Fã de “Malhação”? Então eu tenho um filme para te indicar…

seg, 28/04/08
por Zeca Camargo |
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E não é o último do Ashton Kutcher, “Jogo de amor em Las Vegas”. Tampouco vou recomendar “Hanna Montana & Miley Cyrus: o melhor dos dois mundos”, só porque a novela para o público jovem está na fase musical de toda sua existência – não recomendo, veja bem, por preconceito, mas simplesmente porque eu ainda não assisti. O filme que eu quero comentar aqui hoje tem tudo que o público de “Malhação” gosta: namoros, ciúmes, paqueras, cantadas (das boas e das baratas), sedução, traição, dúvidas emocionais, inseguranças com a aparência, incertezas do coração – e até mesmo (para falar de alguns assuntos mais pesados que, de vez em quando, freqüentam a trama da novela), sexo, masturbação, baixa auto-estima, depressão, rejeição, “pé na bunda”, manipulação e conflito de gerações. Quer ver esse filme? Então torça para “Chega de saudade” estar em cartaz na sua cidade!

Isso mesmo: “Chega de saudade”, o belíssimo trabalho de Laís Bodanzky – que já estreou há algumas semanas, mas que eu só assisti (tardiamente) na última sexta-feira. É sensacional – e, digo isso com o mesmo entusiasmo com que eu constatei, à certa altura, que os conflitos e paixões daqueles nobres personagens que deslizavam pelo salão da União Fraterna (uma casa de bailes que existe mesmo, ali na Água Branca, em São Paulo), não eram muitos diferentes daqueles vividos pelos protagonistas de “Malhação”. A não ser pelo fato de os dois grupos estarem separados por duas (e às vezes três) gerações… mas isso é um detalhe…

saudadeva.jpgFeito o paralelo, vamos mergulhar no filme – porque o seriado, eu tenho certeza que você conhece bem (se não como público cativo, pelo menos como referência televisiva). O problema é… por onde começar a falar de “Chega de saudade”? Pelo elenco? Pelas músicas? Pelo lugar? Pelas histórias? Tudo é tão bem encaixado, tão bem pensado, tão bem escrito – coisas que uma boa diretora como Laís (lembra de “Bicho de sete cabeças”?) – que não é simples fechar o foco num só aspecto do trabalho…

Vamos começar então pelo elenco – a “moçada” que chega naquele salão para dançar. Mais fácil falar primeiro dos dois jovens “de fato”, Paulo Vilhena e Maria Flor, já que eles são a minoria – minoria, diga-se, na faixa etária, mas não no talento. Quem descartava Vilhena sob o rótulo fácil de “ator bonitinho de novela” não pode mais usar essa desculpa para criticá-lo depois desse filme. O cara é bom, e tenho que me segurar aqui para não premiá-lo com um outro rótulo fácil (ainda que mais elogioso): o de “melhor ator da sua geração”. E Maria Flor é o elo perfeito (o talvez o mais convincente e encantador) entre a geração “Malhação” e as outras faixas etárias que circulam pela pista de dança. E para falar delas…

Que gente mais nobre – mesmo na sua aparente decadência! Quantas atrizes são capazes de passar pela humilhação que a personagem de Betty Faria vive no filme – ou melhor, quantas atrizes, hoje tão jovens e viçosas, serão capazes de, daqui a algumas décadas, abraçar num papel como esse? Ao seu lado, “encalhada” na mesa, Miriam Mehler, numa rara e preciosa aparição. Clarice Abujamra é a “madame depravada” que vai ali alimentar suas fantasias naquele baile. Stepan Nercesssian inconseqüentemente usa Maria Flor para torturar Cassia Kiss. A fantástica (e, para mim, até então desconhecida) Conceição Senna é o retrato da mulher madura – e safada, e segura. As melhores risadas que dei no filme foram com ela. E seria impossível fazer justiça aqui a todo o elenco de apoio que, ainda que em papéis menores, conduzem a história com o mesmo brilho dos nomes mais conhecidos? Aliás, por falar neles, o que é a relação reprimida entre Tônia Carreiro e Leonardo Vilar – e seu desfecho emocionante, numa cena descrita por um amigo meu como “a saída de cena mais bonita de toda a história do cinema brasileiro”?

Esse elenco incrível é reunido num roteiro feito de fragmentos narrativos, unidos por uma costura frouxa, mas que, ao contrário de jogar contra o filme, é seu maior trunfo: é o espectador que vai dando o arremate final, escolhendo a história de quem quer acompanhar. E foi ao perceber isso, que me lembrei de “Malhação”! Uma das críticas mais comuns que ouço com relação à novela – obviamente, feita por pessoas que estão bem fora da faixa etária para quem o programa é direcionado – tem a ver com a “banalidade” dos conflitos vividos por seus personagens. Ora ora… Não é que aqueles cinqüentões, sessentões, setentões e até oitentões estavam ali passando por “tormentos” parecidos com o de gerações bem mais jovens, criando climas entre as pessoas não tão diferentes do que as artimanhas elaboradas por qualquer adolescente?

saudadepostzeca.jpgAh, a maturidade… Não foi Woody Allen que disse uma vez à revista “Vanity Fair” que, às vésperas de completar 70 anos, ele não tinha aprendido nada, e que repetiria os mesmos erros de antes, da juventude? Ter mais sabedoria na “idade de ouro”? Tudo bobagem, afirmou o diretor. Pois o filme de Laís só comprova que, quando se trata do coração, estamos condenados a ser eternamente adolescentes. Eu escrevi “coração”? Bem… pode substituir por “sexo”…

Sim, porque “Chega de saudade” é também sensual. Não no sentido que você está pensando: se o seu universo erótico está congelado entre os 18 e os 24 anos, eu só lamento… Dançando ali naquele salão, aquela turma “de idade avançada”, esbanja tesão – e se agarram, e se beijam, e passam a mão, e se roçam, e se galanteiam. E, mais de uma vez, você tem a confortável sensação de que nem tudo vai estar perdido lá na frente, quando cruzar a marca dos cinqüenta anos…

Mas o baile corre solto não apenas por conta dessa libido toda. A música ali é fundamental: uma seleção digna de uma bela festa! Entre apresentações ao vivo (viva Elza Soares!) e a seleção do DJ (Paulo Vilhena), a mistura é não só de estilos como também de décadas – quando não das duas coisas ao mesmo tempo. Que maravilha ouvir “Como uma onda”, de Lulu Santos, logo depois de “Carinhoso”, de Pixinguinha! Entre “hits” manjados e músicas que eu ouvi pela primeira vez (apesar de elas obviamente já terem sido compostas há anos), o melhor momento musical para mim veio no final, quando os créditos vêm acompanhados de uma versão “jovem guarda” de “Chega de saudade”. Seria um encerramento quase perfeito, se “Mon amour meu bem ma femme” (clássico de Odair José) não chegasse para se impregnar na sua memória, segundos antes de você deixar a sala de cinema.

Sou presa fácil para uma boa seleção musical, você me conhece. Mas o filme de Laís Bodansky me fisgou duplamente: pela trilha e pelo cenário. Em nome da transparência, admito que tenho uma ligação especial com o União Fraterna – um lugar onde já me apresentei dançando várias vezes (e se o fato de eu ter dançado chega como uma novidade e/ou ainda é capaz de chocar sua fina sensibilidade, dê uma olhadinha neste post. A atmosfera de um ambiente suspenso no tempo foi perfeitamente capturada em “Chega de saudade” e o prazer de dançar naquele espaço tão acolhedor – posso garantir – está estampado em cada cena.

