“Tieta” em tempos de Facebook

seg, 31/05/10
por Zeca Camargo |
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tieta Como quem já se deliciou com um dos melhores livros de Jorge Amado conhece bem (ou mesmo quem viu a adaptação para o cinema e até mesmo a novela baseada na obra), a protagonista de “Tieta do agreste” tinha um segredo. Expulsa de casa pelo pai ainda adolescente, devido ao seu comportamento “ligeiramente indécente” (o acento é por conta do sotaque baiano), ela retorna anos depois para sua pequena cidade, rica e disposta a transformar o vilarejo – entre outras benfeitorias, ela promove a chegada da luz elétrica para sua miserável população. Mas como é que Tieta fez tanto dinheiro assim em São Paulo? Ah… isso a gente só descobre algumas centenas de páginas depois de ter sido completamente hipnotizado pela história de Amado: ela era uma poderosa cafetina na cidade grande!

Agora, já pensou como seria se essa história se passasse nos dias de hoje. Mesmo levando-se em conta que o cenário é uma minúscula cidade do interior da Bahia – e que a eletricidade já houvesse chegado por lá –, você não acha que no dia seguinte do retorno de Tieta alguém já não teria entrado no Facebook dela para dar uma pesquisada na sua, hum, “rede de relacionamentos”? E que dali para descobrir a verdadeira “atividade” de Tieta seria um pulo… E aí, que história Jorge Amado teria para contar?

Como todo grande escritor, ele certamente não teria dificuldades em encontrar novas e boas narrativas para contar. Mas o que quero discutir com você hoje não é, claro, o talento incontestável de Amado (e de tantos outros autores que vou citar neste texto), mas a dificuldade de contar uma história plausível com personagens contemporâneos, em tempos como o de hoje, quando a privacidade é uma piada e todo mundo está a apenas um clique de conhecer todo mundo.

Escolhi Tieta para dar um exemplo talvez bastante familiar ao leitor brasileiro. Mas você pode pinçar histórias de difícil adaptação para nossos tempos tão modernos em qualquer cultura – ou em qualquer época. Pensei em escrever sobre isso já há algum tempo, quando li um artigo sobre a dificuldade de autores contemporâneos para criar histórias de desencontros amorosos (não me lembro bem onde – talvez tenha sido naquela última página de ensaios do “Book Review” do jornal “The New York Times” –, e certamente não consegui achar esse texto na internet… desculpe).

Na época – algumas semanas atrás –, lembrei-me de um dos melhores livros que li na minha vida: “As relações perigosas”, de Chorderlos de Laclos. Que é, diga-se, um romance do século 18… Talvez você tenha assistido a adaptação para o cinema (de 1989, com Michelle Pfeiffer, John Malkovich e Glenn Close), mas para entender minha associação de idéias, o ideal é que você tenha lido o livro (fica a recomendação) – porque o que os personagens principais faziam, naquela época, está mais ou menos para o que “Gossip girl” faz hoje: elevar a fofoca a um patamar de arte, e fazer de uma rede social uma poderosa arma de promoção pessoal.

O livro de Laclos é brilhante por vários motivos (Já recomendei sua leitura? Então aqui vai um reforço!). Mas o que mais me encantou é que ele é todo escrito em cartas. Da Marquesa de Merteuil para o Visconde de Valmont (a comunicação talvez mais intensa); do Visconde de Valmont à Cécile de Volanges; de madame de Rosemonde ao Visconde de Valmont; do Cavaleiro Danceny à Marquesa de Merteuil. E assim segue uma troca de correspondências frenética e poderosa, capaz de mudar os rumos de jovens amantes e trazer à tona o pior da perversão dos adultos (tenho aqui que resistir à tentação de falar mais desse livro que eu gosto tanto, mas nosso assunto hoje tem outro foco…).

Fiquei pensando que, ironicamente, este romance de mais de duzentos anos, seria talvez um que se adaptasse muito bem ao frenesi cognitivo que temos hoje no nosso cotidiano tão devassado por Twitters, Facebooks, Orkuts e Myspaces… Brilhantes manipuladores que são, a Marquesa de Merteuil e o Visconde de Valmont tinham tudo para se tornar mestres na tortura com torpedos, scraps, twits e msns…

Outras histórias, porém, não teriam a mesma passagem suave para a modernidade. “Bel-ami”, por exempl0, de Guy de Maupasant (um romance que li na sequência de “Ligações perigosas” – um dia ainda falo sobre essa conexão), foi escrito cem anos depois, mas seu herói (uma espécie de “alpinista social”) não conseguiria enganar seu círculo de relacionamentos por muito tempo – posto que  todos estivessem na internet. Fanny Price, a “heroína” de “Mansfield Park” – considerada a obra-prima de Jane Austen – seria uma vítima fácil de “cyberbulling” para seus primos ricos com quem foi criada. E Heathcliff, de “O morro dos ventos uivantes” (para ficarmos ainda no século 19) talvez não levasse a cabo sua vingança contra a família Earnshaw se expusesse seu perfil com transparência na numa página do Facebook…

As coisas ficam ainda mais complicadas nos livros do século 20. Você acha que “O talentoso Sr. Ripely” (1955), um dos mais brilhantes personagens da ficção moderna, criado por Patricia Highsmith (e vivido no cinema, na sua versão mais conhecida, por Matt Damon), seria capaz de esconder sua identidade tão bem nos dias de hoje? Meu palpite é que suas verdadeiras falcatruas não sobreviveriam a uma “googlada”… O sensacional detetive belga Hercules Poirot, criação da não menos sensacional Agatha Christie, só precisaria dar uma “busca” no nome “Ratchett” ou na “família Armstrong”, para descobrir que todos os passageiros do “Expresso do Oriente” (1934), bem… quem já leu o livro sabe onde quero chegar… Boa parte das volumosas tramas de espionagem de John le Carré não passariam de meia dúzia de páginas se as pistas iniciais fossem colocadas num computador. E seria virtualmente impossível a americana Helene Hanff ter escrito “84 Charring Cross Road”, o romance que ficou conhecido por sua versão para as telas – que no Brasil chamou-se “Nunca te vi, sempre te amei” (só esse título já demonstra o que quero dizer) – se as duas pontas dessa história de amor tivessem páginas de relacionamento? A paixão jamais floresceria da mesma maneira entre eles…

E os exemplos são inúmeros também na literatura brasileira. Capitu (“Dom Casmurro”, Machado de Assis) não seria apenas um tema abstrato nas salas virtuais de discussão literária, mas uma personagem cujos scraps poderiam ser examinados minuciosamente para que fossem descobertas pistas de sua traição – ou não, quem sabe os mesmos scraps a absolveriam, finalmente! “Macunaíma” poderia continuar a não ter nenhum caráter, mas suas origens multiculturais se traduziriam em milhares (e por que não milhões?) de ecléticos seguidores no Twitter. E não é só Tieta, no imenso leque de personagens criados por Jorge Amado, que teria muito pouco a esconder em tempos de privacidade zero…

O paradoxo da capacidade do ser humano moderno estar conectado versus tramas românticas (e/ou policiais) que exigem desencontros complica inclusive a vida de autores de novelas. Pense em “Passione”, por exemplo. O mais novo trabalho de Silvio de Abreu – que, como já citei aqui, é um dos meus autores favoritos – traz mais uma vez sofisticados mistérios para serem desvendados aos poucos ao longo de seus capítulos. Mas boa parte desses mistérios seria facilmente resolvida com algumas ferramentas da internet. Por exemplo, a milionária família de Bete Gouveia (Fernanda Montenegro) vive um dilema agora porque ela quer ir à Itália conhecer um filho que ela achava que havia morrido logo depois do parto – Totó (Tony Ramos). Ele, por sua vez, segue sua vida na Itália, inocente de que uma fortuna o espera no Brasil. Mas por que raios, em tempos de Skype, esse pessoal já não fez uma vídeo conferência para resolver tudo?

Ainda na novela, Berillo (Bruno Gagliasso) pensa que sua mulher na Itália, Agostina (Leandra Leal) o abandonou depois que ele veio ao Brasil – e por isso casou-se de novo por aqui. Mas a confusão é culpa do carteiro Mimi (Marcelo Médici), que – apaixonado por Agostina – nunca entregou as cartas de Berillo à esposa… Será que um chat rápido, por MSN mesmo, não teria segurado esse casamento na Itália? Por que nenhuma das partes, nem lá nem aqui, fez um “search”, um no nome do outro?

Eu sei a pergunta para essa resposta – e para a do parágrafo anterior. É porque nós adoramos histórias boas – e nem ligamos para detalhes “modernos” que poderiam arruinar a capacidade delas nos encantar – de “Passione” a “Dom Casmurro”! Mas, nem que seja só para provocar uma reflexão, imagine que você é um jovem escritor, que quer escrever um romance “do seu tempo”, onde as pessoas se apaixonam, não sabem o que fazer com essa paixão, desencanam, somem da vida daqueles a quem juraram amor eterno, e vão viver outras histórias – tudo, claro, levando em consideração Facebooks, Twitters, Googles etc. Será que você conseguiria escrever uma boa – e plausível – história?

Eu mesmo, na minha primeira investida na ficção – há pouco tempo deflagrada aqui mesmo neste espaço – flertei levemente com isso (e, encorajado por seu comentário, já estou com um outro no prelo, no mesmo universo – mas eu divago…). E não foi fácil. Nick Hornby, em livro que comentei aqui recentemente (“Juliet, nua e crua”), usou bem a internet para conectar um duvidoso par romântico – mas a tentativa, embora válida, ainda foi tímida. O que estou esperando mesmo é que alguém venha com um “Ligações perigosas” para o século 21… Seria pedir demais?

Colheita recente

qui, 27/05/10
por Zeca Camargo |
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Instigado por um artigo recente na revista “New York” fui conferir o que há de novo uma forma de arte que julgava moribunda: o videoclipe. Não falo assim por maldade… Afinal, como eu posso negar que, se não fossem eles, os vídeos, eu talvez nem estivesse trabalhando em televisão? (Para a geração que tem menos de 15 anos, eu comecei minha carreira televisiva num jornal chamado “MTV no ar”, mas isso era na era mesozoica… para ter visto o último boletim que eu fiz – e lembrar-se dele! – a pessoa tem que ter no mínimo uns 20 anos… ou então ser um pesquisador bacharelado de curiosidades do YouTube; mais sobre esse assunto, quando o canal completar gloriosos e incertos 20 anos, em outubro).

