Ora, livros…

seg, 21/11/11
por Zeca Camargo |
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Estou saindo de férias. Hoje! E, por conta disso eu tinha preparado uma espécie de despedida. Interativa. Basicamente, diante de uma viagem que será no mínimo longa (para não dizer inesperada) pelas próximas três semanas, eu queria sua opinião sobre o que eu deveria levar como leitura. Não exatamente o que ler, mas como ler. Já tinha separado alguns títulos que, de alguma maneira, combinavam com a viagem que eu estou prestes a fazer – títulos estes que não vou entregar aqui com facilidade, para não dar sequer uma pista velada do meu destino (já que, como você pode imaginar, vou convidar você a adivinhar onde estarei assim que tiver uma boa foto do lugar). De qualquer maneira, para o que eu ia propor para você eles eram irrelevantes.

O que estava me inquietando mesmo era como eu deveria levar esses livros para a viagem – se seria melhor colocar quatro (sim, quatro) volumes de tamanhos “generosos” na minha bagagem ou me render, finalmente, a uma leitura digital. Acredite, conectado como eu gosto de ser – e quem não gosta? – eu até hoje ainda não tenho uma daquelas novas “maravilhas da tecnologia” que nos permitem ler um sem número de livros num pequeno (e, diga-se, bem portátil e prático) tablete. De um lado, o conforto de não ter de carregar aqueles “tijolos” ao longo de um trajeto (quase) imprevisível. Do outro, minha paixão infinita – já declarada em vários posts aqui mesmo neste espaço – por esse antigo objeto conhecido pelo nome de “livro”.

Você pode achar que é pura teimosia, mas eu acho que estou me esforçando para ser um dos últimos da minha geração a adotar a leitura digital. Não falo de revistas – nem, claro, de material exclusivamente produzido na própria internet. Esses já me conquistaram. Mas de livros mesmo – literatura, reportagem, não-ficção, ensaios, contos, essas coisas que muitos acreditam (em vão) que ninguém mais se interessa em ler. Não que eu não tenha tentado. Sempre que um amigo, uma amiga, ou alguém conhecido está lendo alguma coisa dessa maneira, eu dou uma esticada de olho. Já cheguei até mesmo a pedir para um amigo “baixar” um livro que eu precisava consultar para escrever um post – aquele sobre livros de humoristas americanos (eu já o havia lido o volume em questão, “This is a book”, de Demetri Martin, mas queria apenas citar alguns trechos e não o tinha na mão; foi bem prático, mas como leitura, tenho que confessar, nada satisfatório). Mas nada ainda me convenceu a comprar um desses tabletes capazes de substituir prateleiras inteiras de volumes preciosos… Será que uma viagem de logística complicada seria finalmente um bom motivo para experimentar essa “novidade” (antes de me chamar de velho, repare que usei a palavra entre aspas…)?

Eu iria usar este espaço hoje justamente para pedir sua opinião. Será que alguém que vem aqui sempre já faz desse tipo de leitura um hábito? E que conselhos esse alguém teria para me dar? Ou será que alguém já experimentou – e não gostou? Será que alguém recomenda isso para um tipo de leitura – mais breve, ligeira – mas não para outro (mais densa, que exige mais concentração)? Quem sabe alguém não viria com aquele comentário bom (e nostálgico) sobre a sensação inigualável de tocar, pegar um livro nas mãos – algo que um tablete jamais será capaz de substituir? Ou não – quem me garante que não surgiria uma opinião justamente no sentido contrário, defendendo um novo “fetiche”: o da sensação inédita (e inesperada) de ter nas mãos aquele friozinho de uma tela de vidro…

Era só isso que eu queria discutir.

Mas aí, na última sexta-feira, fazendo a mala para ir para Fortaleza – e, no dia seguinte, para o Rio – peguei correndo um livro que tinha chegado esta semana pelo correio: “The sense of an ending”, de Julian Barnes. Os leitores mais assíduos aqui no blog já conhecem este nome – quando há mais de dois anos escrevi sobre um livro seu de reflexões sobre a morte. Barnes é hoje um dos mais respeitados escritores ingleses – uma reputação reforçada agora, depois que ele ganhou o prêmio Man Booker de 2012, na Inglaterra, um dos mais importantes da literatura em língua inglesa. Sou fã dele desde que li, anos atrás, “O papagaio de Flaubert” – e logo em seguida um dos melhores livros da minha vida, “História do mundo em 10 ½ capítulos”. Leio tudo que ele escreve. E encomendei “The sense of an ending” quase que no “piloto automático”. Quando o coloquei na minha mala de mão antes de sair em viagem, foi também nesse espírito – quase um gesto mecânico. Escolhi o livro porque estava em cima da pilha de “novidades”; porque era pequeno (150 páginas, bem enxutas, num formato reduzido); porque eu sabia que não iria me decepcionar com o autor.

