“Eu vou sentir saudades, mas não vou sentir falta”

qui, 24/09/09
por Zeca Camargo |
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Por que as aspas? Ora, porque a frase não é minha. Ouvi-a de um dos meus colegas daqui da equipe que há mais de dois meses está envolvida na gravação de “No limite”, no Ceará. Ele é um grande amigo que fiz por aqui (em algum lugar deste blog já disse que durante essas gravações reencontrei velhos amigos e estava aberto para fazer novos, e esse cara que disse essa frase está na segunda categoria), dono de um belo acervo de funk carioca – que embalou várias festas no já tradicional ponto de encontro “Kalango’s Bar” (sic) –, e portador de um talento fundamental para trabalhar num esquema que exige muito mais do que um “horário comercial”: um bom humor inexorável!. Balada até 5h da manhã? Tudo bem! Gravamos às 8h e lá está ele com uma cara boa, contando as últimas da noite anterior, e já perguntando qual é “a boa” daquela noite… O fato de ele namorar uma das meninas mais bacanas na equipe – que, além de ser extremamente competente organizando o site do programa (ao lado de duas novas e animadas amigas que vou chamar de Brigadeirão e Brigadeirinho!), ainda tem toda a minha simpatia por ter o dom de mandar bem no acordeão – só ajuda na simpatia… E ainda por cima ele me vem com uma frase como essa que eu usei no título de hoje…

Eu quase entrego aqui a árvore genealógica desse colega de trabalho, que revelaria que ele tem na família a “veia literária”… Mas esse “detalhe” nem é necessário. Fato é que ele soltou essa frase tentando resumir nossa experiência aqui nesses últimos dias, e eu não poderia ter definido o momento melhor…

Às vésperas de terminar essa maratona de dois meses que foi a gravação de “No limite”, esse é o sentimento. Trabalhamos muito – literalmente todos os dias! Envolvemo-nos como loucos nas artimanhas do jogo, e nos processos que (apesar das várias “teorias da conspiração” levantadas aqui mesmo na internet – que curiosamente se calaram quando a competição, por caminhos naturais, como sempre acontece, tomou um rumo diferente daquele previsto pelos pretensos “gurus” que acham que tudo sabe como um “reality show” funciona) fizeram a gente chegar até esses finalistas que disputam, no domingo, o prêmio de meio milhão de reais. Vivemos todos os dias aqui totalmente entusiasmados e envolvidos com tudo – e digo, de coração aberto, que não me arrependo de nenhum minuto gasto nesse processo!

No entanto – tenho que admitir –, estamos cansados. Eu mesmo estou tão exausto com todos os processos com os quais nos envolvemos por aqui (pensa que a vida é só quebrar amuleto no “Portal”?) que mal consigo cumprir o que me propus aqui hoje: fazer um bom balanço do que isso tudo significou (aos céticos que acham que o programa que falo não faz parte de um universo de “cultura pop” e, por isso, não se encaixa bem no espaço deste blog, sugiro que façam uma releitura de todos os textos deste espaço – que agora comemora três anos, data esta que será marcada com deferência em post vindouro! – e conclua, afinal, que aqui cabe sim tudo!).

Esse balanço deve ficar para quinta-feira da semana que vem, dia 1º de outubro. Na segunda, vou tirar uma “folga” – se você me permite… Vivemos, insisto, experiências deliciosas e riquíssimas por aqui. Vamos voltar com uma bagagem (e, por favor, leia essa palavra sem a pretensão que nela sempre vem embutida – e sem trocadilhos!) poderosa, diversificada e riquíssima de tudo que aconteceu aqui. Mas, nessa correria, não me sinto apto a traduzir isso tudo em palavras – pelo menos não por enquanto. Estou… frouxo!

Daqui a uma semana, então, prometo um balanço – que pode inclusive ser incrementado com as opiniões sobre essa reta final do programa que você mandar esses dias como um bem-vindo comentário! Mas, por agora, deixe-me justificar a frase do meu novo (e animado) amigo que, independente de quantas horas dormiu na noitada, sempre está lá animado para cuidar do meu áudio.

“Vou sentir saudades, mas não vou sentir falta”! Quanta sabedoria…

E para deixar tudo um pouco mais interessante, será que você é capaz de dizer onde eu estou nesta foto abaixo? Não se trata de questão apenas de espaço, mas também de tempo… Até quinta que vem!

Jovens

seg, 21/09/09
por Zeca Camargo |
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Uma das boas coisas de não ser mais jovem – e acredite, elas existem – é poder olhar justamente para essa, digamos, faixa etária (ou seria um estado de espírito?) e ver onde foi que você errou. Ou acertou… Empurrados na “marcha inexorável do tempo” (drama!), a tendência do ser humano que já não faz parte desse, hum, grupo, é geralmente ou desistir de entender o que passa pela cabeça dos ditos cujos ou ignorar qualquer que seja uma manifestação vinda deles, com uma desculpa hipócrita na linha “no meu tempo (o de quem já não é tão mais jovem assim) eu me divertia mais”…

Felizmente, há um terceiro grupo (bem menor) que se preocupa em decifrar os sempre mutantes códigos desses que estão entre 13 (às vezes 12!) e 19/20 anos de idade – e não só com objetivos acadêmicos (já parou para dar um Google na quantidade de teses e trabalhos sobre o assunto “adolescência”?), ou terapêuticos (um belo filão desde o tempo em que eu mesmo tive de passar por isso – e até antes… bem antes!). Tem quem olhe para esse pessoal como gente que gosta de se divertir – e eventualmente até se ver representada (de preferência sem estereótipos) num bom filme de entretenimento. Foi por isso, imagino, que o diretor Peter Sollet (que é de 1976 – ou um “trintão”) fez “Nick & Norah’s infinite playlist” com tanto gosto.

Lançado nos Estados Unidos no final do ano passado, esse filme fez um certo barulho – especialmente com a crítica. Liza Schwarzbaum, por exemplo (uma das minhas favoritas, que escreve na Entertainment Weekly, deu nota A- para o filme. Diablo Cody – colunista da própria “EW” e “revelação” de Hollywood com seu roteiro de “Juno” (outro bom filme sobre jovens) – colocou “Nick & Norah” como um dos cinco eventos culturais mais interessantes de 2008. Aqui e ali recolhi boas referências – e esperei pela estreia no Brasil…

Esperei tanto que até me esqueci de conferir se tinha estreado mesmo. Até agora não tenho registro de um lançamento oficial do filme em telas brasileiras. Mas quis o destino que outro dia, numa livraria daquelas “megastores” em Fortaleza – num raro passeio para aproveitar um ainda mais raro tempo livre entre as gravções aqui de “No Limite” (sim, na “reta final”, a ser comentada aqui em breve) –, eu encontrei na sessão de DVDs o título “Nick & Norah: uma noite de amor e música” (uma quase boa adaptação do nome original do filme que eu tanto esperei). Comprei na mesma hora – e conferi há alguns dias. Fiquei encantado.