Eu cresci e me formei gostando de música pop – e quando os clipes surgiram (sim, jovem leitor, houve um tempo em que eles nem existiam!), eu passei a acompanhar também sua evolução (e, como já expliquei há pouco, noticiar sobre eles). Talvez seja difícil de acreditar nisso, nesses tempos em que você pode assistir ao vídeo que quiser, na hora que quiser, no seu aparelho celular, mas houve um tempo em que eles eram discutidos como genuína forma de expressão artística, e suas estréias faziam muita gente ficar em casa para assistir “a última” de artistas como Madonna, Prince, Michael Jackson, Pet Shop Boys – e também (pasme!) Skid Row, Blind Melon, En Vogue, Poison… melhor parar por aqui!

E não só isso: lembro-me hoje, com ironia, que o maior “rival” da MTV do meu tempo, no que diz respeito a estréia de clipes, era ninguém menos que… o “Fantástico”! Isso mesmo: os vídeos eram tão importantes, que as então poderosas gravadoras ficavam divididas. Dar a “exclusividade” (só a ideia de que um clipe musical hoje possa ser exclusivo, provoca cócegas na barriga…) da “première” de um artista importante para um veículo que com a  força de audiência que o “Fantástico” sempre teve? Ou respeitar a fidelidade dos fãs mais ardorosos dos mesmos artistas e passar a “novidade” para a MTV? Dúvida cruel… Em particular, tenho a lembrança de uma disputa ferrenha em torno de “Justify my love”, de Madonna (nos idos de novembro de 1990) – que acabou em empate: MTV e “Fantástico” passaram o vídeo exatamente ao mesmo tempo (se bem que, se não me falha a memória, “nós” na MTV passamos a versão sem cortes, que talvez naquela época, fosse ousada demais para a TV aberta…).

Fato é que, depois de ter tido uma presença tão marcante na minha carreira – e na própria cultura pop – os videoclipes caíram na banalidade. E dali, para a indiferença dos amantes de música, foi um pulo. Claro que, nos último 15 anos, alguma coisa boa apareceu. Sempre tinha uma Björk para nos surpreender; um Spike Jonze para vir com uma ideia totalmente imprevisível; um White Stripes para nos lembrar que boa música pode e deve ser acompanhada de um estilo visual; um Daft Punk para dar uma lição de simplicidade e genialidade; um OK Go para provar que ainda era possível inventar alguma coisa; um Gnarls Barkley para um momento mais sublime (se alguém já fez um vídeo mais avassalador que “Who’s gonna save my soul?”, ou mais vibrante que “Going on”, por favor, me avise!).

Mas, como nos conta Logan Hill no já citado artigo da “New York”, sob o título “Internet killed the MTV star” (uma brincadeira com o título do primeiro vídeo que passou em 01 de agosto de 1981, na estréia da MTV americana: o de uma banda que ninguém nunca mais ouviu falar, The Buggles, “Video killed the radio star”, que quer dizer “o vídeo matou a estrela do rádio”…), o clipe experimenta uma espécie de renascimento – e adivinha quem é o maior responsável por isso? Justamente a internet!

Isso não é exatamente uma novidade – especialmente para quem gosta de música. Só para dar o exemplo mais óbvio (que é um dos ganchos tamém do artigo de Hill), “Telephone”, de Lady Gaga e Beyoncé tem – até o momento em que escrevo isso, numa pesquisa rápida – 77.834.585 acessos (vale a pena colocar por extenso: setenta e sete milhões, oitocentos e trinta e quatro mil, quinhentos e oitenta e cinco), somando as versões editadas e a mais “pesada”… Mas o que o me chamou atenção na reportagem é uma nova geração de diretores que estão, mais uma vez, revitalizando o formato.

Fiquei meio passado ao ler que o diretor de um dos clipes mais icônicos daquele meu tempo de MTV – “Smells like teen spirit”, do Nirvana -, um cara chamado Samuel Bayer, hoje assina produções “importantes” como a última versão de “A hora do pesadelo”. Em compensação, Hill seleciona uma nova geração de criadores que estão infestando o youtube (e um celular bem próximo de você) com idéias fantásticas – quando não, ligeiramente assustadoras.

Como Romain Gavras, que dirigiu o alucinante – e mega violento – “Born free”, para a nova música de M.I.A. (qualquer semelhança com o trailer para uma continuação de “Guerra ao terror”, o filme do ganhador do Oscar desse ano, é mera coincidência). Em nove desesperados minutos, Gavras (que é filho do respeitador diretor de cinema Costa-Gavras) oferece um “faux” mini-documentário sobre uma caçada monstruosa de uma tropa de elite americana a um “grupo de rebeldes”… ruivos! A ação é tão violenta (mesmo antes de a primeira vítima morrer com um tiro na cabeça – outras virão, não se preocupe, em detalhes ainda mais grotescos), que você quase esquece da música. Ou melhor, você esquece da música. Mas não esquece da presença oculta de M.I.A. – ou do trabalho de Gavras.

Figuras carimbadas, como Michel Gondry (pense em “Fell in love with a girl”, do White Stripes, ou o inigualável “Let forever be”, do Chemical Brothers) e Spike Jonze (que ainda mostra sinais de muita vitalidade, como no recente e brilhante vídeo para a nova música do LCD Soundsystem, “Drunk girls”), são citadas no artigo. Mas o que mais me deixou animado são nomes novíssimos, como Eric Wareheim (que fez o insano “Keep it goin’ louder”, do Major Lazer, demonstrando que nem sempre a computação gráfica serve para deixar as mulheres mais atraentes!); Sean Metelerkamp, que me apresentou o curto e grosso “Zef side”, de um grupo chamado Die Antwoord – e que eu já sugiro que seja uma espécie de hino alternativo para a Copa do Mundo da África do Sul (os caras são de lá!); e um pessoal que atende pelo nome de Radical Friend, que assina, entre outras coisas, os estranhos vídeos do não menos estranho novo álbum do Yeasayer – “O.N.E.” e “Ambling alp”.

Essa coleção de vídeos, que se você tiver tempo de conferir aí no seu trabalho, ou tarde da noite na sua casa, é a “colheita recente” à que me referi no título deste post. Mas quando comecei a escrever, tinha algo mais em mente: sugerir para você duas bandas que estão tentando já há algum tempo ter algum destaque no universo pop, e que agora parece que finalmente conseguiram. Uma delas é justamente o Yeasayer (não foi coincidência que a lista de clipes terminou com os deles).

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Eles começaram a aparecer no Brooklyn nova-iorquino, na cena alternativa da cidade, em 2006 – e o primeiro álbum “All hour cymbals” era tão, insisto, alternativo, que ouvi só uma vez e deixei para “assimilá-lo” em outra oportunidade (que nunca chegou…). Mas o segundo trabalho “Odd blood”, que saiu este ano, foi tão elogiado, que não resisti a dar uma segunda chance para eles. E fui recompensado com um dos sons mais inesperados da temporada.

Cada faixa de “Odd blood” é densa, como se fosse construída em camadas – dezenas delas. O aspecto um pouco, digamos, mais “cerebral” do álbum anterior foi colocado de lado, e agora parece que eles estão mesmo é a fim de dançar – e levar você junto pra pista… ” O.N.E.”, como já conferi há pouco tempo, funciona bem na pista. E o clima festivo segue por todas as outras faixas. É mais um gosto adquirido do que um “amor à primeira ouvida”. Mas altamente recomendável!

E a outra sugestão de banda que vem batalhando há anos pela sua atenção – e finalmente a merece – também se criou no Brooklyn nova-iorquino, apesar de ter se formado originalmente em Cincinnati, no estado americano de Ohio. E tem um som totalmente diferente do Yeasayer. Ouvindo rapidamente, eles podem até ser confundidos com uma boa banda inglesa do final dos anos 80 ou início dos 90 – os infames “shoegazers” (ou “olhadores de sapatos”, como eram chamados os artistas que ignoravam o público e cantavam olhando para seus pés…). Mas esse é um rótulo superficial demais para definir o complexo – e fascinante – som do The National.

Conheci a banda em 2005, quando o bom álbum “Alligator” me ofertou uma faixa que até hoje não saiu do meu iPod: “Secret meeting”. Depois eles vieram com o bem recebido “Boxer” (2007), mas também não foi dessa vez que eles estouraram. Agora, com o ultra-elogiado “High violet” a sorte da banda parece que está mudando. Felizmente o som, não! Neste novo trabalho, o The National vem com a mesma gravidade – e quase sempre imprevisibilidade – que eles já tinham quando os conheci.

A voz de Matt Beringer, então, está ainda mais envolvente – e estranha… Músicas como “Bloodbuzz Ohio” e “Terrible love” mostram que a banda está quase se aproximando de um pop mais universal – e quem por acaso estiver entrando em contato com esse som por essas faixas não tem desculpa para não se apaixonar pelo The National. Que, aliás – e não posso deixar de assinalar esse detalhe irônico depois de tudo que escrevi hoje -, ainda não tem um clipe oficial para suas novas canções…

Um caso raro

seg, 24/05/10
por Zeca Camargo |
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A personagem Lisbeth Salander, em 'Os homens que não amavam as mulheres'Quantas vezes você já ouviu este clichê: “o livro é melhor que o filme”? Sem contar as vezes que você mesmo usou essa frase – ou pensou em usá-la… Aqui mesmo neste espaço, cheguei a comentar uma vez sobre “problemas de adaptação”, quando falei dos filmes “O caçador de pipas” e “Desejo e reparação”. O que incomoda num clichê, porém, é que ele sempre transmite alguma verdade – engessada num lugar comum, fato, mas nunca menos que um reflexo de uma observação genuína. E esse, que diz respeito a livros que são adaptados para o cinema, também faz um certo sentido…

Daí a minha alegria ao encontrar, recentemente, uma exceção – que vem justamente comprovar a regra (outro clichê!). Fui assistir a “Os homens que não amavam as mulheres” com expectativa moderada. A seu favor, o filme tinha o fato de ser baseado num livro que me interessou – ainda que modestamente (mais sobre a “Trilogia Millenium” daqui a pouco). E mais: não se tratava de uma adaptação “hollywoodiana”, uma vez que a produção é sueca, dirigida por um dinamarquês (Niels Arden Oplev) – o que sempre indica promessa de uma adaptação mais fiel. Mas quando saí da sessão de duas horas e meia, estava mais que satisfeito com o filme: estava entusiasmado – e a fim até de rever alguns aspectos da obra original. E, ainda contrariando todas as expectativas, fiquei com vontade de ver a segunda e a terceira parte da história também nas telas!