Mas aí eu comecei a ler “The sense of an ending” no avião – 3 horas de vôo entre São Paulo e Fortaleza. E não parei mais. E depois que terminei, li de novo. E hoje – segunda-feira de manhã, quando escrevo isto – já estou quase no final da minha terceira leitura. Sim, do mesmo livro. E mais: estou pensando em não levar aqueles títulos que eu havia selecionado para a viagem. Acho que vou levar apenas este. É pequeno. É fácil de carregar. E me preenche com tudo que eu espero de uma boa literatura.

Reconheço que estou sendo um pouco egoísta ao me desdobrar em elogios para um livro que ainda não foi traduzido para o português – embora ele certamente seja lançado aqui (a Rocco é responsável por seus títulos no Brasil). Mas é que eu não tiro esse livro da minha cabeça há 48 horas. E não quero tirar pelas próximas três semanas (a duração das minhas férias)! O que esse livro tem de tão bom?

Bem, primeiro… ele é bem escrito. Muito bem escrito – daqueles em que a maioria das frases não deve exatamente ser apenas lida, mas degustada. Depois, ele tem personagens memoráveis – não daqueles que você se lembra só depois de ter terminado o livro, mas do tipo que gruda na sua memória desde a primeira página em que eles são apresentados. Não são muitos – menos de uma boa dúzia no geral, e menos de meia dúzia, entre os que articulam a trama central. E como se isso não bastasse, tem a história.

Aliás, não é uma história. É um tapa.

E sobre isso eu vou falar pouco. Ou melhor, não vou falar nada. Se eu disser que é sobre um triângulo amoroso, vou estar diminuindo a trama. Se disser que é um acerto de contas de uma antiga rivalidade – quase anos depois dela ter explodido – estarei tirando as nuances de um emaranhado muito maior de histórias. Se eu optar por resumir tudo a uma reflexão sobre amor e culpa – bom, isso também é bem menor do que Barnes consegue expressar em suas breves páginas. Por isso, não vou falar nada – a não ser que o livro é genial. Se você não se sente à vontade de arriscar uma leitura no original, em inglês, espere ansiosamente pelo lançamento de “The sense of an ending” no Brasil. Nenhuma expectativa que eu criar vai ser demais, exagerada. Tanto que eu acabo de decidir: vou levá-lo na viagem para a qual eu parto agora. E não vai ser num tablete – vai ser no papel mesmo, nessa pequena versão antiga e maravilhosa de uma dar coisas mais incríveis que o ser humano é capaz de criar: histórias que valem a pena ser contadas.

 

Retomamos aqui no dia 13 de dezembro. Vou tentar – mas não vou garantir – dar notícias. Sobretudo (espero) vou descansar. E eventualmente me divertir. Se possível, faça você o mesmo nessas três semanas. É bom para a cabeça…

O refrão nosso de cada dia

“I’m going overseas”, Derrick Harriot – não posso indicar uma música que combine mais com o clima que estou entrando – isto é, de férias! – do que essa preciosidade desse (injustamente) esquecido músico jamaicano. Dificilmente eu chamaria essa canção de um reggae – mesmo um “proto” reggae. Mas quem está ligando para rótulos quando a música é tão deliciosa. Assim como quem canta, eu estou indo em direção do além mar… E que esse refrão inacreditavelmente fácil fique com você pelas próximas três semanas.

Pedro e o tigre

qui, 17/11/11
por Zeca Camargo |
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Eu costumo gostar de uns Almodóvares que ninguém gosta muito. Aqui mesmo neste espaço, no final de 2009, fiz um elogio rasgado a “Abraços partidos” – que muita gente achou que era um dos filmes “menores” do diretor espanhol que há quase três décadas vem construindo um imaginário dos mais originais no cinema mundial. Agora estamos diante de “A pele que habito” – que vem sendo aclamado como um dos melhores trabalhos dele nos últimos anos, mas que ao contrário do que descrevo acima, não me conquistou por inteiro. É muito bom sim – e estou aqui justamente para recomendá-lo para quem ainda não viu. Mas mesmo longe, na minha opinião, de poder entrar para a lista de clássicos do diretor, “Pele” tem seus encantos. A começar pelo seu argumento.

O filme conta uma história bem mais profunda do que a superficialidade do título possa sugerir. Uma olhada rápida nas centenas de resenhas e comentários sobre o filme aqui mesmo na internet (dentro e fora do Brasil) dá conta de inúmeras interpretações para um filme que traz a sua intenção de ser denso na própria trama. Eu mesmo me sinto tentado a escrever aqui sobre “A pele que habito” sob a ótica da análise de identidades que o filme provoca. Mas acho que eu seria apenas mais uma voz no coro. Seria apenas um exercício inútil – como, aliás, vários que li – que só serviria para confundir ainda mais as possíveis leituras pessoais de quem foi tocado por um filme tão inteligente quanto este. Assim, planejei uma saída que podemos chamar de elegante: não posso deixar de elogiar o filme (apesar de, como disse, não ser este um dos meus favoritos), mas hoje, aqui, quero fazê-lo por uma qualidade sutil do filme, que de tão bem inserida no contexto até passa despercebida. Estou falando da capacidade quase mágica de Almodóvar de nos contar uma história que nos surpreende a cada minuto – algo que o cinema em geral parece já ter abandonado há um bom tempo…