O filme, claro, não fala diretamente comigo – do alto dos meus 46 anos, posso afirmar que foi-se o tempo em que saía madrugada adentro à procura de uma boa festa (no caso do filme, um bom show, mas já falamos sobre isso). Porém, eu já tive 18 anos e já saí noite adentro procurando alguma coisa legal para fazer (e se no meio dessa noitada rolasse algum “clima”, melhor ainda!). Em algum lugar do meu passado, o filme – sim! – falou comigo. Ainda mais porque a noite em questão se passa em Nova York, e embora eu tivesse já 26 anos quando lá morei, vivi noites em que eu achava que era pelo menos uns oito anos mais jovem, e saía a explorar aquela cidade por altas horas, sem nenhum roteiro planejado, simplesmente deixando a noite (e os amigos) me levar…

Sim, senti um pouco de saudades desse tempo – não porque eu não faço mais parte dessa faixa etária (sem falar que a Nova York de hoje é bem diferente da daquele tempo), mas porque o filme conseguiu um retrato super sincero do que é poder usufruir desse espírito de “vale tudo” que a gente tem tanto quando está perto dos 20 anos e vai perdendo, sem perceber, quando vai ficando longe deles. Ter Michael Cera no papel principal (Nick) ajuda muito – o cara é simplesmente o ator jovem mais carismático (e esquisito) atualmente em Hollywood. Mas o elenco todo é bom, inclusive os dois amigos gays de Nick (interpretados por Aaron Yoo e Rafi Gavron), a própria Norah (Kat Dennings), e sua melhor amiga Caroline (vivida por Ari Graynor, que faz a bêbada mais convincente e divertida que já vi nas telas!).

Muito pouca coisa acontece, a não ser esse bando de jovens esbarrando-se uns nos outros – todos à procura do show de uma banda “ultra super mega underground” chamada Fluffy (tão “alternativa” que eles nunca falam onde vão ser seus shows – os fãs que tem que adivinhar…). Mas no meio disso tem encontros e desencontros emocionais típicos (mas não clichês demais) de todo adolescente, e tudo regado com o melhor da música pop – o “infinite playlist”, ou “lista de músicas infinita”, do casal, numa referência aos CDs incríveis que Nick grava para “o amor da sua vida” (se você é da minha geração, é só substituir CD por “fita cassete” para se localizar…). Ou seja, adorei – pode procurar esse DVD sem susto!

E se você, como eu, estiver no embalo do assunto “jovens”, pode se aprofundar no tema com a ajuda de um livro sensacional que acaba de receber uma tradução para o português: “A criação da juventude: como o conceito de teenage revolucionou o século 20”, de Jon Savage (Rocco). Seu autor é um dos meus ídolos de longa data. Jornalista musical “das antigas” – isto é, do meu tempo… –, é dele uma dos melhores livros sobre o pop inglês de todos os tempos: “England’s dreaming: Sex Pistols and Punk Rock”, de 1991 (ao que me consta, ainda injustamente inédito no Brasil).  Mas não só isso: seus textos sobre música (que acompanho desde que comecei a ler o “NME” nos anos 80) sempre foram sensacionais. E é ele também que assina, junto com outro de meus escritores favoritos (Hanif Kureishi) um dos meu livros de cabeceira “The Faber book of pop” (lamentavelmente também sem tradução por aqui). Por tudo isso, sempre digo que se tem alguém que entende de cultura pop, esse cara é Jon Savage.

Assim, quando vi, ainda em 2007, que ele tinha saído com esse livro na Inglaterra, comprei na primeira oportunidade – e desde então o leio aos poucos, até com certo interesse, digamos, profissional, na qualidade de “conhecedor do público jovem” (o fato de eu ter trabalhado no MTV – eu sei, se você tem menos de 20 anos talvez nem se lembre disso, mas eu e o youtube estamos aqui para provar! – sempre me associou a “assuntos jovens”, mesmo com o passar dos anos… o que aliás, me deixa muito orgulhoso, pois é muito bom saber que você ainda consegue se conectar de maneira natural e “harmônica” com um público do qual deixou de pertencer há algum tempo… mas eu divago…).

Quando vi que foi lançado por aqui (encontrei-o também naquela “megastore” de Fortaleza), comprei-o na mesma hora para intercalá-los com minhas outras leituras aqui “No Limite”. A tradução, assinada por Talita M. Rodrigues, é excepcional (e de um respeito enorme com quem conhece cultura pop) – e eu recomendo sua leitura tanto para os que se interessam por assuntos sobre os jovens, como para os próprios! O que Savage oferece é um estudo minucioso de como a sociedade passou a perceber que existia um outro tipo de indivíduo entre a infância e a vida adulta. O que parece tão natural hoje – quem tem 16/17 anos hoje mal consegue imaginar que houve um tempo em que essa sua condição de adolescente sequer era reconhecida (eu mesmo já não podia conceber isso há 30 anos!) –, foi, na verdade, uma grande revolução na sociedade. E Savage, com seu exímio dom da narrativa, nos faz ficar interessado em cada etapa desse processo.

Seu foco, claro, é como isso se desenrolou principalmente nos Estados Unidos e na Inglaterra (França e Alemanha são referências parciais). Mas, como todos nós sabemos – mesmo você aí de 15 anos que está me lendo (espero!) –, por mais que a gente ache, durante essa fase, que nossos “problemas & questionamentos” são únicos… bem, desculpe se eu quebrar seu coração, mas todo mundo passa pela mesma coisa! Cada um do seu jeito, claro. Mas é a mesma coisa… Assim como a reação dos, hum, adultos a tudo que fazem esses “transviados” (numa referência ao título no Brasil do icônico filme de James Dean – você sabe qual é…). Veja, por exemplo, a chamada de um texto, citado por Savage logo no início de “A criação da juventude”, publicado originalmente na revista “Current opinion”:

“Soou a hora do sexo na América: uma onda de histeria sexual e discussões sobre o sexo parece ter invadido este país.”

Sabe de quando ele é? 1913! O “perigo” ali debatido era o dos salões de dança nas grandes cidades – e das manias das “danças de bichos” (que quem é fã de Woody Allen e de seu filme “Zelig” vai logo se lembrar do “Camaleão”) que os tais salões espalhavam. Homens e mulheres que não eram casais dançando “enlouquecidamente”? Uma verdadeira ameaça aos bons costumes! Savage conta o episódio sem ironia alguma – uma vez que quase todas as reações “dos mais velhos” às ditas loucuras “dos mais jovens”, em qualquer época, parece sempre cômica (pelo menos do ponto de vista dos mais jovens…).

