• Entre os bilhões da corrupção e os milhões de miseráveis

    Em agosto deste ano a força tarefa da Lava Jato em Curitiba expôs em praça pública uma pilha de R$ 4 bilhões, em notas de R$ 100. As notas eram falsas, o valor de recursos recuperado até agora não é exatamente este, foi menos, mas pode ser muito mais. Ainda assim, a escultura não poderia ser mais realista e chocante.
     
    Durante anos, um pequeno grupo de governantes e empresários assaltou o país em plena luz do dia, bradando ética e desenvolvimento, orgulho nacional e o salvamento dos pobres do Brasil. Por incrível que pareça os R$ 4 bilhões da escultura da Lava Jato, que podem chegar a R$ 10 bilhões em indenizações, multas e repatriação, são pouco perto dos estragos causados pela política econômica desastrosa da ex-presidente Dilma Rousseff.
     
    A conta da gestão petista é ainda mais escandalosa, pelo menos a que é possível contabilizar com clareza. O rombo nas contas públicas será de quase R$ 160 bi neste e no próximo ano. Some os R$ 155 bi de 2016 e os R$ 111 bi de 2015. Falta explicar onde foram parar os R$ 500 bi que passaram pelo BNDES para financiar empresas de amigos “do rei” e não produziram nem meio ponto de alta do PIB, ao contrário, só fizeram aumentar a dívida pública. Haja pilha de notas de R$ 100...
     
    Agora imagine se isto tudo não tivesse acontecido, ou que pelo menos o apetite criminoso dos corruptos tivesse sido menor. Certamente não teríamos que nos deparar com a conta mais cara dos escândalos expostos aqui: o crescimento da pobreza extrema no Brasil.
     
    O IBGE acaba de revelar que aumentou em 53% a quantidade de brasileiros que viviam com 1/4 de um salário mínimo por mês, entre 2014 e 2016. Há três anos foi quando a recessão econômica começou, mas os assaltos e os erros crassos na condução do país já estavam sendo cometidos anos antes. O saldo ao final do ano passado é de quase 25 milhões de pessoas vivendo na miséria.
     
    Ao final de 2016 havia outros 36,6 milhões de brasileiros com rendimento per capita entre ¼ e ½ salário mínimo, ou seja, em situação de pobreza, 6% a mais do que em 2014. O Nordeste concentra a maior quantidade daqueles em situação de extrema pobreza, 13,1 milhões de pessoas. Na ponta oposta está o centro-oeste, com 900 mil brasileiros.
     
    A estatística mais recente, liderada pelo economista francês Thomas Piketty, escancarou outra fotografia da nossa triste realidade. A população 1% mais rica detinha, em 2015, 28% de toda a riqueza do Brasil, acima dos 25% em 2001. A diferença entre os mais ricos e mais pobres é de cerca de 70 milhões de pessoas – 1,4 milhão de ricos, 71 milhões de mais pobres.
     
    Olhando para a quantidade de mais ricos e mais pobres do país, cabe aqui uma proporção muito parecida com o que acontece no sistema de previdência nacional. O déficit do regime dos servidores públicos cresce a cada ano para manter cerca de 1 milhão de aposentados e pensionistas. O buraco no INSS aumenta para sustentar os benefícios de quase 30 milhões de aposentados do setor privado. O estudo recente do Banco Mundial mostrou que o déficit da previdência nacional contribui para a desigualdade. Não que muita gente já não soubesse...
     
    Infelizmente há muitos dados sobre o Brasil que revelam a extrema desigualdade no país. A conta de luz tem embutida para todos nós quase 40% de imposto – não importa se você está no topo ou na base da pirâmide (mesmo considerando programa de isenção para famílias de baixa renda). O mesmo vale para o caderno da escola, a roupa, os alimentos ou a máquina de lavar roupa.
     
