9.600 minutos na rádio CBN

ter, 03/09/13
por andre trigueiro |

 

Ao completar 10 anos como comentarista de sustentabilidade da Rádio CBN me deu vontade de fazer um breve balanço a partir do que me foi possível compartilhar em 9.600 minutos de informação e reflexões com os ouvintes sempre aos sábados e domingos, às 13:50h, em rede nacional.

Não seria possível resumir aqui tudo o que de mais importante aconteceu em uma década neste campo – já tão vasto e complexo –, mas tentarei apontar o que mais me chamou a atenção.

Apesar de todas as evidências de que a Humanidade interfere no comportamento do clima – e de que precisamos agir rápido para evitar os piores cenários –, aumentou a distância que separa a corrente majoritária dos cientistas dos tomadores de decisão, ou seja, não importa o que os cientistas estejam dizendo, os chefes de Estado permanecem pouco dispostos a ouvir. E isso é grave.

Seja na COP-15 (a mais importante Conferência do Clima realizada até hoje em número de chefes de estado) ou na Rio+20 ( a maior de todas as conferências da ONU também em número de líderes políticos), a retórica comprometida com “um mundo mais sustentável” contrastou violentamente com as ações desenvolvidas pela maioria absoluta desses países.

No campo energético, vale destacar duas revoluções em curso. Nos Estados Unidos, a exploração do shale gas (por aqui chamado de gás de xisto) reduziu drasticamente os custos de produção e a dependência daquele país em relação a petróleo e carvão mineral. A retomada da economia americana deve muito a essa nova fonte de energia mais barata. Nem os impactos ambientais causados pela “fracking” (tecnologia empregada para a obtenção do gás que já contaminou vários aquíferos subterrâneos) inibiu os investimentos crescentes nesta direção.

Enquanto isso, na Alemanha, a “enegywende” (“virada energética”, numa tradução livre) abriu caminho para a expansão sem precedentes de fontes limpas e renováveis, especialmente solar e eólica, em substituição às usinas nucleares, que serão totalmente desativadas nos próximos nove anos.

No Brasil, a energia eólica tornou-se competitiva – sem ajuda governamental –, cresceu e continua se expandindo em um ritmo frenético. O problema é que as redes de transmissão não acompanharam esse crescimento, o que ainda constitui um problema. Depois do vento, chegou a vez do sol. No próximo dia 18/11, o país realizará o primeiro leilão de energia com oferta para usina solar. Será o primeiro teste – de muitos que certamente virão – para um mercado que já é realidade em países como Estados Unidos, China, Alemanha e Espanha.

O Brasil também deu os primeiros passos na direção do smart grid – redes inteligentes de energia – permitindo legalmente a existência dos chamados micro-geradores de energia (pessoas físicas ou jurídicas que investem em pequenos sistemas de geração de energia renovável, como solar ou eólica) interligados à rede e “vendendo” o excedente para a distribuidora local de energia. Aos poucos, os relógios analógicos de luz vão sendo substituídos por equipamentos digitais que permitem a leitura do consumo à distância, o quanto cada equipamento doméstico gasta de eletricidade, etc.

No capítulo da água, a escassez de recursos hídricos levou a ONU a eleger, por duas vezes nesta década (2003 e 2013), a gestão inteligente da água como tema central de reflexões – e ações – da comunidade internacional. Apesar disso, os indicadores de poluição e desperdício de água ainda são considerados gravíssimos. Foi particularmente doloroso testemunhar a letargia dos governantes brasileiros em relação ao saneamento básico.

No capítulo da biodiversidade, a aprovação do Protocolo de Nagoya em 2010 ( que estabelece regras internacionais para a proteção da diversidade de espécies e dos recursos genéticos de plantas, animais e micro-organismos) significou um avanço importante para conter a atual escalada de destruição, mas o Congresso brasileiro – tendo à frente a bancada ruralista – rejeita a ratificação do Protocolo por entender que o texto ameaça os interesses do setor.

Nesses 10 anos testemunhamos o colapso da mobilidade urbana na maioria absoluta das cidades brasileiras pela multiplicação indiscriminada de carros – cujas vendas permaneceram aquecidas com sucessivas reduções do IPI – sem  que os devidos investimentos em transporte público de massa tivessem acontecido. As bicicletas – e o ciberativismo dos ciclistas – conquistaram espaços sem precedentes nas ruas, nas redes e nas novas disposições dos prefeitos em abrir caminho para as “magrelas”. Há muito por fazer, mas o que foi feito nos últimos anos faz vista.

