A quem interessa a nomeação rápida de Zavascki?

qua, 26/09/12
por Centro de Justiça e Sociedade da FGV-Rio |

Por Ivar A. Hartmann
O Brasil está testemunhando um processo de nomeação de ministro do STF problemático como poucos antes. A relação com o julgamento do mensalão é óbvia. Fingir que essa questão não existe não atende a nenhum interesse legítimo para o Judiciário e para os brasileiros.

A presidente poderia ter nomeado mais tarde; o Senado poderia ter adiado a sabatina. Mas temos de pensar a questão como está posta. E duas perguntas são essenciais: por que Teori Zavascki deveria votar no mensalão? A quem interessa a nomeação acelerada?

A decisão sobre se vota ou não cabe unicamente a Zavascki. Ninguém – nem o plenário do Supremo – pode obrigá-lo a votar se ele não se der por inteirado do caso. Existem argumentos a favor e contra a participação do potencial futuro ministro.

Se votasse no caso do mensalão, Zavascki estaria contribuindo com sua inegável experiência e notável saber jurídico. Especialmente em um caso envolvendo aspectos financeiros – ele foi advogado do Banco Central e é tido como grande tributarista. Tem conhecimento de causa. Sua imparcialidade não pode ser questionada.

Em contra pode-se apontar que teríamos a mudança na composição do órgão julgador em meio ao próprio julgamento. Isso viola o princípio do juiz natural, vital para o Estado de Direito, segundo o qual não se decide arbitrariamente sobre por quem e quando réus são julgados. A decisão de indicar Zavascki agora é uma escolha pessoal da presidente. É mudar as regras do jogo em meio ao próprio jogo.

Independentemente de quem está trabalhando para a aceleração, a quem interessa a nomeação rápida? Os advogados dos réus sabem que com mais ministros na corte, mais ministros precisam ser convencidos da inocência: o empate favorece a absolvição.

A PGR até agora não se manifestou contra a possibilidade de Zavascki votar. O PT não força a conclusão da sabatina no Senado. Apenas o PMDB parece apressar o processo, ao mesmo tempo que presta um ombro amigo ao ministro. Essa questão está mais nebulosa do que deveria, em se tratando da escolha de membro da corte máxima do país.

Os brasileiros precisam exigir que seus senadores obtenham resposta para essas duas perguntas. Ademais, se a pressa nada tem a ver com o mensalão, por que Zavascki simplesmente não responde se vota ou não, sem tangenciar a questão? Uma aprovação pelo Senado que ignore essas questões será nada menos que ilegítima.

Publicada às 7h28

Novo ministro poderia votar no mensalão?

qua, 26/09/12
por Carlos Velloso |

Estão acesas as discussões. O ministro Teori, recentemente indicado para o Supremo Tribunal Federal, poderia votar no julgamento do mensalão?

Primeiro que tudo, desejamos deixar claro que temos pelo ministro Teori Zavascki grande estima, admiração e respeito. A sua indicação para o Supremo foi das mais felizes. Trata-se de magistrado exemplar, competente, de alto saber jurídico, de reputação ilibada, o que é reconhecido pelos homens e mulheres do seu tempo.

Isto posto, vamos ao exame da matéria: poderia ele votar no julgamento do mensalão, ele que está chegando com o julgamento em andamento?

A regra aplicável, em princípio, está no § 2º do art. 134 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal: “não participarão do julgamento os ministros que não tenham assistido ao relatório ou aos debates, salvo quando se derem por esclarecidos.”

E mais: “se, para o efeito do quorum ou desempate na votação, for necessário o voto de ministro nas condições do parágrafo anterior” – a regra do § 2º acima transcrito – “serão renovados o relatório e a sustentação oral, computando-se os votos anteriormente proferidos.” (§3º do citado art. 134).

Veja-se como é cauteloso o Regimento Interno.

Observada a regra acima indicada, o ministro empossado no cargo, quando em andamento um julgamento, se chamado a votar, poderia fazê-lo, desde que se desse por esclarecido. Se está esclarecido, não poderia, evidentemente, pedir vista.

Indaga-se: estaria esclarecido, assim capacitado para votar, o ministro que não assistiu ao longo relatório nem aos debates, nem os votos já proferidos, num processo do tamanho e da complexidade da AP 470? Somente um gênio, daqueles que costumam escapar de garrafas perdidas, é que seria capaz de tal proeza.

Mas o que na realidade ocorre deixa de lado a regra do § 2º do art. 134 do RI/STF.