No final, toda a experiência do filme, ao contrário (talvez) do último filme de Ashton Kutcher, fica com você por um bom tempo – um feito nada desprezível em tempos onde a oferta de filmes em cartaz é bem pouco memorável. Como já mencionei antes, tenho a consciência de que estou chegando atrasado no assunto – pode ser até que o filme, apesar de seu sucesso relativo de bilheteria, ele já esteja saindo do circuito principal de exibição esta semana (o que seria uma pena, pois muita gente ainda poderia se inspirar com ele no feriadão…). Mas, assim como teve gente que (como eu) correu atrás de “Jogos de cena”, quem sabe você não aceita essa contradança? Se não… tem sempre “Malhação”…

(Por falar em feriadão, sabe como é… primeiro de maio… vamos descansar? Vou aproveitar a “folga” para investir em Zuenir Ventura: revisitar “1968 – O ano que não terminou” e descobrir “1968 – O que fizemos de nós”, ambos recém-lançados. Adivinha sobre o que vou escrever na segunda que vem…)

Tem ouvido algum diálogo bom recentemente?

qui, 24/04/08
por Zeca Camargo |
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subtitles300.jpgNo mesmo vôo em que me deliciava com “Rua das flores”, de Miguel Souza Tavares, entre um naco e outro do livro – para descansar os olhos -, resolvi avançar um pouco mais num outro tipo de passatempo que inventei para me divertir em aviões. É simples – você também pode aproveitar a idéia, e não só em aviões: basta assistir a um filme qualquer, sem som e sem legendas. Só isso. Só a imagem. Com que objetivo? Vamos ver por onde eu começo…

Primeiro tem o prazer primário de se deleitar com o mero desfile de cenas. Como vários diretores já propuseram, intuitiva ou explicitamente, cinema pode ser simplesmente isso: uma narrativa feita de imagens. E não estou nem falando do revolucionário trabalho do artista americano Matthew Barney (também conhecido, dependendo das suas referências, como o sr. Björk), que faz verdadeiras sinfonias visuais (uma obra que você pode conhecer melhor no seu elaborado site). Pense em Wong Kar-Wai. Em David Lynch. Em D.W. Griffith. Pense em Humberto Mauro! – e lembre-se de me cobrar um dia um post só sobre “A velha a fiar”!!

Mas este não é um ensaio “cabeça” sobre cinema – aliás, muito pelo contrário, como você já vai perceber. “Inventei” (as aspas cautelosas, já que eu mesmo duvido que ninguém tenha feito isso antes) esse passatempo não como uma demonstração do poder da “sétima arte” (e se existe um predicado para cinema mais odioso que este, eu desafio você a me mostrar), mas justamente para constatar como muitos deles são ordinários – quando não, medíocres.

As primeiras experiências foram com filmes de ação. A “estréia” foi com “Demolidor – o homem sem medo”, aquele “clássico” de Ben Affleck (preciso explicar essas aspas?). E foi, obviamente, durante um longo vôo onde nem os livros nem as músicas foram suficientes para me entreter. A idéia surgiu sem querer: o passageiro do meu lado estava assistindo esse filme (com seu fone de ouvido, veja bem) e, na escuridão da cabine, as luzes que vinham da reduzida tela me chamaram a atenção. Você já passou por isso: ter seu olhar atraído para uma TV quase contra a sua vontade – seu glóbulos oculares seqüestrados por esse estranho magnetismo luminoso…

Enfim, dei uma olhada. Dei duas. E, quando percebi, estava praticamente acompanhando o filme pela tela alheia, sem nenhum áudio. Pensei: “bom, posso assistir ao mesmo filme daqui da minha poltrona, com o meu fone”… ou não! Para que som, se eu estava acompanhando tudo daquele jeito? Será que meu aproveitamento do filme seria diferente? Não quis nem testar: segui a sessão de “Demolidor” do meu lugar mesmo, sem o fone – e acabei de ver o filme sem maiores problemas de compreensão. Me diverti horrores…

Muitos outros títulos se sucederam: “Quarteto Fantástico”, “Homem-Aranha 2”, “As crônicas de Nárnia”, “A lenda do tesouro perdido”, “X-men 3 – confronto final”, “Transformers”, e até mesmo – heresia das heresias! – “O senhor dos anéis – as duas torres” (que eu não tinha visto no cinema na época do lançamento)! Todas, se é necessário acrescentar, experiências muito satisfatórias.

Antes que os fãs de cada um desses filmes se organizem num protesto coletivo, adianto que tê-los escolhidos para assisti-los sem áudio ou legendas não significa que eu os considero trabalhos menores. Sou fã de filmes de ação também – especialmente os que não me chamam de imbecil – e, quem sabe, se eu os tivesse visto no cinema talvez até tivesse gostado tanto quanto quando os assisti nessas condições. Mas você há de concordar que a maioria deles tem narrativas tão simples – e previsíveis – que eles podem ser desfrutados simplesmente com os olhos – e um pouco de raciocínio lógico (se tanto…).

zeca_enchanted300.jpgTalvez por isso, por ter me acostumado a repetir essa experiência, nesse vôo recente resolvi subir o patamar: impus a mim mesmo um novo desafio e encarei dois filmes ao mesmo tempo no avião – sem som e sem legenda, claro. Os escolhidos foram “Encantada” e “Beowulf”. Entenda: eu estava à mercê do cardápio cinematográfico da companhia aérea que viajava – e as opções eram fracas. A melhor delas, “Juno”, eu já tinha assistido (e adorado) e o resto era do mesmo nível que os dois que escolhi. Assim, quando dei uma “zapeada” e vi um longo e divertido número de música e dança de “Encantada” no Central Park (Nova York), não resisti a mais um “experimento” – afinal, musical é um gênero que eu ainda não havia testado! Quando vi, na tela do meu vizinho, que “Beowulf” também estava rolando, resolvi investir na “novidade” – e comecei a ver os dois filmes simultaneamente, em silêncio. E foi ótimo!

zeca_beowulf2_300.jpgQuer dizer, foi médio: “Encantada”, com sua nada complicada (porém engraçadíssima) trama oferecia uma compreensão bastante acessível – e divertida. Já “Beowulf”, apesar de momentos de virtuosismo na computação gráfica, é um porre: aquele avatar de Sean Connery, o nojento demônio (e põe nojento nisso), a rainha Wealthow (certamente a primeira personagem virtual a sofrer por excesso de botox) e todo aquele exército de guerreiros que tinham movimentos tão naturais quanto bonecos animados de decoração de Natal de shopping center… Francamente! (Para não dizer que a produção não tem mérito nenhum, os ângulos e os mergulhos de câmera eram alucinantes… mas só). Ainda assim, 50% de aproveitamento podem ser considerados um resultado positivo.

Pretendo, sem dúvida, continuar com essa brincadeira tanto quanto eu puder embarcar em vôos longos. Mas não quero com isso, celebrar uma nova maneira de assistir filmes. Aliás, nem poderia fazer isso, pelo simples fato de que eu sou um apaixonado por diálogos. Como qualquer um que já leu um post meu sobre livros sabe, sou uma presa fácil de um texto bom. Mas, sobretudo, a “arte do diálogo” me fascina. A primeira vez que reconheci essa paixão foi quando li, há anos, um clássico chamado “As ligações perigosas”, de Choderlos de Laclos. Não sabia que aquele filme com Michelle Pfeiffer, Glenn Close e John Malkovich era baseado num livro? Pois pode devorá-lo (a L&PM acaba de lançar uma nova tradução)!

