Conversando sobre frutas tropicais com os Beastie Boys

qui, 02/11/06
por Zeca Camargo |
categoria Todas

Há um mês eu lancei um livro de entrevistas com artistas do cenário musical nacional e internacional. Chama-se “De a-ha a U2″ (editora Globo). Este texto de hoje, porém, não é uma peça de merchandising (aos mais engraçadinhos… se eu quisesse fazer isso, teria feito um mês atrás, concorda?). Mas preciso mencioná-lo para chegar à entrevista com os Beastie Boys.

No livro, reuni 53 encontros, com artistas que vão de (além daqueles que o próprio título indica) Björk a Rita Lee; de Mick Jagger a Lenny Kravitz; de Renato Russo a Robbie Williams; de Courtney Love a Kurt Cobain – 53! E, mesmo assim, ainda falta tanta gente pra falar. Ao dar entrevistas sobre os livros, ou mesmo nos bate-papos em noites de lançamento, sempre aparecia essa pergunta: quem você ainda não entrevistou mas que gostaria de entrevistar? Tenho sempre essa lista pronta: Prince (impossível!), Morrisey (pura nostalgia, Sade (a dos sonhos), Lulu Santos (com quem nunca parei para falar à larga…). E tem uma banda que eu sempre falo e causa certa estranheza: os Beastie Boys!

Depois do domingo passado, eu já posso tirá-los da lista. Se bem que, mesmo hoje, quinta, já tendo digerido bem nosso encontro, não tenho certeza de que o que aconteceu foi mesmo uma entrevista – algo que eu já deveria ter começado a desconfiar do momento em que eles entraram na sala montada para as gravações.

Ao falar sobre “De a-ha a U2″, sempre explico que uma das lições desses quase 20 anos (!) cobrindo a área de música (em especial o rock n’roll) é esperar qualquer coisa dos artistas. Bom humor, mau humor, péssimo humor, preguiça, entusiasmo, apatia, boa vontade, agressividade – e até cantadas! Isso, claro, depois que você espera horas para encontrar a celebridade (ao bater o recorde nesse quesito, depois de aguardar nove – 9 – horas para conversar com Courtney Love, tive de recorrer ao mantra que aprendi lá nos tempos de MTV: se você quer trabalhar com “showbusiness”, o negócio é correr, correr, correr… e esperar! – em inglês, como ouvi da primeira vez, “you got to rush rush, rush, rush… and wait!).

O atraso, no caso dos Beastie Boys foi negligível (para os parâmetros do rock): apenas uma hora. O que exigiu esforço supremo naquele momento foi disfarçar o choque de ver Mike D, Adrock e MCA adentrando a sala de terno e gravata – retrô, com pinta de anos 50!

Tentei não demonstrar qualquer reação. Dei um “reload” rápido na pauta que tinha preparado na minha cabeça e entrei logo no clima. Que clima? Não tinha muita idéia naquele momento, mas sabia que não poderia nem pensar em falar sobre processo de criação – e nem sobre o Tibete (que os Beastie defendem ativamente que dever ser libertado pela China, e voltar a ser uma nação independente). Então… falar do quê?

Que tal sobre a roupa que estavam usando? A resposta veio rápida: como era domingo de manhã, e eles sabiam que o Brasil é um país católico, eles queriam se vestir de acordo, explicou Mike D. Adrock o contrariou em seguida, dizendo que, como eles sabiam que era dia de eleição, eles optaram pela formalidade. Só para em seguida se contradizer e acrescentar que estavam vestidos daquela maneira para ir tomar um suco na esquina.

Foi só falar nisso, que o assunto se iluminou! Os três passaram a discutir os sabores novos que tinham experimentado na casa de sucos a algumas quadras do hotel onde estavam. “Tangerina”, dizia Mike D em português mesmo, com seu entusiasmo praticamente escondendo o forte sotaque. Se atrapalhou no “abacaxi” (“abaxica”, foi sua primeira tentativa). E Adrock custou mas finalmente descreveu a matéria-prima de seu suco favorito de uma maneira que eu pudesse identificar: fruta-do-conde!

Como eles descobriram essa casa de frutas? “Nós sempre temos olheiros que mandamos na frente de nossas viagens para descobrir o que há de bom na cidade que visitamos”, adiantou-se MCA. Mike D: “Por exemplo, próxima parada, Buenos Aires – e nossos homens já estão lá!”. “Eles sabem do que gostamos”, completou Adrock. Foi então que eu perdi qualquer esperança de fazer uma entrevista séria com os Beastie Boys.