Boa parte do sucesso da adaptação de “Os homens que não amavam as mulheres” tem a ver com a excelente escolha do elenco. Poucas vezes imaginei uma personagem que foi tão fielmente representada como Lisbeth Salander (Noomi Repace) – a “heroína” da história (e põe aspas nisso!). Imaginava talvez o jornalista Mikael Blomkvist um pouco mais galã – menos “acabado” – do que o ator Michael Nyqvist, mas depois de duas ou três cenas, seu trabalho provou ser tão interessante, que isso deixou de incomodar. Toda a família Vanger, em torno da qual gira o mistério que Blomkvist é contratado para investigar, é exatamente como eu achei que poderia ser! E não vamos nem falar nas locações… Levei um susto enorme quando vi que a casa de Henrik Vanger era exatamente o que eu havia esboçado na minha imaginação!

Mas também – e os fãs da trilogia vão ficar ligeiramente incomodados com isso – gostei da adaptação de “Os homens” para o cinema porque isso exigiu uma boa enxugada na história… Como mencionei quando escrevi sobre o livro de Steig Larsson pela primeira vez, um ano atrás, em várias passagens do grosso volume, tive a sensação de que o autor estava “enchendo linguiça”…

Perfis longuíssimos de personagens secundários – que não mostravam nem um virtuosismo literário nem informações relevantes para o enredo maior – revezavam com detalhes repetitivos (sobre a “missão” da revista “Millenium”, onde Blomkvist é repórter, ou sobre a “ficha suja” de Lisbeth) para criar ruídos que atravancam uma história – que é sensacional e cativante. Tão cativante, aliás, que sobrevive a essas interferências e fazem o leitor esperar ansiosamente para ler os volumes 2 e 3  (mais sobre eles daqui a pouco).

No filme, a história é resumida a sua essência: Blomkvist é contratado por Henrik Vanger para resolver um desaparecimento de mais de 40 anos (da sobrinha favorita de Henrik, Harriet), que pode esconder um grande crime, numa cidade do norte da Suécia; por uma coincidência de investigações, Lisbeth – a menina problema, que é também uma “hacker” extremamente habilidosa – resolve ajudá-lo na investigação, que vai desvendando aos poucos muito mais do que a própria família Vanger gostaria de saber. A história complicada de Lisbeth também permeia a trama (entre outras “amenidades” ela é estuprada, em cenas deveras gráficas, pelo seu tutor, de quem ela se vinga mais tarde, com maestria). Com apenas esses elementos, Oplev oferece um filme hipnótico. E sem nenhuma “enrolação”…

Tudo indica que Hollywood vai fazer a sua versão também – prevista para 2012. A aposta é de Carey Mulligan (“Educação”) no papel de Lisbeth, e Brad Pitt como Blomkvist – o que faz até sentido, se o diretor escolhido para a tarefa for mesmo David Fincher (de “O curioso caso de Benjamin Button”). Mas algo me diz que essa “adaptação da adaptação” será “ligeiramente” pasteurizada – de cara, aposto que a vingança de Lisbeth contra seu tutor será cortada na íntegra…

Particularmente estou mais interessado em ver as adaptações suecas dos outros livros de Larsson – que é, ele também, sueco (e, só para registro, o jornalista, com uma carreira curiosamente semelhante à de Blomkvist, morreu de um ataque cardíaco pouco antes de ver sua trilogia ser publicada – e, mais tarde, tornar-se um sucesso mundial). Em especial, espero ansiosamente pela filmagem de “A menina que brincava com fogo”, o segundo livro.

Nas 608 páginas da edição brasileira (toda a trilogia, que soma um total de 1.874 páginas, foi lançada aqui pela Companhia das Letras), você vai encontrar a história mais eletrizante de todas. A investigação agora tem seu foco numa rede de tráfico de mulheres. A revista “Millenium” está prestes a publicar um número especial sobre o assunto, quando o jornalista por trás da reportagem é assassinado. Adivinhe quem é a principal suspeita? Lisbeth! Ela ainda parece ser a culpada por dois outros homicídios – e tudo segue para uma caçada realmente emocionante, e, ao longo dela, mais detalhes impressionantes do passado conturbado de Lisbeth vai sendo revelado.

“A menina que brigava com fogo” não tem uma linha de “gordura”. As aborrecidas divagações do primeiro livro foram substituídas por narrativas cheias de suspense e explicações plausíveis e úteis ao leitor (o final mesmo, como várias pessoas que leram o livro comentaram comigo – e eu concordei plenamente –, é bastante implausível… mas isso é um detalhe…). Surgem novos vilões – inclusive um “monstro” que parece insensível à dor física –, outros são apresentados para a conclusão da trilogia, e o próprio Blomkvist parece menos “super” (um apelido que ele ganha contra a sua vontade no primeiro livro), e mais falível. Para dar uma apimentada, o autor ainda incluiu um tórrido romance entre Lisbeth e uma outra garota (quase tão misteriosa quanto ela). Por isso tudo, mesmo antes de ver “Os homens que não amavam as mulheres” no cinema, quando li “A menina”, no final do ano passado, logo imaginei que daria uma ótima adaptação para as telas. E agora mal posso esperar por ela…

Depois de ter lido “A menina”, entusiasmado com esse novo impulso no meu interesse pela saga de Larsson – confesso que só me forcei a ler o segundo livro por teimosia, porque já o havia comprado –, mergulhei com tudo em “A rainha do castelo de ar”. Nem pensei duas vezes ao incluir o volume – um considerável “tijolo” de 688 páginas – na minha bagagem de mão, numa das etapas das viagens pelas megacidades, no início deste ano. Porém…

Porém, a conclusão da trilogia não chega a ser tão boa quanto sua segunda parte. “A rainha” é, para minha felicidade, bem mais interessante que aquele primeiro livro – pelo qual desgraçadamente temos que passar para acompanhar toda a história. Mas com relação a sua trama, ela não chega a ser tão bem resolvida – sequer tão cativante – quanto à de “A menina”. Dificilmente você vai se aborrecer com essa leitura final – até porque, o leitor se sente recompensado ao ver que vários pontos misteriosos do passado de Lisbeth são finalmente desvendados. Mas a expectativa de um “gran finale” não foi cumprida.

Considerando que Lisbeth passa boa parte desse livro internada (e interditada) num hospital, a ação se desenrola até que bem. Somos convidados a mergulhar ainda mais fundo na biografia da “heroína” – e conhecemos mais de perto sua turbulenta história familiar (que, de certa maneira, se mistura com a história do próprio serviço secreto sueco). Uma conspiração surreal para desacreditar Lisbeth é revelada, e o próprio governo da Suécia fica ameaçado de sofrer o maior golpe da história do país. De alguma maneira, porém, Larsson dessa vez não conseguiu me entusiasmar…

O que não significa que “A rainha do castelo de ar” não dê também um bom filme. Ainda com  “Os homens que não amavam as mulheres” na cabeça, minha esperança é a de que tudo que tem de frouxo no livro pode sim ser corrigido para que a gente tenha mais algumas horas de puro entretenimento no cinema graças ao talento (ainda que irregular) de Larsson.

E só posso lamentar também que ele não esteja mais entre nós para continuar a escrever sobre Lisbeth e Blomkvist… Ou talvez…

Talvez seja melhor assim. Parece que a saga “Crepúsculo”, de Stephanie Meyer, que estava prevista para esses quatro volumes que já são um inquestionável sucesso, vai ganhar uma continuação… (e engordar, claro, as contas bancárias da autora!). E fui só eu que ouvi rumores de que Harry Potter pode colocar as manguinhas de seu uniforme de bruxo de Hogwarts para fora – num futuro próximo?

Será que é necessário estender a vida útil de personagens que tanto amamos apenas em troca de mais alguns trocados? Eu prefiro apostar que sempre vai surgir uma boa – e original – história para nos cativar, mas acho que sou minoria…

Para que servem as cidades

qui, 20/05/10
por Zeca Camargo |
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mumbai_blogEsta semana entrevistei Silvio de Abreu, um dos mais bem-sucedidos e mais respeitados autores de novelas no Brasil. Assunto não era bem o seu trabalho (mais sobre isso daqui a pouco), mas sobre a matéria-prima de seu trabalho: a cidade que o inspira tanto, e que será o tema do último episódio dessa série de reportagens que estou fazendo no “Fantástico” – justamente sobre megacidades: São Paulo.

Em cada escala que fizemos, entrevistamos um autor que reconhecidamente tivesse conseguido transmitir, através de sua obra, um pouco da vibração da gente do lugar que visitávamos. Assim, fomos de Richard Price, em Nova York (um escritor cuja obra já explorei aqui mesmo neste  espaço), a Laura Esquivel, na Cidade do México – passando por um enlouquecido escritor de romances para telefones celulares, Keipu Endo (onde mais, se não em Tóquio?). Este domingo, quando vamos visitar Mumbai, na Índia, você está convidado a ver uma conversa com o escritor que – confesso aqui pela primeira vez – inspirou toda a série com o seu livro: Suketu Mehta, autor de “Maximum city: Bombay lost and found”, uma sensacional biografia de uma cidade, que é até hoje um dos melhores livros de não-ficção que eu já li (e que permanece até hoje, seis anos depois de seu lançamento internacional, injustamente inédito no Brasil – o próprio Mehta me contou na entrevista que ele havia ouvido alguma coisa sobre uma possível tradução para o português, mas até agora não consegui descobrir nada…).

E para encerrar a série, no domingo que vem (30 de maio), com a “nossa” megacidade – São Paulo – fui falar com Silvio de Abreu. Sua nova novela (“Passione”) havia estreado no dia anterior à entrevista – e eu, claro, como fã de seu trabalho, já havia assistido o primeiro capítulo com a máxima atenção. E fui, mais uma vez – como aliás sempre acontece quando vejo suas novelas –, surpreendido pela trama instigante, pelo dialogo esperto, pelo humor preciso, e pelo elenco perfeitamente adequado.