Quem conhece a obra deve estar estranhando eu citá-la num texto sobre diálogos, sendo que o livro não traz nenhum… ou traz? O que são aquelas cartas trocadas entre os personagens da história, se não elaborados diálogos? Quando eu percebi isso, me encantei ainda mais com aquela leitura, e, a partir daí, comecei a prestar atenção em todas as formas de conversa: escrita, cantada, interpretada. E é isso que mais me seduz em uma obra. Nos livros, são tantos exemplos que eu precisaria dedicar um (ou mais) post(s) só para isso. Mas vou continuar falando de cinema, porque é o assunto de hoje. E porque, no feriado, peguei uma reprise de “Ponto final”, Woody Allen.

Todo o filme é genial, eu sei. Mas tem uma cena em especial, aquela em que Scarlett Johansson vai tomar um drinque com Jonathan Rhys-Meyers logo depois que ela sai de um teste como atriz. Que diálogo! Quanta coisa eles trocavam numa conversa que, se ouvida displicentemente, parecia sem nenhuma conseqüência! Que maravilha de duelo verbal – e que trabalho de lapidação das palavras!

Concordo que usar Woody Allen para falar de diálogos brilhantes é uma covardia. Das interações mais ordinárias (como a cena em que Judah, o personagem de Martin Landau, encontra a aeromoça Dolores, vivida por Angélica Huston, em “Crimes e pecados”) a roteiros inteiros (“Noivo neurótico, noiva nervosa”), passando pelos mais absurdos (ator no filme e espectadora na platéia falando entre si, em “A rosa púrpura do Cairo”? Por que não?), poucos são os diretores que dominam tão bem a arte de dialogar nas telas como Allen. Mas pode lembrar de qualquer outro filme bom que você tenha assistido ultimamente: aposto que ele contém uma conversa genial.

“Juno”? Lembra quando ela conta para os pais que está grávida? “Sangue negro”? Como esquecer a conversa que leva ao clímax final? “Piaf”? O que era a cantora, verborrágica, no primeiro encontro com seu grande amor, o boxeador Marcel Cerdan? “Conduta de risco”? Para mim o que deu o Oscar a Tilda Swinton foi seu desmoronamento durante o diálogo final com George Clooney (Michael Clayton). A lista é enorme – e, como sempre, eu gostaria de saber qual é seu diálogo favorito no cinema…

Enquanto espero seu comentário, sigo preenchendo qualquer momento livre que tenho com episódios de “Seinfeld”. Explico: ganhei (de aniversário, de um casal amigo que tem minha eterna gratidão) uma caixa completa com todas as temporadas do “sitcom” americano, que eu acho que é uma das coisas mais bem escritas que já apareceu em televisão. Não sou nem louco de querer começar a falar de “Seinfeld” a essa altura do texto (espaço! espaço!) – pode deixar que eu, aumentando minha lista de promessas, ainda vou dedicar um post só sobre isso (quem sabe quando eu acabar de assistir “a caixa”).

Mas, só para despedir, destaco aqui uma conversa entre Seinfeld e Elaine, que abre um episódio que eu ainda não tinha visto – um mais antigo, no qual os dois decidem transar. Você pegou esse? É sensacional: toda a introdução é um “duelo” entre eles para discutir a possibilidade de sexo, sem nunca falar a palavra. É quase o antidiálogo, no qual o que se quer discutir nunca é dito, mas tudo fica entendido. Já viveu uma situação assim?

O fado

seg, 21/04/08
por Zeca Camargo |
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Não existem mais segredos na internet. O que não é uma novidade, eu sei. Mas, com a foto do post anterior, eu tinha uma mínima esperança de dificultar um pouco a revelação do lugar onde eu a tirei. Mas eis que logo no quarto comentário, alguém que assina como Dan (Daniel? Danielle?), mesmo sem ter feito uma “pesquisa confirmatória” acerta de cara: eu estava no Centro Cultural de Belém, em Lisboa. É verdade que, como eu pedi, a resposta poderia ter sido um pouco mais específica – afinal eu estava diante de uma imensa obra do artista americano Frank Stella, chamada “Severambia” (1995), que faz parte do impressionante acervo da coleção Berardo, abrigada no centro cultural. Mesmo assim… bravo!

Num outro comentário posterior, Alessia acertou até a Coleção Berardo. Tecnicamente, para responder corretamente, ficaram faltando ainda a obra e o artista que, embora não esteja na minha lista dos 30 artistas americanos mais interessantes do século passado, tem um estilo relativamente fácil de ser reconhecido. Mas já eram dois que acertavam… E olha que eu me esforcei para disfarçar – usando, inclusive, a foto do trajeto do avião quando ele passa sobre Cabo Verde (não foram poucos os que arriscaram que eu estava em Mindelo – a “capital cultural” cabo-verdiana, como sugere a wikipédia), uma rota obrigatória quando se voa sobre o Atlântico entre Brasil e Europa.

Ou talvez eu não tivesse disfarçado tão bem assim, pois sempre que volto de Portugal, trago a própria felicidade estampada no rosto – felicidade essa que deve vazar de alguma maneira para o que eu escrevo… Aliás, se eu começasse a escrever de Portugal de uma maneira geral aqui, você iria finalmente proferir com propriedade a reclamação: “Caramba Zeca, esse post tá longo demais!” – e eu ia ter de concordar…

Pois fato é que eu adoro Portugal – um país que eu conhecia apenas superficialmente até 1998, quando então (nossa! já se vão dez anos!) eu fiz uma série de reportagens para o “Fantástico” chamada “Aqui se fala português”. Viajando pelos PALOPS (“apelido” das ex-colônias portuguesas que, ainda que cambaleando, mantiveram alguma ligação com a “nossa” língua), Lisboa era o ponto de conexão constante, claro. Durante esse projeto, passei mais de dez vezes pela capital portuguesa e, para roubar uma expressão tão querida de lá, “apaixonei-me imenso” por tudo que se refere “à terrinha”.

E como não se apaixonar? Os laços – mesmo descontando todas as piadas que você possa ter no seu surrado repertório – são fortíssimos. Nós, brasileiros, somos queridíssimos por lá. Há as referências arquitetônicas, culturais, gastronômicas, históricas, genealógicas (em muitos casos), lingüísticas, poéticas… E sobretudo há a música, o fado!

Eu estava meio sem saber como introduzir essa minha paixão por Portugal para você, quando esbarrei numa excelente (pronunciado “echhhlêint”, num bom sotaque lisboeta!) oportunidade: ao voltar de Lisboa, na sexta-feira da semana passada, fui abordado por alguém que estava organizando um pequeno concerto de uma cantora de fado em São Paulo, logo na segunda-feira seguinte. Não me lembro de ele ter dito o nome da cantora – ou então eu fiquei tão entusiasmado com a possibilidade de o convite estender minha recente experiência portuguesa, que eu não o registrei…

mafaldava.jpgSó sei que sete dias atrás eu estava sentado em um espaço num hotel de São Paulo ouvindo Mafalda cantar o fado. Seu nome completo é Mafalda Arnauth, mas com a intimidade que os bons artistas conseguem estabelecer quase que instantaneamente com seu público, todos a conhecem, claro, apenas pelo primeiro nome. Eu mesmo, não sendo um grande entendedor de fado, já havia ouvido rasgados elogios a ela, e estava com a expectativa lá em cima para a performance.

