Essa Academia não aprende…
Gostou do Oscar 1978? Eu não. Quer dizer, gostei da festa, gostei de quase tudo que vi. Os apresentadores eram modernos – e carismáticos. O ritmo era bom – e permitia até piadas sobre o atraso atávico da cerimônia (já falo sobre isso). Os convidados estavam elegantes e descontraídos. E a distribuição de estatuetas era razoável. Tudo indicava que a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood finalmente tinha chegado ao século 21. Mas aí…
Aí veio a premiação final, e a sensação foi a de que tínhamos voltados algumas décadas no tempo… Mas acho que estou me adiantando. Como talvez você já esteja esperando – afinal, este já é o quarto ano em que você encontra um post como este na segunda-feira pós-festa –, o assunto hoje é Oscar: um relato “minuto a minuto” do que eu consegui ver. Sim, porque, só lembrando, eu, hum, trabalho geralmente no domingo à noite, e invariavelmente ainda estou no “serviço” quando as primeiras estatuetas são distribuídas. Assim, tudo que posso dividir com você é o que conferi depois que o “Fantástico” terminou.
E este ano, isso significou que quando cheguei à casa de amigos que já acompanhavam a cerimônia, Anne Hathaway já estava no seu terceiro vestido – sem contar o que ela usou na entrada do tapete vermelho, como me informou minha anfitriã. Considerando que ela ainda entraria com mais cinco “modelitos” diferentes, isso dá, mais ou menos, a média de um “look” (até o cabelo mudava!) para cada 20/25 minutos! – já pensou a correria nos camarins para vesti-la e “desvesti-la” com tanta rapidez?
Mas acho que estou me adiantando… Vamos aos poucos. Meu relato começa precisamente às…
23h33
Christian Bale está no palco para receber o prêmio de melhor ator coadjuvante. Que barba era aquela? O novo visual de Batman? Será que o “cavaleiro das trevas” agora também é “feio, sujo e malvado”? Não… Bale é insípido demais para passar uma mensagem dessas. O prêmio é injusto. Geoffrey Rush, como o homem que indiretamente faz “O discurso do rei”, deveria ter levado. Bale está bem em “O vencedor”, mas pegando emprestado uma crítica que li, não me lembro bem onde – acho que foi na “New York” –, o problema com ele nesse filme é que você nunca acredita que ele está “vivendo” o personagem (a bizarra “lenda do boxe”, Dicky Eklund), mas sim “interpretando para ganhar um Oscar” o tempo todo. Certamente o prêmio para atriz coadjuvante – Melissa Leo, como a mãe de Dicky –, que já havia sido entregue antes de eu começar a assistir, foi bem mais merecido (assim como os de roteiro adaptado, para “A rede social”, e original, para “O discurso do Rei” – se bem que quem viu “Another year”, de Mike Leigh, acha que esse filme deveria ganhar nessa categoria…). Mas veja só, eu mal cheguei e já estou achando defeito? Vamos em frente!
23:40
Anne Hathway adentra então o palco – que me parece interessante, sem exageros e prático –com o que, sou informado então, é sua terceira roupa. O modelo parece um pouco exagerado (duas cores, rendas) – a ponto de ofuscar James Franco, quase mal-ajambrado em seu smoking “simplezinho”. Mas Hathaway tem um rosto tão magnético, que conquista imediatamente meu perdão, por qualquer excesso que venha a cometer durante a noite…
23:42
Hugh Jackman – que apesar de ter nascido apenas cinco anos depois de mim aparente ter 15 anos a menos que eu (um pensamento que sempre perturba este que vos escreve) – aparece elegante ao lado de Nicole Kidman – que finalmente ouviu o clamor das massas e diminuiu um pouco suas aplicações de botox. Estava bonita (este é o ano do bordado!) e (quase) natural para apresentar o Oscar de melhor trilha sonora. Que vai para Trent Raznor! Trent Reznor! Quem poderia imaginar que eu iria viver para um dia ver o cara por trás de uma das bandas mais alternativas (e geniais) de todos os tempos, o Nine Inch Nails, receber uma estatueta? Não se trata de uma aberração – sua trilha para “A rede social” é mesmo muito boa! Mas é que essa premiação tem gosto de “choque cultural” – a “velha guarda” da Academia com a música contemporânea (tudo bem, nem tão mais contemporânea assim, mas vá lá…). Novos tempos no Oscar – fico contente.