Felizmente, essa é a regra – e não a exceção – no mundo do pop. Já havia aprendido isso desde o tempo em que, lá pelo início dos anos 90, seduzimos o Red Hot Chili Peppers a passear num veleiro pela costa do Rio de Janeiro, na esperança de fazer a melhor entrevista da carreira deles – só para, depois de passar o dia com eles no barco, sair com um belo material para um videoclip, mas nada de consistente para uma entrevista… Daí em diante, relaxei.

Não apenas relaxei: passei a ver todas as entrevistas com artistas do mundo do rock de maneira diferente. Será que alguém quer saber mesmo qual foi a inspiração de um artista por trás da faixa 7 do disco de 1998? Se o novo álbum tem mesmo uma influência mais de blues do que o trabalho anterior? Se ele ou ela está mais contente com a nova formação da banda? Se a banda se considera uma alternativa para o movimento batizado de “new wave of new wave”(não estou inventando!! isso realmente existiu!)? Ou se esse é mesmo (pela décima-oitava vez) o fim da banda?

Na preparação do meu livro, relendo entrevistas antigas (não as minhas, mas de outros repórteres, em várias revistas que coleciono) tive a convicção de que, para a maioria das pessoas, inclusive para muitos dos fãs, esse tipo de informação é chatíssima. E os próprios artistas não agüentam mais falar sobre as mesmas coisas (colegas e futuros colegas: se vocês quiserem ter uma visão do horror que é para uma banda passar pelas nossas entrevistas, procurem o DVD “Meeting People Is Easy” (1999), onde o Radiohead registra, aparentemente sem nenhuma ironia, a avalanche de encontros com a imprensa de parte da turnê de “OK Computer”; você nunca mais vai encarar uma sessão de perguntas e respostas da mesma maneira…).

As boas entrevistas acontecem quando o artista sai do universo do seu disco e explora assuntos maiores – pode ser até música mesmo, mas de uma maneira mais geral. Foi assim com Lenny Kravitz. Ou quando eles mostram um interesse maior na própria essência de sua celebridade – como Alanis Morrisette. Ou quando o mundo lhe parece mais interessante que seu próprio trabalho musical. Sim, Bono. Ou então quando eles chutam tudo para cima e resolver falar qualquer bobagem. Como os Beastie Boys.

Nosso encontro teve um leve momento de sobriedade sim, quando, ao perguntar como eles conseguiam fazer um trabalho tão interessante, mesmo depois de 20 anos juntos. “Hit the juice bar!”, respondeu MCA (ou, “vá mais à loja de sucos). E prosseguiu na metáfora, dizendo que quanto mais frutas eles experimentam, melhor fica o trabalho. Se não gostam de alguma fruta (palavras dele), não repetem – mas o importante é sair experimentando sem medo.

E tudo terminou depois que Mike D ofereceu um emprego para alguém que pudesse ajudá-los a combinar os ternos com os sapatos (os que os três usavam naquela manhã eram terríveis). Outra piadinha… e, pelo menos do jeito que ele falou, engraçada! (a entrevista editada pode ser vista aqui).

Não consegui ir ao show deles no Rio, no domingo – nem em Curitiba, na terça. Mas todos os relatos de amigos que foram (para não falar nas críticas da imprensa) me confirmam que foi sensacional. Talvez tenha perdido um grande momento. Mas pelo menos aproveitei a conversa com os Beastie Boys para reafirmar a certeza de que no mundo do pop, quanto menos sério, melhor…

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36 Comentários para “Conversando sobre frutas tropicais com os Beastie Boys”

Páginas: [2] 1 »

  1. 36
    nilton:

    JECA, PORQUE O FANTASTICO ESTA SAINDO TANTO DO FOCO QUE ERA AS GRANDES INTREVISTA.GRANDES NOMES DA MUSICA. TUDO TEM SER FANTASTICO…

  2. 35
    Elber Tiago Camargo Goebbels:

    Zeca, por favor, meu maior sonho, o da minha vida, é trocar idéia com os caras do Beastie Boys…como eu faço isso???
    Abrásss man…God bless ya!!!
    .
    .
    .