É que o ministro ora indicado – indicação das melhores, vale repetir – sucederá ao ministro Cezar Peluso. Ambos, aliás, têm o mesmo perfil. São magistrados notáveis. E o ministro Peluso, agora aposentado, participou do julgamento e votou. Então, o seu sucessor não poderia votar no mesmo julgamento.

Não importa se o ministro sucedido votou apenas numa “fatia” do julgamento. O que importa é que participou do julgamento e votou. Assim, não poderia participar desse mesmo julgamento o seu sucessor. Se o fizesse, teriam participado não onze ministros (Constituição Federal, art. 101), mas doze, o que tornaria nulo o julgamento.

Anulação
A propósito da possibilidade de anulação de decisão do Supremo Tribunal Federal, esclareça-se que somente este é que poderia fazê-lo, e não uma corte internacional, como, equivocadamente, um ou outro tem sustentado.

É certo que o Brasil aceitou a jurisdição da Corte de Direitos Humanos da OEA. Todavia, o Brasil, que não é país de 4ª classe e é cônscio de sua soberania, não se comprometeu, no Pacto de São José da Costa Rica, a subordinar os órgãos do seu governo à Corte de São José ou à sua Comissão de Direitos Humanos. O que poderia ocorrer é, por exemplo, em caso de erro judiciário, fazer jus, o prejudicado, a uma indenização.

Recentemente, aliás, a presidente Dilma, ao que estou informado, rejeitou comunicação da Comissão de Direitos Humanos, a respeito da Usina de Belo Monte e, considerando-a inaceitável, chamou de volta o nosso embaixador junto à OEA. Procedeu com acerto, a presidente, procedeu como chefe de Estado de um país que leva a sério a sua soberania.

Recomenda-se a leitura atenta do Pacto de São José da Costa Rica.

A força da maioria

qua, 26/09/12
por Centro de Justiça e Sociedade da FGV-Rio |

*por Vitor Pinto Chaves

Na última quinta-feira o ministro revisor Ricardo Lewandowski surpreendeu ao mudar seu posicionamento sobre o que é necessário para o crime de corrupção passiva. Ao contrário de seu voto no caso do deputado João Paulo Cunha, o revisor seguiu o que identificou ser um novo entendimento da maioria do Tribunal. Para que ocorra o crime de corrupção passiva não seria mais necessária a identificação do chamado ato de ofício – o ato praticado pelo funcionário público por causa de sua função, no caso, se os deputados e ex-deputados réus votaram ou prometeram votar com o governo. Bastaria o recebimento da vantagem indevida e o poder potencial do cargo ocupado. Lewandowski fez questão de enfatizar que essa não era sua opinião. Mesmo assim, em suas palavras, curvou-se à posição da maioria.

O ministro revisor teve, entretanto, uma postura diferente em relação a outro crime, a lavagem de dinheiro. Na segunda-feira ele reafirmou sua posição do início do julgamento, ressaltada também na última quinta-feira, de que o ato do recebimento do dinheiro pelos réus (parlamentares, ex-parlamentares, dirigentes partidários e assessores) não poderia ser, ao mesmo tempo, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Em sua visão, tratar-se-ia de uma dupla punição pelo mesmo ato(ne bis in idem), o que seria proibido pelo direito. Sua posição foi a mesma de quando votou pela absolvição de João Paulo Cunha pelo crime de lavagem de dinheiro. Naquela oportunidade foi vencido pela maioria, que considerou que os dois crimes haviam ocorrido. Não se curvou à maioria.

Não é raro – não apenas no STF como também em outros tribunais – um juiz abandonar suas convicções pessoais em nome da interpretação colegiada. Porém, não é nada fácil saber, de fato, qual é a força da maioria.

STF inicia reforma política com votos sobre corrupção

qui, 20/09/12
por Centro de Justiça e Sociedade da FGV-Rio |

Por Tânia Rangel
A grande novidade no julgamento do mensalão hoje foi a concordância entre os ministros relator e revisor. E em quê eles concordaram?

Concordaram que as provas exigidas para a comprovação do crime de corrupção passiva devem se concentrar no núcleo principal do crime, no recebimento ou na solicitação da vantagem indevida. E o ato de ofício? Não teria ele que ser provado?