23:45
James Franco – cuja gravata borboleta ainda está me incomodando – chama Matthew McConaughey e Scarlett Johansson para apresentar os prêmios técnicos de som. McConaughey, sem graça como sempre. Já Scarlett emprestava sua beleza para o primeiro momento de glamour que conferi na noite (lembrando: não vi o tapete vermelho…). “A origem” leva as duas estatuetas (mixagem e edição de som) – e a única sensação do momento foi o que me pareceu um beijo na boca que Lora Hirschberg deu em alguém que parecia ser sua companheira! Mas eu posso estar enganado…
23:55
Lá vem aquele vídeo com os prêmios técnicos – entregues numa cerimônia à parte, com Marisa Tomei. James Franco conqusita finalmente minha simpatia quando retoma o palco e diz: “Parabéns, nerds!”. E logo vemos Cate Blanchett deslumbrante tomando conta do palco inteiro – e aquele palco gigantesco. Imponente, com aquela beleza que parece um desafio à natureza, Cate vem com um vestido que é um adeus definitivo ao “look” despojado no Oscar. Se alguém pode vir à festa vestida de rosa, coberta de pérolas falsas da mesma cor, essa mulher é Cate Blanchett! Não é à toa que ela está lá para apresentar o prêmio para melhor figurino – “Alice no país das maravilhas” (barbada!) – e melhor maquiagem – “O Lobisomen” (que nem enfrentava competição séria… será que não é o caso de a Academia substituir esse prêmio pelo de efeitos especiais?).
00:01
Primeiro sinal de anacronismo da noite: o prêmio para melhor canção, numa época onde ninguém se preocupa em fazer uma canção que marque um filme. O que, aliás, era fácil de ver pelo vídeo apresentado com depoimentos colhidos de populares (inclusive um que eu achei que conhecia, chamado Barack Obama), falando qual foi a música de um filme que mais os marcou. Adivinha… “The time of my life”, “My heart will go on”, “Beauty and the beast” – todas as canções mais previsíveis estavam lá, até mesmo “As time goes by”, indicada pelo tal Obama… Mas aí, quando Kevin Spacey aparece para chamar duas das indicadas, você tem a certeza de que a categoria está obsoleta: nenhuma dessas canções serão lembradas em premiações futuras. Ouvimos os temas de “Toy story 3” e “Enrolados” sem a menor emoção – ou mesmo a memória de que um dia as ouvimos no cinema. Triste…
00:12
James Franco volta a me incomodar – e eu descubro o porquê: está com muita maquiagem, e me faz lembrar de Jim Carrey… Sua missão agora é chamar os apresentadores para o prêmio de melhores curtas-metragens. E finalmente vemos um cara que sabe vestir um smoking: Jake Gyllenhaal! Este sim, o primeiro apresentador realmente elegante da noite – sem exageros, com um corte perfeito, discreto e moderno. Se um dia convidado for para tal cerimônia, é assim que eu quero me vestir. Ah, mas e os prêmios? Lembra quando você nunca achava que iria ter chances de ver o vencedor nessas categorias – muito menos todos os indicados? Mas agora já existe o youtube (e derivados) – e você pode conferir não apenas “Strangers no more” (melhor documentário), como “God of love” (melhor ficção). Isto é, se você quer mesmo ver “God of love”, pois, a julgar pela performance do diretor do curta – estranha figura, que fez estranho discurso de agradecimento –, o curta tem tudo para ser um irritante “exercício de arte” – mas eu divago…
00:17
Anne vem com novo vestido – que, apesar de dourado, é elegante. E, junto com James Franco, faz uma ótima brincadeira sobre 2010 ter sido um grande ano para os musicais… Como sabemos, se você descontar uma monstruosidade chamada “Burlesque”, o gênero mal registrou nas bilheterias do cinema mundial… Mas com a ajuda daquela tecnologia que transforma qualquer diálogo em canção, eles mostraram cenas dramáticas “hilárias” – minha favorita foi aquela tirada de “Harry Potter e as relíquias da morte – parte 1”. Sensacional!