Nessa semana que passei em Portugal, o fado tinha tido apenas uma participação coadjuvante. Durante uma breve (brevíssima) passagem pelo Porto, meu irmão e uma prima minha tinham se perdido do grupo com o qual eu viajava por algumas horas. Vagas mensagens de texto pelos celulares explicavam superficialmente que eles haviam se encantado com uma apresentação de fado – e iriam nos encontrar só mais tarde. Parecia apenas uma desculpa para se atrasar para um compromisso – era o meio da tarde, e era bastante improvável que eles tivessem topado com uma casa de fados aberta àquela hora… Quando nos reunimos no jantar, porém, veio a prova: registradas na câmera do meu irmão, vi as imagens de um distinto senhor, vestido de maneira simples, porém formal, cantando aparentemente de improviso para um público escasso que se distribuía preguiçosamente nas mesas de um bar que parecia ter sido cavado na pedra.

Se a descrição da cena parece surreal, te garanto que a própria imagem era mais ainda. Mas o mais importante é que a interpretação era tão forte (e, ao mesmo tempo, tão econômica), que me lembrou o incrível personagem criado pelo escritor argentino Tomás Eloy Martinez, no recomendadíssimo “O cantor de tango” (Companhia das Letras) – um certo Julio Martel… Com pouquíssimos recursos, esse senhor (o do Porto), que eu via na diminuta tela daquela câmera – bem como, segundo o relato do meu irmão e minha prima, tantos outros que passaram por aquela “tasquinha” naquela tarde no Porto –, dava um show de emoção.

Não esperava de Mafalda nada menos do que isso. E já na primeira canção, soube imediatamente que não iria me decepcionar. Uma mulher belíssima, de traços fortes e corpo largo e delicado que define o espaço à sua volta, Mafalda entrou já no clima de aproximação. Ao contrário do clichê que geralmente se associa a um fadista, ela logo rejeita a teatralidade gratuita (atalho fácil para remeter o público à angústia da maioria dos clássicos desse repertório) para estabelecer um contato direto com quem a assiste – e a chave para isso é a simpatia. Ou, pelo menos, este é o primeiro registro, porque em seguida você se vê hipnotizado por uma voz poderosa, que carrega você por poesias “nunca dantes navegadas”.

Não sem uma certa dificuldade, é verdade. Mas isto, pelo menos para a maioria dos ouvidos brasileiros, faz parte do prazer de ouvir o fado: perceber-se envolvido por uma sonoridade que cá e lá empresta uma chave para sua compreensão, o sutil alívio de uma palavra cristalina, capaz então de desvendar o significado de todo um poema cantado. Foram muitos os momentos assim proporcionados por Mafalda, na noite da última segunda-feira.

E mais: a certa altura a fadista chama uma das minhas cantoras brasileiras favoritas para uma participação especial, Olivia Bayington – sim, a mesma Olivia que cá me escreveu um comentário na semana passada e que (“revelação final”!) eu já admiro de longe como fã e eventualmente de perto pelos “amigos que são amigos” (uma curiosa coincidência, ou melhor, descoberta “familiar”, me colocou ainda mais próximo dessa artista maravilhosa, mas isso fica para um outro post – por enquanto, se quiser conhecê-la ainda melhor, visite o seu MySpace. Enfim, as duas juntas naquele pequeno palco celebraram um brilhante poeta português, Tiago Torres da Silva, e cantaram juntas uma música que eu achei que seria o ponto alto da noite. Mas coisas ainda mais bonitas viriam – e olha que mais bonito que o encontro delas estava difícil de imaginar…

Por exemplo, quando Mafalda, anunciando um pequeno intervalo para si, chamou o momento que, segundo ela, num show de fado geralmente é conhecido por “guitarrada” – mas ela preferia chamar de “magia”… Parece piegas? Ora pois… Nos quase dez minutos que os três músicos ficaram sozinhos, eu fui apresentado para um outro patamar de música. Por mais que eu gostasse de fado, confesso que nunca separei o som dos instrumentos da cantoria – mas naquele momento eu estava diante de uma prova irrefutável de que aquilo que saía daquelas cordas era mais do que um simples acompanhamento…

Era como se eu estivesse ouvindo um nova língua muito elaborada – basco? tâmil? klingon? – sendo falada numa velocidade absurda e fascinante. Foi como se eu tivesse descoberto as infinitas possibilidades da música – pela primeira vez (uma experiência que eu vivo de vez em quando, seja num show dos Arctic Monkeys que eu vi no ano passado, ou numa festa popular em Tuvalu – um episódio de 2002 que um dia ainda vou contar por aqui). Eu, mero espectador, olhava extasiado para aquelas guitarras conversando livremente, quase esnobando quem estava de fora, tão atônito quanto eu…

Não era, claro, esnobação. Era arte. Uma arte que Mafalda ainda retornaria ao palco para celebrar num final muito alegre e feliz.

São muitos os fadistas que valem a pena ser ouvidos – Camané, Ana Moura, Mariza, apenas para citar alguns –, mas acho deixo isso com você: essa busca deve ser pessoal. Eu sei bem a inspiração que o show de Mafalda trouxe para mim – só posso torcer para você descobrir algo parecido… E que também, seja pelo fado ou por tantos outros aspectos dessa cultura que eu ainda espero discutir aqui, você se apaixone cada vez mais por Portugal.

Como sobreviver a um longo vôo diurno (de onde eu vim mesmo?)

qui, 17/04/08
por Zeca Camargo |
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zecacamargomindelo17042008.jpgAh… a tortura de viajar de avião… Já ouviu isso antes? Pois essa é a reclamação que mais me tira do sério! Voar significa ir para um lugar diferente, conhecer coisas novas, rever um endereço favorito, reencontrar um amigo ou um familiar querido – enfim, sair da sua rotina. E quer algo melhor que isso? Saber que no destino da sua chegada está um prazer tão grande como esses que listei já é o suficiente para espantar qualquer inconveniente de passar nove, dez, doze horas – ou mais – num avião. E mesmo no trajeto de retorno, quando o objetivo é chegar na sua casa, você tem o registro da viagem, mais a expectativa do retorno ao seu ponto de referência maior – o que são algumas horinhas suspenso no ar?

Ainda mais quando se está bem acompanhado – e isso não é uma referência ao “clássico” filme de 1974, “Emmanuelle” (citação gratuita só para dar trabalho para você no Google!).

Primeiro, tem a música – o que, como ficou claro nos comentários mandados sobre o último post, mesmo diante da oferta abundante que encontramos hoje, está longe de ser obsoleta ou irrelevante (alguns exemplos: “têm sempre músicas de gente que nem somos muito fãs que marcam nossa vida, e essa é a graça”, escreveu a Kely; “o gosto de tirar um CD da sua banda favorita do plástico e ouvi-lo pela primeira vez, como se fosse a última coisa a se fazer no mundo…”, descreve o Jr; “Tenho um apetite voraz por novas músicas, novas tendências, mas principalmente por qualidade musical. E por isso namoro cada nova descoberta que atenda a esses quesitos. Talvez seja interessante frear um pouquinho nossa pressa e degustar melhor nossas descobertas”, aconselha Marina Guimarães; e, só para citar mais uma, tem a história que melhor ilustrou o que eu queria dizer na segunda-feira, a do Bruno Perillo contando do seu amigo que tem tudo de David Bowie no seu computador – mas quem disse que ele escuta…).