Permanece a polêmica envolvendo o licenciamento de substâncias geneticamente modificadas, especialmente no setor de alimentos. Em 10 anos, os transgênicos se expandiram rapidamente pelo mundo – e muito especialmente no Brasil – embalados pelos interesses de grandes multinacionais por vezes acusadas de “atropelar” os protocolos de biossegurança mais razoáveis.

Em relação ao lixo, o Brasil conseguiu finalmente aprovar (foram aproximadamente 20 anos de espera no Congresso Nacional) a “Política Nacional de Resíduos Sólidos” que abre caminho para a erradicação dos lixões, a expansão da coleta seletiva, a logística reversa, o aproveitamento energético do lixo e a responsabilização de todos os elos da cadeia (de produção e de consumo) na destinação final dos resíduos. Ainda há muito trabalho pela frente até que a política dê os resultados esperados. Mas saímos da inércia.

Como se vê, são muitos os assuntos interessantes que testemunhamos e compartilhamos nesta década. Devo dizer que nada supera a força, o dinamismo e a capacidade do rádio chegar mais profundamente e rápido no coração das pessoas do que qualquer outro veículo de comunicação. De alguma forma, pelo retorno dos ouvintes, construí a convicção de que a informação acelera os processos de mudança do mundo. Participar desse processo como jornalista é simplesmente uma honra.

 

 Ouça o comentário “Os frutos do Mundo Sustentável”na Rádio CBN

 

Um ministro “verde” comanda o Itamaraty

seg, 26/08/13
por andre trigueiro |
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Luiz Alberto Figueiredo estreou na “ala verde” do Itamaraty assessorando o então Ministro das Relações Exteriores, Celso Lafer, durante a Conferência Internacional da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio 92). De lá para cá, assumiu funções cada vez mais importantes na condução dos trabalhos que nortearam a posição oficial do governo brasileiro em diferentes conferências internacionais das Nações Unidas.

Como negociador-chefe do Brasil na COP-15 (a maior e mais importante de todas as Conferências do Clima realizadas até hoje, em Copenhagen, na Dinamarca) Figueiredo teve de interromper reuniões de trabalho com os colegas diplomatas para assessorar diretamente a então pré-candidata à Presidência da República Dilma Rousseff, que apareceu por lá para marcar pontos na corrida eleitoral juntamente com os demais pré-candidatos Marina Silva e José Serra. Dilma ficou marcada pela gafe cometida durante uma entrevista coletiva quando disse que “o meio ambiente é um obstáculo ao desenvolvimento sustentável”. Pano rápido. E cara de paisagem para Figueiredo demais autoridades presentes.

A mais importante atribuição conferida a Luiz Alberto Figueiredo até ser nomeado hoje Ministro das Relações Exteriores foi a de coordenador-geral dos preparativos da Rio+20, o maior encontro da História da ONU em número de países. Ele organizou uma reunião com jornalistas semanas antes do evento para explicar os objetivos da Conferência, esclarecer dúvidas e manifestar com clareza as posições dele – e não apenas do país – em relação a várias questões.

Era comum ouvi-lo dizer que os negociadores dos países ricos “não eram ambientalistas”, e que as questões puramente econômicas preponderavam nos círculos diplomáticos. Defendia o direito de o país crescer de forma sustentável, desde que as nações mais ricas também assumissem compromissos nessa direção. 

Com o tempo, Figueiredo aprendeu o “ecologês” e tomou gosto pelos assuntos ambientais. Em momentos de descontração, compartilhava suas expectativas mais sinceras de acordos multilaterais amplamente favoráveis à sustentabilidade, mesmo sabendo que isso seria impossível.

Agora Ministro, no comando do Itamaraty, Figueiredo terá a chance de qualificar melhor a posição do Brasil em duas agendas internacionais que convergirão em 2015. No calendário das negociações do clima, 2015 será o ano em que os países deverão apresentar prazos e metas para a mitigação e a adaptação das mudanças do clima. Também daqui a dois anos, as nações do planeta deverão apresentar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) que substituirão as Metas do Milênio da ONU, resultado direto da Rio +20, organizada por ele.

Pode-se dizer que ele é hoje o diplomata mais preparado para assumir a condução dessas negociações estratégicas. Como ministro, é apenas um servidor direto da Presidência da República, mas que pode influenciar as canetadas da exigente chefe.

Papa fez História, mas não falou de sustentabilidade

seg, 29/07/13
por andre trigueiro |
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Foi uma visita arrebatadora.

O Papa endereçou mensagens pontuais a diferentes segmentos da sociedade ao longo de toda a Jornada Mundial da Juventude. 