Sua análise, porém, começa ainda mais cedo, com dois fascinantes personagens do final do século 19: Marie Bashkirteff (autora, aos 17 anos, de um diário de suas desventuras – porres e orgias incluídos –, que se tornou uma sensação na França daquela época); e Jesse Pomeroy (preso aos 15 anos depois de ter mutilado aquela que era sua décima vítima, uma criança de quatro anos de idade). Quer falar então de “juventude transviada”? Então é melhor se preparar para viajar mais no tempo do que você pensava…

Até porque, como o autor diz logo na introdução, o livro “termina com um começo”, por volta de 1945, quando a adolescência (ou os anos “teen” – da palavra em inglês para números que vão dos 13, “thriteen”, aos 19, “nineteen”) já é oficialmente reconhecida, ainda que com temeridade, pela sociedade americana. Para você ter uma idéia, como conta Savage, foi em 1945 que a revista do jornal “The New York Times” publicou uma lista (parte ingênua, parte sincera, e parte hilária) dos “direitos” desses adolescentes. Entre eles, o de “deixar a infância ser esquecida”; “ter regras explicadas e não impostas”; “o direito de estar na idade romântica”; e de “lutar pela sua própria filosofia de vida”!

O “negócio” então tinha virado sério. Hollywood, claro, teve parte nisso – e o relato de Savage do impacto de “Inimigo público número 1”, com James Cagney, e seus desdobramentos foi para mim revelador, assim como “pequenos movimentos”, como o “Bright Young People” (“jovens pessoas brilhantes”), da Inglaterra dos anos 20. Para explicar melhor o que aconteceu, Savage abre um leque que vai de Oscar Wilde à Juventude Hitlerista. Pode ser que, mesmo depois de ter lido “A criação da juventude”, nem metade das perguntas que você tem sobre esse períodos das nossas vidas tenham sido respondidas. Mas eu duvido que você não vai ficar fascinado com essa história – que a gente nem sabia que era uma história…

Só um conselho: se a certa altura do livro de Savage (que é um considerável “tijolo” de mais de 500 páginas) você quiser relaxar sem ficar muito distante do espírito adolescente, pare para ouvir (quem sabe mais uma vez) a música da temporada (pelo menos aqui no meu retiro cearense!), que é de um certo gênio musical que eu admiro muito, Mika, e que se chama “We are golden”. Para cantar junto esse lindo resumo poético do que Savage levou um livro inteiro para contar, aqui vão os primeiros versos – com a tradução (sempre apressada) logo a seguir:

“Teenage dreams in a teenage circus
Running around like a clown on purpose
Who gives a damn about the family you come from?
No giving up when you’re young and you want some”

(“Sonhos adolescentes num circo adolescente / Correndo por aí como um palhaço com uma missão / Quem se importa de que família você vem? / Nada de desistir quando você é jovem e “tá a fim”)

E quem disse que as coisas não estão todas conectadas?

Crônica de um riso anunciado

qui, 17/09/09
por Zeca Camargo |
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Pois então eu estava falando de humor outro dia – das razões que nos levam a rir, ou ainda, dos mais diversos estímulos que vão desembocar numa resposta comum, que é o riso –, quando uma amiga que mora em Washington (EUA), mas estava de passagem pelo Brasil (e desencontrou de mim, posto que estou justamente isolado aqui no Ceará gravando “No Limite”), me mandou um email com o instigante título de “Uma razão para viver”. Longe de tudo que eu gosto de cultura pop, como tenho insistido ultimamente, fiquei mais que curioso. E ao abrir encontrei apenas uma foto – na verdade, a reprodução de uma capa da “Entertainment Weekly”, que por alguma razão havia me escapado da ronda que eu costumo fazer pelo site da revista ew.com. E ali, estampados abaixo do logotipo do principal semanário de cultura pop americana, estavam eles: o elenco inteiro de “Seinfeld”, junto com Larry David.

Seria um truque? Uma reunião? Um “revival”? Uma “pegadinha”? Nada disso! Eles estavam lá simplesmente para anunciar que se juntaram mais uma vez para participar de alguns episódios (cinco, se não me engano) da nova temporada do brilhante sitcom criado e interpretado por Larry David, “Curb your enthusiasm” (que eu me divirto em traduzir apressadamente por “Menos!”).

Um pouco de background se faz necessário aqui, se você tem menos de 20 anos – ou se tem entre 20 e 30 anos e optou por passar sua adolescência assistindo “Friends” no lugar de “Seinfeld” (nada contra Joey, Monica, Ross, Phoebe, Chandler, Rachel, amigos, mas se um dia eu tiver tempo para fazer um estudo comparativo dos dois sitcoms que dominaram os anos 90 não tenho dúvidas de quem vai se dar melhor… mas eu divago…). Larry David foi um dos criadores de “Seinfeld”, que era, como todo bom fã declamava de cor, era um seriado sobre nada (o que era uma maneira esperta não só de promover o nonsense dos episódios como também um artifício elegante para dizer que o seriado era sobre “tudo”, tudo que nos cerca na vida moderna e nas relações que ela nos força a ter com os outros).

David era apontado como um dos cérebros responsáveis pelo sucesso da série – especialmente pela elaboração das situações surreais do cotidiano de uma cidade como “Nova York” (só para citar um exemplo mais à mão, quem não se lembra do “soup nazi”, ou “nazista da sopa”, que cozinhava uma sopa tão deliciosa que as pessoas atravessavam a cidade para experimentá-la, ficavam horas na longa fila de devotos do paladar, e ainda estavam sujeitas ao humor do dono da loja, que por razões mais que misteriosas podia simplesmente implicar e não servir a iguaria para você?). E não são poucos os “seinfieldólogos” que afirmam que as histórias “perderam pulso” quando, no auge do sucesso, ele resolveu abandonar o seriado.

Talvez ele não tivesse a fim de encarar a responsabilidade de manter “Seinfeld” no topo por muito mais tempo (para quem assiste televisão hoje, e sente a audiência completamente fragmentada – um fenômeno que não é só brasileiro, mas mundial, e que afeta especialmente os programas americanos – fica até difícil imaginar um seriado que fosse realmente um “evento”, que todo mundo parasse para ver, como um último capítulo de novela, como aconteceu com “Caminho das Índias” na última sexta-feira, só que todas as semanas!). Há rumores de brigas e disputas com o próprio Seinfield (que era mais ou menos o protagonista da série). Podia ser simplesmente uma estafa. Mas logo seus admiradores ficaram sabendo que Larry David tinha outros planos. Depois de alguns anos de hiato, finalmente surge na HBO (americana, depois no resto do mundo), a sensacional série “Curb your enthusiasm”, que ele não apenas escrevia mas também tinha o papel principal.