Num vôo longo (ou mesmo uma ponte aérea) qualquer MP3 torna-se um item mais imprescindível do que aquelas máscaras de oxigênio que “em caso de despressurização, automaticamente cairão à sua frente”… Desde que, claro, sua seleção seja boa (como escreveu a Edna – só para citar mais um comentário -, “ouvir música não é o problema, ouvir música RUIM é que é !”). Os filmes disponíveis no sistema de “in-flight entertainment” (adoro esse nome!), nem sempre são os mais interessantes…), mas quebram um bom galho (se bem que eu já vi – pasme! – o belíssimo “Primavera verão outono inverno primavera” uma vez de Londres a Bangcoc; e rever algo maravilhoso que te encantou na “telona” – como “Piaf”, por exemplo -, apesar de nem chegar perto da experiência original, também mal não faz).

Mas se nem música nem imagem bastam, têm sempre as palavras…

Elas foram minha salvação nos longos vôos recentes que eu fiz, todos diurnos – tanto os da passagem, há três semanas, por Nova York, como essa última, cujo destino eu vou comentar daqui a pouco. Viajei na companhia de dois consideráveis volumes – um de 480 páginas e outro com 608 (fora os apêndices) – e, estes sim, foram meus grandes companheiros nesses esticados trajetos. Permita-me então recomendá-los para sua leitura – ainda que não necessariamente de bordo…

filhosimperador17042008.jpgO primeiro deles – o de 480 páginas – é “Os filhos do imperador”, de Claire Messud (editora Nova Fronteira). Estava de olho neste livro desde que a revista “The Economist” o selecionou como um dos melhores livros de 2006 (sim, eu diria que a tradução demorou um pouco a sair aqui no Brasil…). Pelas resenhas que havia lido sobre “The emperor’s children” (seu título original), eu não imaginava que esse trabalho fosse passar pelo crivo da “Economist”. Afinal, tratava-se de uma crônica social contemporânea, ambientada em Nova York, onde personagens ambiciosos, beirando os 30 anos, digladiam-se em ridículas disputas sociais/sexuais/ intelectuais – ah! e com uma pitada de 11 de setembro para dar uma atualizada no painel que a autora queria mostrar. Até as comparações com a obra máxima de Tom Wolfe, “A fogueira das vaidades”, me pareciam exageradas, e assim resolvi dar um tempo, antes de adquiri-lo.

Foi por impulso então que, embarcando para Nova York, peguei o livro na minha sempre crescente pilha de “coisas que quero ler um dia” (refiro-me à edição de capa mole americana; ainda não tinha visto a tradução nas livrarias brasileiras). E já nas primeiras páginas, me arrependi de ter adiado por tanto tempo (quase o ano) o prazer de me envolver com esses personagens aparentemente tão fúteis, mas, numa segunda análise, bastante representativos do que passa hoje por uma intelectualidade liberal urbana. O cenário, claro, é (na maior parte) Manhattan – mas eu não tive dificuldades em relacionar personagens como Marina, Danielle e Julian a pessoas reais nos círculos que freqüento entre Rio e São Paulo – e tenho certeza de que a mesma identificação pode se estender a Porto Alegre, Recife, Brasília ou qualquer outro centro de poder e cultura, seja no Brasil ou no mundo.

Mas o que faz esses personagens fascinantes não é apenas a caótica movimentação deles por uma cena social porosa, sedutora e frágil. Na escrita de Messud eles nos são apresentados como figuras muito mais interessantes que a sua banalidade aparente. Sim, eles são banais – e vão “piorando” à medida que a história avança. Mas por que você vai ficando cada vez mais interessado neles? Só pode ser pelo talento da autora! Quando “Os filhos do imperador” se aproxima do desfecho, você está irremediavelmente envolvido não só com esse trio, mas também com o excelente elenco “coadjuvante” (Frederick Tubb é meu favorito). Não é à toa que o final parece abrupto demais…

Desejando mais – mas procurando em outras praias -, encarei, para outro vôo longo, o novo romance de Miguel Souza Tavares, “Rio das flores” (o tal de 608 páginas). O nome lhe é familiar? Pois deveria ser: este escritor português escreveu um dos livros mais saborosos “na nossa língua” deste século: “Equador”. Se você adora ler, é bem possível que tenha esbarrado nesse trabalho. Lançado aqui em 2004 (pela editora Nova Fronteira), “Equador” é uma fascinante história que se passa no início do século 20, na então colônia portuguesa de São Tomé e Príncipe. O cenário é exótico, mas a narrativa é especial não apenas por isso. Tavares tem o dom de construir (ainda que nem sempre em profundidade) personagens simples e cativantes e jogá-los em conflitos que apenas parecem ordinários, mas que, na verdade, convidam o leitor a interessantes reflexões. E tudo com um pano de fundo histórico que não é nem didático demais nem apenas “decorativo”. Viajar nas suas histórias é uma imersão num imaginário passado – mas não apenas contemplativa: é como se as cenas e os diálogos fizessem parte da nossa memória, e Tavares está lá apenas para nos ajudar a lembrar de tudo.

Em “Rio das flores” não é diferente – e o meu (e possivelmente o seu) envolvimento com o livro tem um potencial ainda maior, uma vez que a saga dessa família alentejana passa – “con gusto” – pelo Brasil. Porém, assim como na história de Claire Massud, personagens, cenários e enredo não explicam todo o fascínio da leitura. Tanto quanto a autora de “Os filhos do emperador”, Tavares não pára de oferecer palavras e frases preciosas – muitas delas em construções quase estranhas, uma vez que li a edição portuguesa (a brasileira ainda não saiu, mas se você é fã do escritor, também já pode encomendar a sua no site da Livraria Bertrand), mas nunca menos que caprichadas.

Exemplos? Logo no início, ao descrever a movimentação da noite de Sevilha (Espanha) num longínquo setembro de 1915, Tavares chama a atenção para esse retrato: “jovens moços, vestidos pobremente de toureiros sem quadrilha, caminhavam em grupos de dois ou três, com um olhar que suplicava a glória de uma tarde ou mesmo a glória de uma morte numa tarde de arena”.

Na morte do patriarca Manuel Custódio Ribera Flores, é assim que o autor descreve o que passava pela cabeça da viúva: “Junto ao corpo do morto, chorava o seu próprio corpo, que via ao espelho ainda jovem e apetecível, em que as ancas ainda não haviam arredondando desproporcionalmente com os partos, o peito não descaíra como se fosse velha, as pernas não tinham perdido a sua rigidez de sempre, o pescoço não ganhara rugas, nem as costas acumulavam cansaços incuráveis”.

zecacamargoondeestoumenor17.jpgE que prazer descobrir numa carta de Diogo (o personagem que conduz a maior parte da história), escrita para sua mulher Amparo em 1936, esse registro de sua passagem pelo Rio de Janeiro: “Acima de tudo, para além da beleza da paisagem, da alegria das pessoas, da língua e da música extraordinárias, o que mais me fascina é a sensação de país novo, onde tudo pode ainda ser sonhado e concretizado”.