Instigou os jovens a irem para as ruas e “fazerem confusão”, em defesa dos espaços que precisam ser ocupados por eles na sociedade.

“Sejam revolucionários. Tenham a coragem de seguir contra a corrente. De serem felizes”.

No dia dos avós, abençoou os mais velhos e criticou a exclusão a que são submetidos.

Na favela de Varginha, lembrou da generosidade de quem é pobre quando se põe “mais água no feijão”.

Em Copacabana, fez uso de outra expressão idiomática tupiniquim ao recomendar que se “bote fé, bote esperança e bote amor!”.

No Theatro Municipal, defendeu a reabilitação da política, considerada por ele uma das formas mais altas de caridade, e o diálogo permanente entre as partes conflitantes: “Entre a indiferença egoísta e o protesto violento, há uma opção sempre possível: o diálogo”.

No Sumaré, criticou o “clericalismo” e convidou o corpo da Igreja a sair da zona de conforto em favor dos necessitados e ir para as ruas.  

Em resumo: o Papa disse a que veio e marcou novas e importantes posições em seu recém-inaugurado pontificado.

Revelou-se um pastor antenado com as demandas de seu tempo.

Mas para um Papa chamado “Francisco”, inspirado no poverello de Assis – o padroeiro da Ecologia – esta teria sido uma ótima oportunidade de mencionar em algum momento da Jornada a maior crise ambiental da História da Humanidade.

Não apenas por este ser um assunto de interesse da maioria dos jovens, mas principalmente pelo fato de que esta crise afeta diretamente os mais pobres.

São os pobres, miseráveis e excluídos os que mais sentirão os efeitos da escassez de água doce e limpa, da desertificação do solo, das mudanças climáticas e seus efeitos devastadores (eventos extremos, elevação do nível do mar, mudança do ciclo das chuvas, etc).

De forma indireta, o Papa defendeu questões caras ao ambientalismo quando condenou o consumismo, a cultura do descartável e do perecível, escolheu carros mais simples como meio de transporte, recebeu índios no palco do Theatro Municipal e, num gesto de simpatia, até trocou o solidéu por um cocar.

Mas, para o primeiro Papa Francisco da História da Igreja, é enorme a expectativa de que a sustentabilidade passe a estar presente de forma direta no discurso, fecundando a palavra que orienta e esclarece multidões.

Único país do mundo com nome de árvore, potência megabiodiversa, o Brasil seria o lugar ideal para que em algumas palavras, Francisco relembrasse o quanto a espécie humana depende visceralmente de um meio ambiente saudável e resiliente.

O sistema condenado pelo Papa é aquele que discrimina os mais jovens, os mais velhos e os índios, e exclui os que não têm dinheiro. Trata-se do mesmo sistema que dilapida os recursos naturais como se não houvesse amanhã, arruinando o nosso futuro comum.

Uma coisa está relacionada à outra.

Francisco tem um pontificado inteiro pela frente para a operação-desmonte desse sistema. Que aquele que lhe empresta o nome o abençoe e proteja.

Saindo do ponto morto…

dom, 23/06/13
por andre trigueiro |
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Dilma convidou os prefeitos das capitais para uma reunião de trabalho nesta segunda-feira (24) às 16h. Antes, ao meio-dia, eles se reúnem entre si na capital federal num encontro promovido pela Frente Nacional dos Prefeitos. Querem afinar as propostas antes da conversa com a Presidenta.

São duas as medidas relacionadas à mobilidade urbana que os prefeitos devem apresentar à Dilma.

Que se institua a CIDE (Contribuição de Intervenção de Domínio Econômico) para subsidiar o transporte público. Ou seja, quem tem automóvel e abastece o veículo com álcool ou gasolina, passaria a subsidiar com recursos extras o transporte coletivo. É o que o Prefeito de Porto Alegre, atual Presidente da Frente Nacional dos Prefeitos, José Fortunati, gosta de chamar de imposto de Robin Hood : “quem quer andar de carro, que incentive o ônibus”, diz ele.

Os prefeitos também querem o apoio de Dilma para aprovar um projeto que tramita há dez anos no Congresso e que sugere a criação de um “Regime Especial de Incentivos para o Transporte Coletivo”.  Na prática, o projeto torna possível a desoneração de todos os impostos em cascata que incidem sobre o transporte público.