Os ministros relator e revisor responderam que a prova do ato de ofício, o ato que é da competência exclusiva do funcionário público (o voto do deputado, por exemplo), serve para que o aumento da pena do crime seja aplicado e não para que a pessoa seja condenada. Para a condenação basta que exista uma expectativa da prática desse ato de ofício e que este ato de ofício esperado esteja dentro das atribuições, das funções do funcionário público, do parlamentar.

Por isso, quando o deputado recebe dinheiro e esse recebimento fica comprovado por provas documentais e testemunhais e quem paga a ele tem a expectativa de que ele votará para favorecer seu interesse, esse deputado será condenado por corrupção passiva. E se ele usou o dinheiro para repassá-lo ao partido para pagar dívidas de campanha?

Nesse caso, não interessa para quê o deputado recebeu o dinheiro. Se foi para caixa dois de campanha eleitoral, ou para comprar um carro, ou para viajar. Se ele recebeu dinheiro que não deveria já é corrupção.

Caso essa concordância entre os ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski seja mantida pelos outros Ministros do STF – e é provável que assim seja – podemos dizer que hoje foi o dia em que se começou uma verdadeira reforma política no Brasil.

Essa decisão demandará maior transparência nas contas partidárias. Com ela, se poderá conhecer todos os doadores das campanhas eleitorais, pois os candidatos que receberem dinheiro e não declararem poderão ser condenados por corrupção passiva. Perderão o mandato, se eleitos, e se tornarão inelegíveis por alguns anos. É um novo começo. Um bom começo.

Um peso e uma medida

seg, 17/09/12
por Alexandre Camanho |

Houve ou não o pagamento de propina a parlamentares? Esta será a principal questão a ser respondida na fase que se inicia hoje no julgamento do Mensalão. Voltam ao centro do debate dos ministros do Supremo os crimes de corrupção passiva e ativa.

A tendência é de que a Suprema Corte não utilize dois pesos e duas medidas para estabelecer os elementos probatórios necessários para comprovar a corrupção ativa: afinal, seus ministros já firmaram o entendimento de que não há necessidade de prova direta para condenar um criminoso por corrupção passiva. Valorizar-se-á, ao que tudo indica, a análise sistemática das provas e a lógica e o bom senso, que ostensivamente apontam para o cometimento orquestrado, preordenado e metódico dos mais variados crimes.

O encadeamento das etapas e a progressiva validação da denúncia do Ministério Público Federal indicam que o STF vai privilegiar o acervo probatório da Ação Penal 470 e partir do pressuposto de que todos os esquemas relacionados aos crimes já julgados – lavagem de dinheiro, peculato, desvio de recursos públicos, gestão fraudulenta, gestão temerária – serviram a um propósito comum. Os crimes não eram cometidos isoladamente, mas como peças de uma engrenagem. Na realidade, o STF – a despeito da crescente e indisfarçada aflição dos advogados do réus – está fazendo uma notável interpretação e aplicação das leis penais, adequada à mais alta Corte do país.

Mesmo com uma jurisprudência já consolidada e originária dos tribunais dos quatro cantos do Brasil – aí incluindo as Cortes superiores -, que se empenharam fortemente em prodigalizar garantias e proteções a um ponto tal que virtualmente inviabilizaram a persecução de crimes dessa natureza, o Supremo vem conciliando-se, nesta matéria, com uma atribuição clássica do Judiciário: dar efetividade às leis. Ao esmerar-se em trazer de volta certos tipos penais que pareciam relegados à academia e a outros países civilizados, o STF dá um enorme passo no sentido de, acima de tudo, fazer ressurgir o até então esquecido conceito de república, que prestigia fortemente a proteção e o bom uso do dinheiro público, o desempenho probo do cargo público e a imprescindibilidade da fiscalização de ambos.

Um pedido do Supremo

sex, 14/09/12
por Centro de Justiça e Sociedade da FGV-Rio |

Por Tânia Rangel
Talvez tenha causado assombro a algumas pessoas ao acompanhar o julgamento do mensalão essa semana perceber a facilidade com que se desviava, transferia e se lavava grandes quantidades de dinheiro, superiores a R$ 70 milhões. E, como bem lembrou o Ministro Gilmar Mendes, esses valores podem ser somente uma parte de todo o esquema. Inclusive, com possíveis participações de outras instituições financeiras e pessoas. É fácil perceber que esta não é uma afirmação leviana do ministro. Ao contrário.