Ah, Diogo, se você passasse por aqui hoje…

Bem, mas eu divago… Vejo que o texto de hoje já se alonga – e eu ainda nem joguei as perguntas que venho ensaiando há dias: por onde estive viajando na semana passada? Em que itinerário tive o prazer de ler “Rio das flores”? Assim, para encerrar, aqui estão elas. Uma rápida olhada na internet pode dar algumas pistas – quem é que consegue fazer alguma coisa escondida hoje em dia… Mas não basta apenas dizer o país que visitei! Para me despedir depois dessas nem tão breves sugestões de leitura, quero “exigir” aqui uma resposta bem precisa com relação à foto ao lado: “onde eu estou?”. Você tem o fim de semana todo para tentar descobrir…

Será que estamos ouvindo música demais?

seg, 14/04/08
por Zeca Camargo |
categoria Todas

Foi a melhor festa do mundo. A do meu aniversário, claro. Com a minha seleção de música, mais a que você mandou em resposta ao último post, não tinha como não ser boa a festa. Afinal, foram… quantas músicas mesmo? Façamos as contas: até publicação deste post, 142 comentários. Muita gente mandou uma lista como a minha, de cinco músicas. Outras mandaram mais – ou apenas um “parabéns” (sempre bem-vindo), e alguns ainda indicaram repertórios inteiros de um artista (Gustavo, por exemplo, declarou: “minha lista só tem Mariah Carey”!). Mas vamos tirar, por cima, uma média de três sugestões por comentário – o que dá 426 canções! Não dá uma boa festa?

Porém, de volta da semana de comemorações (da qual alguns aspectos serão comentados aqui a partir do post da próxima quinta-feira, com um já tradicional “onde eu estou?”), fui tomado de uma curiosa inquietação. Como qualquer bom questionamento, esse já se desenvolvia em esboços há algum tempo. Mas foi justamente a avalanche de músicas das listas enviadas nos últimos dias que detonou uma observação mais “profunda” da questão que joguei no título acima: será que estamos ouvindo música demais? A primeira de uma série de perguntas musico-filosóficas (!?) que, cada uma a seu tempo, eu pretendo trazer aqui.

fila-de-discos-1.jpgEnquanto escrevo, tenho diante de mim uma pequena pilha de CDs que adquiri recentemente (em viagens, compras pela internet – e um até que ganhei de presente). São eles: Crystal Castles (álbum homônimo); Battles, “Mirrored”; MGMT, “Oracular spetacular”, Ghostland Observatory, “Robotique majestic”; Neon Neon, “Stainless style”; e Erykah Baduh, “New Amerykah part one”. Estou olhando para ela, a pilha, meio desanimado, pois apesar de ter ouvido todos eles, não consigo me lembrar exatamente da experiência individual que cada um me proporcionou.

Sim, Erykah Badu, nem que seja apenas pelo brilho misterioso da sua voz (e de seu estilo), se sobressai. Mesmo assim… “Dancing on my grave”, faixa de “Robotique majestic”, tem um refrão levemente memorável. As incursões psicodélicas pesadas do Battles também são fáceis de lembrar – embora eu seja, a essa altura, incapaz de reproduzir uma frase musical deles. Crystal Castles e Neon Neon deixaram registros ainda mais insignificantes – como se eu os tivesse escutado ao mesmo tempo, em “players” diferentes, sem ter feito a menor diferença.

Seria fácil jogar a culpa nesses artistas – cambada de gente sem talento incapaz de produzir algo que possa conquistar uma categoria além do descartável (se bem que o adjetivo, pelo menos no pop, nem é de todo mal). Alguns dos “hits” mais marcantes de toda a história do gênero não são mais do que isso: descartáveis; pense em “Please mr. Postman”, das Marvelettes, no comecinho dos anos 60; ou “Love will keep us together”, de Captain & Tennille, nos 70; “Kharma chameleon”, do Culture Club, nos 80; “All that she wants”, do Ace of Base, anos 90; ou mesmo, já neste nosso século 21, algo como “Dragostea tin dei”, dos romenos do O-zone (e não venha demonstrar choque ou espanto de saber que essa música originalmente não é do Latino). Se alguns desses artistas da pilha de CDs à minha frente tivesse me oferecido um “hit” tão descartável e tão bom quanto esses que juntei aleatoriamente no parênteses anterior, eu estaria feliz. Porém, nem por isso, eu colocaria a responsabilidade desse “baixo recall” neles.

Afinal, mesmo em relação a alguns dos melhores discos de 2008 (e mesmo em abril já temos música boa o suficiente para uma lista de melhores do ano, muitos deles já exaltados aqui mesmo neste blog), eu tenho de confessar que mal dei a eles a atenção merecida. Numa lista rápida dessas imperdoáveis negligências coloco Lightspeed Champion, “Falling of the lavender bridge” (das poucas coisas recentes que merecem os adjetivos “brilhante” e “inventivo”); Vampire Weekend (cujo álbum homônimo resgata o prestígio do rótulo “art rock”); a inacreditável coletânea de pop espanhol dos anos 60, “Papagayo!”; e sobretudo o indescritível trabalho do espanhol Pablo Díaz-Reixa, o cara por trás do inexplicável El Guincho, com seu “Alegranza!” – um álbum que, desde a primeira audição me fez cair de joelhos e pedir sem pudor: “Leve-me ao seu líder!” (só para te dar uma idéia, perto de El Guincho, The Avalanches parece tão linear quanto o “Tema de Lara” tocado em uma flauta doce).

Pois nem essas modestas obras-primas eu ouvi direito!

fila-de-discos-2.jpgE de quem é a culpa? Minha talvez… Ou será que divido essa responsabilidade com esses tempos alucinados em que é possível ouvir qualquer coisa, a qualquer hora, numa fração de tempo tão rápida quanto a que levamos para desistir dessa mesma coisa? A pergunta, claro, é para você também: como anda escutando música ultimamente?

Enquanto você elabora uma resposta (que já te convido a mandar como comentário), permita-me uma rápida lembrança… Um tempo não muito longe – pelo menos no calendário – em que receber um disco novo tinha a importância de uma cerimônia religiosa. Acredite: mesmo nos anos 80, conseguir pôr as mãos em um álbum de uma banda alternativa (inglesa ou americana) não era algo simples. As gravadoras ainda levavam meses para lançar algo mais ousado no Brasil (e, quando lançavam, mesmo com uma repercussão boa da mídia – que na época se resumia aos cadernos culturais de jornais diários –, as edições eram tão pequenas que se você bobeasse perdia a oportunidade de comprá-la nesse estabelecimento em extinção: as lojas de disco). E quem sabia de alguém que ia viajar para o exterior – principalmente Estados Unidos e Inglaterra –, apressava-se em entregar uma lista de encomendas prometendo pagas que iam das mais repugnantes tarefas domésticas aos mais sórdidos favores sexuais – se pelo menos parte dela retornasse sob forma de vinil na bagagem do viajante.

E quando os discos chegavam, iniciava-se um ciclo ritualístico que começava com a primeira (e solene) audição; depois vinham duas ou três repetições consecutivas da mesma audição (“para fixar”); e aí o álbum entrava numa cabalística classificação numa secreta lista de preferência – que iria determinar então quantas vezes aquele artista seria ouvido a cada semana.