A intenção dos prefeitos é condicionar a vigência desse Regime Especial apenas às cidades que criarem um “Conselho Municipal de Usuários do Transporte Público”, que teria representantes de diversos setores da sociedade com a função de fiscalizar as receitas e as despesas das operadoras de transporte, planilhas de custo, margens de lucro e etc. A expectativa dos defensores da criação deste conselho é implodir todas as caixas pretas que tornam obscuros os números do setor.

Tudo isso só está acontecendo por conta das manifestações de rua. Elas ecoaram nos gabinetes. A agitação nos meios políticos é grande. O custo da inação será muito maior do que qualquer providência que seja tomada a partir de agora – com a celeridade possível – em favor das reivindicações.

Ponto para as ruas.

Quando retroceder é avançar

qua, 19/06/13
por andre trigueiro |
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Que diferença faz o que disseram dias atrás os prefeitos de São Paulo e do Rio (e os alcaides de outras cidades brasileiras) quando defenderam a manutenção dos preços das passagens de ônibus?

De que valem neste momento os contratos de reajuste, as planilhas de custo, os índices que medem a inflação?

Tudo isso ruiu diante da constrangedora realidade revelada nas manifestações de rua dos últimos dias.

Não importa quantos na multidão são usuários de ônibus.

Não importa que esta seja apenas uma das pautas do movimento que virou notícia no mundo inteiro.

Não faz diferença se o Palácio do Planalto entrou no circuito (junto com alguns governadores) para alinhar as medidas de contenção numa tentativa de esfriar os ânimos dos manifestantes.

O que merece atenção agora é que eles ouviram.

Aqueles que mandam, ouviram.

E a democracia brasileira abre espaço para algo diferente, certamente inédito nestas proporções.

Da rua veio o recado. Dos gabinetes veio a resposta, ainda que tardia.

Sim, reduziremos as tarifas. E não apenas dos ônibus.

É o suficiente para dispersar as multidões?

Quem saberá? Por hora, vale reconhecer que a distância entre as ruas e os gabinetes diminuiu.

E isso não é pouca coisa.

Nas ruas, de novo

ter, 18/06/13
por andre trigueiro |
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O imponderável, novamente, dita os rumos da História. Ninguém previu. Ninguém sabe o que será. Mas há um movimento em curso. Isso é História.

O que leva uma tsunami de gente para as ruas desse jeito?

A pauta de reivindicações é difusa. Começou com a elevação da tarifa dos ônibus, alcançou o elevado custo assumido pelo país para sediar a Copa – e o superfaturamento de boa parte dos novos estádios – e se espraiou pelas múltiplas agendas (todas urgentes e oportunas) em favor da qualidade da saúde e da educação, do combate à corrupção etc.

As lideranças são pouco conhecidas, e não se pode atribuir a elas tamanho poder de arregimentar tanta gente.

Por que então tantos resolveram protestar agora?

O emprego da força máxima contra os manifestantes ajudou a fermentar a massa.

Balas de borracha disparadas a esmo, pimenta em forma de gás e bombas lacrimogêneas que perturbam os sentidos por longos minutos revelaram o despreparo de certos policiais para lidar com situações do gênero.

Mas a verdadeira arma não letal foram os celulares que fotografam, filmam e disparam mensagens nas redes sociais.

Flagrantes de ataques gratuitos contra manifestantes se transformaram rapidamente em novos virais.

E o Batalhão de Choque entrou em curto. Em algumas cidades, saiu de cena.

Alguns manifestantes – a minoria – cometeram atos de violência e depredação.

É gente que não entendeu ainda como as manifestações pacíficas são arrebatadoras.

Nesta segunda-feira, 17 de junho, multidões há muito tempo ausentes das ruas voltaram à ativa.

Ativo. Não mais passivo. Não nesta segunda-feira.

Um dia em que, provavelmente (poucos) políticos experimentaram um estado de graça. Em que (muitos) políticos ficaram sem graça. Em que todos os políticos aprenderam uma lição, de graça.

Balanço de um ano na área ambiental

qua, 05/06/13
por andre trigueiro |
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Decidi aproveitar o dia de hoje (5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente) para listar 10 dos mais importantes assuntos ocorridos na área ambiental desde junho do ano passado no Brasil e no mundo. A lista, embora incompleta e arbitrária (a escolha dos assuntos foi minha), indica avanços e retrocessos significativos nesta longa, porém irreversível jornada rumo a um mundo mais sustentável.