00:19
No final do ano, no “Fantástico”, apresentamos uma reportagem sobre as conversas fiadas que as vendedoras de loja mandam nas clientes para convencê-las de comprar uma roupa que não caiu exatamente bem – você já passou por isso, tenho certeza… Pois bem, num dos momentos mais engraçados da reportagem, uma vendedora aconselhava a uma cliente que estava achando que o vestido estava um pouco apertado: “O importante não é respirar querida, é ficar bonita!”. Não sei por que, essa história me veio à cabeça quando vi Oprah entrar no palco para anunciar o melhor documentário – a única chance que o Brasil tinha de ganhar uma estatueta (mesmo assim, por tabela!). Num corte inesperado de câmera, vemos os irmãos Cohen com cara de aborrecidos, como se tivessem sido obrigados a assistir o próprio “Bravura indômita” de novo – mas o que me chamou mesmo atenção nessa hora foi uma figura adolescente sentada logo atrás deles: seria Justin Bieber, ou apenas um garoto emulando aquele penteado? Melhor ficar alerta! Enfim, quem ganha na categoria é “Trabalho interno” (“Bye bye Brazil”!), e o diretor faz o primeiro protesto da noite lembrando que nenhum dos agentes financeiros responsáveis pela últimas crise econômica mundial – o tema do seu documentário – está na cadeia… Acho que vou ver esse filme hoje!
00:28
Billy Cristal faz um discurso ligeiramente longo demais depois de ter brincado com o próprio atraso da cerimônia do Oscar… “Temos que correr, vamos direto ao prêmio de filme do ano”, disse ele com humor – mas o que veio a seguir foi uma grande falação… Ter “ressuscitado” Bob Hope – um dos apresentadores de Oscar mais icônicos da história – foi um truque interessante. Mas o que causou mesmo sensação no público feminino que assistia à festa comigo foi a chegada de Jude Law ao palco… Ao lado de Robert Downey Jr, ele apresentou o prêmio para melhores efeitos especiais – “A origem” (covardia!) – e melhor montagem – “A rede social” (eu levei um tempo para entender o que eram aquelas sessões com advogados no meio da história, e teria dado a estatueta para “O discurso do rei”, mas não quero ser chato…).
00:41
Anne Hathaway, como se isso fosse possível, agora aparece ainda mais bonita – de vermelho! – e ofusca Jennifer Hudson (que apesar de estar com uma cor parecida, não é páreo para Anne. Hudson chama mais duas canções candidatas – e quando vejo que é Florence Welsh (do Florence and the Machine!) que vai cantar o tema de “127 horas”, dou um pulo do sofá! O Oscar nunca esteve tão moderno! Meu entusiasmo, porém, levou um balde de água fria quando descubro que é Gwyneth Paltrow que vai cantar a música seguinte… Gwyneth, querida, larga esse microfone e volta para as telas, por favor! Quem leva o prêmio é Randy Newman, pela canção de “Toy story 3” – chata… Mas só de ter visto Florence Welsh no palco do Oscar, já ganhei a noite!