    Como nosso sistema tributário está ancorado no consumo e não na renda, quanto mais rico, menos se paga, numa lógica perversa que acelera a condição de pobreza da maioria, especialmente em momentos de crise e de elevação da inflação como o que vivemos entre 2014 e meados deste ano.
     
    A inflação é outro mal a ser combatido porque, assim como a corrupção e a irresponsabilidade com o dinheiro público, ela ataca os mais pobres que não tem como se defender da alta de preços. Em 2015, o IPCA ficou em 10,67%, o maior em mais de 10 anos. Só a conta de luz, insumo básico para as famílias brasileiras, subiu 70% em média, em todo país.
     
    O retrato que o IBGE revela é mais um capítulo a ser adicionado nesta triste e trágica história da pior crise econômica vivida em tempos de moeda relativamente estável no Brasil. Contar os pobres ainda vai nos assustar durante muito tempo, mesmo que a economia esteja voltando aos trilhos e a retomada seja consistente, ainda que fraca.
     

  • Mercado pede folga

    “Governo está com dificuldade para colocar em votação a Previdência, e, pelo visto, de não colocar também”, disse o economista de uma grande instituição financeira ao Blog, depois que o presidente Michel Temer desmentiu o senador Romero Jucá sobre a votaçao da reforma da previdência.
     
    Mal deu tempo de apurar com economistas e operadores de mercado o que poderia acontecer com adiamento da votação e já voltou tudo como era antes, ou seja, sem definição. A não definição já está praticamente “precificada” no mercado. Nos últimos dois meses a correção de preços, destaque para bolsa de valores e dólar, foi relativamente forte.
     
    A Bovespa, que experimentou os 78 mil pontos, voltou para os 72 mil e deve ficar por aí até inicio do próximo ano. O dólar, que bateu R$ 3,09 em setembro, subiu para a casa dos R$ 3,38 e tudo indica que permanecerá mais caro no período. Se um milagre acontecer e a reforma for votada este ano, daí serão outros quinhentos. Enquanto a briga continuar em Brasília, a volatilidade seguirá ditando os mercados, mesmo que em menor intensidade.
     
    “Foco agora é total nas eleições! O cenário macro da economia nos próximos 12 meses já está definido. A eleições sempre foram mais importantes que a Previdência e a proposta discutida é tímida, o próximo presidente terá que fazer outra. As questões agora são: Lula será ou não condenado? Alckmin fecha um acordo com o PMDB? Meirelles sai candidato? Mercados só vão olhar isso”, disse um experiente economista de um banco brasileiro.
     
    Eu liguei para um alto executivo de uma das maiores instituições do país e ouvi dele um longo suspiro quando perguntei sobre o que esperar do comportamento do mercado diante deste quadro estapafúrdio. O suspiro dele diz tudo, desde a frustração com o tratamento dos políticos dado a um tema tão sério e relevante, até um cansaço real de viver no sobe-e-desce, no vai-não-vai.
     
    “É frustrante ver como tantas concessões foram dadas, como o Funrural e o Refis para MPE’s e o compromisso com a reforma da Previdência, que é uma questão séria ao país, sendo tratado dessa forma. O relevante a partir de agora serão as eleições, quem serão os candidatos, tudo que gira em torno delas. Isto que vai fazer preço no mercado”, avaliou a fonte.
     
    O mercado pede folga. A volatilidade excessiva causa distorções na formação dos preços dos ativos. Faz muita gente perder dinheiro – e outros ganharem, mas estes apostam contra tudo e não são a maioria. Aliás, acho que o país todo pede esta folga.

  • Será preciso firmeza para reduzir o spread bancário no Brasil

    O Banco Central vai descumprir a meta de inflação em 2017 e vai, ao mesmo tempo, ter cumprido a missão de controlar o processo inflacionário no país, reestabelecido a credibilidade na condução da política dos juros e ancorado as expectativas dos agentes econômicos com a inflação futura. Há um ano, apenas metade deste quadro era esperado já que a credibilidade do BC começou a ser restaurada no momento em que Ilan Goldfajn assumiu a cadeira de presidente. Sobre a resposta do IPCA e dos juros, ninguém imaginou o cenário atual.