  3. 34
    José Barreto:

    Dia e Noite !
    Sol e Lua !
    Branco e Preto !
    Riqueza e Pobreza !
    Alto e Baixo !
    Moderno e ultrapassado !
    Macho e Fêmea !
    Monarquia e República !
    Cultura alta e Baixa ?
    Rei ou Alcaide ?

    Onde é Brasil, onde são todas Campos dos Goytacazes ?
    Verdade e Mentira !
    Todo dia na mão do Rei ou Rainha 3,4 milhões.
    Cultura alta de Doutor, camisa limpa e cheirosa !
    Toda dia e toda Noite na mão do súdito , roupa suja e ensanguentadamente fedorenta.
    Servir a qual ?
    Servir a que ?
    Servir a quem ?
    Pra que sirvo ?
    Pra que serve ?
    Eu
    Você !

    ” Zeca ” Barreto

  4. 33
    Heide:

    Hey =]
    Vi sua entrevista no Jô ontem, eu qro esse livro!
    Eu não vi o Beastie Boys. É uma droga quando essas bandas muito muito fodas aparecem por aqui… nenhuma delas NUNCA vêm à Goiânia (exceto o Deep Purple, por motivos óbvios).
    Mas eu tenho 3 perguntas pra fazer:
    1 – Cansei de ser sexy é uma droga ou eu que sou chata?
    2 – OK Go é realmente bom ou eu só fiquei impressionada com os mocinhos q dançam no jardim e nas esteiras?
    3 – Perdeu a implicância com o Franz Ferdinand?

  5. 32
    David Obadiah:

    Parabéns por seu brilhante trabalho, desde sempre. Quando você vem ao Nordeste? espero que venhas lançar seu livro aqui em João Pessoa. O novo DVD do Renato que está sendo lançado com a MTV e DeckDisc tem 1h30min com sua entrevista feita com o Renato como entrevista principal? abraço e força sempre!

  6. 31
    Gisane de Caux:

    Olá zeca!!!!!!

    Já estou anciosa para ler seu novo livro De a-ha a U2.
    Agora não estou podendo ler nadaaaaaaaaaa que não seja relacionado à revista por causa do meu trabalho de conclusão do meu beeeeeeelo curso de jornalismo! apresento dia 21 de novembro! ai sim poderei ler seu livro! rsrsrs pena que esse não vai ser autografado como o outro!
    Beijos da sua super fã!

  7. 30
    Anônimo:

    Oi Zeca, como vai? É a primeira vez que entro em seu blog e achei muito legal! Comprei seu livro “de a-ha a U2 ” no sábado e já estou quase no final, têm uma linguagem espontânea e é muito gostoso de se ler! Nem preciso dizer que AMEI seu livro, meus Parabéns!
    Sempre assisto vc desde os tempos de MTV e admiro seu trabalho. Depois que eu terminar de ler este livro, vou comprar ” a fantástica volta ao mundo” pois já me disseram que é muito bom tbm”!
    Ah… estou baixando várias das músicas que estão no livro, e algumas eu nem imaginava que eram tão boas, estou surpresa!
    Bem, deixo um grande beijo á vc e sucesso sempre!

  8. 29
    Dewis Caldas:

    Olha só pessoal.
    Mais um capitulo de “A-ha à U2″
    esperamos mais.

  9. 28
    Anônimo:

    vc eh um p*** jornalista chato

  10. 27
    Anônimo:

    Tenho acompanhado tudo que o Zeca tem feito durante a sua carreira…desde os tempos de escola….ele simplesmente tem se superado cada dia….Parabéns!!!!

  11. 26
    KADU GIABATTELO:

    ZECA ….

    ENTREVISTA UM POUCO CURTA … MAIS RESUMIL BEM O MAU ESTILO DOS BEASTIE BOYS RSRS …
    (QUEM SABE ELES NAO ELES NAO ENCONTRARAM ALGUÉM AQUI NO BRASIL PARA MELHORAR SUA VESTIMENTAS RSRSRS )
    ALÉM DE TUDO QUE DEU PARA PERCEBER NA ENTREVISTA …
    O MELHOR DE TUDO FOI PERCEBER QUE O MUNDO POP PODE SER BEM MAIS FÁCIL DO QUE SE IMAGINA RS …

    GRANDE ABRAÇO ZECA …

  12. 25
    Wanessa:

    Yupiiiiii! Enfim, respondeu minha mensagem, hem? rs Já estava perdendo as esperanças! Mas… reconheço q sua rotina e seu trabalho (belo trabalho, aliás!) devem tomar grande parte do seu tempo, né? Então, OBRIGADA pela breve mensagem! Depois que ler meu email a gente se fala melhor!