00:52
Celine Dion canta para homenagear as pessoas envolvidas com cinema que morreram no ano passado – tanta gente, que eu tive a impressão que ela teve de fazer uma versão remix da música… Em seguida, Hale Berry faz uma homenagem especial a Lena Horne, uma das primeiras atrizes (ela era primeiro cantora, é bom lembrar) negras a acontecer em Hollywood. A imagem de arquivo que vemos diz tudo – Horne estava tão maquiada e iluminada para “parecer branca”, que fica claro que o que a Academia estava fazendo ali era pedindo desculpas pelos erros (leia-se “discriminação”) do passado…
01:02
Anne Hathaway, como se isso fosse possível, agora aparece ainda mais bonita – sei que já escrevi isso, mas o que eu posso fazer? Ela agora está de azul – e a única palavra que eu consigo achar para descrevê-la é, desculpe, em francês: “ravissante”! Anne chama Hillary Swank – que quase desaparece perto da apresentadora oficial. Hillary, por sua vez, chama Kathryn Bigelow – que ganhou o Oscar de melhor direção no ano passado, por “Guerra ao terror”. E Kathryn chama… o diretor de “O discurso do rei”, Tom Hooper. Mau sinal…
01:06
Annette Bening faz uma breve aparição para chamar um vídeo sobre a festa dos “Oscars” especiais – um clima meio “Hollywood das antigas”. De alguma maneira, a festa parece mais íntima – e mais divertida – que a própria cerimônia a qual estamos assistindo… Mas o momento passa rápido…
01:11
Anne Hathaway, como se isso fosse possível, agora aparece ainda mais bonita – sei que já escrevi isso, mas o que eu posso fazer? Ela agora está de azul – o mesmo vestido azul que citei há pouco… Ela ainda não mudou de roupa, mas me surpreende mais uma vez com sua beleza… Ao lado de James Franco, estou convencido que eles esbanjam química – e elejo essa a melhor dupla de apresentadores em anos! Ambos chamam Jeff Bridges, que, para anunciar os indicados ao prêmio de melhor atriz, faz pequenos discursos que lembram aqueles que precedem uma eliminação no paredão do “BBB”… Mas acho que divago de novo… Outra “surpresa”… Natalie Portman vence sem muito questionamento – se bem que eu torcia secretamente para Annette Bening. Pronto, falei! Aposto que o discurso dela seria mais curto que o de Portman – que agradeceu tanta gente que, como disse uma amiga minha, só faltou a babá de seu futuro bebê… (Mas que ela estava bonita grávida, estava…).
01:20
A insuportável Sandra Bullock chega para fazer a mesma coisa que Jeff Bridges fez, só que para anunciar os candidatos a melhor ator. Ah, e sem um pingo de charme ou simpatia. Sandra, qual é o seu problema? Quem leva, claro, é Colin Firth – que faz um discurso de agradecimento ainda mais longo do que o de Natalie Portman – e eu agradeci que ele não tentou dizer o texto no mesmo estilo de seus personagem em “O discurso do rei” antes de ter se curado da gagueira… Teria levado horas!
01:32
Que decepção… E não estou falando do prêmio de melhor filme – não ainda! Mas da última roupa de Anne Hathway… Foi errar a mão justo no final? Tudo bem que eu já havia dito que ela seria desculpada de tudo esta noite, mas mesmo assim… Bem, mas ela e James estão lá para chamar Steven Spielberg, que por sua vez está lá para anunciar o filme do ano! Fiquei torcendo para Spielberg mostrar pelo menos um trailer do que será seu filme sobre Tintim, mas não rolou… Ele só veio mesmo para dizer que “O discurso do Rei” levou o Oscar 2011 – e essa sim, foi uma grande decepção… Depois de mostrar, de várias maneiras, que estava chegando à modernidade, no lugar de escolher um filme atual, do seu tempo, como “A rede social”, ou uma ousadia irreverente como “Cisne negro”, a Academia me vem com… “O discurso do rei”? Ora, faça-me um favor… A mesma Academia que premiou “Quem quer ser um milionário?” há apenas dois anos – e “Guerra ao terror” em 2010 – retrocede décadas e prestigia um filme caretérrimo. Bom, sem dúvida (ainda quero falar dele aqui neste espaço – talvez na quinta-feira). Mas super convencional… Vai entender…
01:38
Dezenas de crianças invadem o palco para cantar “Over the rainbow”, no que deveria ser um “gran finale”… Eu particularmente prefiro aquela garotada de uma escola pública de Nova York (o P.S. 22) cantando “Liztomania”, do Phoenix – mas eu entendo… Era o encerramento do Oscar… Ficou bonitinho! Só fiquei meio perturbado quando uma pequena multidão começou a invadir o palco com estatuetas na mão. Achei que era o elenco de “Quem quer ser um milionário?” que tinha voltado para a mesma performance do Oscar 2009… Mas não: eram só os premiados da noite (aparentemente todos) marcando presença, como que para dizer: “a festa só parece que homenageia o passado – nós somos o futuro”… Amém.