Notas sobre um escândalo
Previsivelmente, aquele vídeo com imagens minhas fazendo danças orientais chegou à TV – curiosamente num programa que sempre foi legal por ser imprevisível… Que material delicioso para meus colegas blogueiros! Foi pura diversão – mas talvez ninguém tenha se divertido mais do que eu com a inesperada conclusão de que algumas pessoas ainda insistem em condenar o que eu acredito que deve ser celebrado: a capacidade de passar da informalidade da dança para a seriedade do meu trabalho como jornalista com extrema facilidade, desenvoltura e, dizem, com competência. E isso porque cito aqui apenas dois aspectos das minhas atividades… Entre passado e presente – e, tomara, o futuro também – a diversidade das experiências que experimento é tão rica que só posso lamentar que mais pessoas não tenham essa oportunidade. Talvez seja essa falta de perspectivas que gerou um “debate” (e põe aspas nisso) tão inócuo – para não falar dos comentários que recebi aqui e na minha caixa postal (invariavelmente anônimos, claro) que beiravam (quando não ultrapassavam) o limite da cordialidade virtual – uma tentativa pífia de transformar episódio num escândalo…
Aliás, tenho que pedir desculpas, pois, mais uma vez, você foi enganado pelo título de um post meu. “” não se refere aos acontecimentos que descrevi acima – como eu poderia considerar “escandaloso” um trabalho que fiz com dedicação, prazer – e, dentro do cenário da dança, com uma boa dose de profissionalismo? Se rever o vídeo despertou alguma coisa em mim foi uma certa saudade daquela forma física que já não tenho mais (lembrando sempre que o material foi gravado no início dos anos 90, quando a natureza ainda estava jogando a meu favor…). Esse assunto está bem resolvido, vamos em frente.
Chamei este post de “” para falar – sim – de mais um filme que estava na seleção do Oscar. É o última vez que vou recorrer ao Oscar, ok? Muitos são os títulos que concorreram (inclusive os que ganharam algumas estatuetas) que ainda poderiam ser comentados. Mas fiquei com mais vontade de ir adiante nas minhas escolhas cinematográficas porque o que sobrou para eu assistir não me inspira. “Babel”? Cansei de encontrar gente que detestou e me desestimulou de assistir. “Dreamgirls”? Eu mesmo me comprometi a fazer uma crítica comparada dele com “Antônia“, lembra, mas o desestímulo de quem viu também bateu forte. Os dois de Clint Eastwood? Se era só para conferir a fotografia (e evitar a nada subliminar “mensagem americana” – leia-se “propaganda”), acho que o trailer de “Cartas de Iwo Jima” já é suficiente (e que fotografia, hein?).
Minha opção então é falar de mais um pequeno filme para encerrar a temporada. Pequeno filme, claro, não é a melhor maneira de descrever “”. Mas uso a expressão para definir esses filmes que não têm um grande lançamento nos cinemas por aqui – e às vezes nem o tiveram no exterior. Um distribuição menor, infelizmente, significa que o filme chega a um público menor. Os dois trabalhos comentados no último post, “Vênus” e “O último rei da Escócia”, também estão neste grupo. Nenhum dos dois, porém, é algo menos que “brilhante”. E isso serve, claro, para “Notas”.
O diretor Richard Eyre, conhecido por trabalhos “pequenos” (veja a definição acima), saiu com vantagem, pois estava trabalhando com uma história que já era muito boa: o livro de Zoe Heller (que na tradução brasileira recebeu o nome de “Anotações sobre um escândalo”, editora Record). Como se esse não fosse um belo empurrãozinho, ainda tem o elenco, encabeçado simplesmente por Judi Dench e Cate Blanchett. Com tantos ingredientes bons, seria difícil não sair com um filme interessante – e o que o público recebe, ao sair da sessão, é mais que isso: um belo estudo sobre manipulação.
Podia gastar bem mais de um parágrafo descrevendo como Judi Dench, no papel de uma professora veterana de uma escola pública de Londres que acredita esconder um segredo de todos os colegas. Mas recontar aqui qualquer uma de suas cenas é roubar você do prazer de ver o filme – se é que você vai conseguir pegá-lo em cartaz depois de ler isso (como as programações mudam amanhã, na sexta, e como “Notas” não foi agraciado com nenhum Oscar, as chances de ele sumir das telas em menos de 24 horas é grande; mas… viva o DVD, que logo vem aí para resolver essa questão!). O que é interessante ressaltar é que, mesmo no papel de uma vilã, a atriz consegue fazer com que você torça para ela. E isso é o aspecto mais fascinante do filme: não é só para a professora má que você torce – quando você vê, passou o tempo todo torcendo para todas as pessoas “erradas”.
Mais algumas explicações: Bárbara (a professora) manipula Sheba (Cate Blanchett, no papel de outra professora) porque descobriu que ela tem um caso com um aluno de 15 anos de idade. Bárbara, por sua vez, tem um interesse, digamos, especial por Sheba – que é casada, com um homem bem mais velho (possivelmente da idade de Bárbara) que foi também seu professor… Complicado? Você não viu nada…
Todas as paixões do filme são desencontradas. Mas ao contrário daquelas mostradas em “Pecados Íntimos” elas não são reprimidas. São vividas com perigosa intensidade. O escândalo do título da história está no singular, mas seria mais correto usar a palavra no plural. Cada um daqueles personagens, do garoto de 15 anos – Andrew Simpson, no papel de Steven – ao diretor da escola; da ex-”amiga” de Barbara (como ela prefere se referir à antiga companheira) ao marido de Sheba – todos vivem ali seus pequenos escândalos. E você torce por todos eles.
Vá ver o filme – e encerre comigo essa temporada de Oscar. Sei, sei… Ela chegou (e vai embora) meio atrasada, mas nós aqui no Brasil, lamentavelmente, temos que aproveitar os lançamentos desses filmes indicados depois da cerimônia, e não antes, como os americanos… Mas chega. O resto fica para o DVD – e, se for o caso, comentamos uma outra hora.
Até porque, só lembrando, este não é um blog só de cinema… Temos muitos outros assuntos para tratar aqui. Segunda-feira, vamos de “Paraíso tropical”. E depois tem Gilbert & George, Racionais MC, Klaxons, The View, Dave Eggers, Elis Regina – e quem sabe até outros filmes – para falar.
Vamos em frente. Sempre.