seg, 31/10/11
por Paulo Coelho |
Um profeta chegou certa vez a uma cidade para converter seus habitantes.
A princípio, as pessoas ficaram entusiasmadas com o que ouviam. Mas – pouco a pouco – a rotina da vida espiritual era tão difícil, que homens e mulheres se afastaram, até que não ficou uma só alma para ouvi-lo.
Um viajante, ao ver o profeta pregando sozinho, perguntou:
— Por que continuas exaltando as virtudes e condenando os vícios? Não vês que ninguém aqui te escuta?
— No começo, eu esperava transformar as pessoas – disse o profeta. — Se ainda hoje continuo pregando, é apenas para impedir que as pessoas me transformem.
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dom, 30/10/11
por Paulo Coelho |
Um peregrino está obrigado a compartilhar com os outros tudo o que sabe do caminho. Quem ajuda, sempre é ajudado.
Precisamos dividir. Mesmo que sejam informações que todos já sabem, é importante não se deixar levar pelo pensamento egoísta de chegar sozinho ao fim da jornada. Quem faz isto, descobre um paraíso vazio, sem qualquer interesse especial – e em breve está morrendo de tédio.
Não podemos pegar as luzes que iluminam o caminho, e carregar conosco. Se agirmos assim, vamos encher nossas mochilas com lanternas, mas – para abrir espaço – teremos que nos livrar do alimento que nos dá força para seguir adiante: amor.
Neste caso, mesmo com toda a luz que carregamos, não vamos contar com uma boa companhia. De que adianta?
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sáb, 29/10/11
por Paulo Coelho |
Um paciente de 32 anos procurou o terapeuta Richard Crowley:
— Não consigo parar de chupar o dedo – disse.
— Não ligue pra isto — respondeu Crowley. — Mas chupe um dedo diferente a cada dia da semana.
A partir deste momento, o paciente – toda vez que levava a mão à boca – era instintivamente obrigado a escolher o dedo que devia ser objeto de sua atenção naquele dia. Antes que a semana terminasse, estava curado.
Quando o mal torna-se um hábito, fica difícil lidar com ele – conta Richard Crowley. — Mas, quando ele passa a nos exigir atitudes novas, decisões, escolhas, então temos consciência de que não vale tanto esforço.
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sex, 28/10/11
por Paulo Coelho |
Um mestre zen descansava com seu discípulo. A certa altura, tirou um melão do seu alforje, dividiu-o em dois, e ambos começaram a comê-lo.
No meio da refeição, o discípulo comentou:
— Meu sábio mestre, sei que tudo que o senhor faz tem um sentido. Dividir este melão comigo talvez seja um sinal de que tem algo a me ensinar.
O mestre continuou a comer em silêncio.
— Pelo seu silêncio, entendo a pergunta oculta – insistiu o discípulo. — E deve ser a seguinte: o gosto que estou experimentando ao comer esta deliciosa fruta está em que lugar: no melão ou na minha língua?
O mestre não disse nada. O discípulo, entusiasmado, prosseguiu:
— E como tudo na vida tem um sentido, eu penso que estou perto da resposta a esta pergunta: o gosto é um ato de amor e interdependência entre os dois, porque sem o melão não haveria um objeto de prazer, e sem a língua…
— Basta! – disse o mestre. — Os mais tolos são aqueles que se julgam os mais inteligentes, e buscam uma interpretação para tudo! O melão é gostoso, isto é suficiente, e deixe-me comê-lo em paz!
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qui, 27/10/11
por Paulo Coelho |
Um lavrador com a esposa doente encomendou uma série de preces a um sacerdote budista. O sacerdote começou a rezar, pedindo que Deus curasse todos os enfermos.
— Um momento – interrompeu o lavrador. — Eu pedi para que rezasse por minha esposa, e o senhor pede por todos os doentes.
— Estou rezando por ela.
— Mas pede por todos. Pode terminar beneficiando o meu vizinho, que está doente também. E eu não gosto dele!
— Você não entende nada de curas – disse o monge, afastando-se. — Ao rezar por todos, estou unindo minhas preces às de milhões de pessoas que encontram-se agora pedindo por seus doentes. Somadas, estas vozes chegam até Deus e beneficiam a todos. Divididas, elas perdem sua força, e não chegam a lugar nenhum.