Ele é mestre nisso, mas seus filmes têm sempre tantos motivos para serem aclamados que essa característica quase nunca é ressaltada. Um dos meus preferidos do diretor, “A má educação”, prima exatamente por essa qualidade. Na época de seu lançamento, logo depois do revolucionário “Fale com ela”, as pessoas estavam esperando uma outra obra-prima. Almodóvar respondeu com um dos filmes “menores”, mas que para mim é uma lição de “desembrulhar histórias”, uma dentro da outra – com reviravoltas que só uma mente como a sua (associada às estranhas histórias que sempre  nos rondam no mundo real) seria capaz de nos apresentar. “A flor do meu segredo”, que foi talvez sua primeira incursão numa história que não fosse totalmente cômica, é também um delírio narrativo – ofuscado, quem sabe, por interpretações tão fortes que inevitavelmente roubavam toda a atenção de quem o assistia. O próprio “Abraços partidos”, embora um pouco mais confuso, nos concedia a proeza de surpreender com uma trama que, a princípio poderia parecer bastante convencional. E agora vem “A pele que habito”, que “fracassa” em alguns aspectos (as interpretações, por exemplo, estão bem aquém do que se pode chamar de “magistrais”, com Antonio Banderas no auge da sua “canastrice”; Marisa Paredes, geralmente condutora de “master classes” de atuação, dando apenas uma fração do que é capaz; e Elena Anaya, que já conhecíamos de “Fale com ela”, parece, por motivos que a própria história determina, incapaz de usar seu belo rosto para transcender no seu papel) – mas que sem dúvida nenhuma é uma das histórias mais bem contadas dos últimos anos.

Meu problema agora é… como falar de uma trama em que justamente a graça maior está em ser descoberta – e redescoberta – a cada cena? Fui assistir ao filme com um amigo que já o havia visto na estreia (na semana passada) e fiquei admirado com sua devoção a Almodóvar. Afinal, “Pele” é um filme que tem boa parte da sua graça justamente no desvendar da história, naquele já quase esquecido prazer de se entregar no cinema a uma obra que vai dar um nó – ou vários nós – no seu pensamento (pense também em David Lynch). Não sei se eu teria gostado tanto assim a ponto de vê-lo repetidamente. Por isso mesmo, não sei direito o que devo contar ou não sobre esse trabalho, sem estragar o prazer de quem ainda não o viu (e ao mesmo tempo dialogar com com já o conferiu).

Mas digamos que se eu falar que essa é uma história de um cientista maluco que faz experiências com uma pele sintética – e usa cobaias humanas para isso – eu não estou nem entregando demais nem dando pouca informação. Afinal, nos primeiros quinze ou vinte minutos do filme é justamente isso que Almodóvar quer que você ache que está acontecendo na tela. Só que isso, claro, como a própria brincadeira do título sugere – título esse que permite uma tradução fiel em cada língua do país onde ele for exibido (mais um toque de mestre do diretor, que já havia conseguido o mesmo feito com “Fale com ela”) -, isso é apenas o que está na superfície. Mais profundamente, o que ele propõe é uma brilhante reflexão sobre identidade – não apenas identidade sexual, como os mais apressados podem correr para concluir, mas a própria dúvida de quem somos nós que habitamos esse corpo que temos (e que somos obrigados, ou não, a conviver com ele para o resto de nossas vidas).

Usando a figura relativamente fácil de um cientista maluco – Robert Ledgard (Antonio Banderas) -, o diretor nos apresenta a improvável história de uma vingança, que a princípio pode parecer apenas isso, mas que traz muito mais implicações do que você imagina. Como várias pessoas com quem conversei nesses últimos dias – e que me cobravam porque eu ainda não havia assistido ao último Almodóvar! – eu saí um pouco perturbado do cinema (na verdade, trago essa perturbação comigo até hoje, quando escrevo isto para você). Mas acho que se eu for falar sobre isso vou estar justamente caindo na armadilha que eu disse que não queria cair lá no início do texto. Então acho que vou me controlar e voltar a falar apenas da capacidade única desse diretor de apresentar histórias imprevisíveis que prendem nossa atenção de maneira quase perversa!

Quantos filmes você viu recentemente que merecem o adjetivo de “imprevisível”? Poucos, não é? Assim, num exercício rápido, lembro-me de “O segredo dos seus olhos”. Talvez “A origem” – mas o interesse aí talvez não estivesse em ser surpreendido, mas sim perceber que a história só ia ficando cada vez mais complicada. Num outro patamar de entretenimento, os dois filmes com o título “Se beber não case” até que se encaixam nessa proposta de “o que vai acontecer agora?” – ou melhor “o que acabou de acontecer que me fez parar aqui?”. Mas nenhum desses filmes trata de desenrolar um trama de uma maneira tão requintada quanto “A pele que habito”, de Almodóvar.