Quem acha que eu estou exagerando é porque não leu (nem viu a razoável adaptação para o cinema de) “Alta fidelidade” – a semi-ficção de Nick Hornby que é a biografia não-autorizada de todos nós que um dia já queimamos uma seleção de músicas (ou, como diriam os povos antigos, “gravamos uma fita cassete”) para dar de presente a alguém.

Contudo, evoco essa época não num arroubo de nostalgia – você que já me acompanha aqui há algum tempo sabe que não tenho tempo (e nem aprovo) aquele tipo de saudade gratuita que parece sugerir algo na linha “os bons tempos não voltam mais”… Puxo essa lembrança mais para refletir sobre como mudaram os hábitos de ouvir música. E você sabe do que eu estou falando…

Quantas canções de uma determinada banda (ou um determinado artista) você ouve até o fim ao encontrá-lo no myspace ou na lastfm? Quando tempo você agüenta antes de clicar na faixa seguinte para conferir se essa banda (ou esse artista) realmente te entusiasmou? Ou ainda, uma vez que você decidiu que gosta daquele som, e baixou ou comprou (virtual ou fisicamente) o trabalho daquela banda (daquele artista), quantas vezes você parou para ouvi-lo com atenção? Quantas vezes uma determinada canção entrou no “shuffle” do seu iPod? Quantas músicas “favoritas” dos últimos cinco anos você consegue cantarolar de memória? Qual foi a última vez que você parou tudo e falou: agora vou ouvir música?

Perguntas cruéis, eu sei – mas são questões que eu faço a mim mesmo, e que agora, com essa pilha de CDs ainda hoje intocada (nos dois sentidos!) eu tive vontade de dividir com você.

Há pouco tempo, numa conversa em altas horas, depois de alguns copos de vinho, reclamei displicentemente com uma amiga que estava faltando música na minha vida. Ela, respondendo na mesma freqüência, não tardou em concordar: “É isso mesmo, tá faltando música na vida da gente!”. Naquela noite, nos demos por felizes com este “momento eureka!” – apenas para nos reencontrarmos dias depois e constatarmos, um pouco decepcionados, que o problema não era a falta de música, mas o excesso dela.

Será que estamos “empanturrados” de tantos sons? “Entupidos”? “Fartos”? “Supersaciados”? Alguém tem um adjetivo melhor?

Quem dera eu tivesse uma resposta… Na esperança de encontrar na própria música algum alívio para tantas aflições (!) acho que vou criar coragem e encarar novamente um desses CDs na minha frente. E se não der certo, vou colocar El Guincho em “loop” no iPod – e celebrar, como já o fiz no meu livro “De a-ha a U2”, o prazer de ficar perdido em música…

5 para 45

seg, 07/04/08
por Zeca Camargo |
categoria Todas

Conforme o combinado… Nesta véspera do meu aniversário, quando então dei a mim mesmo uma folga de uma semana (!), marco presença rápida aqui apenas para “oferecer” a música de Jovanotti que ficou faltando: “Ragazzo fortunato”, que é aquela que eu gosto de achar que ele fez para a minha pessoa. E para tantas outras pessoas, claro, que dividem comigo a estranha (e rara) crença de que as coisas do mundo, em geral, conspiram a seu favor.

Sei que isso pode soar meio inocente, ainda mais em tempos onde a maioria das pessoas acreditam justamente no contrário: que tudo conspira contra você… Bom, não quero convencer ninguém, mas minha certeza é outra: a de que as coisas sempre dão certo. E tenho dito – pois estou vivendo isso neste exato momento em que escrevo isso. E, quando alguma coisa dá certo, a gente tem que celebrar! Por isso, separei uma pequena lista de apenas cinco músicas (seis com a do Jovanotti, claro) que me transmitem o espírito da celebração. Talvez você não conheça todas elas – talvez você se assuste com uma delas -, mas eu sugiro que você corra atrás… e faça sua festa. Aliás, tenho certeza de que você tem a sua música favorita para celebrar os bons momentos – se quiser mandar sua sugestão, quem sabe minha festa não fica ainda mais animada? Bom, aqui vai minha lista inicial (o resto é com você) e… até segunda que vem!

“Loaded”, Bran Van 3000
“Estamos juntos”, Léo Garcia
“Ring bell”, Miriam Makeba
“Nights of the living dead”, Tilly & the Wall
“Xote da alegria”, Falamansa

Como minha avó numa foto quando moça

qui, 03/04/08
por Zeca Camargo |
categoria Todas

Não tenho talento algum para a música – isso é um fato. Dispersas aulas de violão na tenra infância já sinalizavam isso: não passei dos primeiros acordes de “Casinha pequenina”, para o desespero da minha professora que certamente tinha, diante de mim, o maior desafio de sua carreira. Um piano “de parede” surgiu alguns anos depois na minha casa, esboçando a promessa musical do meu irmão mais novo. Mesmo ciente de que “aquilo” não era para mim, de vez em quando arriscava um “Bife” (meu sonho mesmo era poder tocar os primeiros acordes de “Love is blue”, mas…). Tal prática, claro, só aumentava minha distância do universo musical – apesar de “colateralmente” me aproximar, com entusiasmo, do papel de ouvinte. Piano, violão, ou mesmo flauta (doce, claro) e alguma percussão (outras tentativas fracassadas ainda no esboço) – nada disso, porém, me deixou tão frustrado quanto minha total incapacidade de cantar.

lorenzo-blog.jpgO motivo pelo qual divido essa enorme decepção com você é que acabo de ouvir “Safari” (2008), o novo disco do melhor ídolo do pop italiano, Lorenzo “Jovanotti”. Nenhum outro artista me inspira tanto a insistir no erro de cantar suas músicas em voz alta – coisa que faço a plenos pulmões e a duras penas (um castigo para meus próprios ouvidos; amigos que, desavisados, não podem escapar de um improviso destruidor; e ainda inocentes desconhecidos que eventualmente estão presos num engarrafamento ao lado do meu carro). Com essa nova leva de canções, a lembrança do meu fracasso como vocalista volta ainda mais forte – e basta você ouvir apenas uma de suas músicas (já já faço um guia rápido de faixas fundamentais para os iniciados) para entender o que acontece comigo.

Esbarrei com Lorenzo há alguns anos em Sevilha – numa daquelas coincidências que, como você que me acompanha aqui sabe, sempre permeiam minhas experiências culturais. Passava um fim de ano com um grupo de amigos pela Andaluzia e, justamente na noite do réveillon, enquanto improvisávamos uma ceia no quarto do hotel (antes de sair para a grande festa popular na “Plaza del reloj”), na TV (sintonizada na MTV espanhola) começou a passar um videoclipe de algo que se chamada “Serenata rap” (clique aqui para assistir). O nome do artista era ligeiramente familiar (só semanas depois fui conectá-lo a uma mini-onda musical do início dos anos 90, chamado “italo disco” – algo promovido pela extinta e gloriosa revista “The Face”), mas a música dispensava apresentações: era simples, bonita, levemente dançante, com um vocal totalmente sedutor – e, ainda por cima em italiano!