     

    No encontro com jornalistas em Brasília para fazer um balanço do ano e falar dos próximos passos, Goldfajn falou de um tema que é relevante para o equilíbrio do sistema financeiro e também, teoricamente, para o controle da inflação. O recolhimento compulsório é uma quantia de dinheiro que os bancos são obrigados a deixar parada no BC. Atualmente, 45% dos depósitos à vista, 36% dos depósitos a prazo e 30% dos de poupança são recolhidos dos bancos.

     

    Isto significa que toda essa dinheirama não pode ser utilizada para nada: nem para dar crédito, nem para comprar títulos do governo, nem para fomentar financiamento da casa própria, etc. Este instrumento tinha algum propósito, teoricamente, quando o Brasil tinha inflação altíssima e precisava de mais ferramentas para controlar a quantidade de dinheiro na praça, só os juros não eram suficientes.

     

    Agora que a inflação está baixíssima, vai rodar entre 3% e 4% nos próximos anos, e os juros vão cair para casa dos 6% e ficar em 8% até final de 2019, o sentido dos compulsórios se perde. E sua função, há muitas controvérsias sobre a sua real eficiência, causa distorções na economia e no funcionamento do sistema financeiro.

     

    Os bancos alegam que parte do altíssimo spread bancário do Brasil se explica pelos compulsórios. Tudo na vida é assim: quando o preço é 100 e estão gastando 120, alguém tem que pagar a diferença. O mesmo funciona com a taxa de juros. Se os bancos são obrigados a deixar o dinheiro parado no BC, estão, teoricamente, perdendo operações de crédito ou aplicações rentáveis. O custo desta obrigação, na prática, vai para a taxa de juros cobrada dos consumidores.

     

    Ilan Goldfajn disse aos jornalistas que os técnicos do BC estão estudando o melhor jeito de reduzir “estruturalmente” os compulsórios.

     

    "O compulsório é algo que a gente precisa convergir, no médio e longo prazos, para níveis inferiores. É uma questão estrutural, para reduzir os custos administrativos. E não pensar ela como uma medida de política monetária [relacionada com o nível dos juros básicos da economia]. É pensada de forma estrutural, pensada de médio e longo prazos, para reduzir o custo do crédito", afirmou o presidente do Banco Central.

     

    Há um ano Goldfajn apresentou a agenda BC+, um conjunto de medidas que visam reduzir o custo do crédito, melhorar a eficiência do sistema financeiro e do marco legal do BC, e promover a educação financeira. Mexer nas regras dos compulsórios era uma das coisas a serem abordadas.

     

    O sistema financeiro do Brasil é um dos mais sólidos do mundo, aqui as regras são mais rígidas do que o BIS, que é uma espécie de banco central dos bancos centrais. Tanto assim que, na crise de 2008, o mercado brasileiro sentiu muito menos do que muitos países, entre emergentes e desenvolvidos. O excesso de limites evitou que exageros fossem cometidos na exposição a riscos, como aconteceu lá fora.

     

    Agora que a economia entrou minimamente nos eixos, a inflação está controlada, os juros estão “estruturalmente” mais baixos, podendo ficar assim por muito tempo, está na hora de cuidar da maior distorção que existe no país: a diferença entre os juros básicos da economia e as taxas cobradas na praça. Parece coisa de filme de piada ou ficção, difícil de explicar e de entender.

     

    Lá vem a ressalva de novo. Se o quadro político permitir e a reforma da previdência passar, o BC terá mais segurança e liberdade para atuar. Será preciso muita firmeza também para quebrar esta dinâmica perversa que, assim como a solidez do nosso sistema, nos separa de boa parte do mundo – pelo lado negativo. 

