Entre as estrelas
No meu penúltimo post, citei o IDFA (International Documentary Film Festival Amsterdam), o maior festival de documentários que existe. Vou aproveitar o gancho para falar do filme que ganhou a edição do ano passado, Posição entre as Estrelas (Position among the Stars), também exibido no Brasil no festival É Tudo Verdade deste ano.
É mais um documentário em que a câmera está tão perto, e por tanto tempo, que podemos pensar por vezes que aquilo é real demais para ser verdade. E mergulhamos tão fundo na história daquela família que esquecemos que existe um “estrangeiro” ali gravando. Só lembramos quando sobem os créditos e, principalmente os profissionais do ramo, terminamos por nos perguntar como os caras conseguiram aquilo tudo.
Na história, o morador de uma favela na Indonésia vai até o escritório da assistente social pedir uma bolsa do governo e se faz de coitado. Fala sobre a dureza da vida e, finalmente, o funcionário público é convencido de que o pedido é procedente, basta uma visita de praxe à casa do sujeito. O tal morador então volta apressadamente para casa, esconde a moto no banheiro, manda o filho guardar o Play Station, joga um monte de papelão no chão da sala e, com um invejável traquejo, convence o assistente social de que vive como catador desafortunado.
Em outra seqüência igualmente fantástica, um quebra-pau entre marido e mulher começa por causa de meia dúzia de peixinhos de briga, um “esporte” que eu não fazia idéia que era popular em algum lugar, tão surreal quanto o impiedoso treinamento diário para os lutadores: submeter os tais peixinhos a doses diárias de falta de oxigênio em um prato fundo seco.
Estou chamando a atenção aqui para os episódios mais pitorescos, mas o filme é também muito sensível e delicado ao abordar o conflito de gerações e as inquietações de cada membro dessa mesma família. “Posição entre as Estrelas” se tornou para mim referência definitiva de trabalho duro e dedicado, porque não é com meia dúzia de fitas gravadas que se cumpre um desafio aparentemente simples – mas quase inalcançável – que é retratar uma família qualquer.