Desde o segundo parágrafo de hoje estou tentado aqui a escrever um pouco mais sobre “Seinfeld”, perguntar para você qual é seu episódio favorito; ou mesmo qual o seu personagem favorito (o meu é Elaine); fazer uma enquete sobre o momento mais memorável (a boneca com a cara da mãe de George ou Elaine passando na loja onde ela acha que foi mal tratada dizendo “bye bye sales commission”?); sobre a trama mais absurda (a namorada de George morrer por causa da cola dos envelopes do seu convite de casamento ou a Elaine ter que pegar sua comida chinesa “delivery” num endereço falso porque o restaurante não entregava no seu prédio?); a melhor entrada de Kramer no apartamento de Seinfeld; a mais improvável namorada do próprio Seinfeld (a que mais me fez rir foi aquela que tinha “mão de homem”); ou qualquer um dos milhares de assuntos que o seriado desperta… Mas vamos deixar isso para uma outra hora (quem sabe uma outra “efeméride” envolvendo o sitcom), e concentrar agora em “Curb”!

Se Seinfeld era “sobre o nada”, o projeto solo de David tinha um assunto muito definido: era sobre ele mesmo. Já que não o conheço pessoalmente – nunca tive a oportunidade de entrevistá-lo –, fico tentado (como qualquer um que assiste ao menos um episódio) a confundir personagem e ator. E não apenas porque o nome dele no seriado é Larry David! A naturalidade com que ele se envolve em brigas e confusões, rixas e dissabores, é tão impressionante, que não é difícil acreditar que você está vendo um “reality show”, e não um trabalho de ficção.

As coisas que acontecem com Larry David (o personagem) são totalmente verossímeis – poderiam acontecer com cada um de nós. Só que com ele, porém, tudo se torna o motivo de uma implicância, que vai escalando para discussões cada vez mais ácidas e embaraçosas, com consequências não menos que desastrosas para o próprio David. A própria maneira como as cenas são gravadas – Larry (o ator e escritor) dá apenas algumas linhas sobre o que espera daquela sequência e deixa tudo rolando no improviso mesmo – também ajuda a dar realismo aos diálogos, e o que você vê no final é menos um seriado de humor do que um estudo em constrangimento e auto-humilhação.

Assim como “Seinfeld”, explicar um episódio de “Curb” é tarefa ingrata, pois o grande atrativo de cada um deles não é o argumento, mas todos os desdobramentos de sua idéia inicial. Há por exemplo o episódio (cito de cabeça aqui, já que estou longe da minha coleção completa das seis temporadas em DVD – da qual muito me orgulho!) em que ele desconfia que o macarrão com camarão que eles sempre pedem no delivery veio com menos camarão dessa vez, e arma um “grande plano” para conferir se o dono do restaurante o está enganando. Ou aquele em que um comentário seu inocente para uma amiga de sua mulher que ele encontra fazendo “jogging” o transforma no homem mais sexista de toda Los Angeles (onde se passa o seriado). Tem ainda um surreal em que ele corta os cabelos de uma boneca raríssima da filha do dono da casa onde ele foi convidado para uma festa – e tem que arrumar outra “igualzinha” de qualquer jeito. Ou então aquele que tem a conversa telefônica mais absurda que eu já vi na TV: sua mulher, dentro do avião que está caindo (a situação está tão grave que o piloto autorizou usar o celular), liga para ele para se “despedir” e David diz que não pode falar com ela porque está com o “cara da TV a cabo” em casa – e “você sabe como são esses caras”…

Agora então imagine o potencial de cruzar isso com o elenco de “Seinfeld”!

Não será exatamente a primeira vez que algum daqueles atores participa de “Curb”. Jason Alexander (George Costanza) apareceu em alguns episódios tentando justamente emplacar um novo programa que o livrasse da “maldição de Seinfeld” (com exceção de Julia Louis-Dreyfus, que fazia o papel de Elaine e se deu relativamente bem com “The new adventures of old Christine”, nenhum deles, nem o próprio Seinfeld, conseguiu sucesso depois do seriado). E a própria Julia Louis-Dreyfus também fez uma ponta de luxo como ela mesma “pagando um favor” para David – isto é, visitando uma vizinha dele que era fã de Elaine, para desfazer um mal entendido entre eles (sim, as tramas são absurdas assim mesmo!). Mas o que está prestes a acontecer agora é muito, mas muito mais especial!

Saudosismos à parte, esse encontro tem tudo para dar certo. Sei que a nova temporada de “Curb” (a sétima) está para estrear – vi um trailer da edição digital da “The New Yorker” (numa novidade que eu achei bem esperta, ao folhear as páginas da revista, exatamente como você folhearia uma de papel, ao passar o mouse sobre o anúncio da série, que é uma reprodução do que saiu no exemplar vendido em bancas, você pode assistir ao trailer!), mas ele não revela nada sobre isso. Ao mesmo tempo, estou tentando até evitando “garimpar” informações na internet sobre o reencontro, apenas para não diminuir o prazer que eu sei que vou sentir quando finalmente assistir aos episódios. Como disse minha amiga, “Seinfeld” mais Larry David é, de fato uma boa razão para viver – e acrescento: “para se ter esperança na humanidade”.

Sobretudo a esperança de que é possível tirar humor de tudo – mesmo das pessoas mais mal-humoradas do mundo. O que, apenas para encerrar, me lembrou um cartum que vi nessa mesma edição da “New Yorker”, que, como todo bom cartum (lembrei-me que ainda quero escrever um post apenas sobre essa sofisticadíssima forma de humor) prima pela simplicidade: uma mulher com cara de assustada aproxima-se de policial no meio da rua e diz, “Seu guarda, tudo nesse mundo está me importunando” – palavras que poderiam bem sair da boca de Larry David…

O mundo lá fora

seg, 14/09/09
por Zeca Camargo |
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A Andréia quebrou meu coração em mil pedaços com seu comentário sobre o post anterior. Não foi de propósito, claro. Quando ela me mandou um link sobre a passagem do Beirut pelo Brasil, ela certamente quis fazer uma carinhosa referência a mais de um texto que já escrevi aqui sobre essa banda – primeiro colocando um disco da banda na lista dos melhores álbuns de 2007 “que ninguém escutou”, depois num outro sobre a minissérie “Capitu” .Mas a lembrança de que eu estou ainda afastado de todas essas “tentações culturais” até o final das gravações de “No Limite” (dia 27 agora)… magoou…

Sim, deu (mais uma vez) saudades das coisas que me alimentam – e, numa fúria saudosista, apelei para a internet hoje de manhã para ver “o que estava acontecendo”. Comecei fuçando no meu site favorito de “showbusiness”, ew.com – e fui direto conferir as premiações da temporada: o Emmy e o VMA (Video Music Awards, da MTV americana). Vendo os contemplados do primeiro – o prêmio mais importante da TV americana –, fiquei satisfeito só de ver que Tina Fey tinha sido reconhecida pela sua “imortal” imitação de Sarah Palin, a não-intencionalmente engraçada ex-candidata à vice-presidência dos Estados Unidos.