    Tenha um belo domingo (que prá mim é de folga e pra vc é de trabalho intenso) e depois nos falamos!

    (Ahhhhh, não precisa publicar esse comentário no blog, viu?)

    Beijo grandão!

    Wanessa

  13. 24
    Marcella Cnha (Má):

    Zeca….como sempre texto adorável!! QUe legal conhecer uma faceta dos Beastie Boys ate então meio “desconhecida”!!!
    Um beijão…Até o próximo

  14. 23
    fabio:

    Oi Zeca eu gostaria de ler colunas suas tambem de musicas da periferia do Globo fora do circuitão Estados Unidos-Canada-Inglaterra istoé, world music na veia! Poderia ser algo de bangra, j-pop, latin?! Obrigado!

  15. 22
    andre alaniz:

    porque essa entrevista nao foi ao ar no fantastico?
    deve ter sido maravilohsa!!! eles sao demais, acabei de comprar a trip deste mes com a entrevista deles…
    parabens zeca

  16. 21
    WANESSA LOPES:

    Saudações MINEIRAS com sabor de TANGERINA panhada do pé! rs

    Como vai? Aliás, quando é q vai responder meu email, hem? afff…. (brincadeirinha! paciência e peserverança são dons superiores!rs)

    Pois bem, parabéns por mais essa entrevista! Ficarei aguardando para assistí-la na íntegra!

    No mais, quando bater saudade do pão de queijo é só pintar por BH novamente!

    BEIJO GRANDÃO!

    WANESSA LOPES

  17. 20
    Anônimo:

    Tudo bem Zeca!!!Meu nome é Valter,estudante de Jornalismo, moro em Curitiba e você esteve aqui na cidade no útimo dia 24 pra lançar seu novo livro,maravilhoso por sinal. Fui na noite de autografos no shopping você assinou meu livro fiquei muito satisfeito.Porém no dia seguinte fui assaltado dentro da lanchonete Mcdonalds que odeio por sinal, só fui por pressão psicológica.Gostaria de saber da possibilidade de um novo autógrafo;pode ser sdcaniado e enviado por email,extremamente traumatizado!!!Se puder por gentileza responda!!!Abraço

  18. 19
    Nathanial David H.:

    Zeca, por mais interessante que tenha sido seu papo com os Beastie Boys, frustrante deve ter sido ler a entrevista que os três deram à revista Trip. Quase que de maneira brilhante, os dois repórteres “trip” separaram os Adams e o Mike e obtiveram um resultado, que beira a confissões, no mínimo, inspirador. A você eles deram a entrevista que dão a simplesmente TODOS os jornalistas. Você foi zuado como todos os outros, não se destacou e relegou-se ou regozijou-se com o “menos sério, melhor” do mundo pop porque o deleite foi seu e somente seu, não dos leitores. Realmente você deveria ter ido ao show, que foi ainda mais inspirador. Mas acho que primeiro você deveria ter lido a fantástica entrevista da Trip. Mas como vc mesmo diz no Pop: “menos sério, melhor”. Quando deveria ter sido, “no punk rock, melhor é mais divertido”!

  19. 18
    Fernando Magrello:

    Zeca,

    perdido numa noite em um quarto de hotel (isso parece letra de musica do Gessinger) acabei assistindo um documentario do Bob Dylan, em que mostra o periodo que ele se cansou da imprensa, e como ele curtia com ela. Principalmente daquelas perguntas “cabeças” que sempre surgem.

    Outra que gostei e me lembro é a do Iggy Pop na Trip, pra mim exemplar pra jornalista que quer extrair alguma coisa de qualquer celebridade pop.

    Asta,

  20. 17
    cintia:

    Olá Zeca!!
    Sou de Santos e soube que você esteve por aqui para uma tarde de autógrafos na Realejo Livros.
    Puxa vida! Perdi esta oportunidade de te conhecer e de autografar “meu livro”…devido ao meu horário de trabalho.
    Adorei o livro e fico imaginando estar no seu lugar, entrevistando as celebridades uns com uma conversa inteligente e outros nem tanto e com muitas manias.
    Parabéns e sucesso!
    Vou ficar de olho na sua agenda…quem sabe você estará em alguma livraria em São Paulo!
    Beijos
    Cintia

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