa e aliado do peemedebista.