E quanto ao VMA, selecionei duas cenas que me chamaram a atenção – numa cerimônia que, uau… esses caras sabem fazer uma festa! (O que era Taylor Swift cantando ao vivo num vagão de metrô? E as sinceras homenagens ao rei Michael Jackson?).

Primeiro, foi um “momento-baixaria”, quando Kanye West interrompeu o discurso de agradecimento da própria Taylor Swift (que havia ganho na categoria “melhor vídeo feminino”) para dizer que quem tinha o melhor clipe “de todos os tempos” era a Beyoncé – o que deixou muitas pessoas perplexas, e a própria Beyoncé, que estava na platéia, simplesmente passada… (em termos de constrangimento, a subida gratuita da rapper Lil Mamma ao palco enquanto Jay-Z e Alicia Keyes cantavam a sensacional “Empire state of mind” no final da premiação chegou perto…).

Depois… ELA! A insuperável Lady Gaga com aquela performance ao vivo de “Paparazzi”! O que é aquilo? Quando você acha que ela já demonstrou o suficiente o quanto ela é louca, Lady Gaga simplesmente se supera. A melhor apresentação ao vivo que já assisti até hoje – e a melhor que eu vou ver por muito tempo!

Um link puxa o outro, e logo estava revendo a única cena que talvez supere o número de Lady Gaga no VMA, em termos de bizarrice… A aterrissagem de Brüno sobre Eminem no meio da platéia do MTV Movie Awards, em junho passado – uma cena que eu só havia conferido em fotos, mas não em vídeo. Para quem não viu (não é difícil encontrar esse clipe na internet): o ator Sacha Baron Cohen aparece sobre o público preso por cabos e vestido de anjo – isto é, um anjo cheio de penas e com pouca roupa –, até que um “defeito” no equipamento faz com que ele desabe sobre Eminem, que estava assistindo o show. Para ser um pouco mais, hum, gráfico, Brüno cai de boca na virilha do rapper, que fica com a cara enfiada na virilha do “anjo”… Os seguranças de Eminem entram em ação, e o rapper sai furioso enquanto Brüno tenta se desvencilhar da corda. (Eu sei, eu sei… Um longo debate veio em seguida para “apurar” se a cena “ultrajante” era ou não combinada entre os artistas. Mas mesmo que tenha sido, não é difícil admitir que a idéia é genial e provocante – e ficou bem engraçado…)

Você, que talvez tenha visto mais trechos do show da MTV americana do que eu, deve estar até achando graça do fato de eu me divertir com tão pouco… Mas as gravações – e todo o trabalho além disso (edições, apresentação ao vivo, chamadas, testes, reuniões) – estão num ritmo tão frenético (por que você acha que eu só postei uma foto com um curto parágrafo na última quinta-feira?), que mesmo “um pouco de alegria” para mim já é muito. Sério! Antes de conferir o Emmy e o VMA, sabe o que mais me divertiu recentemente na internet? Uma visita ao site de um dos meus ídolos musicais, Beck – onde fui parar movido pela curiosidade de saber o que ele tinha feito com o disco clássico do Velvet Underground & Nico.

Explico: li (na própria internet) que Beck estava com um novo projeto. Ele convida um grupo de amigos músicos para passar um dia no seu estúdio, fazendo versões – faixa por faixa – de um disco clássico, sem ensaios, tudo no improviso. O primeiro deles foi justamente o do Velvet – e eu mal podia esperar para ver o que ele tinha feito com canções tão perfeitas como “Sunday morning”, “Femme fatale”, “Heroin”… na verdade, todas daquele álbum! Bem… Mesmo um fã enlouquecido de Beck como eu não teria a cara de pau de dizer que ficou genial. Eu usaria o adjetivo “curioso”. Mas também não diria que eu perdi meu tempo! Na verdade, me entusiasmei mais com o segundo disco que ele escolheu para trabalhar, “Songs of Leonard Cohen” – que ele fez a releitura com a colaboração de ninguém menos que Devendra Banhart e os caras do MGMT!

O que me deixou ainda mais encantado, porém, é o próprio site de Beck, que eu não visitava há muito tempo. Fora esse projeto (que se chama “Record Club”), lá você também encontra megamixes de faixas que – pelo que eu entendi – Beck (ou algum convidado) acha legal juntar (procure na seção “Planned Obsolescence”). Sem falar em mais um monte de informações soltas, mas jamais inúteis! Onde mais, se não no site de Beck, eu seria capaz de ouvir faixas do único disco de um dos gurus de Michael Jackson – não Quincy Jones, mas Uri Geller?

O nome lhe parece familiar? Só se você tiver mais de 40 anos e se lembrar de suas aparições “assustadoras” na TV, entortando talheres e parando relógios com o poder da mente… Ou então se você for muito, mas muito, fã de Michael Jackson! De qualquer maneira, esse israelita (naturalizado britânico) foi sensação nos anos 70 – mas não exatamente como cantor. O que é fácil de comprovar depois de você ouvir menos de 30 segundos de qualquer faixa que Beck disponibilizou – minha favorita é “Mood”, na qual, sob uma trilha “new age”, ele pede para o ouvinte pegar um garfo, repetir mentalmente a ordem “dobre!”, e ver o que acontece… e se nada acontecer, Uri avisa, já sob o som de violinos, que “tudo bem, porque não acontece com todo mundo”… “A vida é estranha, e as pessoas são ainda mais estranhas”, conclui o “paranormal” nessa faixa – numa “emocionante” lição de vida digna de constar numa coletânea de “O melhor da auto-ajuda”!

Sim, sim – é com essas coisas que tenho me divertido ultimamente, enquanto vocês vão a shows do Beirut, assistem a “Anticristo”, compram ingressos para o AC/DC, e não param de ver o trailer do filme de Michael Jackson, “This is it”…

Devo dizer que este último eu também assisti – pelo menos uma vez! Foi numa tarde recente, onde “mergulhei” numa sessão contínua de trailers no youtube: “O informante” (com Matt Damon); “Where the wild things are” (o novo de Spike Jonze); “District 9” (o sucesso alternativo da temporada americana); “Inglorious basterds” (Tarantino!); e até “Avatar” (“O horror! O horror!”). Será que você consegue adivinhar qual é o único desses títulos todos que eu realmente fiquei a fim de assistir?

A esta altura deste post, você tem o direito de se sentir um pouco perdido com esse meu “passeio por coisas que não experimentei”. É proposital. Para variar um pouco – e especialmente para os “saudosistas de plantão” que lamentam que o blog está “mudado” (quando eles já deveriam estar acostumados a esperar por tudo neste espaço…) – resolvi escrever um texto sem roteiro prévio, sem planejamento, ao sabor do que fosse me inspirando. Deixei essa associação de idéias me levar para uma viagem para “o mundo lá fora”, no universo da cultura pop – enquanto eu mesmo participo aqui da confecção de um produto de cultura pop!