Curiosamente, entre os trailers que passaram antes de o filme começar, estava o de “Missão impossível: protocolo fantasma” – e eu fiquei meio incomodado. As distribuidoras de cinema sempre tentar aproximar os novos lançamentos dos títulos que estão em cartaz. Como você pode imaginar, o novo “Missão impossível” traz – a julgar pelo trailer – a promessa de uma nova história sem pé nem cabeça, que, como um quebra-cabeças montado com serrote e martelo (ou seja, aquele em que as peças se encaixam “por bem ou por mal”), serve apenas de um varal alegórico onde possam ser penduradas inacreditáveis sequências de ação (aquela explosão logo no início do trailer é demais!). Por associação de deias, será que “A pele que habito” seria apenas um “thriller” desmiolado, com o verniz da assinatura de Almodóvar.

Novamente, a primeira impressão é a de que sim – trata-se apenas de um mistério “noir” disfarçado de ficção científica. Até que… Bem, tudo vai muito bem no “castelo” do doutor Robert – todas suas experiências com células transgênicas vão muito bem, sempre em segredo, e sua “obra final” em breve poderá ser apresentada para o mundo. Quem se lembra do primeiríssimo “Frankenstein” – aquele, de 1931, com Boris Karloff no papel principal – sente até um frisson de saudade. Mas assim como a paz é perturbada por uma menininha nesse clássico do cinema de horror, a aparente calma da criatura mantida cativa pelo médico em Toledo (onde se passa a história de “Pele”) é desmantelada por um tigrinho. Isso mesmo, um tigrinho chamado Zeca!

Novamente, vou ter que me segurar aqui para não contar demais – e não estragar o filme para quem ainda não o assistiu. Mas vou dizer apenas que Zeca é um personagem que surge do passado, que une Robert, Marilia (a personagem de Marisa Paredes), e Vera (vivida por Elena Anaya). Interpretado por um ator espanhol (Roberto Álamo), mas com um sotaque brasileiro que é de se admirar, Zeca aparece na porta da casa de Robert durante o Carnaval fantasiado de tigre – outra metáfora de alguém que está numa pele que não lhe pertence – e abre a “caixa de Pandora”, aquela de onde saem todos os pecados, todas as tentações e todos os males que nós, humanos, pensamos que um dia poderíamos viver sem.

Com Zeca, “el tigre”, Pedro Almodóvar desmonta toda uma história de aberrações que, apesar de “fundamentada” em uma vingança aparentemente “justa”, reflete o pior que temos dentro de nós. O que, inevitavelmente, nos leva à paixão…

Reconheço que este texto está ficando um pouco complicado… Estou querendo falar de coisas demais, ao mesmo tempo que não quero falar de muita coisa. Vou parar por aqui. Mesmo para quem, por ventura, já tiver assistido ao filme e está agora lendo estas linhas, eu prefiro não contar demais, não tirar conclusões demais, não deixar as coisas muito explicadas. Porque o gênio de Almodóvar – mesmo num trabalho que não seja capaz de me encantar como tantos outros – é exatamente este: o de contar uma história perturbadora, cuja sensação de desconforto que ela provoca não dura apenas os minutos da projeção, mas ecoa em cada cena do nosso cotidiano, por conexões que nem o próprio diretor pode sonhar que quem assiste um dia vai fazer. Conexões essas, caro leitor, cara leitora, que eu não tenho o direito de lhe roubar limitando a sua imaginação ao desfilar aqui as que “A pele que habito” provocou em mim. Assista, e divirta-se consigo mesmo!

O refrão nosso de cada dia

“Susurrando”, Peor Imposible – sim, existe uma curiosa conexão entre o refrão que vos apresento hoje e o diretor Pedro Almodóvar. Mas você vai ter que descobrir qual é assistindo a esse videoclipe (que é de 1984!). A música é uma daquelas deliciosas bobagens que a “new wave” nos fez cometer quase sem pensar nos anos 80, só que na Espanha – ou você achou que só aqui no Brasil a gente tinha alguma coisa parecida com a Gang 90 e as Absurdetes? Vale – e muito – como registro de uma época! Já assistiu? E não encontrou a “conexão Almodóvar”? Então repare nas meninas que fazem, já quase lá no final, uma coreografia que a gente poderia chamar de precursora da “dança do quadrado”… Mais que isso não conto!

“Loving the alien”

seg, 14/11/11
por Zeca Camargo |
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Zeca Camargo durante entrevista com viúva de Kurt Cobain

Courtney Love quer visitar Hugo Chávez – e levar para ele sua solidariedade. Ela também vai atuar em três filmes em 2012. E esteve num jantar recente com gente muito poderosa da oligarquia russa. E faz questão de mostrar a expressão facial que Madonna roubou dela. E diz que sua filha com Kurt Cobain foi sequestrada (na verdade, a justiça lhe tirou a guarda de Frances…). E ela está desenvolvendo uma nova linha de roupas. E não toma drogas desde 2005. E passou a madrugada acordada desenhando. E acha que vai ganhar algum dinheiro com sua “arte”. E, sempre preocupada com sua imagem, pergunta de repente numa das raras pausas que deu nos 45 minutos quase ininterruptos do monólogo que apresentou: “Posso falar palavrão?”. Claro que pode, eu respondo. E um dos primeiros deles vai para… Kurt Cobain!