O crime de lavagem de dinheiro, combatido mundialmente, é responsável não só por alimentar redes terroristas, grupos armados e organizações criminosas, mas também é a forma usada para limpar o dinheiro que vem da corrupção. Responde por 5% do PIB mundial, como dito hoje no julgamento. E justamente por isso, sua prática é feita quase sempre com o uso de super estruturas, com o maior grau de complexidade que os envolvidos conseguirem formular. E é em razão disso que quando se descobre a prática do crime de lavagem de dinheiro por um determinado grupo, dificilmente se consegue descobrir todo o montante lavado e todos os envolvidos com o crime.

Com esse julgamento, percebe-se que esses grupos não terão a conivência do Judiciário. É um passo dado em direção a um verdadeiro Estado Democrático de Direito. Mas não é suficiente. Para se combater crimes com essa complexidade de operação, é preciso que as nossas instituições de fiscalização, o Banco Central e o TCU entre elas, aperfeiçoem seus mecanismos de fiscalização para evitar não só a prática desses crimes, mas que também facilitem a obtenção de provas da sua prática, facilitando o julgamento desses crimes. Foi com esse pedido que o Supremo encerrou hoje a sessão. Por que não atendê-lo?

A participação de Teori Zavascki no julgamento do mensalão

qua, 12/09/12
por Centro de Justiça e Sociedade da FGV-Rio |

*por Tânia Rangel

Se o Ministro Teori Zavascki, recém indicado pela presidenta Dilma para o STF, tomar posse e o processo do mensalão ainda não tiver terminado, o que acontece? Duas são as possibilidades, cada uma com diferentes desdobramentos.

A primeira possibilidade é que ele decida não participar do julgamento. Em geral, um Ministro não pode decidir se vai ou não participar do julgamento de um processo, a não ser que esteja impedido ou seja suspeito. Nenhuma dessas exceções é o caso do Ministro Zavascki. Mas, o Regimento Interno do STF permite ao Ministro, que não tenha participado do relatório e dos debates, ausentar-se também do julgamento.

Nesse caso, o julgamento do mensalão continua com os atuais dez Ministros. Mas, se houver empate, aí o Ministro Zavascki terá que votar.

E nesse caso, conforme do Regimento Interno do STF, o relatório e as sustentações orais deverão ser renovados, isto é, deverão acontecer de novo, para que ele possa se inteirar do caso, formar o seu convencimento e votar. E assim desempatar.

A outra possibilidade é que ele participe do julgamento. Mesmo sem ter participado das sessões onde foi lido o relatório e das duas semanas de sustentações orais feitas pela defesa e pelo Procurador Geral da República, ele pode se declarar esclarecido do processo e votar.

Nesse caso, ele poderá pedir vista do processo? A princípio não. Por quê? Porque para o Ministro que não participou da apresentação do relatório e dos debates, a regra geral do Regimento Interno do STF é que ele não vote. Exceto se der empate.

Para que possa votar, ele tem que se declarar esclarecido do processo, isto é, que ele conhece o processo, que ele conhece os fatos e provas ali produzidos. Ora, se ele já está esclarecido sobre o processo, não há motivo para o pedido de vista, que é justamente o pedido feito para que se conheça melhor o processo. Foi por isso, inclusive, que o Ministro Marco Aurélio, em entrevista, disse que ele não poderia pedir vista do processo.

Porém, é o Presidente do STF, o Min. Ayres Britto, quem tem a palavra final a esse respeito, pois é ele quem concede ou não o pedido de vista.

E supondo que ele se declare esclarecido e não peça vista, ele vota a partir de qual ponto? Não há dúvidas de que ele não poderá votar sobre o primeiro ponto que já foi votado pelo Ministro Peluso. Nem participar da dosimetria das penas desse item, pois ela também já foi definida por ele. Mas e nos outros pontos?

Como os Ministros do STF podem rever o seu voto a qualquer momento do processo, desde que antes da proclamação final do julgamento, o novo Ministro poderá, a princípio, votar em todos os pontos, com exceção do ponto 3, que foi votado pelo Min. Peluso. E, desde que não haja empate nos pontos já julgados pelo Supremo, o voto de Zavascki não fará diferença quanto à condenação ou absolvição dos réus julgados.

Porém, se no momento em que tomar posse, o julgamento estiver na parte da dosimetria das penas, o Supremo terá que decidir se ele participará desse momento do julgamento ou não. Isto porque nesse momento, o Plenário já terá decidio quem são os culpados e por quais crimes e quem são os inocentes. E apesar de o julgamento não ter terminado, votar somente na dosimetria é um procedimento estranho a qualquer tribunal. No STF nunca ocorreu até agora. Seria essa a primeira vez?