A revolução energética do gás de xisto
O aperfeiçoamento de tecnologias de extração de petróleo e gás possibilitou o acesso a grandes reservas presas em depósitos de xisto dos Estados Unidos – especialmente em Dakota do Norte e no Texas – determinando uma importante mudança na geopolítica energética do mundo. Ao ampliar a participação do gás em sua matriz – muito mais barato do que as demais fontes de energia – os Estados Unidos voltaram a atrair as grandes indústrias para seu território. O país também aumentou a exportação de carvão mineral, especialmente para a Europa, e reduziu a importação de petróleo. Se o xisto está ajudando os americanos a sair da crise, permanece a desconfiança de que a técnica empregada para a obtenção do gás incrustado nessas rochas – “fracking”– não é segura ambientalmente, dado o risco de contaminação das águas subterrâneas. Vários casos de contaminação foram registrados em solo americano. O Brasil licitará em outubro, pela primeira vez, a exploração do gás de xisto. Será mais seguro por aqui?

O céu é o limite
Pela primeira vez na História da Humanidade, alcançamos a concentração recorde de 400 partes por milhão de dióxido de carbono na atmosfera (400 ppm de CO2). A principal causa é a queima progressiva de combustíveis fósseis. A impressionante velocidade com que o principal gás de efeito estufa vem se acumulando (280 ppm antes da Revolução Industrial, 320 ppm na década de 1950) e a iminente ultrapassagem do índice apurado semanas atrás – considerada uma medida simbólica que marca uma tendência preocupante na direção do agravamento do efeito estufa – indica que as mudanças em curso, de acordo com a parcela majoritária da comunidade científica, deverão causar mais problemas econômicos, sociais e ambientais em escala global.

Ter ou não ter editoria de meio ambiente?
A decisão do “The New York Times” de fechar sua prestigiada editoria de meio ambiente – remanejando os jornalistas especializados no assunto para outras editorias – teve repercussão internacional. Afinal de contas, seria preciso ter uma editoria especializada em meio ambiente para se cobrir bem o tema? Na opinião dos diretores do NYT, como a sustentabilidade é um assunto transversal (alcança indistintamente todas as áreas do saber e do conhecimento) os “eco-jornalistas” seriam melhor aproveitados nas editorias convencionais (economia, política, cultura, cidade, etc.) aprimorando a cobertura dos demais assuntos do dia-a-dia com um toque “verde”. Um saudável debate que ganhou espaço mundo afora.

Balanço da Rio+20
O legado da maior conferência da História da ONU em número de países não parece ter contaminado efetivamente o rumo dos acontecimentos no mundo desde junho de 2012. O monumental descolamento entre a “real politik” dos tomadores de decisão e o mundo real revelado à luz da ciência está custando cada vez mais caro às gerações futuras. Preconiza-se como princípio que o custo da inação é muito superior ao custo dos ajustes que se fazem necessários para a implementação de uma “economia verde”. Mas pouco tem sido feito nesse sentido.

Um ano de Código Florestal
A baixíssima adesão dos proprietários rurais ao chamado CAR (Cadastro Ambiental Rural) – principal ferramenta para a adequação ambiental das propriedades – gera preocupação. Segundo o próprio Ministério da Agricultura, mais de 4 milhões de propriedades rurais no país têm alguma pendência ambiental. Estima-se que, até o momento, menos de 5% dos proprietários rurais tenham se cadastrado. Alguns mapeamentos feitos por satélite indicam que o desmatamento tem aumentado no Brasil.

Tem raposa no galinheiro?
A Comissão de Meio Ambiente no Senado virou posto avançado da bancada ruralista. Liderados pelo ex-governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, um dos maiores produtores individuais de soja do mundo, a comissão abriga ainda os senadores Ivo Cassol, José Agripino, Garibaldi Alves Filho e Kátia Abreu, presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Nada contra a legítima presença de ruralistas na comissão, até porque não é possível imaginar uma agricultura forte sem um meio ambiente saudável e resiliente. O problema é quando os interesses públicos e privados se misturam (situação combatida pelo próprio regimento, embora inócua na prática) ou quando se usa a comissão para reduzir a proteção das florestas ou os direitos das comunidades indígenas.

Desprestígio das comunidades indígenas
Agravou-se a tensão nas comunidades indígenas com a tramitação no Congresso da PEC 215, que na prática torna sem efeito a parte do Estatuto do Índio (Lei 6.001/73) – regulamentado pelo Decreto 1.775/96 – que estabelece que “a demarcação de terras indígenas cabe à União, com base em estudos e sob a orientação da Fundação Nacional do índio (Funai)”. Pelas novas regras, ainda em discussão, as demarcações passariam a ser submetidas à aprovação do Congresso Nacional. Teme-se que os interesses regionais e/ou corporativos (especialmente aqueles ligados ao agronegócio) impactem negativamente o destino de comunidades ameaçadas. Há novos conflitos abertos entre indígenas e fazendeiros em várias regiões do país.