  • 'Brasil pode viver 2015/16 agravado se agenda de reformas for abandonada', diz Marcos Lisboa

    A economia está em recuperação, num processo inegável de retomada. O que não é consenso ainda é se este processo é consistente e, principalmente, se vai sobreviver ao ano de eleições gerais, com a manutenção de um quadro político extremamente instável. O que estará em jogo na escolha das novas lideranças é a agenda de reformas que o país ainda necessita enfrentar, além da reforma da Previdência que está no centro do debate agora.
     
    “2018 será um divisor de águas. Será que nós vamos continuar com agenda de reformas para enfrentar os problemas, ou vamos sucumbir, do tipo 'já bastou', não precisamos fazer mais nada (e partimos para) as saídas fáceis como fizemos em 2014? Este é o grande dilema que vamos enfrentar. Vamos enfrentar os problemas ou vamos fazer a saída populista?”, indaga o economista Marcos Lisboa, presidente do Insper.
     
    Em entrevista exclusiva ao blog, Lisboa faz um balanço do processo de retomada da atividade este ano e alerta para os riscos de o país viver um “novo 2015/16, só que piorado”, se o ajuste fiscal for deixado de lado. O economista afirma que o Brasil está colhendo frutos de um cenário externo favorável e da mudança na política econômica iniciada em 2016, mas que a “janela de oportunidade” para um crescimento duradouro não vai durar muito tempo e certamente não vai resistir a uma ruptura da agenda de reformas.


    A seguir os principais trechos da entrevista.  
     
    Como o senhor explica o crescimento atual da economia?
     
    Nós estamos colhendo neste momento os benefícios das mudanças de política econômica ocorridas a partir do segundo semestre ano passado. O governo sinalizou o começo, eu enfatizo que é apenas o começo, de uma agenda de ajuste fiscal de longo prazo, com melhora do ambiente de negócios, reformas importantes como a trabalhista e a mudança na taxa de juros do BNDES.
     
    É claro que nem tudo foi na direção correta. Houve vários equívocos também neste período como o reajuste salarial (aos servidores públicos) que foi grave. Tanto que precisou aumentar impostos este ano para pagar porque não tinha dinheiro. Foi muito ruim o processo de enfrentamento do problema dos estados. Vamos ter uma herança muito difícil para resolver esta questão dos estados, que vai requerer reformas duríssimas. Volta e meia pinga uma medida de volta ao passado, lembrando as medidas equivocadas do governo anterior, com coisas que vão na contramão do crescimento porque beneficiam alguns grupos de interesse específicos, mas são extremamente prejudiciais ao país.
     
    O saldo é positivo ou negativo?
     
    O saldo líquido é muito positivo. Estamos colhendo o benefício dessa agenda fiscal, das medidas na direção correta e de uma boa condução da política monetária, que voltou a ser muito bem conduzida, num salto de qualidade impressionante que o BC trouxe em relação ao que a gente vivenciou nos últimos anos.
     
    A gente estava indo em direção ao muro com uma velocidade imensa no governo anterior. Na hora que começou uma agenda diferente, continuamos indo, mas numa velocidade um pouco menor e sinalizamos que vamos botar o pé no freio. Não botou ainda, mas sinalizou que vai botar. Isto levou o BC a baixar os juros em meio à queda da inflação, o que, hoje, está resultando em crescimento. Estamos colhendo aqui os impactos da política monetária iniciada um ano atrás. E ainda tem muito impacto para acontecer. A política monetária importa e ela tem impacto.
     
    O cenário externo colaborou para todo este processo?
     
    Há pouco mais de um ano o mundo estava saindo da crise, crescendo, mas ainda com taxas de juros nula ou negativa, e inflação muito baixa. Aos poucos o desemprego foi caindo lá fora, os Estados Unidos estão crescendo 3% ao ano, já há sinais de que a inflação vai voltar a subir, o que quer dizer que os juros vão deixar de ser nulos.
     
     
    2018 vai ser mais um ano de voo de galinha para economia?
     