3 + 5 = 4?

seg, 10/09/12
por Centro de Justiça e Sociedade da FGV-Rio |
categoria Todas

*por Diego Werneck Arguelhes e Vitor Pinto Chaves

Qual a ligação entre a gestão fraudulenta de dirigentes do Banco Rural (item 5 da denúncia) e os desvios de recursos públicos do Banco do Brasil e da Câmara dos Deputados (item 3)? Essa é a questão implícita que o Supremo terá de decidir nesta semana. Cada item da denúncia é uma peça isolada ou estamos diante de um quebra-cabeça? A resposta a essa pergunta será fundamental para que o STF decida se houve ou não o chamado “mensalão”.

Há duas semanas o Tribunal concluiu que João Paulo Cunha, Henrique Pizzolato, Marcos Valério e seus sócios desviaram recursos públicos. Na última semana, condenou dois dirigentes do Banco Rural por empréstimos bancários forjados às empresas de Marcos Valério e aos Partidos dos Trabalhadores. Esses dois crimes poderão ou não se encontrar a partir desta segunda-feira, quando o Supremo iniciará a discussão sobre se os empréstimos bancários serviram ou não para a lavagem dos dinheiros desviados.

Segundo o Ministério Público os dirigentes do Banco Rural, no momento da concessão dos empréstimos em condições facilitadas, sabiam da origem ilícita do dinheiro (parcela do qual advindo de recursos públicos) que seria utilizado para o saques de políticos e laranjas, e não para pagamento de fornecedores das empresas de Marcos Valério. Por essa razão estão sendo acusados do crime de lavagem de dinheiro (item 5 da denúncia). Para o MP há um conjunto.

Para as defesas a soma das partes não significa um todo. As defesas dos dirigentes do Banco Rural afirmam que seus réus não tinham conhecimento da origem/natureza ilícita do dinheiro. Não terão, entretanto, mais a seu favor o argumento de que os empréstimos foram legais. O Supremo, de forma unânime, negou essa tese. Também negou que tenha havido simplesmente o crime de gestão temerária, como tentou argumentar a defesa em recentes memoriais enviados aos Ministros. Ou seja, ocorreu crime não porque os empréstimos tenham sido excessivamente arriscados ou imprudentes, mas porque não eram de fato empréstimos. Eram simulações. A gestão fraudulenta, na visão dos ministros, foi definitivamente comprovada.

O STF ainda não decidiu se os itens 3 (desvios de recursos públicos) e 5 (gestão fraudulenta) estão ligados pelo item 4 (lavagem de dinheiro). Mesmo que entenda que sim, isso ainda não resolverá a questão que a opinião pública quer ouvir dos ministros: o dinheiro foi destinado a caixa dois de campanhas eleitorais, ou houve de fato o chamado “mensalão”? A ligação entre 3 e 5, porém, pode ser um divisor de águas para a caracterização do crime de quadrilha – quando mais de três pessoas se juntam para o cometimento de crimes. Ficará em aberto, todavia, quais eram todos os seus membros e para que serviam os recursos desviados. Mensalão ou caixa dois?

Peças de dominó?

sáb, 08/09/12
por Alexandre Camanho |
categoria Todas

Até agora, no julgamento do processo do mensalão, as teses apresentadas pelo procurador-geral da República, Roberto Monteiro Gurgel, vêm sendo confirmadas pelos ministros da Suprema Corte. Após a análise de dois capítulos, oito réus foram condenados e dois absolvidos. Os entendimentos firmados na Ação Penal 470 estão realmente fazendo História. Superando jurisprudências impróprias para o enfrentamento eficaz da criminalidade e firmando novas diretrizes absolutamente adequadas à contemporaneidade, o Supremo vem mostrando que sua percepção é de que os crimes aconteciam de forma organizada.

Alguns já tentam até prever qual será o destino dos demais réus, que ainda aguardam a decisão final do Supremo Tribunal Federal. Contudo, isso é impossível. Embora sejam peças concatenadas, as práticas criminosas vêm sendo apreciadas de forma estanque. É claro que, a cada vez que o tribunal se debruçar sobre um grupo e seus delitos e proclamar condenações, estará validando a teses de que havia uma dinâmica entre esses blocos subjetivos e suas ações; os crimes não ocorriam sem conexão com outros, mas para servirem a um propósito, a um proveito. Mas isso se concluirá paulatinamente,se e quando prosseguirem as condenações.