(Antes de continuar, um esclarecimento importante para os que acreditam em teorias de conspiração: escrevi este último parágrafo sim com três armas apontadas para a minha cabeça  – depois de já ter recebido algumas coronhadas –, empunhadas por três homens encapuzados, porém vestidos com ternos elegantes –  seriam da gangue que assaltou a joalheria em São Paulo no último domingo? –, que não disseram exatamente para quem trabalhavam, mas me informaram que, se eu gostasse do meu emprego era melhor eu escrever bem da nova novela, do contrário eu teria de – sic – arcar com as consequências… Caro, cara, “descobridor(a) de mistérios… Satisfeito? Satisfeita? Você que acha que não tenho a opção de escrever sobre o que quero aqui neste espaço pode correr para o twitter e espalhar algumas frases que estão entre estes parênteses e mostrar ao mundo como você é esperto(a) e como todas suas suspeitas sobre mim estavam corretas! Por outro lado, você que acredita em opiniões independentes – e que, aliás, como bom (boa) seguidor(a) deste blog há quase quatro anos –, entendeu a ironia das linhas acima, vamos em frente… Você sabe o quanto eu gosto de novelas, e que se faço tantos elogios a Silvio de Abreu é porque eles são frutos de uma genuína admiração. Com você não preciso me alongar nessas sutilezas – continuemos!)

Como mostrou já no início de “Passione” – e em tantos trabalhos anteriores – Silvio (se ele me permite essa intimidade) é profundo conhecedor de São Paulo. Aliás, mais que isso: ele é um apaixonado por essa cidade – pela sua diversidade de culturas, pelas suas inesgotáveis possibilidades de entretenimento, por sua incrível mobilidade social, pelo (talvez surpreendente) calor de seus habitantes, e até mesmo pelos seus problemas cotidianos que, de certa forma, obrigam quem mora nessa megacidade a ir em frente com mais determinação. Que delícia – especialmente para mim, paulistano adotado (há meros 40 anos!) – ouvir ele falar com tanto entusiasmo de São Paulo!

Fiquei feliz com o resultado –  afinal, vou ter a chance de fechar a série de reportagens com “chave de ouro”, usando as palavras desse autor. Mas, aqui entre nós do blog, o que mais gostei foi da conversa que continuamos a ter depois que as câmeras já haviam sido desligadas – e a equipe estava arrumando todo o equipamento para irmos embora. Foi nesse bate-papo – talvez breve, mas bastante intenso –, que falamos sobre viagens (um assunto que está obviamente entre os meus favoritos) e cidades que gostamos. E foi durante essa troca que pensei melhor sobre o sentido dessas matérias que estou fazendo – e é isso que quero dividir agora com você.

Durante a entrevista, ele me contava de sua origem num bairro simples de São Paulo, a Baixada do Glicério – e que tinha a sua turma lá, e que, de certa maneira, todo mundo saiu desse núcleo para trilhar um caminho interessante. A começar, claro, por ele mesmo… Quando terminamos de gravar, quis retomar este tema, em função do que estive pensando nessas minhas andanças pelas grandes cidades do mundo – juntando ainda com algo que o próprio Silvio havia dito sobre os cruzamentos de culturas que só acontecem numa metrópole como São Paulo. Eles só poderiam acontecer num lugar, numa atmosfera ultra urbana.

Duvida? É mais fácil demonstrar isso dando um exemplo contrário. Imagine, hipoteticamente que existem pessoas com uma cabeça genial no mundo todo – e elas podem aparecer em qualquer parte do planeta. Mas, diga lá, se você tem uma pensamento mirabolante, mas está longe de alguém interessante com quem possa compartilhá-lo, que conquência ele vai ter?

A idéia é essa: cidades (e quando maior, mais significativo e decisivo é esse processo) têm o potencial de juntar pessoas com boas idéias, fazer elas se conhecerem, trocarem essas idéias, e a partir dessas trocas, gerar idéias ainda  mais interessantes e mais ambiciosas.

Pensando na própria história, Silvio de Abreu reforçou minha teoria, lembrando de movimentos da cultura paulistana que surgiram a partir de grandes encontros. Sua referência maior, claro, é o teatro paulistano (que ele graciosamente homenageia em sua nova novela, não apenas com a presença de Fernanda Montenegro, mas também de outros membros ilustres do elenco, como Cleyde Yácones, Leonardo Villar e Elias Gleiser). Mas ali mesmo, de memória, conseguimos lembrar de outras turmas, que renderam bom caldo – e rendem até hoje. Os Titãs, por exemplo, que se conheceram em torno do Colégio Equipe, nos anos 80; o pessoal da antiga Casa 7 – um micro-movimento de artes plásticas, também daquela década, de onde saíram nomes que hoje são conhecidos internacionalmente; Silvio lembrou do “pessoal” de teatro da Praça Roosevelt, que hoje, segundo ele, faz coisas mais interessantes em termos de experimentação em arte cênicas do que grupos de vanguarda nova-iorquinos.

E podemos ir para o Rio de Janeiro também, onde, falando de artes plásticas, uma tal Geração 80 surgiu então em torno do Parque Laje (já ouviu falar de Beatriz Milhazes, a primeira artista brasileira a ter um quadro vendido por um milhão de dólares?). Ou podemos discutor os grupos de teatro então chamado “besteirol”, que gravitava em torno do teatro Cândido Mendes, na mesma década. O Monobloco inspirou toda uma geração (e talvez duas!) de músicos cariocas. E não vamos nem falar em cinema…

Para fugir do eixo Rio-SP, pense na música feita no Recife nos anos 90 – e todo o legado de Chico Science (que veio dar em Karina Buhr!). Ou pense em Brasília nos anos 90 – Legião, Capital etc. Que tal a turma de teatro de Lázaro Ramos e Wagner Moura, que começou a fazer barulho no final dos anos 90, em Salvador? E, voltando a falar de cinema, Porto Alegre nos deu Jorge Furtado e muito mais com sua Casa de Cinema.

E olha que estou girando apenas em torno das artes e espetáculos – que é minha praia. Mas tenho certeza de que encontros poderosos assim também acontecem nas grandes cidades em áreas diversas, como ciência, esporte, publicidade, pesquisa – e até, por que não, na política! Pelo que pude perceber nessas andanças recentes, o mesmo fenômeno ocorre – em proporções locais (ou até mundiais, conforma a cidade em questão) – em cada um desses enormes centros urbanos.

Falar de Nova York é covardia, claro – de Madonna a Lady Gaga (para fechar apenas em algumas décadas de música pop) temos uma linhagem de estrelas que só poderia ser “cultivada” numa atmosfera criativa como a daquela cidade. Mas pude ver coisas semelhantes – talvez, repito, não com um impacto global, mas certamente regional – em lugares tão distintos (e distantes) como Cidade do México e Mumbai!

Já escrevi mais de uma vez aqui neste espaço sobre meu amor à Índia – a mais recente delas, há dois meses. Mas revendo o material que gravamos em nessa cidade indiana para a série (no ar neste domingo!), tive mais uma vez a sensação de que um movimento cultural tão delirante quanto Bollywood, por exemplo, só poderia sair de um lugar tão efervescente quanto Mumbai! Em mais de uma ocasião, durante os breves dias que passei por lá, peguei-me sonhando em fazer parte daquela cultura. Cara de indiano eu já tenho – o que me enche de vaidade… Por isso mesmo, mais de uma vez, vi-me a poucos passos de integrar-me naquele ritmo que a cidade mostra nas suas ruas – se pelo menos eu falasse o híndi…

Ou ainda, minha mais recente paixão urbana, Xangai – também aqui já exaltada –, também tem a ver com a descoberta de que a cidade, longe de ser um aglomerado urbano sem-graça, pulsa com energia suficiente para inspirar uma geração de novos artistas, chefs, empreendedores, exploradores, cientistas e afins!

Se vou levar um registro interessante dessas megacidades é o de que são em lugares assim que eu quero morar sempre! Minha inspiração – posso afirmar agora sem receios – vem dessa vibração maluca, dessa troca inevitável de idéias (que nem sempre estão alinhadas, mas por isso mesmo talvez nos inspire a pensar de outra maneira), que só pode florescer e crescer em espaços como esses.

Outro dia, em algum lugar deste blog, falando dessa curiosidade infinita que eu tenho, alguém me perguntou se eu – que sou nascido em Uberaba (MG) – teria tido o mesmo percurso se minha família não houvesse se fixado em São Paulo, quando eu ainda era criança. Gostei da provocação e pensei comigo mesmo que… talvez não. Foi São Paulo que me abriu milhões de oportunidades. E é por isso que eu amo tanto essa cidade – que espero retratar com toda essa paixão sem ser esse domingo, no próximo. É cheia de problemas, sim. Tem horas que você se pega pensando em lugares alternativos para morar porque não aguenta mais algum problema crônico, sim. Tem vezes que você não vê a hora de deixá-la por uns dias, sim. Mas foi em São Paulo que eu aprendi a gostar das grandes cidades. E se eu não tivesse tido essa “dura” educação urbana por aqui, como eu poderia ser feliz no resto do mundo metropolitano que eu adoro explorar?

Fico feliz de ver que essas poderosos centros urbanos por onde eu passo algumas vezes – Nova York, Londres, Istambul, Buenos Aires –, e Rio, Salvador e São Paulo, com uma frequência ainda maior, não param de me inspirar. Do alto dos meus 47 anos, vejo com entusiasmo novos atores, músicos, escritores, arquitetos, dançarinos, jornalistas, modelos, designers – seja o que for –, que fazem questão de passar pela cidade para mostrar o seu trabalho. E, como acrescentou bem Silvio de Abreu, no nosso papo que inspirou este post, não basta “passar” – tem que mostrar que é bom, tem que chamar a atenção da cidade, tem que fazer barulho entre seus habitantes, tem que ter um efeito transformador!

Afinal, as cidades precisam de gente assim, tanto quanto gente assim precisa delas. Que venham mais e mais!

Se Stefhany pode…

seg, 17/05/10
por Zeca Camargo |
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bad_romance_video_zecaChame de uma coincidência… Mas há  praticamente um ano, eu escrevia pela primeira vez sobre Lady Gaga aqui neste espaço. Ou melhor, pela primeira vez eu fazia uma referência a Lady Gaga aqui no blog – já que o post tinha apenas uma foto desse “monstro pop”!