Na minha – sem falsa modéstia – vasta experiência em entrevistar artistas do mundo da música, eu nunca havia passado por uma situação como essa. De Lady Gaga a Paul McCartney, digamos que já passei por uma “fauna” das mais variadas e divertidas – para não dizer surpreendentes. A própria Courtney já tinha entrado para essa lista, num encontro “antológico”, menos pelo conteúdo da entrevista do que pelas nove horas (sim, nove horas) que ela me fez esperar para conversarmos. (Quando escrevi o livro de “De a-ha a U2”, contei sobre esse bastidores e “cravei” que esse tinha sido o recorde de “aluguel” que um artista jamais tinha me dado – oficialmente, o encontro, que foi em Nova York, estava previsto para 16h, e acabou acontecendo tipo 01h da manhã – e é um alívio para mim confirmar que sua marca ainda não foi superada… mas eu divago…).

Minha expectativa era a de que ela não atrasasse tanto no novo encontro que estava marcado para este sábado passado, às 13h, em São Paulo. Até porque eu não tinha o tempo todo para ela – tinha de pegar um avião às 16h para vir para o Rio e já começar a trabalhar no “Fantástico”. E ela mesma, imaginei, tinha lá seus compromissos para com o festival onde ela iria tocar – Courtney, como você talvez esteja acompanhando, é uma das atrações do SWU, o festival de música e “conscientização” que termina hoje (e que eu, infelizmente, não pude conferir desta vez…). Mas a primeira informação que chegou não era boa: seus assessores já estavam passando a entrevista para 14h, com a desculpa de que ela (Courtney) não havia dormido nada e que precisava se arrumar para estar bem no encontro.

Bem… pelo menos a parte de “não ter dormido à noite” não era mentira. Nem a de que ela queria estar bem no encontro. Ao adentrar a sala do hotel reservada para a gravação – com surpreendentemente modestos 15 minutos de atraso (na verdade, 75 minutos, se formos contar o acerto original, mas ninguém aqui quer ser mesquinho…) – ela foi logo dizendo que não havia pregado os olhos. E estava de fato exuberante – aliás, com uma roupa que, soube logo de antemão, é da nova grife de roupas que está desenvolvendo. De fato, a mulher entrou com tudo, com uma energia que mesmo eu  senti um pouco de inveja. A única coisa que talvez entregasse sua idade (47 anos) eram os óculos que ela tinha sempre à mão para ler alguma coisa de perto. De resto, Courtney Love era um dínamo. E, com isso, eu tinha um problema.

Essas entrevistas com grandes estrelas – e, sim: antes que você faça uma gracinha, Courtney está nessa lista – são “jogo rápido”. Como já mencionei algumas vezes aqui (e já descrevi mais amiúde no meu livro já citado hoje), raras são as que duram mais de dez minutos. Nós, jornalistas acostumados a esse esquema, já trabalhamos com essa “janela de tempo” – preparamos uma entrevista para esses dez/doze minutos. E eventualmente torcemos para que a gente ganhe uns minutos extras! Porém, neste sábado eu estava com meus horários ligeiramente apertados – e, por mais contraditório que isso possa parecer, eu estava torcendo para ter apenas os dez minutos de praxe com Courtney! Eu realmente precisava sair daquele lugar às 15h! Só que eu não contava com uma mulher totalmente sem freios falando indefinidamente num pique que era admirável! Como eu deveria administrar aquilo?

Sua entrada já foi triunfal – esvoaçante! Veio carregando seu “caderno de desenhos” e me mostrando o que tinha “produzido” durante a madrugada: um esboço de uma mulher nua, sangrando, crucificada (uma poesia de Plabo Neruda – segundo ela – completava a composição). Não ouve uma introdução, uma apresentação – nada. Ela simplesmente começou a falar. E a falar. E a falar. E falava de quê? De tudo, sem nenhum filtro, sem nenhuma edição. Mais de uma vez eu tentei focar em um assunto – mas logo percebi que seria um esforço inútil. Numa análise rápida, isso poderia parecer “a entrevista dos infernos” – e quase foi mesmo, não fosse o fato de a própria Courtney ter se apresentado dessa vez como a mais simpática de todas as divas do rock!

Que diferença do nosso “primeiro encontro”… Foi no início dos anos 90, quando ela veio acompanhando Kurt, naquela passagem histórica do Nirvana pelo Brasil. O que eu queria mesmo era entrevistar seu marido, mas ela estava sempre presente “cuidando” da agenda dele – leia-se “atrapalhando nosso trabalho”. Foi um acerto difícil, como eu conto em “De ah-a a U2” (e prometo que essa é a última vez que eu cito o livro!), mas quando chegamos para a entrevista ele estava no estúdio com a banda dela, a Hole. E quando, depois de horas, já de madrugada, fez-se o silêncio, e nós nos preparamos para falar com ele, ela chega e anuncia, com ares nada amigáveis: “Kurt está dormindo – e ninguém acorda Kurt quando ele dorme”. Se quiséssemos conversar com ele, seria quando ele despertasse… O que só aconteceu horas depois, já quase de manhã…