Não estamos tratando aqui de peças de dominó. A queda dos primeiros oito não significa, necessariamente, que os demais estão fadados à condenação. A legislação brasileira garante aos réus um julgamento digno, com procedimentos bem definidos, típicos de um Estado Democrático de Direito. Somente quando se encerrar a última sessão deste julgamento é que teremos a compreensão da abrangência do esquema e da medida da participação dos envolvidos.

As vozes do Supremo e a sociedade

qui, 06/09/12
por Centro de Justiça e Sociedade da FGV-Rio |

*por José Augusto Garcia de Sousa

Na semana passada, o ministro Luiz Fux afirmou: “a cada desvio de dinheiro público, mais uma criança passa fome, mais uma localidade fica sem saneamento, mais um hospital sem leitos. Estamos falando de dinheiro público, destinado à segurança, saúde e educação.” Na sessão de ontem, ele repetiu o discurso, salientando o prejuízo que os crimes financeiros causam principalmente às pessoas mais pobres.

A rigor, o Supremo Tribunal Federal não precisaria emitir esse tipo de comentário. Não seria o mais apropriado diálogo com a sociedade. Alguns mais críticos falariam em populismo judicial. Quando julgam homicídios, por exemplo, os juízes não precisam discorrer sobre os malefícios desse crime. Basta aplicar as regras técnicas correspondentes.

É irreal, porém, pensar que o mensalão seja um julgamento qualquer. Nunca as vozes do Supremo foram tão ouvidas pela sociedade brasileira. A Corte sente que tem uma oportunidade de ouro para estampar a sua legitimidade. Nesse contexto, as fundamentações devem ser mais abrangentes. E as palavras do ministro Fux, antes de traduzirem indesejável populismo, podem mostrar que o Tribunal se mostra sensível aos clamores da sociedade.

Certo, o julgamento dos réus, em um processo penal, deve ser técnico, sem brecha para qualquer populismo. Mas isso não impede que o Supremo reafirme,sempre que possível, valores essenciais à ordem jurídica e à coletividade. É o que se espera do órgão de cúpula de um dos poderes da República.

Diferença entre gestão fraudulenta e gestão temerária

seg, 03/09/12
por Centro de Justiça e Sociedade da FGV-Rio |

Hoje relator e revisor condenaram os réus do Banco Rural por gestão fraudulenta. Enquanto isso os advogados dos réus enviaram memoriais de última hora reforçando o pedido de declaração de inocência, mas dizendo que caso o STF os declare culpados que o façam por gestão temerária e não por gestão fraudulenta.

Qual a diferença ? Por que eles fizeram isso?

A gestão fraudulenta envolve, como o nome diz, fraude. Ou seja, a produção de um documento falso, a prestação de uma informação falsa, uma mentira. O que se está protegendo aqui é a fé pública. Um banco que preste informações falsas está comprometendo, em primeiro lugar, a credibilidade das relações entre bancos e órgãos de controle que são baseadas na confiança. Mas está também criando espaço para acobertar o cometimento de crimes por parte de seus clientes.

Já na gestão temerária o banco não mentiu. O banco descumpriu normas de cautela. Emprestou mais do que deveria a um cliente já inadimplente, tomou riscos que as condições de mercado não aceitavam, colocou em risco o patrimônio de seus clientes. Aqui, se pretende proteger a saúde do sistema financeiro. Se um banco toma riscos elevados ele pode comprometer o sistema bancário como um todo, produzir um efeito dominó.

Levando em consideração essas diferenças a lei prevê uma pena maior para a gestão fraudulenta. Em primeiro lugar pela conduta maliciosa embutida na fraude, mas também porque essa conduta possibilita que crimes gravíssimos possam ocorrer, danificando não apenas o sistema financeiro, mas vidas e patrimônios de muitos indivíduos.

Se condenados por gestão temerária a pena mínima é de dois anos, o crime pode até estar prescrito.

Por isso, o que os advogados do Banco Rural tentam dizer é que eles não produziram nenhuma informação falsa. Eles, quando muito, avaliaram inadequadamente o risco dos empréstimos que fizeram.

Relator e revisor não concordaram, foram categóricos em afirmar que houve fraude. Que as condutas do Banco Rural devem ser punidas, não por terem colocado em risco a saúde do sistema financeiro, mas por terem sido condutas fraudulentas que possibilitaram o cometimento de crimes.

Resta agora ver como se posicionam os outros ministros.



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