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qua, 26/10/11
por Paulo Coelho |
O rabino Wolf entrou por acaso em um bar. Algumas pessoas bebiam, outras jogavam cartas, e o ambiente parecia carregado.
O rabino saiu sem comentar nada. Um jovem veio atrás dele.
- Sei que não gostou do que viu – disse o rapaz. – Ali só vivem os pecadores.
- Gostei do que vi – disse Wolf. – São homens que estão aprendendo a perder tudo. Quando tiverem mais nada de material neste mundo, só lhes sobrará voltar-se para Deus. E, a partir deste momento, que servos excelentes serão!
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ter, 25/10/11
por Paulo Coelho |
Um jovem muito rico foi encontrar-se com um rabino, e lhe pediu um conselho para orientar a vida. Este o conduziu até a janela:
- O que vês através dos vidros?
- Vejo homens passando, e um cego pedindo esmolas na rua.
Então o rabino mostrou-lhe um grande espelho:
- E agora, o que vês?
- Vejo-me a mim mesmo.
- E já não vês os outros! Repara que a janela e o espelho são ambos feitos da mesma matéria prima: o vidro. Mas no espelho, porque há uma fina camada de prata colada a vidro, enxergas apenas a ti mesmo. Deves comparar-te a estas duas espécies de vidro. Pobre, prestavas atenção aos outros e tinhas compaixão por eles. Coberto de prata – rico – só consegues admirar teu próprio reflexo.
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seg, 24/10/11
por Paulo Coelho |
Um homem resolveu visitar um ermitão que vivia perto do mosteiro de Sceta.
“Qual o primeiro passo daquele que pretende seguir o caminho espiritual?”, perguntou.
O ermitão levou-o até um poço, e pediu que olhasse seu reflexo na água. O homem obedeceu, mas o ermitão começou jogar pequenas pedras, fazendo com que a superfície se movesse.
“Não poderei ver direito o meu rosto enquanto o senhor jogar pedras”.
“Assim como é impossível ver seu rosto em águas turbulentas, também é impossível buscar Deus se a mente estiver ansiosa com a busca”, disse o monge. “Não faça perguntas, apenas siga adiante com fé. Este será sempre o primeiro e mais importante de todos os passos”.
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dom, 23/10/11
por Paulo Coelho |
Um homem recebeu, certa vez, a visita de alguns amigos.
“Gostaríamos muito que nos ensinasse aquilo que aprendeste todos estes anos”, disse um eles.
“Estou velho”, respondeu o homem.
“Velho e sábio”, disse outro. “Afinal de contas, sempre te vimos rezando durante todo este tempo. O que conversas com Deus? Quais são as coisas importantes que devemos pedir?”
O homem sorriu. “No começo, eu tinha o fervor da juventude, que acredita no impossível. Então, eu me ajoelhava diante de Deus e pedia para que me desse forças para mudar a humanidade. Aos poucos, vi que era uma tarefa além das minhas forças. Então comecei a pedir a Deus que me ajudasse a mudar o que estava à minha volta”.
“Neste caso, podemos garantir que parte de seu desejo foi atendido”, disse um dos amigos. “Seu exemplo serviu para ajudar muita gente”.
“Ajudei muita gente com meu exemplo; mesmo assim, sabia que não era a oração perfeita. Só agora, no final de minha vida, é que entendi o pedido que devia ter feito desde o início”.
“E qual é este pedido?”
“Que eu fosse capaz de mudar a mim mesmo”.
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sáb, 22/10/11
por Paulo Coelho |
Um homem larga a vida mundana e transforma-se em ermitão. Longe do centro de decisões políticas da época, passa anos de sua vida tentando preparar o caminho para o Messias. Define-se como “a voz que clama no deserto”.
Num primeiro momento, podemos pensar que tal homem – João Batista – não teria qualquer influência em sua época. Mas a história nos mostra o contrário: sua presença foi fundamental na vida de Jesus.
Quantas vezes nos sentimos como vozes que clamam no deserto? Nossas palavras parecem se perder no vento, nossos gestos aparentemente não despertam qualquer reação.
João persistiu; cabe a nós fazer o mesmo. As vozes que clamam no deserto são as que escrevem a história do seu tempo.
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