Na mesma época – apenas algumas semanas antes –, eu falava aqui, também pela primeira vez, de Stefhany, a “sensacional” artista (as aspas são opcionais!) piauiense que acreditou no seu talento e foi buscar um espaço na internet. E dali, conquistou o mundo!

Quis o destino que, por uma coincidência – sempre o acaso! –, eu recebesse, um ano depois desses comentários, um link do youtube que me fez lembrar de ambos. Não que seja uma novidade… Meras 3.216.700 pessoas já haviam visto isso antes de mim – uma quantidade impressionante de acessos, se você considerar que ele foi postado há menos de um mês. Mas para mim era novo – e fiquei encantado!

A conexão deste vídeo com Lady Gaga é óbvia: um coral masculino chamado On the Rocks (da Universidade de Oregon, nos Estados Unidos) faz uma versão impagável de “Bad romance” – em “a capella”, ou seja, só com vocais. E é sensacional! Só o arranjo já é divertidíssimo, mas como se isso não bastasse, os caras (nenhum deles com o tipo físico que poderíamos identificar como o de um bailarino profissional) desenvolvem uma coreografia que é um excelente pastiche daquela que vemos no clipe oficial da música – tudo com um figurino não mais elaborado do que as roupas do dia-a-dia que eles usam para ir às aulas. Repito, é sensacional.

Mas vamos explorar agora a conexão com Stefhany, que são um pouco mais sutis… As intenções artísticas não são exatamente as mesmas – é claro. Enquanto o On the Rocks faz o que a gente pode chamar de homenagem debochada – algo que, tenho certeza, deixou a própria Lady Gaga bem contente –, a versão de Stefhany para a música de Vanessa Carlton, “A thousand miles”, tinha a honestidade de quem estava se lançando para o estrelato – ainda que por vias duvidosas.

Nos dois vídeos, a admiração pelos artistas que inspiraram aquelas performances é nítida. Mas enquanto o coral da Universidade de Oregon usa Lady Gaga como gancho para mostrar sua versatilidade e humor, Stefhany encara o “hit” de Carlton como referência artística, e parte dela para lançar a sua plataforma como “performer”.

Então pergunto: será que uma manifestação é menos válida que a outra?

Quando eu escrevi sobre Stephany, em abril do ano passado, a desconfiança de boa parte das pessoas que leram era tão grande, que não faltaram comentários insinuando que eu estava usando o vídeo da cantora para disfarçadamente humilhá-la, criticá-la, e diminuir seu trabalho – quando minhas intenções, dentro da minha fé no universo pop, tinham o objetivo exatamente oposto: elogiar sua iniciativa (teve gente que chegou até a insinuar que eu estava usando a Stefhany como desculpa para falar mal de toda a cultura do Piauí – mas eu divago… ou será que eles divagavam?).

Achei legal mesmo – e ao longo dos últimos 12 meses, acompanhei a sua ascensão… meteórica. Não tenho lido muito sobre os planos de Stefhany para 2011, mas só posso torcer para que ela continue a sonhar em ser, cada vez mais, uma estrela pop. Só lamento, talvez, que à medida em que ela fica cada vez mais famosa, ela abandone o aspecto, digamos, tosco daqueles primeiros videoclipes e passe a ficar cada vez menos, hum, autêntica!

Porque se tem uma coisa que me fisgou logo nas primeiras vezes que vi seus vídeos – especialmente “Amor meu” e “O que passou, passou” – foi a sua cândida “vontade de acertar”, de mostrar seu trabalho na mesma linguagem das “grandes estrelas”, mas com o que podemos chamar de “os recursos disponíveis”…

A coreografia do On the Rocks para “Bad romance” tem uma “tosqueira” equivalente à que vemos no “corpo de baile” de Stefhany – e acho que por isso que eu acabei ligando as duas coisas. Fiquei tentando entender porque tinha gostado tanto da tal versão “a capella” da música de Gaga e, num pensamento livre acabei fazendo essa associação de idéias. Como sugeri no título, se Stefhany pode, por que não os rapazes do On the Rocks? Por que eu tenho a sensação de que muita gente que acha “ridículo” o que Stefhany faz, acha “super cool” o que o On the Rocks fez? Quem disse que o Oregon é mais descolado que o Piauí? Por que simplesmente não abraçar tudo de bom e belo que o pop sempre tem para nos oferecer?

Quantas questões “profundas”, não? Mas não se preocupe, pois hoje não vou muito mais adiante com essa discussão. Na verdade, nem pensava em escrever muito quando comecei hoje – e, veja só, já estamos aqui… De qualquer maneira, vale explicar que fiz este post mais para lembrar a você – e a mim mesmo – de que este espaço não é tão “cabeça” como as nossas discussões recentes talvez pudessem sugerir… (o que não significa que não fiquei lisonjeado com a seriedade de alguns comentários que foram mandados sobre a questão da nudez). Tem horas que é bom falar bobagem. Ou melhor, tem horas que é preciso falar bobagem!

Até para a gente poder retomar a conversa séria da próxima vez…

Eu entro

qui, 13/05/10
por Zeca Camargo |
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Vamos começar com essas duas imagens acima. Provocantes? Elas são de um conhecido fotógrafo americano, Duane Michals, que começou a aparecer no circuito artístico nova-iorquino em meados dos anos 60. Suas sequências de fotos, com legendas que sugeriam uma narrativa (muitas vezes onírica), tornaram-se uma espécie de marca registrada – copiada indiscriminadamente até hoje…

Esses dois trabalhos que abrem o post são dos anos 80, mas têm a ver com os temas que o fotógrafo explora desde o início de sua carreira: o desejo – e nossa relação (nem sempre transparente, nem sempre feliz) com ele. Nesses trabalhos, Michals não poderia ser mais direto: eles se chamam “A parte mais bonita do corpo da mulher” e “A parte mais bonita do corpo do homem” – isso, claro, segundo o artista. “Nos sonhos mais antigos dos homens, os seios das mulheres persistem mesmo por muito tempo depois que seus desejos tornaram-se poeira”, escreve ele, em sua caligrafia claudicante, sobre o detalhe do corpo feminino. Sobre a cintura masculina, ele ressalta suas “curvas gêmeas delineadoras, femininas em sua graça, ‘sulcando’ o tronco, guiando os olhos para baixo, rumo sua intersecção – o ponto do prazer”.

Você consegue dar definições mais inspiradas – dessas ou de outras partes do corpo humano (quem sabe onde você esconde seu desejo é você!), feminino ou masculino? Eu gostaria de ler…

Essas imagens me inspiraram por décadas (conheci o trabalho de Michals mais de perto quando morei em Nova York, em 1989), e não é à toa que eu as escolhi para falar hoje sobre nudez – numa continuação do assunto que propus no post anterior (mais sobre isso, daqui a pouco). Belas como elas são, você diria que essas fotografias seriam capazes de ofender o público médio? Posso afirmar quase com certeza que seu autor não as criou com essa intenção – e eu mesmo não tenho motivo algum para achá-las ofensivas.

Porém, elas foram o pivô de um episódio bastante pessoal, que vou relatar agora: há alguns anos fui convidado a preencher um espaço visual de um restaurante em São Paulo. É uma espécie de vitrine rotativa, onde frequentadores do local e artistas (no seu mais amplo significado, de designers a poetas), há anos, expõem suas idéias. Eis que um dia, fui eu então convidado a ocupar aquele espaço (enquanto frequentador, claro, não como artista…). Eu teria, teoricamente, a liberdade de apresentar qualquer idéia – e então me ocorreu que eu poderia fazer uma singela (insignificante, na verdade) homenagem às fotos do artista que tanto prazer me deu. Propus fotografar as mesmas partes do corpo masculino e feminino eleitas por Michals como as mais bonitas – mas os modelos seriam os garçons e garçonetes do próprio restaurante (famoso, entre outras coisas, por selecionar para o trabalho de servir as mesas o melhor da juventude que está querendo fazer um dinheiro enquanto termina a faculdade e/ou espera uma chance de montar um espetáculo).

Eles não seriam identificados – talvez apenas por seus namorados ou namoradas -, uma vez que as fotos originais não mostram os rostos, e eu pretendia seguir à risca esse modelo (inclusive no branco e preto). E com um “staff” de cerca de 20/30 pessoas, o anonimato estaria quase garantido. A resposta do restaurante: a idéia era ousada demais e poderia incomodar os clientes. Fiquei meio decepcionado com essa resposta – especialmente porque ela vinha de um lugar que se orgulha até hoje de servir hambúrgueres e outros quitutes para a fina flor da vanguarda artística… (não me sinto, nem de longe, um “artista de vanguarda”, mas você entendeu a decepção, não?).

Agradeci o convite, claro. Acabei não fazendo nenhuma instalação. E fiquei pensando… Já em pleno século 21, o que será que incomoda tanto as pessoas quando o corpo humano nu está em questão? De vez em quando – se vejo um trabalho de arte poderoso – essa inquietação volta à tona. E foi justamente a propósito da retrospectiva da artista performática Marina Abramovic, no Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), que decidi convidar você para essa discussão. Nascida na extinta Iugoslávia, mas radicada nos Estados Unidos, Abramovic ficou conhecida por suas performances onde, desde o início dos anos 70, ela explora “os limites do corpo”.

Falar que uma artista envolvida com performances “explora os limites do corpo” é quase um pleonasmo (por isso as aspas na expressão). Mas no caso de Abramovic essa descrição é bem precisa. Se você visitou a última Bienal de São Paulo, talvez tenha esbarrado com uma série de vídeos de trabalhos antigos seus – e tenha ficado fascinado (como eu fiquei). Se não cinhece nada do seu trabalho, o youtube está aí para isso mesmo… Mas nessa exibição do MoMA – que termina no dia 31 deste mês e, ao que tudo indica, eu não vou conseguir visitar – a idéia foi não apenas mostrar vídeos, mas remontar um conjunto de suas performances mais importantes – com outros artistas/modelos -, e acrescentar mais um trabalho inédito.

Sua performance criada especialmente para a ocasião chama-se “The artist is present” (“A artista está presente”), e trata-se, tão somente, da figura da própria Marina Abramovic sentada numa cadeira olhando para quem quiser sentar-se na cadeira vazia em frente dela (se você quiser acompanhar ao vivo essa perfomance, o MoMA tem um link direto nas horas em que o museu está aberto). Só isso. Durante todos os dias da exposição.