Se calhar (como se diz adoravelmente em Portigal), posso ir ainda mais adiante, falando do livro mais fascinante que li nos últimos anos – tão bom que os que me acompanham aqui regularmente vão se lembrar que eu já havia começado a lê-lo desde que cheguei aqui, mas fico economizando essa leitura para estender esse prazer: “Censoring na iranian love story”, do escritor iraniano Shahriar Mandanipour. Mas o texto já está bem longo, e acho que esse livro merece bem mais que dois parágrafos…

Enfim, perdoe-me se a viagem de hoje foi aleatória demais – em inglês existe uma expressão que não tem boa tradução para o português, mas que descreve bem meu pensamento de hoje: “serendipity”. Envolvido como estou com meu trabalho aqui, e sonhando com as coisas que acontecem longe desse lugar maravilhoso onde estou nas últimas seis semanas, deixei o pensamento literalmente “ir embora”. Quero falar de outras terras, mas não vai ser hoje. Devo ainda a conclusão de uma conversa sobre humor… Talvez o melhor no momento seja encerrar por aqui, com um pequeno trecho enigmático de um livro que já citei: “Querida companhia aérea”, de Jonathan Miles – trecho esse que traduz, com estranha poesia, a sensação que me atravessa nessa reta final do programa:

“Aqui é algum outro lugar”
“Já não é mais”, disse o coronel.

Pausa

qui, 10/09/09
por Zeca Camargo |
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Claro que temos ainda muito o que conversar sobre o humor – conversa essa que disse que continuaria hoje. Porém, devido aos acontecimentos recentes (sim, coisas demais por aqui no Ceará!), vou adiar esse compromisso para segunda que vem, e convidar você a assistir o episódio desta quinta de “No Limite” – especialmente você, que tem sua “teoria da conspiração” de bolso. Eu mesmo, mal posso esperar por hoje à noite…

Não existe riso à toa

seg, 07/09/09
por Zeca Camargo |
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Tive vontade de rir quando Sandi conquistou a imunidade no último episódio de “No Limite”. Estava lá, na gravação da prova, na expectativa de ver quem se livraria do Portal, quando ela escolhe a pista certa – que eu, como sempre na hora dos desafios, nunca sei qual é. Por que tive vontade de rir? Ora, aposto que você já respondeu: porque era coincidência demais ela ter conseguido duas imunidades duas vezes consecutivas – coincidência, claro, mas não um evento improvável. Como qualquer aluno que prestou atenção às aulas de matemática lembra-se bem, para tudo existe uma probabilidade. Ela pode até ser pequena, mas ela existe.

Claro que não foi pela ocorrência de um evento “tão raro” que eu tive vontade de rir – a matemática, que sempre me deu muito prazer (e eventualmente dá até hoje), não é exatamente “hilária”. O que provocou meu bom humor foi pensar na inevitável avalanche de “teorias da conspiração” que viria na sequência – da qual os comentários recentes neste mesmo blog são apenas “a ponta do iceberg”… Uma personagem polêmica ganhando a imunidade duas vezes? “Ah” – confesse que você pensou! – “estão mexendo no jogo”! Com que objetivo exatamente, quem acusa não deixa muito claro, já que ninguém garante que o programa fique melhor ou pior com a participante supostamente protegida – aliás, as “acusações” ingenuamente (ou seria “propositalmente”, imbuídas do afã de alardear?) desconsideram que talvez o jogo fique mais interessante com uma articuladora de peso como a Sandi FORA da competição, uma vez que ao sair, os eliminados passam a fazer parte de um júri que vai decidir o vencedor da prova…

Aliás, as “acusações” desconsideram várias coisas para tentar emplacar seu tom de “a-há!”, entre elas – a que mais me diverte – o fato de numa temporada do “Survivor” americano (gravada em Exile Island, Panamá) um participante (Terry) ter ganho a imunidade individual cinco (isso mesmo, cinco!) vezes consecutivas, “certamente” – como diriam os que “tudo” sabem sobre como esses “realities” são feitos – um “plano” da CBS, rede de TV americana que exibe o programa nos Estados Unidos, de “desesperadamente criar polêmica no programa” (atenção nessas aspas!). Mas eu divago…

Mencionei minha vontade de rir na prova em que a Sandi ganhou a nova imunidade, mais para poder comparar aquele impulso com as gargalhadas que eu dei outro dia ao ver o DVD com a primeira série do “The Sarah Silverman Program” – como mencionei no post anterior, ao ensaiar um breve ensaio sobre o humor. São situações, ou melhor, são “provocações” completamente diferentes e, no entanto, provocaram em mim a mesma reação. Como é possível? A primeira é uma situação observada na vida real, uma mera coincidência que – como se comprovou, trouxe reações engraçadas (para não dizer previsíveis…). A segunda, uma série de roteiros pré-escritos, extremamente ofensivos (mais sobre eles daqui a pouco) – e extremamente hilariantes. O que essas coisas tão diferentes têm em comum para provocar o meu riso?

A pergunta pode ser feita mesmo com produtos “similares” – digamos, dois filmes. Durante anos – por mais de duas décadas, na verdade –, a comédia que mais me fez rir chamava-se “Aperte os cintos, o piloto sumiu!” (uma tradução deveras infeliz para a simplicidade do título original, “Airplane!”). Para te dar uma idéia do poder que ele teve sobre mim, da primeira vez que vi este filme, assisti a três sessões seguidas: vi a segunda porque tinha rido tanto na primeira, que cheguei a perder boa parte das piadas; e vi a terceira só para conferir se não havia perdido nenhuma delas. Até hoje, momentos como o “flashback” que parodia “Os embalos de sábado à noite”, ou a “voz do pensamento” da mulher desconfiada que diz que seu marido nunca “vomita em casa”, são capazes de colocar mais que um sorriso no meu rosto. Para não falar de gagues que só fui perceber em sessões subsequentes , como o barulho de motor de hélice que sempre aparece nos planos do avião (que é a jato) do lado de fora, ou a sutil piada do “flashback” numa casa de repouso que envolve uma mulher que acha que é a cantora Ethel Merman (interpretada pela própria).

Enfim, este era o filme que mais me havia feito rir, até que, em 2005 eu assisti a “The aristocrats”, um inacreditável documentário sobre uma piada só. Que eu tenha registro, este filme nunca foi lançado comercialmente no Brasil, mas é fácil de contar do que se trata: é sobre uma tradição entre comediantes americanos, de contar a mesma piada, e o diretor (Paul Provenza) pediu para vários deles – de Whoopi Goldberg a Jon Stewart, passando por Robin Williams, Jason Alexander (George Costanza, de “Seinfeld”), e dezenas de artistas desconhecidos para o público brasileiro, mas todos muito competentes!