    2018 vai ser um divisor de águas. Será que nós vamos continuar com agenda de reformas para enfrentar os problemas, começando pelo fiscal, pela previdência e as reformas necessárias para que o país equilibre suas contas públicas e volte a crescer muitos anos a frente? Ou vamos sucumbir, do tipo “já bastou”, não precisamos fazer mais reformas (e partimos para) as saídas fáceis como fizemos em 2014? Este é o grande dilema que vamos enfrentar. Vamos enfrentar os problemas ou vamos fazer a saída populista?
     
    É claro que os problemas podem ser enfrentados de várias maneiras e a escolha de qual o caminho, é uma escolha da política. O que vai ser preocupante é se negar que os problemas existem. A negação dos problemas é que o grave. Existem várias saídas e ela, mas elas não são técnicas, elas são da política.
     
    E isto não vai se resolver enquanto não passar o período das eleições.
     
    Se a gente resolver enfrentar os problemas e escolher caminhos sustentáveis, o país tem uma oportunidade de crescimento imensa. Se a gente conseguir acertar a parte fiscal, com uma agenda para reduzir as distorções, a produtividade volta a crescer, o país volta a crescer. A gente tem um potencial de crescimento muito alto, por muitos e muitos anos.
     
    Agora, se a gente resolver de novo com populismo, achando que é sempre o outro que vai pagar a conta, que não tem que fazer ajuste duro, que não tem que ter sacrifícios no curto prazo para colher os benefícios nos próximos anos, daí a gente pode repetir 2014 e a consequência será um novo 2015/16, só que mais grave.
     
    E o país aguenta muito tempo?
     
    Quanto mais o tempo passa, pior a situação fica. A gente tem uma janela de oportunidade. Estamos colhendo os frutos de um bom momento do cenário externo e da mudança na política econômica. Se continuar na mudança, podemos colher mais frutos ainda no futuro. Se interromper a mudança, a doença volta, só que volta agravada.
  • 56% dos trabalhadores formais estão insatisfeitos com o trabalho, revela pesquisa

    O emprego está voltando, mostram os dados do mercado de trabalho. O Brasil chegou a contabilizar mais de 14 milhões de desempregados este ano. Agora são 12,7 milhões, segundo o IBGE. Há um novo dado sobre o mercado de trabalho no país que acende um alerta para um dos principais debates sobre o tema: a qualidade do emprego e da relação entre empregadores e empregados. 

     

    Uma pesquisa feita pelo Instituto Locomotiva revela que 56% dos trabalhadores com carteira assinada estão insatisfeitos com seu emprego. Isto significa que 18,7 milhões de pessoas trocariam de lugar na busca de mais alegria no trabalho. Apenas um terço dos entrevistados pela entidade se declarou satisfeito de modo geral. Numa economia que tem 33,3 milhões de trabalhadores formais, como fazer para trocar mais da metade de lugar sem tira-los do mercado? 

     

    “Um dos grandes problemas das empresas, que nem no período da crise e do aumento do desemprego foi superado, é a troca de pessoal, o turnover. Qual prejuízo que isso tem para as empresas? Todo treinamento que a empresa investe nos funcionários deixa de existir quando ela perde este talento para alguma concorrência. Combater o turnover das empresas é um dos grandes desafios para construção da produtividade no Brasil”, disse ao Blog o economista Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva. 

     

    A mesma estatística do IBGE que mostra que o desemprego diminuiu nos últimos seis meses revela que 74% das vagas criadas entre janeiro e outubro deste ano estão na informalidade. Com a legislação trabalhista que surge depois da reforma, espera-se que boa parte deste contingente seja formalizado sob novas condições que não necessariamente a carteira de trabalho. 

     

    A pesquisa do Locomotiva mostrou que, dos 1019 entrevistados, 81% conhecem o tema da reforma trabalhista, mas não se consideram informados sobre as mudanças. A ameaça do desemprego pode ter se arrefecido com a melhora dos últimos meses, mas a preocupação com futuro, não, já que 87% disseram estar preocupados com os efeitos que a nova CLT vai causar no mercado. 