Depois disso, teve o episódio das nove horas de espera, quando o maior obstáculo não era exatamente ela, mas uma de suas produtoras, que sempre chegava anunciando um novo atraso e reclamando do cenário que havíamos montado (e remontado a cada vez que ela pedia para mudar tudo!). Deveríamos ter falado antes da sua passagem de som numa casa de shows em Times Square, o Roseland. Mas foi ficando para depois da passagem, depois teve a maquiagem, depois o show da banda de abertura, depois o show dela, depois a festa dela no camarim… até que à 1h da manhã ela estava pronta para mim! Quando chegou, se não foi exatamente simpática, foi pelo menos profissional – apesar de não ter dado a menor bola para o atraso…

Essas experiências anteriores me prepararam para… Bem, não me prepararam exatamente para nada! Eu sabia que poderia esperar qualquer coisa de Courtney Love. Mas a simpatia e extroversão me pegaram realmente desarmado! Ali, diante de mim, estava um furacão – de assuntos, de opiniões, de confissões… E eu não estava sabendo bem o que fazer com tudo aquilo. De vez em quando vinha um momento de lucidez – com quando ela falou de Cameron Crowe, o diretor de cinema (que, diz ela, é um grande amigo pessoal), e, lembrando que o seu filme mais recente é “Pearl Jam Twenty” (ainda inédito no Brasil), que celebra o aniversário da banda, e que traz raras imagens de Kurt Cobain, eu vejo uma brecha para falar daqueles tempos loucos em que Jam & Nirvana eram os dois nomes mais poderosos do rock. Ela faz então uma pausa, diz que foi ela que colocou Vedder e Cobain juntos… e imediatamente parte para falar de outro assunto!

Isso se repetiu várias vezes. Quando, logo após perguntar se poderia falar palavrões ela mandou um para Kurt, eu achei que poderia tirar dela algumas lembranças dessa figura que é idolatrada até hoje. Mas, como sempre, o fio da conversa não dava em nada. Ou quando ela começou a reclamar de dinheiro, e praguejou contra os ex-colegas de Kurt no Nirvana – Chris Novoselic e Dave Grohl (Foo Fighters). “Eles me roubaram, roubaram o dinheiro de Frances!”, praguejava ela. Mas o assunto também não ia adiante. Nem quando eu perguntei se poderia comprar um de seus desenhos – achei que um interesse numa coisa sobre a qual ela estava se debruçando naquele momento poderia capturar sua atenção – eu consegui mais do que alguns segundos de conexão (para registro, ela não quis me falar o preço da sua “obra”, mas insistiu que é isso que vai fazer dela uma mulher rica!). E assim nossa conversa foi rolando não apenas por dez, mas quinze, vinte, trinta e cinco minutos…

Quando fechamos 40 minutos, comecei a me despedir. Deixei claro que eu tinha um compromisso – com ela mesma: o de levar o material da própria entrevista para ser editado no Rio. Mas ela se mostrou totalmente indiferente ao meu apelo. Courtney continuava falando e falando – e agora também queria desenhar! Pegou o caderno e os lápis e seguiu “criando” – escrevendo mais coisas, e incluindo até meu nome no papel! Levantei-me e fui definitivo: “Preciso ir”. Ela olha para a minha camiseta e, sem mais nem menos, mostra-se extremante interessada no desenho de cores dela. E agora? Ela está grudada na minha camiseta!! “Vou embora”, insisti mais uma vez – e ela me pediu só mais um minuto para me mostrar uma música em seu iPad. Nãooooooo!

À beira do desespero, viro-me para seu produtor e suplico: “Tome conta dela”… Nunca, nunca mesmo, eu mesmo coloquei um ponto final numa entrevista. Mas eu tinha de ir! E saí às pressas, sem me dar conta de que Courtney, segundos após eu ter dado as costas para ela, já estava se distraindo com outras coisas… Só quando eu vi a matéria finalmente editada percebi que “nossa relação” não seria duradoura… Magoei…

Foram 45 minutos ensandecidos – com momentos de bipolaridade patológica (como encarar uma mulher que uma hora se considera “irrelevante” e em seguida “poderosa”?). Mas, como diz o título do clássico de David Bowie evocado no título de hoje, eu acabei me apaixonando pelo alienígena! E mal posso esperar pela próxima vez que a gente se encontrar…

O refrão nosso de cada dia

“We’ve got a file on you”, Blur – qual a música mais curta do Blur que você conhece? “Song 2”, claro. Mas deixe-me apresentar “We’ve got a file on you” para você. Ela tem pouco mais de um minuto, e é, basicamente, só um refrão. E é genial – ainda mais compacta e com mais energia do que “Song 2”. Para nós que estamos já perdendo as esperanças de ver alguma coisa nova do Blur conhecer a luz do dia, “File” é um bom lembrete do porque essa banda é – e sempre será – tão importante.