A piada é muito simples: uma família se apresenta para um empresário do meio artístico e oferece um número de teatro que é “garantia” de sucesso. O empresário pergunta como é, e o comediante passa a descrever então as cenas mais pornográficas, bizarras e escatológicas possíveis. Ligeiramente chocado, o empresário pergunta qual o nome do número – e vem a resposta: “Os aristocratas”. Sem graça? Nem pensar! Porque o que funciona mesmo na piada é a maneira como os comediantes descrevem o ato escabroso – e aí entra a genialidade e o talento de cada um. Fui vê-lo em Nova York, em 2005, com um amigo americano de longa data – e gargalhamos tanto que no jantar que se seguiu à sessão, ficamos checando quais trechos o outro tinha perdido por ter desviado a atenção da tela num ataque de riso. Revi “The artistocrats” algumas vezes no DVD – e a reação é sempre a mesma: tenho que assistir apertando sempre o “pause”, para recuperar o fôlego.

Refaço a pergunta então: o que “Aperte os cintos, o piloto sumiu!” tem a ver com “The aristocrats”? Nada – a não ser a capacidade de provocar o riso solto!

Retomando o seriado que assisti aqui na minha temporada cearense, enquanto estamos nas gravações de “No Limite”, conheci Sarah Silverman em “The aristocrats” – e sua versão para a piada (nada difícil de encontrar na internet…) tem um “timing” de gênio! Depois de ter me tirado “seriamente” do sério, virei seu fã – por isso quis ver seu programa. É uma das coisas mais ofensivas que já me fizeram perder o controle do riso. Mesmo! Se você achou que “Brüno” passou “ligeiramente” da conta no quesito ousadia, melhor nem experimentar com Silverman – que você pode conferir no site do Comedy Central.

Para citar só por cima, num episódio ela ironiza (para usar um termo “elegante”) a comoção das pessoas com relação a quem é soropositivo. Em outro, a gozação é com crianças órfãs. E no episódio chamado “Batteries”, ela sai para comprar pilhas para seu controle remoto que travou num canal de TV que tem uma maratona de doações para crianças com câncer – cujo protagonista, um menino careca, de muletas, aparece para assombrá-la em sua própria casa! Tem o episódio em que ela acha que virou lésbica e provoca todos os estereótipos possíveis (lembrando que seus vizinhos é um casal de gays obesos). E é melhor você ter estômago para incontáveis piadas sobre flatulência…

É, aviso, absurdamente ofensivo. E é engraçadíssimo. Tão engraçado, aliás, quanto um outro seriado americano, inocente o suficiente para passar na TV aberta (inclusive no Brasil), chamado “30 Rock”! Com um comedido vocabulário – mais uma capacidade incrível de ironizar a própria TV onde o “seriado dentro do seriado” é gravado –, Tina Fey consegue arrancar minha compostura!

E, para não ficar só na graça das imagens, todas as vezes que li um livro de David Sedaris LINK PARA POST DE 30de06de08 em público passei por um constrangimento – por não ter conseguido conter o riso. E minha leitura mais recente, o elogiado (e breve) livro de Jonathan Miles “Querida companhia aérea” (Editora Globo) – título que no Brasil, por razões que não consigo entender, oculta a American Airlines do original (“Dear American Airlines”) – é muito, mas muito engraçado. Seleciono aqui algumas frases soltas da carta que o autor escreve para a companhia de aviação que o deixa preso no aeroporto de Chicago, depois de ter cancelado sua conexão para Los Angeles com uma desculpa esfarrapada – uma misto de desabafo e desculpa para passar o tempo (e rever uma vida muito louca):

“Cresci em Nova Orleans, onde cirrose hepática está listada como ‘causas naturais’ no atestado de óbito”.

“Ao chegar à adolescência, meu pai era uma sombra cinzenta e sem som que passeava pela casa, o fantasma de um faz-tudo martirizado, e minha mãe permanecia, como antes, um caso para uma brigada antibomba psicológica. Eram menos pais do que companheiros de cela.”

“Não damos bola para sua desculpa oficial de mau tempo porque já a desmascarei claramente com minha contínua avaliação do tempo do lado de fora, que, no último exame, mostrava uma mistura de fresco e agradável com uma probabilidade de 90% de deleite que se estende pela manhã, com ventos, como seus horário de vôo, leves e variáveis”.

“Foi aí que passei das garrafas de 750 ml de vodca para as garrafas de um litro, o que é na verdade apenas uma questão de eficiência, mas não vamos fingir que não é simbólico”.

O livro tem alguns problemas de tradução – ou melhor, “alguns vários” problemas de tradução (digamos que usar “cubo de Rubik”, o “Rubik cube” em inglês, no lugar de “cubo mágico”, como o brinquedo ficou famoso no Brasil, até passa; mas traduzir “call the kids” por “chame as crianças”, e não “ligue para seus filhos”, ainda mais no contexto da história, já é um pouco de liberdade poética demais…). Mas o tom é sempre engraçado, e não permite que alguns momentos mais dramáticos se alonguem demais.

Pois então, tudo isso me faz rir. E qual é – para usar mais uma referência matemática – o denominador comum? Bem, acho que vou deixar a resposta (está apenas insinuada no título de hoje) para o próximo post. Nesse meio tempo, não quer me mandar, num comentário, um bom exemplo de alguma coisa que te fez gargalhar muito? Uma cena de filme, um trecho de um livro, uma cena de novela, um texto de teatro – até mesmo uma piada (mas que, por favor, seja mesmo engraçada!). Só para a gente continuar a risada – digo, a conversa…

Alegria! Alegria!

qui, 03/09/09
por Zeca Camargo |
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Bia Guedes

Foto: Bia Guedes

Quero achar que foi a passagem de Claudia Leitte ontem pelas nossas gravações de “No Limite” – como você confere no episódio desta quinta-feira, ela fez um “pocket show” para alguns participantes da competição (“the happy few”, ou, os “poucos felizardos”, como Shakespeare colocou na boca de Henrique V), aliás, um show que me agradou imenso (como se diz “no” Portugal), não só pelas versões improvisadas das músicas dela, como por sua interpretação, que eu não conhecia, de “D’yer maker” (Led Zepellin!), um som que me remete, não aos anos 70 (segure sua piadinha com o quarentão aqui!), mas ao ano de 1989, quando eu morava em Nova York e toda terça ia num clube (que não existe mais, na esquina da rua 14 com a terceira avenida) chamado Carmelita’s, um estranho espaço cuja decoração lembrava o de um bordel na fronteira entre o Texas e o México (do lado mexicano), e a iluminação era tão intensa que não permitia ninguém com auto-estima baixa aparecer na pista de dança (ou você se achava o mais gostoso ou a mais gostosa da noite, ou era melhor ficar em casa e não ser revelado por aquelas luzes!), e o DJ tinha uma certa “atitude” (palavra que ainda não era usada com esse sentido na época) e nunca deixava a festa animar, isto é, se tinha mais de seis pessoas dançando, era sinal de que a coisa estava ficando quente, e era o sinal para ele trocar de música, a não ser que ele estivesse a fim de tocar “D’yer maker”, a única faixa que ele permitia que fosse executada até o final…

