O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou nesta quarta-feira (14) cinco questões levantadas pelos advogados de defesa nos recursos dos 25 condenados no processo do mensalão, consideradas pelo presidente do Supremo e relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, como questões "preliminares".
Os ministros rejeitaram a possibilidade de um novo relator para os embargos de declaração (recursos contra condenações); a republicação do acórdão do julgamento (documento que resume as decisões tomadas); o envio do processo dos réus sem foro privilegiado para julgamento na primeira instância da Justiça; que os ministros que absolveram pudessem definir penas; e a nulidade dos votos dos ministros que julgaram os réus, mas que não participaram da definição do tamanho das punições.
Em apenas dois pontos não houve unanimidade. O ministro Marco Aurélio Mello entendeu que a retirada de falas de ministros do acórdão prejudicou as defesas e que, portanto, um novo documento é necessário. Ele manteve ainda voto dado no ano passado de que os réus sem foro privilegiado têm o direito de julgamento na primeira instância.
A maioria dos magistrados considerou que todos os temas já haviam sido decididos pelo tribunal no ano passado, quando a Corte condenou 25 e absolveu 12 após entender que houve esquema de compra de votos de parlamentares para favorecer o governo federal nos primeiros anos da gestão de Lula.
No começo da sessão desta quarta, o presidente da corte, ministro Joaquim Barbosa, anunciou que, após a definição das preliminares, o julgamento dos recursos será feito de maneira individualizada, ou seja, réu por réu.
Chamados de embargos de declaração, esses recursos servem para contestar "omissões, contradições ou obscuridades" no acórdão, que é o documento que resume as decisões tomadas no julgamento e foi publicado em abril. Na teoria, esses embargos não mudam o mérito da condenação, mas servem para esclarecer pontos obscuros da decisão. No entanto, se constatada alguma irregularidade no processo, eventual "contradição" pode resultar em redução das penas.
Ao todo, são 26 embargos apresentados – além dos recursos dos 25 condenados, há embargos de declaração de Carlos Alberto Quaglia, cujo processo foi enviado para julgamento na primeira instância. O Supremo decidiu absolvê-lo de um dos crimes para que ele responda apenas por lavagem de dinheiro na primeira instância.
O presidente do Supremo anunciou em plenário que serão julgados os recursos na seguinte ordem: Emerson Palmieri, Jacinto Lamas, Valdemas Costa Neto, José Borba, Romeu Queiroz, Roberto Jefferson, Simone Vasconcelos e Bispo Rodrigues. A ordem dos demais não foi anunciada.
Joaquim Barbosa
Ao rejeitar a possibilidade de um novo relator para os embargos de declaração, o presidente do Supremo e relator do processo do mensalão, ministro Joaquim Barbosa, afirmou que, pelo artigo 337 Regimento Interno do Supremo, cabe a ele se manter como relator.
O segundo ponto analisado por Joaquim Barbosa foi o pedido de alguns réus para que o acórdão do julgamento do mensalão fosse anulado devido à ausência de trechos de debates e votos no documento. Para o ministro, o cancelamento no acórdão de falas proferidas durante o julgamento não compromete a compreensão da decisão tomada pela corte.
“Não há que se falar em omissão causada pelo cancelamento de algumas notas taquigráficas relativos às intervenções orais dos ministros desta Corte. O mesmo se diz em relação à falta de alguns votos vogais. Não se trata de obscuridade que impeça a compreensão do acórdão até porque o julgado está claramente posto.”
Barbosa rejeitou ainda alegação contida nos embargos de que réus sem foro privilegiado tiveram a defesa cerceada por serem julgados diretamente no Supremo Tribunal Federal, em vez de terem a ação analisada pela primeira instância. O ministro argumentou que a matéria já foi analisada pela Corte no começo do processo e que a maioria decidiu que não caberia desmembrar o processo, ou seja, enviar os réus sem foro privilegiado para a primeira instância.
“O que se tem aqui é a tentativa de eternizar a discussão acerca de um tema já analisado pelo plenário”, argumentou.
Barbosa rejeitou também a alegação de que o voto do ministro Carlos Ayres Britto no julgamento não se concluiu e deveria ser anulado, porque ele não chegou a apresentar a dosimetria da pena, ou seja, discutir o tamanho das punições dos condenados. Britto se aposentou antes do cálculo das penas.
“Não há omissão, obscuridade ou dúvida porque essa alegação foi objeto de exame objetivo durante o julgamento em razão de questão de ordem formulada duas vezes e rejeitada pelo colegiado.”
Voto divergente
O ministro Marco Aurélio foi o único a discordar de Barbosa. Ele defendeu argumentação feita pela defesa de que o cancelamento de falas no acórdão do julgamento do mensalão prejudicou a ampla defesa dos réus.
“Os cortes se mostraram substanciais. Digo que nós somos senhores das nossas palavras. Atuamos com autonomia da vontade jurídica, mas uma vez vinculadas as nossas palavras em termos de julgamento, a partir da ciência e consciência presumidas, essas palavras não nos pertencem mais e compõem algo que é uma garantia maior dos cidadãos, ou seja, o devido processo legal.”
Marco Aurélio também discordou da maioria dos ministros e aceitou recurso segundo o qual os réus sem foro privilegiado deveriam ter sido julgados pela primeira instância.
Novos ministros
O julgamento dos recursos tem dois ministros diferentes daqueles que participaram da análise da ação penal no ano passado: Teori Zavascki e Roberto Barroso. Zavascki, no entanto, só deve participar na semana que vem devido à morte de sua mulher, Maria Helena Marques de Castro Zavascki, na segunda.
Antes de acompanhar Barbosa nesta quarta, Barroso fez sua primeira atuação no processo do mensalão e disse que a discussão sobre corrupção no país "não deve ser politizada". “Não existe corrupção do PT, do PSDB ou do PMDB. Existe corrupção. Não há corrupção melhor ou pior. Não é corrupção do DEM. A corrupção é um mal em si e não deve ser politizada", disse Barroso.
Gurgel
A discussão nesta quarta (14) também marcará a despedida de Roberto Gurgel do cargo de procurador-geral da República. No julgamento no ano passado, ele pediu a condenação de 36 réus e disse que o mensalão "foi o mais atrevido e escandaloso caso de corrupção, de desvio de dinheiro público flagrado no Brasil".
Antes de participar de sua última sessão como representante do Ministério Público no Supremo, Gurgel defendeu que os recursos dos 25 condenados no processo do mensalão não modifiquem decisões tomadas pela Suprema Corte no ano passado.