As aves que aqui gorjeiam

seg, 07/11/11
por Zeca Camargo |
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E daí que parece com uma música da Jovem Guarda que inexplicavelmente ficou de fora do repertório da Ternurinha? “Depois”, a terceira faixa do novo álbum de Marisa Monte, é tão bonita e interpretada de maneiera tão sincera, que é melhor você estar com o coração bem forte para ouvi-la. E daí que “Hoje eu não saio não” é ligeiramente derivativa e calculadamente malandra (especialmente quando coloca uma letra que fala de baile funk em cima de um quase baião)? Quero ver você vir com um refrão mais fácil de ficar na sua cabeça. Ah, acha o corinho de “Ainda bem” ainda mais fácil e assimilável? Mas se incomoda com o cantarolar – que já é quase uma marca registrada da cantora? Não vejo nada demais – pelo contrario, até gosto. Se sua intenção é criticar “Verdade, uma ilusão” porque ela imita uma canção “como antigamente”, como se você aplicasse um filtro sépia numa foto que você tirou ontem à noite na balada – desista. A faixa é tão bem-feita  – no sentido de ser bem construída – que resiste até a esse comentário. Também achou “Amar alguém” fácil demais, só porque tem uma estrutura simples e uma letra para lá de convencional? Que mal há nisso, quando tudo que você quer é descobrir para quem você pode mandar essa música e recomeçar uma história? E se o seu problema for com “Lencinho branco”, bem… “Lencinho branco” é indefensável…

Mas fora isso, “O que você quer saber de verdade” é um ótimo álbum de Marisa Monte – parte “exatamente o que você já estava esperando”, parte “nossa, acho que eu nunca vi a Marisa cantando isso”! Ou será que você já ouviu e não se lembra? Será que isso importa? É pouco provável que “Saber de verdade” vá trazer uma nova legião de fãs à cantora que já se tornou mais que consagrada nas duas últimas décadas – dentro e fora do Brasil. Então por que exigir dela algo que talvez ela não esteja mais a fim de dar – uma guinada, uma nova vertente, uma ruptura? Sem culpa nem remorso, aparentemente guiada apenas pelo prazer de oferecer mais do que sabe fazer e melhor, ela embarca em um repertório que, com um certo tom de ironia, faz uma referencia involuntária à musica que, sem querer virou um de seus “standards”, “Não é proibido”.

Assim como as guloseimas dessa letra oferecem um cardápio variado de opções para a criançada (de todas as idades) se deleitar, no seu novo álbum Marisa vem com uma cornucópia de opções musicais prontas para agradar a todos os gostos. Variações do que ela já fez, sem dúvida. Mas dificilmente você diria que é sobre um mesmo tema.

Estou dando voltas aqui em cima do assunto e você talvez esteja se perguntando: mas o Zeca gostou ou não do novo trabalho? Muito justo, uma vez que – reconheço – alguns elogios que fiz acima podem ser interpretados de mais de uma maneira. Mas o que eu quero colocar, mais do que um simples “curti” (ou não), fácil de ser retwittado com um ou dois cliques, é que a minha opinião – ou mesmo a sua – sobre “O que você quer saber de verdade” é totalmente irrelevante. Não que nossas opiniões não contem nada. Mas é que Marisa está, a essa altura, num patamar de onde ela pode fazer o que bem entender, com a segurança de que sua imagem, sua carreira, e mesmo sua consagração são intocáveis. Talvez – novamente, talvez – este não seja o melhor disco que ela já gravou. Mas quem disse que eu não vou ouvi-lo à exaustão tentando sempre reencontrar a Marisa que já me tirou do sério várias vezes?

A primeira delas, claro – como já contei no meu livro “De a-ha a U2” (onde eu, entre tantas entrevistas, recupero uma que fiz com ela no início dos anos 90, que está entre um dos meus encontros mais felizes com os artistas que eu admiro) –, foi quando a vi cantar junto com uma banda chamada Nouvelle Cousine, no auditório do MASP (São Paulo), no final dos anos 80. Como acho que até já relembrei em algum canto deste blog, Marisa era apenas convidada para um dueto (“Bess, you is my woman now”), e simplesmente roubou a noite – me lembro até da intensidade com que eu batia palmas… Mas essa não foi a única vez que me deslumbrei com aquela voz… A cada disco, e a cada show, eu sempre encontrei um motivo par descobrir um novo aspecto do seu talento. Para lembrar de mais um desses momentos, cito aqui um show que fui ver em meados dos anos 90 e que me deixou tão enlouquecido que voltei correndo para a redação do jornal em que eu trabalhava na época (“Folha de S.Paulo”) só para escrever uma resenha que começava assim: “Eu quero morar no país que Marisa Monte canta”… E tem ainda uma memória recente, no teatro Rival, ali na Cinelândia, Rio de Janeiro, quando fui às lágrimas enquanto ela cantava, junto com Adriana Calcanhoto, a belíssima “Beijo sem” (da autoria de Calcanhoto) – “Madrugada, sou da lira, manhãzinha, de ninguém”… Que coisa mais linda…