O aumento do lixo
Um estudo da Abrelpe (Associação Brasileiras das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais) divulgado semanas atrás revela que nos últimos 10 anos a população do Brasil cresceu quase 10% (9,65%), enquanto que o volume de lixo no mesmo período aumentou 21%. O incremento de aproximadamente 40 milhões de pessoas na chamada “nova classe média” fez aumentar exponencialmente a geração de resíduos. Apenas no ano passado foram descartados 24 milhões de toneladas de resíduos em lugares inadequados, o suficiente para encher 168 estádios de futebol do tamanho do Maracanã. Como a maioria dos municípios (mais de 3 mil) ainda descarta o lixo a céu aberto em vazadouros clandestinos (o popular “lixão”) a situação é preocupante. Embora a Política Nacional de Resíduos Sólidos estabeleça o prazo final para a erradicação dos lixões em todo o território nacional até 2014, a Frente Nacional dos Prefeitos já defende a prorrogação do prazo, sob a alegação de que os municípios mais pobres não têm dinheiro para providenciar os ajustes necessários.

A hora e a vez das “magrelas”
As bicicletas ocuparam espaços sem precedentes na mídia brasileira por conta de sucessivos acidentes com ciclistas – especialmente, o crescimento do número de mortos sobre duas rodas em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro – e a preocupação das autoridades em anunciar medidas em favor do aumento de ciclovias, ciclofaixas e bicicletários. É notório o aumento do número de ciclistas e a mobilização das redes em favor das bicicletas.

Nota zero para o IPI Zero
O derrame indiscriminado de automóveis nas cidades brasileiras tem o respaldo do Ministério da Fazenda, que mais uma vez reduziu o IPI (Imposto sobre Produtos Industriais) para carros zero km. O que à primeira vista parece ser um estímulo para a economia (pelo aumento do dinheiro em circulação nas cadeias produtivas) agrava a mobilidade urbana com impactos diretos sobre a mesma economia. Apenas em São Paulo, cidade mais motorizada do país, um estudo coordenado pelo vice-presidente da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e ex-secretário municipal de Desenvolvimento Econômico e Trabalho de São Paulo, Marcos Cintra, revelou que os engarrafamentos geram aproximadamente R$ 40 bilhões de prejuízo por ano à capital paulista.

A geração 400 ppm

seg, 13/05/13
por andre trigueiro |
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Cada geração deixa para a seguinte um legado, uma herança, uma marca de sua passagem pela Terra. Quando na última quinta-feira (9), dois diferentes observatórios internacionais confirmaram a concentração recorde de 400 partes por milhão de C02 na atmosfera, materializamos um dos mais terríveis legados da nossa geração. Se for para ser assim, é bom que saibamos exatamente o que isso significa.

Apesar de todos os alertas da comunidade científica – especialmente do grupo de aproximadamente 2.500 cientistas reunidos no Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU – chegamos ao patamar considerado de risco para que os fenômenos climáticos ocorram de forma minimamente previsível e não ameace a vida tal como a conhecemos. Ou seja, estaríamos maculando o software inteligente da natureza através do qual os ciclos climáticos se resolvem.

Sim, ao longo de sua história o planeta já sofreu várias glaciações e já conheceu períodos de concentrações ainda mais intensos de CO2 na atmosfera. O fato é que jamais tamanha acumulação de gases na atmosfera aconteceu tão rapidamente, determinando em um período tão curto de tempo variações tão importantes de temperatura. Em resumo: este novo ciclo de aquecimento global guarda uma forte relação com nossos hábitos, comportamentos, padrões de consumo e estilos de vida.

É como diz Nate Lewis, do Instituto de Tecnologia da Califórnia: “A composição da atmosfera terrestre tem permanecido relativamente imutável por 20 milhões de anos. Mas nos últimos 100 anos, começamos a transformar de forma drástica essa atmosfera, e a mudar o equilíbrio de calor entre a Terra e o Sol, de modo que essas mudanças poderão afetar enormemente o habitat de cada planta, animal ou ser humano neste planeta”.

A capacidade de o planeta “metabolizar” os gases-estufa através de fenômenos naturais de absorção pelos oceanos, solos e florestas é de aproximadamente 5 bilhões de toneladas por ano. Apenas no ano de 2008 (no auge da crise internacional e com as economias do mundo desaceleradas) emitiu-se 7,9 bilhões de toneladas com a queima de combustíveis fósseis e 1,5 bilhão de toneladas com os desmatamentos. Esses 4,4 bilhões de toneladas a mais vão se acumulando lenta e perigosamente na atmosfera, agravando a retenção de calor.