Grandes noites no Carmelita’s – mas eu divago…

Retomando, quero achar que foi essa passagem por aqui de Claudia Leitte (na foto acima, gravando chamadas comigo para o programa) que trouxe essa onda de alegria para minha temporada cearense. Seu carisma e sua simpatia deram mais do que um simples momento de alegria para essas “pobres almas” que já estão na quinta semana de penúria da competição – e atravessaram, em especial, uma semana que, tenho de admitir (sem contar demais…), foi mais que animada, com a Sandi projetando-se como a figura mais polêmica da tribo de sobreviventes! O clima bom da cantora contagiou toda a equipe, trouxe uma lufada de entusiasmo para todo mundo (ajudado pela constatação de que agora temos menos dias de gravações pela frente do que todo o tempo que já gravamos!), e, especialmente para mim, veio de encontro a uma série de eventos engraçados que me cercaram na última semana – o que inclui, claro, Vanusa cantando o Hino Nacional… (Não sabe do que estou falando? Ah, foi você que chegou de Marte ontem? Então dá uma fuçada no youtube…).

Tudo começou com um DVD que eu trouxe para ver nas horas vagas que eu achei que teria aqui… Como já brinquei antes, doce ilusão a minha de que esse tempo livre seria abundante! Mal consegui ver um quinto dos filmes que estão aqui comigo… Mas no último domingo de manhã, fugindo do sol e fazendo hora para ir para a base das nossas operações (acompanhar a edição do programa e me preparar para a apresentação ao vivo), peguei por acaso “Sullivan’s travels” para ver. Fiquei interessado em conhecer este filme quando li um artigo de A.O.Scott (de dezembro do ano passado) no “New York Times” sobre o que filmes antigos que evocavam o espírito da “Grande Depressão” (consequência da crise financeira de 1929) tinham a dizer para o público americano hoje, quando o mundo vive outro período de incertezas financeiras.

Veronica Lake em 'Sullivan's travel' (Divulgação)

Veronica Lake em cena de Sullivan's travel (Divulgação)

Comprei o DVD em janeiro e meio que esqueci dele – até “redescobri-lo” na pilha que trouxe para cá. Por ser uma produção antiga (1941), em branco e preto, achei que tinha cara de matinê e coloquei no meu laptop naquela manhã de domingo. Veronica Lake e Joel McCrea (o Sullivan do título) são os astros, mas o que me estimulava mais a curiosidade era o nome que assinava a direção: Preston Sturges – alguém que, como o próprio “New York Times” dizia (numa crítica da época) “não precisava de motivos para dominar as comédias no cinema, já que ele fez mais do que qualquer outro nos últimos dois anos para dar brilho e ritmo e autoridade para este gênero” (perdão pela tradução apressada).

Assim, assisti a “Sullivan’s travels” – como se diz – “de boa”. Difícil imaginar um público de hoje – acostumado a rir de piadas escatológicas dos grandes sucessos de bilheteria – achando graça da “provocativa e elegante” trama desse filme: um diretor de comédias de sucesso resolve fazer uma superprodução sobre a pobreza e deixa sua vida milionária para trás para tentar descobrir o que sente o “homem simples” (acompanhado, por coincidências bizarras demais para eu explicar aqui, por Veronia Lake). Gostei de tê-lo visto – embora esteja longe de ser um “clássico”. Porém, fiz questão de citá-lo hoje aqui por causa de sua mensagem final.

Depois de várias desventuras – que culminaram com a detenção de Sullivan numa colônia penal, onde a única diversão (que levava os presos às gargalhadas) era uma projeção de desenhos animados de Walt Disney –, o diretor volta para casa e desiste de capturar “a grande tragédia humana” para as telas (numa referência que os cinéfilos vão adorar, ele recusa a proposta de dirigir a adaptação de um livro chamado “O brother, where art thou?”, nada menos do que o filme que foi feito, décadas depois, pelos irmãos Coen, conhecido no Brasil por “E aí, meu irmão, cadê você?”). Atônitos, os diretores de um grande estúdio perguntam o que o fez mudar de idéia, e Sullivan responde algo sobre a importância de fazer todo mundo rir, pois muitas vezes (cito de memória), “uma boa risada é tudo que o homem simples tem”.

Como se meu pequeno universo de cultura pop que trouxe aqui comigo estivesse conspirando a meu favor, no mesmo dia comecei a ler um livro muito engraçado (e infelizmente muito mal traduzido), chamado “Querida companhia aérea”, de Jonathan Miles (Editora Globo). No dia seguinte, tirei da minha pilha de DVDs, a primeira série do “Sarah Silverman Program” – uma das melhores (e mais provocativas) comediantes americanas atuais. E isso me fez lembrar do filme mais engraçado que já vi na minha vida: uma colagem enlouquecida de comediantes contando a mesma piada que se chama “The aristocrats”. Daí veio o email com o link para Vanusa cantando o Hino Nacional. E “amarrando” o ciclo “alto astral”, Claudia Leitte aparece para cantar “D’yer maker”!

É muita alegria para uma semana só – e me senti inspirado a fazer dois ou três comentários sobre humor – mesmo sabendo dos riscos que a gente sempre corre ao tentar falar sério de uma coisa que é justamente o oposto… Eu sei, geralmente não dá certo – fica sem graça e (pior) chato! Mesmo assim, queria tentar. Só que o espaço hoje já está curto para começar um pensamento (e, sendo bastante honesto, o episódio de hoje de “No Limite” está deixando a mim – e todos nós aqui – de cabelo em pé… tenho que cuidar das reviravoltas!).

Então vamos deixar para segunda-feira (sim, em pleno 7 de setembro – afinal, eu vou estar trabalhando!). Como “preparação”, se puder pesquise alguma coisa sobre “The aristocrats” nesse fim-de-semana. Para entrar na “frequencia” do humor de Sarah Silverman, visite o site do canal a cabo americano Comedy Central. E se quiser ler “Querida companhia aérea” rapidinho, ele tem só 215 páginas – você “mata” em uma tarde! Ah, e para vir preparado mesmo para a discussão sobre humor, lembre-se da cena impagável de Alan Alda em “Crimes e pecados”, de Woody Allen (um trecho nada difícil de você encontrar aqui mesmo na internet”), em que ele, no papel de um diretor bufão, explica ao personagem de Allen – que está fazendo um documentário justamente sobre o personagem de Alda – a “regra de ouro” sobre piadas e situações cômicas:

“Se envergar, é engraçado; se quebrar, não é” (no original, para facilitar sua pesquisa: “If it bends, it’s funny; if it breaks, it isn’t”).

Garanto, se não boas risadas, pelo menos uma boa reflexão. Até segunda – e bom feriado!



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