Para este trabalho, a artista está  vestida… Mas o nu, que sempre esteve presente em suas performances passadas, está espalhado por várias peças da retrospectiva, causando diferentes níveis de desconforto e constrangimento nos visitantes. E talvez nenhuma delas incomode tanto quanto a que eu descrevi no meu último post, onde um homem e uma mulher nus ficam (quase) imóveis no meio de uma passagem, obrigando a quem quiser atravessar de uma sala para outra a esbarrar (quando não roçar) em um deles – possivelmente nos dois.

Foi engraçado ver algumas resposta enviadas à minha inocente pergunta “você entraria na sala?”. “Que graça teria a vida se a gente não aproveitasse as coisas diferentes”, escreveu a Magaly (que entraria). “Talvez entrasse engatinhando porque entre as pernas dos dois tem um espaço maior”, mandou Cesar Marx. “Não entro na sala não, fico no espaço estreito – se o casal for mais bonito que o da foto”, sugeriu espertamente o Caio. “Um pouco constrangida, sim, mas acho que passaria… Corpos nus na entrada?? Imagina o que terá lá dentro”, provoca Cynthia. “Arte?! Oh, claro… Não, muito obrigado”, ironizou o Márcio. A Yumi não entraria: “Não que eu ache feio e que não seja normal, mas é que me incomoda muito esse tipo de situação”. “Sem pestanejar, eu entraria, claro, esfregando-me no nu feminino”, arriscou o Bruno Silva, esquecendo-se talvez que o outro lado do seu corpo estaria “se esfregando” no nu masculino…

O fato é que ninguém ficou indiferente à idéia proposta – e posso ter quase certeza de que mesmo quem não mandou um comentário, mas leu o post, pensou no assunto… O mérito dessa provocação não é meu, claro, é da artista – que é genial! E que mérito é esse? O de nos fazer sentir provocados por uma coisa que parecia já conquistada: o nu. (Como observou bem Eva Pfannes, que “matou a charada” que eu propus logo no primeiro comentário”). Por que essa reação, se como eu já coloquei anteriormente – e vários comentários reforçaram – um corpo nu está longe de ser novidade? E não só nas artes plásticas? O nu não é novidade nem no nosso cotidiano – você mesmo, aqui neste espaço “livre” conhecido como internet, nunca caiu na tentação de conferir uma página de pornografia? Mais de uma talvez? Quem sabe ontem à noite… Mesmo assim, é pensar no assunto e sentir um frisson…

Sei que falar de pornografia é  um caminho fácil – até porque, é a forma mais hipócrita (e menos poética) de apreciação do corpo humano. (Com isso, claro, não estou pregando um discurso moralista em defesa do pudor, mas sim despindo, com o perdão do trocadilho, essa forma de erotismo de qualquer pretensão artística…). Mas como medir a honestidade de quem ainda tem receio de aceitar um desafio como esse proposto por Abramovic, mas não tem barreira alguma quando a idéia é se esbaldar num imaginário sexual virtual?

São coisas diferentes, claro… Mas a, digamos, matéria-prima é a mesma: um corpo nu. E nós temos sim um problema com isso. A começar pela referência ao nosso próprio corpo… Mas antes que isso vire uma discussão barata freudiana, quero só concluir dizendo que eu me divirto com essas provocações. Ainda mais neste país – este nosso país! – onde, desde o descobrimento, temos dificuldade em ocultar as carnes… Na exuberância dos trópicos, aprendemos a admirar corpos nus (ou seminus) – e a nos aproveitar deles. Tenho um prazer especial em, quando eu viajo a outro país, me apresentar como brasileiro e receber e receber aquele olhar de quem quer dizer: “ah, daquele lugar onde todo mundo anda pelado…”. E – talvez até, admito, por causa do meu passado ligado à dança – não tenho a menor dificuldade nem de encarar nem de exaltar (e eventualmente experimentar) um corpo nu. Ele deve sempre ser celebrado!

Mas admito que essa é uma relação complicada para muitas pessoas. O que não significa que a gente não possa se divertir discutindo isso por aqui…

Uma questão palpitante (em mais de um sentido)

seg, 10/05/10
por Zeca Camargo |
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abramovicVocê está visitando uma exposição de arte. Uma retrospectiva de uma artista importante. Distribuídos em algumas salas, alguns corpos nus – não pintados em telas, ou representados em bronze, mas em carne e osso (e vivos). Você já está acostumado com isso, afinal, que novidade tem um nu hoje em dia, especialmente num museu – especialmente numa mostra de arte contemporânea? Aliás, de maneira geral, que novidade tem um nu nos dias de hoje? Mas eu divago…

Você prossegue com sua visita pelo museu, e então percebe que, para entrar uma determinada sala, você é obrigado a passar por uma porta onde estão – um de cada lado – um homem e uma mulher. Nus. O espaço entre eles é estreito. Muito estreito. Se você quiser ir em frente, vai ser obrigado (ou obrigada) a encostar em um deles – possivelmente nos dois. Mais que encostar: você teria que roçar naquelas figuras – que, só lembrando, estão nuas. E vivas.

Você entra na sala?

O retorno à forma antiga

qui, 06/05/10
por Zeca Camargo |
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austerhornby450 Em meados de 1992, eu ia embarcar para Nova York para aproveitar uns dias de folga e, como sempre, coloquei um livro para ler no trajeto, na sempre possível hipótese de uma insônia. Quando cheguei ao aeroporto, recebi a desagradável notícia de que o meu voo estava com “overbook” – ou seja, venderam mais passagens do que os assentos disponíveis. Mas a notícia acabou não sendo tão desagradável assim: naquele tempo, as companhias aéreas ainda não cobravam para usar o banheiro, e eventualmente até davam dinheiro para minimizar o desconforto de ter sua viagem adiada… Assim, por algumas centenas de dólares, aceitei voar no dia seguinte (com embarque garantido!) e voltei para a casa – com meu livro, claro, na bagagem de mão.

Como era tarde da noite quando adentrei o apartamento onde eu morava, nem liguei para ninguém para contar do meu infortúnio – deixei para o dia seguinte. E comecei a ler o tal livro que eu havia separado. E fui lendo… Só na alta madrugada, deixei o sono me vencer – e mesmo assim, relutante. A história que se desenrolava diante dos meus olhos era tão fascinante e hipnótica, que eu não queria parar… E no dia seguinte, no momento em que acordei, retomei a leitura e simplesmente não contei para ninguém que ainda estava no Brasil (emails e mensagens de texto ainda não faziam parte do nosso cotidiano, entenda bem, e todo mundo achava que eu já estava aproveitando Nova York naquela altura). O livro tornou-se a coisa mais importante da minha vida naquelas horas – a ponto de eu nem abrir as janelas do meu apartamento para quem passasse pela minha casa ter a chance de achar que eu ainda estava lá.

Terminei de ler logo no início da tarde e, ainda sem falar com ninguém, retomei alguns trechos que havia gostado mais. E li toda a parte final pela segunda vez, até que chegasse a hora de eu ir novamente ao aeroporto e embarcar então para Nova York. E, por segurança, com o mesmo volume que eu acabara de ler (e reler) na mão. O nome do livro: “Leviatã”, de Paul Auster.

Eu só havia lido seu livro imediatamente anterior, “A música do acaso” – e tinha gostado tanto que adotei parte de sua filosofia como minha também (e quem vem aqui assiduamente pode comprovar que eu trato o acaso quase como uma religião). Só por isso, já era seu fã. Mas “Leviatã” levou minha devoção a um outro patamar. Sem me alongar muito – esse não é meu assunto principal hoje, acredite – a trama trata de uma investigação sobre um homem que explodiu com uma bomba no interior dos Estados Unidos. Mas, como todos os livros de Auster, isso é apenas uma desculpa… O que ele quer mesmo é contar a trajetória de dois escritores – e uma fotógrafa (inspirada, como depois eu vim saber, na artista francesa Sophie Calle, que se você esteve ligado, fez uma exposição genial no Brasil no ano passado). E que história!

Entusiasmado com “Leviatã” (que recomendo e desejo sorte para quem se interessar em lê-lo, pois está meio sumido das prateleiras – a última edição é de 2001, pela Companhia das Letras), fui atrás de trabalhos anteriores (como a “Trilogia de Nova York”), e passei a esperar ansiosamente por qualquer novo lançamento seu. O livro seguinte, “Mr. Vertigo”, também foi um delírio. Mas com o subsequente, “Timbuktu”, comecei a sentir que algo estava faltando nas narrativas de Auster. Essa desconfiança só foi piorando a cada novo trabalho. Eu lia todos, religiosamente, mas cada vez menos animado – quando ele lançou “Desvarios no Brooklyn” (sempre pela Companhia das Letras), eu achei que ia retomar o velho entusiasmo, mas o livro como um todo não me preencheu…

Assim, foi quase que por inércia que eu comprei, no início deste ano, durante uma viagem, seu mais novo título ainda em inglês – que agora sai traduzido no Brasil: “Invisível” (Companhia das Letras também). Comecei a folheá-lo quase por obrigação – mas a curiosa cena que abre o livro logo me fisgou: no final dos anos 60, numa festa de estudantes da Universidade de Columbia, em Nova York, um jovem (Adam Walker) é seduzido por uma estranha conversa de um ainda mais estranho casal francês (pelo menos uma década mais velho que ele). Encantado pela inteligência do homem e a beleza da mulher, os dois não saem da sua cabeça. E para somar a esse encantamento, o francês, alguns dias depois, oferece a Walker dinheiro para que ele publique uma revista literária. É muita notícia boa para ele acreditar – tinha de haver alguma coisa estranha por trás daquilo tudo. E claro que havia.

Aos poucos, numa narrativa praticamente impossível de abandonar, Walker vai desvendando o mistério da maneira mais inesperada possível – as figuras do casal francês vão se tornando cada vez mais sombrias, e as consequências dos seus atos, cada vez mais trágicas. Até que eles somem – e Walker vai atrás deles em Paris… Está gostado da história? Pois essa não é a única trama do livro. Sabemos de tudo isso porque o próprio Walker escreveu para um antigo colega de Columbia – hoje um consagrado escritor -, que é o narrador de “Invisível”, e resolveu contar tudo… antes que o câncer acabe com sua vida!