A lista poderia ser maior, mas não quero alugar você com tantas lembranças – até porque eu tenho certeza de que você também tem as suas (se é mesmo um fã, ou uma fã, de Marisa que está lendo isso). O que importa é que ela, na sua carreira, criou para nós todos uma doce armadilha: como se ela fosse capaz de nos desafiar dizendo, eu cantei para você esse tempo todo e fiz você feliz – agora deixa eu cantar para mim… E mesmo esse desafio – se é que ele existe, mesmo que num nível subjetivo – não é verdadeiramente uma negociação. Aceite que você é seu refém e pronto! O conjunto de músicas que “O que você quer saber de verdade” traz não é nada além do que um punhado de canções que Marisa resolveu cantar agora – sons que tiveram a felicidade de encontrar sua voz nessa temporada. Um encontro, aliás, que de tão perfeito, é evocado inclusive no título de uma das mais belas faixas do álbum: “Era óbvio”!

Conexões menos óbvias – e, se você preferir, mais inesperadas – podem ser encontradas num outro CD lançado recentemente, de outra boa voz que gorjeia por aqui: a de Karina Buhr. “Longe de onde” é o nome de seu segundo trabalho – que é, diga-se, ainda mais interessante que o seu disco de estreia (o já instigante “Eu menti pra você”, de 2010). Sim, Karina é uma artista relativamente nova, que goza de um espaço na mídia que é apenas uma fração do que Marisa Monte consegue apenas ao anunciar que está no estúdio. Mas essa comparação é injusta. As duas artistas, brilhantes em suas próprias categorias, não poderiam ser mais diferentes – e se as coloco juntas aqui é simplesmente pelo fato de ambas estarem lançando disco quase que ao mesmo tempo. Tem ainda um “link” inusitado, que é o fato de Karina ter me proporcionado uma noite excelente no mesmo teatro Rival onde vi Marisa cantando “Beijo sem” – uma performance (de Karina) que eu só posso classificar de ensandecida! Fora isso, insisto, são artistas distintas, e que merecem sua atenção por motivos também distintos. Os de Marisa já apontei acima. Vamos agora aos de Karina.

A primeira coisa que fez com que eu me apaixonasse por ela foi sua falta de cerimônia com seu sotaque – lindamente lapidado no circuito cultural de Recife, onde essa baiana surgiu primeiro como artista. Na sempre lamentável tendência que o mercado da música tem de padronizar todo mundo, ouvir uma voz que canta “Eu sou uma pessoa má, eu menti pra você”, pronunciando “menti” com a língua batendo no dentes e não imitando o som de um aerossol, já era um grande alívio. Mas se esse fosse seu único mérito, Karina seria uma artista de um truque só. Coisa que quem já teve a oportunidade de vê-la no palco sabe bem que ela não é (pelo que conferi no seu site, ela vai estar rodando o Brasil a partir deste mês – confira as datas e cidades, pois vale a pena).

Se eu já achava que ela era uma das mais criativas e surpreendentes novas vozes do nosso pop, com “Longe de onde” sua reputação definitivamente se consolidou comigo: Karina Buhr aceita assumir alguns riscos – e isso para mim já é bem mais do que boa parte dos artistas novos faz, e merece meu aplauso. Para o novo trabalho, ela bebeu numa fonte que se não é exatamente inédita, é pelo menos curiosa: o Marrocos. Mas engana-se quem pensa que ela voltou de lá com um repertório de clichês orientais. Seu caminho como sempre é mais sutil – e o resultado, mais prazeroso. Nas suas novas faixas, Buhr pode ser curiosamente romântica (como em “Não me ame tanto”) ou radical (que tal uma musica chamada “Cadáver”?). Ela pode cantar em inglês (“The war’s dancing floor”), ou no seu próprio “baianês” (que fica lindo em “Sem fazer ideia”). Mas uma coisa eu posso garantir que ela nunca vai ser: previsível!

E acho que é assim, com uma paixão por uma veterana (Marisa) renovada, e a esperança de que o novo (Karina) sempre nos purifica, que vou me encaminhando para o final de um ano musical que foi, no mínimo bizarro. Estas últimas semanas de 2011, quem sabe, ainda podem nos surpreender. Mas, preparando-me para minhas férias (mais detalhes sobre isso até o final deste de mês), eu já escolhi pelo menos essas duas trilhas sonoras que certamente poderão me fazer boa companhia quando eu estiver perdido em… Ooooops! Eu quase ia contar para onde vou – perdendo assim uma ótima chance de poder perguntar para você, em breve, “onde eu estou?”…

Estou me adiantando demais… Será a vontade de partir logo de férias?

O refrão nosso de cada dia

“Hi life”, Syd Matters – descobri esse cara numa coletânea que comprei no início do ano e fiquei completamente obcecado por ele. Sua música é tão sofisticada que falar de um só refrão é uma injustiça. “Hi life” é quase que um refrão só. Ou ainda, um monte de refrões montados um em cima do outro, em camadas que vão se sobrepondo… Ou se você quiser tentar explicar de outra maneira o que acontece com seus ouvidos quando você ouve essa música, fique à vontade…



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