Os 10 anos mais quentes já registrados desde o início das medições, em 1880, ocorreram a partir de 1996. A concentração de 400 ppm de CO2 registrada dias atrás projeta um cenário de aquecimento – se nada for feito e continuarmos aumentando nesse ritmo as emissões de gases-estufa – que poderá chegar aos 6,4 ºC graus até o final do século.

Usinas termoelétricas a carvão estão entre principais emissoras de carbono na atmosfera (Foto: AP Photo/Charlie Riedel)

Professor de Política Ambiental em Harvard e ex-presidente da Associação Americana para o Progresso da Ciência, John Holdren explica de forma bastante simples os impactos da elevação da temperatura do planeta: “A temperatura normal de seu corpo é cerca de 37 ºC. Quando sobe um pouco, até 39 ºC, isso já é uma coisa grave, e mostra que há alguma coisa errada com você”.

O degelo das calotas polares (que vem acontecendo numa velocidade superior à prevista pelos estudiosos) e a expansão volumétrica dos oceanos já determinaram a elevação do nível do mar entre 10 cm e 20 cm no século passado. Parece pouco, mas não é. Em um planeta mais quente esses processos serão intensificados e deverão modificar a geografia costeira dos continentes com impactos diretos sobre aproximadamente 600 milhões de pessoas que vivem em áreas mais vulneráveis.

Haverá também mudanças importantes nos ciclos de degelo em cordilheiras nevadas como os Andes e os Himalaias. Isso significa a interrupção do abastecimento regular de água em períodos de estiagem em países como China, índia e Peru, com graves impactos na produção de alimentos. Certas culturas agrícolas mais sensíveis já estão sendo realocadas pois não se adaptam facilmente à mudança do clima. Isso tem provocados sucessivas quebras de safra e riscos reais para a segurança alimentar em várias partes do mundo.

A acidificação dos oceanos – causada pelo acúmulo de CO2 – e a elevação da temperatura da água já estão determinando perdas importantes nos ecossistemas marinhos. A principal delas é a morte dos corais, base da cadeia alimentar de inúmeras espécies. Sem redes de corais resilientes e saudáveis, os impactos econômicos e sociais sobre quem pesca, quem processa o pescado e quem se alimenta de peixes e frutos do mar é incalculável.

São muitos os estudos revelando os impactos das mudanças climáticas sobre espécies animais e vegetais. Nos diferentes reinos da natureza, nem todos os seres vivos se adaptam a mudanças de temperatura.  Considerando o nível de interdependência entre as espécies, cada perda significa um novo risco sistêmico, enfraquecendo a “teia da vida”.

A mudança do ciclo da chuva é particularmente dramática em países como o Brasil, que depende de “São Pedro” para manter uma agricultura forte e pujante e uma matriz energética fortemente baseada em hidroeletricidade. Para sustentar o nível dos rios e das represas em padrões adequados, é preciso chover no lugar certo, e de preferência, nos períodos certos.

O agravamento dos chamados eventos extremos – aumento do poder de destruição de furacões, ciclones, tornados, tufões, secas, inundações etc – tornou obrigatória a definição de novos protocolos de segurança, alertas meteorológicos, macrodrenagem urbana, contenção de encostas, remoção das áreas de risco e etc.

São muitas as mudanças necessárias e urgentes na direção da mitigação (redução das emissões de gases-estufa) e adaptação (ações que reduzam os impactos inevitáveis causados pelas mudanças climáticas). O incrível – ou melhor, o absurdo – é que a ampla maioria dos países endossa os alertas da comunidade científica, financia as pesquisas de ponta relacionadas às mudanças climáticas, assina acordos internacionais importantes como o do Clima (1992) e o Protocolo de Kyoto (1997), envia representantes para as Conferências das Partes organizadas pela ONU para debater o assunto, mas, apesar de tudo isso, não consegue praticar o que fala.

É enorme a distância que separa as “boas intenções” das medidas concretas e efetivas que reduzam os estragos das mudanças climáticas. São muitos os chefes de estado que posam com o cenho franzido na foto, declaram-se publicamente preocupados e comprometidos, mas que nada ou pouco fazem. A atual geração de líderes políticos entra para a história como os avalistas do indigesto legado de 400ppm de CO2 na atmosfera.