Confuso? Sim – ainda bem! Tudo vira, enfim, uma história de escritores – num curioso paralelo com o próprio “Leviatã”. Mas o quão verdadeira é essa história? A partir da metade do livro, tudo que você foi construindo na sua imaginação de leitor começa a desmoronar. Num misto de decepção e raiva, você é tentado a continuar a leitura – aliás, felizmente, pois as recompensas são muitas! Tantas que me fez lembrar porque eu gostei tanto de Auster pela primeira vez: por sua capacidade única de fazer, de histórias improváveis, narrativas plausíveis, demonstrando assim que somos, ainda que recusemos reconhecer isso, indefesas vítimas do acaso…

Nem preciso descrever o prazer de ver um autor que você sempre gostou tanto, mas que andava meio caído, voltar à forma antiga – preciso? Passei a recomendar “Invisível” para todos os meus amigos – e faço isso agora neste espaço. E digo mais: essa minha alegria ainda é dupla, porque um outro escritor que também já não vinha me entusiasmando nos últimos lançamentos, reaparece agora com um livro para “matar as saudades dos velhos tempos”, sem cair na armadilha de se repetir (um truque que o próprio Paul Auster executou com perfeição). Falo agora de Nick Hornby e seu último romance, “Juliet, nua e crua” (recém-lançado pela Rocco).

Eram os idos de 1995, quando eu pus os olhos em um livro que parecia ter sido escrito para mim – e só para mim! Chamava-se “Alta fidelidade”, de um autor de quem eu só ouvira falar perifericamente, por conta de um livro seu de ensaios sobre futebol – aclamado pela imprensa britânica como um clássico instantâneo sobre o tema. “Alta fidelidade” tratava de outro assunto – de música. E de um jeito que ninguém havia tratado até então.

Se você quisesse, poderia ler o livro apenas como um romance: um trintão dono de uma loja de discos – que poderia ser considerada até uma ocupação razoável ainda nos anos 90 – termina seu namoro e revisita namoradas antigas, sempre através das músicas que envolviam essas histórias (e que músicas!). Mas o livro era muito mais! O ouvido de Rob Fleming, o protagonista, era tão pop quanto o meu – e, a partir dessa identificação, eu já comecei achar que essa era uma biografia da minha vida não vivida… Nunca havia trabalhado numa loja de discos – especialmente numa em que o dono se recusava a vender um disco (e estamos falando, claro, de vinil), se ele não achasse que o comprador fosse mesmo um admirador daquele artista -, mas sempre sonhei ter esse emprego na minha juventude. Não tinha ainda um currículo amoroso tão grande quanto o de Rob, mas certamente já havia gasto o mesmo tempo que ele – ou talvez até mais – para gravar a fita cassete (procure o significado dessa expressão aqui na internet ou pergunte ao seu pai!) perfeita que desmancharia a resistência de qualquer coração…

(Até ler “Alta fidelidade” eu achava que só eu dedicava tanta energia a essa tarefa, que sempre era muito mais importante para mim do que para quem recebia as fitas que eu gravava – e posteriormente os CDs. Mas Hornby me fez ver que eu não estava sozinho nessa minha obsessão, que, pelo contrário, havia uma legião de maníacos por música que tinham o mesmo comportamento que eu. E, no lugar de me sentir “roubado” da minha mania, vi-me abraçado numa bizarra comunidade de “caçadores do pop perfeito” – da qual me orgulho de pertencer até hoje!).

Enfim, espalhados pelo livro, encontrei vários traços de Rob que também eram meus – e adotei “Alta fidelidade” como uma bíblia! Naturalmente, passei a ler tudo que Hornby escreveria dali em diante. Mas seguindo a mesma “lei das recompensas decrescentes” que regeu minha relação com Paul Auster, fui gostando cada vez menos do que ele escrevia. Tolerei “Um grande garoto” (que, assim como “Alta fidelidade”, recebeu uma interessante adaptação para o cinema), seu romance seguinte. Mas dali em diante foi só decepção… (em nome da transparência, devo dizer que nem toquei em “Slam”, sua novela “adolescente”, de 2008).

Mas no início deste ano comecei a me animar novamente com o imaginário de Hornby – e a porta de (re)entrada foi ironicamente um filme, “Educação”, já comentado aqui, cujo roteiro é de sua autoria. E há poucos dias esse “reatamento” foi selado quando li “Juliet, nua e crua”. Para mim, que via nele uma espécie de guru da mistura entre literatura e música pop, ali estava “o grande retorno”. Todas aquelas idiossincrasias de quem venera o pop e constrói mitologias inteiras em cima de um artista de rock (ou uma banda) estão lá. Aliás, a trama inteira é em cima disso… Viva!

Rapidamente – e sem tirar seu prazer de ler “Juliet, nua e crua” -, o livro começa com um casal de uma cidade do interior da Inglaterra numa espécie de peregrinação pelos Estados Unidos em busca de lugares por onde passou o grande roqueiro Tucker Crowe, que teve uma carreira respeitada entre meados dos anos 70 e 80, antes de abandonar misteriosamente a vida artística, e desaparecer por completo do radar. Não conhece Tucker Crowe? Nunca ouviu o seu clássico álbum “Juliet”? Não se preocupe… ele é um artistas fictício, criado por Hornby. Mas os detalhes de sua biografia bem que poderiam ser tirados da vida real…

Depois de anos de silêncio, alguém descobre uma fita “demo” com as gravações originais de “Juliet” e decide lançá-la como um CD, sob o nome de “Juliet, nua e crua”. As implicações desse “ressurgimento” vão afetar não só a vida do casal que conhecemos logo no início (Annie e Duncan), mas também a do próprio Crowe – que está bem vivo, e agitando…

O que é uma verdadeira delícia nesse retorno de Hornby também à forma antiga, é ver como ele adaptou sua história às novas regras do universo da música, sem perder as manias de um velho fã de música. Por exemplo, sua descrição do que pode estar acontecendo no “cyberespaço” enquanto seu computador procura informações sobre um CD que ele acaba de inserir é constrangedoramente hilária – especialmente para esse que voz escreve, e que já teve pensamentos similares cruzando a cabeça… E mais: o artista em questão tem página na wikipédia – no livro, mas não (ainda) na vida real -, e os “religiosos” que seguem cada pista sobre o paradeiro de Crowe têm discussões acaloradas em fóruns e sites de relacionamentos na internet.

Não estamos mais no território da Championship Vynil – a loja de Rob em “Alta fidelidade”. Mas navegamos sim na mesma frequência que um dia o próprio Hornby nos apresentou: aquela onde todas as histórias, e nossa própria vida, giram em torno de perfeitas canções pop.

E é lá que eu quero viver para sempre. Aliás, como diria Elvis Costello numa de suas pequenas obras-primas esquecidas, “Every day I write the book”…

O que esperar quando você está esperando (2010)

seg, 03/05/10
por Zeca Camargo |
categoria Todas

Vá ver o novo filme de Woody Allen, “Tudo pode dar certo”. Leitores de longa data deste blog já sabem que eu não preciso de muitos motivos para recomendar um trabalho desse diretor. Já cheguei até a comentar brevemente sobre “Tudo”, depois de tê-lo assistido numa ridícula tela de avião, a propósito de uma crônica confusão sentimental. E agora, com sua estreia tardia nos cinemas nacionais, reforço minha recomendação – pelos motivos de sempre, e por um inesperado.

Primeiro, “os motivos de sempre”. Como já havia colocado, Allen faz mais uma inspirada ode ao acaso – essa força estranha que comanda todos nós (e que eu adoto como uma espécie de religião). E apostando na imprevisibilidade das nossas escolhas (afetivas, sobretudo), o diretor nos ensina mais uma vez a não nos preocuparmos demais com as consequências que elas podem trazer. Afinal, como diz o título, tudo pode dar certo – eu acredito piamente nisso, tanto que para pegar o nome original do filme emprestado (“Whatever works”), um dos meus slogans pessoais favoritos é “whatever x 2”!

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Não é, como demonstra Larry David nas telas – o ator da vez escolhido para encarnar o próprio Woody Allen –, uma questão de adotar um otimismo tolo. Acreditar que as coisas sempre vão se desenrolar no final não tem a ver com uma fé cega, mas com algo que talvez seja bem o oposto disso: significa relaxar. Como seres humanos, estamos fadados a sofrer, nos arrepender, admitir que erramos, desejar que não tivéssemos feitos determinadas escolhas… Mas no fim, como diria o Coldplay, “viva la vida!” – ou, melhor ainda, adaptando as palavras de Ricky Martin, “viva la vida loca!”. Tudo se resolve!

Estou resistindo aqui a contar alguns detalhes do filme, pois prefiro que você se delicie com cada um deles no próprio cinema. Vou apenas chamar sua atenção para o trabalho de uma atriz que, ao lado de David, enche o filme de graça: Patricia Clarkson, que faz o papel de Marietta, a mãe da incrivelmente jovem namorada do sessentão Boris (David), Melody (Evan Rachel Wood). Ela não só tem a trajetória mais improvável da trama (imagine uma cinquentona que sai do interior dos Estados Unidos para recuperar a filha que está nas mãos de um cara bem mais velho, e acaba como musa dos artistas de Manhattan, além de pivô de um curioso “ménage à trois”!), mas é também a personagem mais viva em cena – eu veria o filme mais uma vez só para conferir de novo suas aparições…

Mas isso tudo é exatamente o que eu espero de um filme de Woddy Allen. Como disse há pouco, insisto ainda para que você vá ver “Tudo pode dar certo” logo também por um motivo inesperado. É que daqui a algumas semanas, os cinemas vão receber uma sucessão de estreias da temporada hollywoodiana de verão (americano). E, como sempre nessa época do ano, o que a gente pode esperar não é exatamente entretenimento de qualidade… Isto é: a leva de filmes lançadas agora nos Estados Unidos não é famosa por sua “elaboração dramática”…

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Nos chamados “filmes de verão”, o que se espera é uma diversão “descomplicada” – uma coleção de filmes de ação, sequências de “franchise” de super-heróis, despretensiosas comédias românticas, ou colagens de humor escrachado. Mas será que é só isso mesmo? Será que “Tudo pode dar certo” é nossa última esperança de bons filmes até o Natal?