Talvez você seja jovem demais para se lembrar, mas houve uma época em que a canção italiana teve uma dimensão mundial – eu mesmo era meio… jovem nos anos 60, mas me lembro de vários sucessos que “vazaram” para os anos 70 – e não estou falando só de Rita Pavone. Depois disso, porém, o boom do pop italiano chegou ao Brasil ou via Laura Pausini (que já fazia sucesso mas teve um reconhecimento ainda maior quando recebeu o aval de uma “cover by” Renato Russo – lembra de “Strani amori”?) ou por uma regravação de um grande sucesso italiano em português – algo que os fãs dos artistas que assinavam as versões nem desconfiavam (levante a mão quem sabia que “Quando você passa”, de Sandy & Junior, tem passaporte italiano?).

Fiz essa “mini retrospectiva” apenas para lembrar que sempre se fez coisa boa por lá, pela Itália – das mais bizarras trilhas sonoras (que tiveram seu período de ouro nos anos 70 – especialmente nos filmes de terror, faroeste e… eróticos!) ao pop mais descarado. E, como se eu precisasse de mais uma prova disso, naquela noite em Sevilha, eu estava sendo apresentado a Jovanotti – ou Lorenzo (sempre existe a possibilidade de ele mudar de nome a cada novo trabalho). Começava o ano de 1994 e, embora seja difícil você conceber isso, encontrar um disco de um artista não era uma simples questão de “dar um google”.

Tive de fazer um certo garimpo para achar Lorenzo (discos italianos – até hoje – não são artigos fáceis de serem encontrados por aí – nem mesmo na Itália), mas cada vez que descobria um CD seu, a recompensa era enorme – ouvir um disco inédito seu é uma das experiências mais excitantes que gosto de repetir de tempos em tempos, já que ele costuma vir com algo novo a cada um ou dois anos. Tenho tudo desse artista – e ele é um dos poucos que me fazem sentir “na obrigação” de consumir tudo que lança. E nunca me decepciono.

E a cada novo trabalho de Lorenzo/Jovanotti renovo a lembrança da minha incapacidade de cantar sequer um refrão com um mínimo de afinação. Mas como resistir? “Safari”, por exemplo, tem pelo menos três canções que eu venho assassinando desde que comprei o CD na viagem recente a Nova York: “Fango”, “Punto” e “Come musica”. A primeira tem um introdução meio mantra que volta hipnoticamente a cada estrofe e praticamente te obriga a decorá-la – mesmo em italiano: sem muita resistência, quando você percebe já está repetindo: “Io lo so che non sono solo / anche quando sono solo”. “Punto” é um sambinha bem safado (já falo sobre sua conexão com a música brasileira) puxado por um versinho quase infantil – se não fosse tão adorável (“Vorrei che questa pagina tornasse bianco per scriverci ti amo… punto!”). E “Come musica” tem simplesmente a frase musical mais linda já criada para declarar amor eterno a alguém – só mesmo esse cara para me inspirar a cantar num volume impensável (e “cantar”, no meu caso, é força de expressão, como já expliquei): “So che è sucesso già / che altri già si amarono / non è una novità / ma questo nostro amore è come musica / che no potrà finire mai / “che no potrà finire mai / mai mai”…

Uma cena constrangedora como essa – não tente imaginar! – acontece periodicamente toda vez que meu iPod escolhe músicas como (e aqui vai a tal seleção introdutória!) “Me fido de te”, “Piove”, “Per te”, “Un raggio di sole”, “Tanto tanto tanto”, “Ciao mamma”, “Si va via”, “Questa è la mia casa”, “Noi”, “Stella cometa” e, sobretudo, “Bella” (já desenvolvo!).

Como esse cara consegue? Como é possível? As músicas são de uma diversidade incrível – ainda que sempre pendam para o dançante, Lorenzo vai da balada à disco sem perder o balanço. Mas todas tão certo – todas são lindas, todas são cativantes, todas ficam na sua memória. Às vezes evoco o santo nome de Lulu Santos para explicar para alguém que não conhece Jovanotti o mistério da sua diversidade. No nosso pop, talvez só Lulu tenha chegado perto de fazer qualquer coisa, em qualquer ritmo, qualquer estilo, tão bem quanto esse meu ídolo italiano – “Um certo alguém” e “Casa” (“Tudo azul” e “Tempos modernos” também, em ocasiões mais… embriagadas) foram veículos de constrangedoras madrugadas protagonizadas por mim à frente do meu maior inimigo: um karaokê! Enfim, sabe a vontade de irromper cantando um verso sem ligar para as críticas de quem está por perto? Jovanotti tem o dom de fazer isso comigo.

E sua música “viaja” bem em qualquer língua: uma das melhores surpresas que tive com Lorenzo (fora seu dueto com ninguém menos que Luciano Pavarotti!!!) foi um disco seu… “em português”! Explicando melhor – uma conexão que nunca entendi direito – um músico brasileiro (de origem italiana), Franco Cava, adaptou boa parte dos sucessos de Jovanotti para o português, adaptando-os aos ritmos “nativos”. O resultado – “Bossa Jova” – é bastante original. Injustamente (já que poderia ter sido uma bela introdução do trabalho do italiano aos brasileiros), não fez o menor sucesso por aqui – apesar de a wikipedia italiana afirmar que “Samba” (uma versão para “Ciao mamma”) celebra a primeira vitória de Lula nas eleições presidenciais. Fora isso, os fãs de Daniela Mercury já descobriram (talvez sem querer) os encantos de Jovanotti quando ele fez uma participação especial nas gravações do “MTV ao vivo – Eletrodoméstico” – e ainda faturou um beijo da baiana depois de mandar um verso de “Serenata rap” “a capella”.

Mas deixe essa “distração” para depois. Invista primeiro nos discos do próprio Lorenzo, pois sempre é tempo de conhecer alguém tão bom. Pode começar até mesmo por “Safari” (que, se for para acreditar nos créditos, teve partes gravadas até no Rio de Janeiro). Ou por qualquer outro disco. Em todos eles, você vai encontrar uma harmonia celeste entre música, canto e letra – combinações perfeitas que vão te remeter a um estado de graça. Como isso que eu sinto toda vez que escuto “Bella”.

Deixo você hoje com esse clipe – que é extremamente ingênuo, mas isso não é importante. Em “Bella” – mais ainda que em qualquer outra canção de Jovanotti – está a expressão mais cristalina e, ao mesmo tempo intuitiva, do que é o amor. Juntando um monte de elogios para a mulher por quem está apaixonado, ele canta uma série de retratos cotidianos. Ordinários, sem dúvida, mas que na sua simplicidade captam a essência da felicidade – que, em suma, pode ser traduzida pela presença da pessoa amada. Um passaporte com a foto de um bebê. Uma segunda-feira de férias depois de um ano de trabalho. Uma harmonia. Uma alegria. E, acima de tudo, minha avó numa foto quando…

bella1.jpg

Só por essa homenagem (involuntária) a alguém que, apesar de não estar mais aqui, ainda é muito querida, Jovanotti já me teria como um fã eterno. Mas ele fez mais, muito mais: a música que define minha vida – e que eu vou “dar de presente” aqui na segunda-feira que vem. Dia 07 de abril será véspera do meu aniversário – e eu vou usar a data descaradamente como uma desculpa para tirar uma folga. Mas não sem deixar aqui essa espécie de “presente” – essa música que eu gosto de achar (“viajandão”) que Lorenzo fez para mim (detalhe: não é nenhuma das que eu citei hoje aqui). E que, por isso mesmo, vou oferecer para você comemorar comigo meus 45 anos.



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