     

    Mesmo que convivendo com a insegurança com a nova legislação, os trabalhadores sinalizam que o salário não é a única forma de motivação para gerar satisfação. Para 87% dos entrevistados pelo Locomotiva, as premiações em produtos e serviços são uma boa forma de as empresas valorizarem seus funcionários. Já 80% acreditam que programas de premiação podem estimular muito a sensação de reconhecimento, a produtividade e a melhora do ambiente de trabalho, além da satisfação geral.

     

    “A pesquisa deixou claro que, infelizmente, não basta apenas um bom salário para manter os funcionários motivados. Quando mais da metade de trabalhadores formais querem mudar de emprego, alguma coisa precisa ser revista no jeito em que as empresas estão engajando a sua força de trabalho”, disse Renato Meirelles. 

     

    Parece que está faltando também psicologia e noção de relações humanas dentro das empresas brasileiras. Numa escala de graus de satisfação dos trabalhadores, é como se salário fosse essencial, premiação fosse sensacional e o reconhecimento “imaterial”, fosse extraordinário. 

     

    A pesquisa mostra que 96% das pessoas consideram importante que as empresas reconheçam seus funcionários por meio de recompensas materiais como dinheiro, viagens, vale-presente, etc. E 90% consideram que este reconhecimento pode vir sob outras formas, como elogios, homenagens até mesmo uma estrela no peito, desde que seja uma atitude que valorize a entrega do trabalhador. 

     

  • Como BC vai explicar a inflação baixa demais?

    A inflação de 2017 ficará abaixo de 3%, a menor desde que o Brasil adotou o sistema de metas para inflação, em 1999. Pelas regras do modelo brasileiro, o IPCA pode flutuar numa banda de 1,5 ponto percentual para cima e 1,5pp para baixo. A meta deste ano é de 4,5%, ou seja, ficando abaixo de 3%, o Banco Central terá descumprido seu mandato. Será a quinta vez que isso acontece, mas será a primeira que o problema foi a inflação ter caído demais, ou seja, ter furado o piso e não o teto da meta.
     

    Também pelas normas do sistema, o presidente do BC precisará mandar uma carta ao ministro da Fazenda explicando o que se passou e o que ele pretende fazer para levar o IPCA de volta à meta. O documento é endereçado ao ministro, mas é, na verdade, uma satisfação à sociedade. Imagine a abertura da carta:
     

    - Sr. ministro, o BC errou. A inflação caiu demais! Ficou muito baixa! Faremos de tudo para que ela volte a subir!
     

    Por mais esdrúxula que seja a paródia, ela faz sentido e leva a algumas reflexões importantes. A primeira delas é sobre qual é a meta de inflação mais adequada, digamos assim, para o momento atual da economia brasileira. Desde 2005 o BC persegue os 4,5%, que também valerá para o ano que vem. A partir de 2019, a meta começa a baixar: 4,25% em 2019 e 4% em 2020. A banda de tolerância vai permanecer em 1,5pp, o que aumentará a flexibilidade do IPCA no período, já que a meta será menor.
     

    Nestes 12 anos com uma meta de 4,5% para o IPCA, a economia viveu de tudo. Crescemos como a China, em 2010, e vivemos três anos de recessão, em 2009, 2015 e 2016, sendo que nos últimos dois anos as perdas do PIB passaram de 7%. O Banco Central também experimentou vários níveis de taxas de juros, entre a máxima de 19,75%, em julho de 2009, passando rapidamente pelos 7,25% de 2012, voltando aos 14,25% em julho de 2015, onde permaneceu por 15 meses, e os 7% de agora.
     