Na expectativa por esses filmes que estão chegando, resolvi repetir hoje o mesmo exercício que fiz neste espaço em 2008: assistir a trailers das “grandes promessas” cinematográficas da temporada e ajudar você – e, quem sabe, a mim mesmo – a escolher melhor com o que gastar seu rico dinheiro na compra de um cada vez mais caro ingresso para uma sessão (e não estou nem falando do trocado extra cobrado para ver filmes em 3-D, que não tinham a menor necessidade de ser em 3-D – tipo…  “Alice no país das maravilhas”).

Assim, aqui vai uma coleção de resenhas dos trailers das estreias vindouras – todos disponíveis aqui mesmo na internet (lembrando que a ordem dos filmes aqui não é de preferência, mas aleatória). Espero que você se divirta – agora, e depois!

“Sex & the city 2” – você achou que não ia ter continuação? Tolinho, tolinha… O sucesso de Sarah Jessica Parker tinha tudo para se tornar uma mina de ouro nas bilheterias – e foi. A “parte 2” era inevitável. E com tudo em cima. As “meninas” agora driblam a chatice da fase pós-lua-de-mel viajando juntas para… Abu Dabi! Você provavelmente já conhece todas as piadas (ou, no mínimo pode prevê-las!), mas e daí? Novidade talvez só um número musical com Liza Minelli – e olha lá… Mas que há de resistir? Veredicto: compre o ingresso!

“Robin Hood” – fui só eu que tive a impressão de ter visto esse filme antes? Ridley Scott dirigindo… Russel Crowe no papel de um “justiceiro alternativo”… Várias cenas de batalha em câmera lenta… Uns séculos mais, outros menos, essa é sim a mesma história de “Gladiador”! E considerando que a minha geração já teve um filme razoável sobre aquele que roubava dos ricos para dar para os pobres (em 1991, com Kevin Costner no papel principal), nada me anima para ver essa nova versão. Veredicto: espere pelo DVD.

“Encontro explosivo” – estou aqui brigando comigo mesmo pelo fato de admitir que vou ter que recomendar um filme com Tom Cruise! Mas, baseado no que vi do trailer, esse é bom! Numa lanchonete bem americana, Cameron conta a um amigo (namorado?) a incrível história de seu envolvimento com um possível agente secreto (Cruise), depois de um espetacular acidente aéreo. Improvável? Sim. Tentador? Pode apostar! Veredicto: compre o ingresso!

“Salt” – Angelina Jolie como uma possível espiã russa que trabalha para o governo americano e está por trás de um plano para assassinar o presidente americano? Bem, se você adorou “Lara Croft” pode ser que você goste da idéia de ver Jolie como “heroína de ação” (tudo bem, as sequências de ação não são tão gratuitas como as de “Lara”, e a trama parece ser menos ingênua, mas você percebe o que eu quero dizer, não percebe?). Mas esse filme não é para mim. Veredicto: um dia ainda vai passar na TV…

“The kids are all right” – eu vejo qualquer coisa com Juliane Moore. E eu vejo qualquer coisa com Annette Bening. Logo, eu vejo qualquer coisa com as duas juntas – ainda mais quando “juntas” quer dizer “casadas”. Sucesso já no circuito de festivais alternativos, o filme conta a história de um casal de lésbicas com dois filhos (frutos de inseminações artificiais) que resolvem descobrir quem foi o doador de esperma escolhido por suas mães. A premissa já é fantástica – e o desenvolvimento dela, pelo que dá para ver no trailer, é ainda melhor. Veredicto: compre o ingresso!

“Comer, rezar, amar” – Julia Roberts. Precisa dizer mais alguma coisa? Bem… precisa! Adaptado de um livro que é “best seller” mundial (escrito por Elizabeth Gilbert), essa é a história de uma mulher de uns 40 anos que resolve tirar um ano para “fazer o que ela quiser” – largar sua vida convencional para trás e mergulhar de cabeça no desconhecido. “Eu tinha aquele apetite pela vida e isso foi embora”, declara a personagem de Roberts a certa altura. Isso para mim é mais que inspirador, mas, de alguma maneira acho que não “conectei”… Dever ser um sucesso (e devo aplaudir ainda a escolha da sensacional “Dog days are over”, da Florence and the Machine, como tema sonoro), mas meu veredicto é: espere pelo DVD.

“Toy story 3” – se você viu “Alice” nos cinemas, certamente viu esse trailer. E certamente também percebeu a diferença entre um filme que foi todo pensado em 3 dimensões, e um que foi apenas “adaptado” pela assustadoramente perigosa nova mania de Hollywood… “Toy story 3”, claro, está na primeira categoria – mas mesmo que eles resolvessem lançar em apenas duas dimensões, eu estaria na fila para assistir à estreia! Fora a oportunidade de rever alguns dos personagens mais inventivos que a computação gráfica da Pixar  já criou (Woody, Buzz Lightyear) vem aí um Ken impagável (“Eu não sou um brinquedo de menina!”, grita ele desesperado no trailer), e uma Barbie que promete mudar a imagem da boneca que por gerações foi um exemplo de boa moça… Veredicto: compre o ingresso!

“Shrek 4” – por falar em animação… Dizem que esse é o último filme da série, mas quantos eles decidirem fazer com Shrek como personagem principal, quantos eu vou ver na primeira fileira. A premissa é hilária – Shrek vai para um “mundo paralelo”, onde Fiona é uma criminosa foragida, o Burro não o reconhece, e o Gato de Botas (Puss!) está gordo e preguiçoso – e as piadas parecem (pelo menos pelo trailer) frescas. Veredicto: compre o ingresso!

“O último mestre do ar” – a última vez que o diretor M. Night Shyamalan resolveu dar uma guinada no seu estilo (com o terrível “A dama na água”) foi um desastre. Agora, no lugar de vir com mais um mistério de final mirabolante, ele se arrisca a contar uma história fantástica – que tem grandes chances de se tornar uma série. Por tudo que vi no trailer, porém, esse filme não me seduziu. Fiquei tentado a ver como Dev Patel se virou depois de “Quem quer ser um milionário?”, mas não o suficiente… Veredicto: um dia ainda vai passar na TV…

“Grown ups” – faz tempo que você não vê uma boa comédia com Adam Sandler? Pois vai ter que esperar mais um pouco, a julgar pelo trailer dessa sua nova investida. Cinco amigos de infância reúnem-se mais de 30 anos depois para… para ter uma desculpa para contar piadas aparentemente sem graça! O elenco de comediantes não poderia ser mais sensacional (tem até o sumido Chris Rock!), mas se o roteiro tem cenas realmente engraçadas, eles não quiseram soltar nenhuma delas no trailer. Veredicto: espere pelo DVD.

“Dinner for shmucks” – estava eu assistindo o trailer desse filme tranquilamente quando, de repente, tenho uma vontade incontrolável de rir. Tem a ver com uma piada que envolve os versos de “Imagine”, de John Lennon – e mais não conto. Dali para frente, mais algumas piadas muito engraçadas me tiraram realmente do sério – e eu fiquei salivando para ver mais. Nessa refilmagem de uma comédia francesa (“Le diner de cons”), um bando de executivos compete para ver quem leva o convidado mais imbecil para um jantar. No caso, Paul Rudd convida Steve Carrell para o evento. Veredicto: saia da minha frente que eu vou comprar esse ingresso agora!!!

“The A-team” – outro filme de ação? Melhor ser muito bom, muito diferente, muito surpreendente, se quiser fazer barulho nessa temporada. Pelo que vi no trailer, “The A-team” não é nenhuma dessas coisas. Fora uma cena incrível de um tanque que cai de paraquedas de um avião que explodiu (e um cara sai atirando de dentro do tanque em pleno ar!), nada vai me fazer sair de casa para assistir a isso… Veredicto: um dia vai passar na TV…

“Tron legacy” – quantas vezes você já viu esse trailer? Parece que ele é onipresente em todas as salas de cinema atualmente – mas isso não é exatamente uma reclamação… Gosto de ver aqueles efeitos especiais, e juntando isso com uma certa nostalgia de ter vibrado com o filme original (se você tem menos de 30 anos, certamente nem se lembra que ele existiu), eu quase fiquei com vontade de ver “Tron legacy” nos cinemas. Quase… Será que além dos efeitos existe uma história? Duvido… Veredicto: espere pelo DVD.

“Mother & child” – Mais um filme com Annette Bening. Mais um filme que me deu vontade de ver. O que parece ser uma história açucarada – mãe adolescente entrega a filha para adoção e, anos depois, quer reencontrá-la – tem tudo para ser interessante no final, sobretudo pelo elenco (que ainda inclui Naomi Watts e Samuel L. Jackson). O trailer é meio confuso, mas chamou minha atenção. Veredicto: compre o ingresso!

“The other guys” – mais uma feliz escolha para trilha sonora (vide “Comer, rezar, amar”) – dessa vez, o clássico alternativo “Been caught stealing”, do Jane’s Addiction. Mas nem isso nem a participação de Mark Wahlberg (que eu acho ótimo) me animaram muito. Uma comédia sobre dois policiais trapalhões em Nova York? Não, obrigado. Veredicto: espere pelo DVD.

“Príncipe da Pérsia” – Gostou dos filmes da “Múmia”? Então “Príncipe da Pérsia” é o filme da sua vida! Jake Gyllenhaal, no entanto, não é exatamente Brendan Fraser. E os efeitos especiais (pelo menos os que separaram para o trailer) não parecem inovar muito em cima daqueles de “A múmia”… Ah, devo mencionar que o filme é inspirado em um vídeo game? Veredicto: um dia vai passar na TV…

“A origem” – Lembra quando você assistiu a “Amnésia” pela primeira vez? Pois é… Senti uma espécie de arrepio igual àquela primeira sessão do filme de estreia de Christopher Nolan quando vi o trailer de “Inception”. Com o sucesso de “O cavaleiro das trevas”, Nolan poderia ter feito qualquer coisa (Hollywood está cheia de histórias de diretores que se deslumbraram com grandes bilheterias), mas parece que ele se segurou e vai vir com uma bela trama – e com Leonardo DiCaprio! Veredicto: compre o ingresso!

Dias interessantes pela frente – pelo menos para quem (como eu!) gosta de passar duas horas numa sala escura…



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