    Nestes 12 anos, o IPCA só ficou colado ao centro da meta em 2007 (4,46%) e em 2009 (4,31%), e abaixo disso em 2009 (3,14%). Nos outros 9 anos o índice oficial rodou bem perto dos 6%, ou acima dele, chegando a 10,67% em 2015. A banda de flutuação do sistema ficou em 2 pontos durante 11 anos, permitindo que o BC acomodasse choques de preços involuntários e também, infelizmente, o desejo político do governo petista, especialmente na gestão de Dilma Rousseff.
     

    Esta sopa de números mostra que a flutuação da inflação e da taxa de juros foi forte demais, o que não é nada saudável para nenhuma economia. A boa notícia é que, de um jeito, ou de outro, a moeda sobreviveu e o processo inflacionário não desandou, apesar de ter passado por momentos de altíssimo risco, como quando o governo de Dilma resolveu controlar preços à força e comprometer a credibilidade do BC.
     

    O debate sobre a redução da meta de inflação não é novo e abrange muitas questões que ultrapassam o escopo de atuação do Copom. É o caso da política fiscal, ou seja, dos gastos públicos. Quanto mais desequilibrada ela for, mais o BC precisa “compensar” os riscos do descontrole dos gastos com juros mais altos. Esta foi a fórmula que vimos atuar na última década. Mesmo em momentos em que foi possível reduzir a taxa básica da economia, com um IPCA mais comportado e previsível, o Copom sempre ficou limitado ao destempero fiscal estrutural do Brasil – caso da previdência e da folha de pagamento do funcionalismo público e também do crédito subsidiado pelos bancos públicos.
     

    Ora, você pode indagar, estamos exatamente num momento em que a situação fiscal é gravíssima, a mais grave da história, com inflação baixa e previsível. Há algumas diferenças estruturais que marcam este período. Do que depende do governo, as reformas aprovadas no último ano criaram uma nova fundação para a economia: teto de gastos, que limita o destempero do governo de plantão; a TLP, nova taxa de juros do BNDES que reduz subsídios ao crédito; redução da participação dos bancos públicos nas concessões de crédito; a reforma trabalhista que pode melhorar a arrecadação de impostos se a formalidade do mercado de trabalho aumentar.
     

    O plano de concessões e privatizações já apresentado colabora nas duas pontas: traz dinheiro para o caixa e reduz gastos futuros com a manutenção e os riscos das empresas repassadas ao setor privado. Há outros exemplos, mas os de cima são suficientes para demonstrar a mudança estrutural, sendo repetitiva, na relação entre despesas e receitas do governo. A própria retomada da atividade já trouxe aumento de arrecadação de impostos.
     

    A carta que o BC vai escrever ao ministro da Fazenda vai conseguir explicar o que aconteceu em 2017. Só a deflação de quase 5% no preço dos alimentos, depois da alta de 9% em 2016, já responde por muita coisa. A recuperação da credibilidade do BC deu mais segurança sobre o controle do processo inflacionário e também para as expectativas sobre o futuro. É improvável que o que vimos em 2017 se repita nos próximos anos. Mas isto não impede, ou pelo menos não deveria, um aprofundamento do debate sobre o tamanho da meta de inflação que o país precisa ter.
     

    Como tem acontecido com todas as análises sobre a economia brasileira, a última ressalva se repete: tudo isso será realidade se, e somente se, a reforma da Previdência for aprovada antes das eleições. O mundo vai acabar se isso não acontecer? Não, nem o Brasil. Vamos apenas abrir mão da oportunidade de viver durante mais tempo com menores solavancos na inflação e nos juros, o que nos daria mais chances de crescer com qualidade bem superior ao que experimentamos no passado.

Autores

  • Thais Herédia

    Jornalista, especialista economia e política; é colunista da Globo News. Foi assessora de imprensa no BC e gerente de comunicação do Carrefour. Na TV Globo, foi repórter de economia do Bom Dia Brasil. Tem pós-graduação em finanças pela FIA.

Sobre a página

A jornalista Thais Herédia comenta os principais fatos econômicos do país e do mundo e explica como eles afetam a sua vida.