Esse descolamento entre o discurso engajado e as políticas públicas se materializou fortemente no ano passado durante a Rio+20 (o maior encontro internacional da História em número de países), quando a proposta de se reduzir ou eliminar os subsídios da ordem de 1 trilhão de dólares destinados anualmente à exploração de petróleo foi solenemente ignorada na Cúpula. O Brasil, por exemplo, que realiza esforços e manobras contábeis sem precedentes para financiar a exploração do petróleo na camada pré-sal, foi contra.

Trata-se do mesmo governo que ignorou o prazo estipulado pela Política Nacional de Mudança do Clima (abril do ano passado) para que fossem anunciadas as metas para a redução das emissões de gases estufa em setores específicos da nossa economia.

Fundador do World Watch Institute, atual presidente do Earth Policy Institute, o pesquisador Lester Brown, em um dos capítulos do livro “Plano B 4.0”, resumiu da seguinte maneira o tamanho do desafio que os atuais chefes de estado não parecem dispostos a enfrentar com a devida celeridade:

“Dada a necessidade de simultaneamente estabilizar o clima e a população, erradicar a pobreza e restaurar os sistemas naturais da Terra, a civilização enfrenta, neste início de século 21, desafios sem precedentes. Responder bem a pelo menos um deles já seria algo importante. Mas o grave quadro exige responder efetivamente a cada um deles ao mesmo tempo, tendo em vista a interdependência entre os problemas”.

Tal como hoje se dá na Alemanha, quando as novas gerações estudam o nazismo nas escolas e depois, em casa, os netos perguntam para os avôs: “O que o (a) senhor (a) fez para impedir isso?”, é bastante provável que em um futuro próximo também os nossos netos nos perguntem: “Quando se confirmou o risco do pior cenário climático, o que o (a) senhor (a) fez para impedir isso?”

Qual será a sua resposta?

(leia também o artigo publicado nesta coluna em 3/7/2012 : “Todos somos céticos”

Por que o Rio decidiu multar quem joga lixo no chão?

qua, 10/04/13
por andre trigueiro |
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A partir do próximo mês de agosto, aproximadamente 500 agentes públicos participarão de uma operação permanente – e inédita – nas ruas do Rio de Janeiro. Eles vão multar quem for flagrado jogando lixo no chão. E não importa o tamanho do resíduo.

Para volumes pequenos, que tenham tamanho igual ou menor ao de uma lata de cerveja, a multa é de R$ 157. Para resíduos maiores que uma lata de cerveja e menores que um metro cúbico, o valor sobe para R$ 392. O que for descartado de forma inadequada com tamanho acima de um metro cúbico custará ao infrator R$ 980. Em caso de entulho, o valor sobre para R$ 3 mil.

Depois de quase dois meses de consultas ao Departamento Jurídico da Comlurb (Companhia Municipal de Limpeza Urbana) e à Procuradoria do Município, a Prefeitura chegou à conclusão de que a melhor maneira dessa nova regra “pegar”, ou seja, de a multa surtir o efeito desejado e constranger o cidadão a não jogar lixo no chão, era garantir que o valor estabelecido será pago e que o eventual não pagamento significará uma enorme dor de cabeça para o infrator.

Vai funcionar assim: cada equipe de fiscais será composta por um guarda municipal, um policial militar e um agente de limpeza da Comlurb. Caberá ao guarda municipal levar consigo um computador de mão com acesso à internet, acoplado a uma impressora. Ao flagrar o lançamento irregular de lixo no chão, a equipe fará imediatamente a abordagem para obter o CPF do infrator. Basta o número do CPF para que a multa seja impressa na hora no local do flagrante. Se o cidadão se recusar a dar o CPF, será levado pelo policial militar até a delegacia mais próxima como já acontece com quem é flagrado fazendo xixi na rua.

Quem for multado tem o direito de recorrer. Se ainda assim for considerado culpado e decidir não pagar a multa, terá o título protestado pela Prefeitura. Ou seja, ficará com o nome “sujo” na praça e poderá ter dificuldades para pedir empréstimos ou fazer compras a prazo.

É possível que alguém considere exageradas estas medidas. Mas exagerado é o volume de lixo abandonado no lugar errado no Rio. Apenas no ano passado, foram recolhidas das ruas, praias, encostas e outros lugares onde não deveria haver lixo nenhum mais de 1,2 milhão de toneladas de resíduos. O equivalente a três Maracanãs repletos de lixo.

A eventual falta de lixeiras por perto não deveria servir de desculpa, pois que em várias cidades do mundo elas também não são fáceis de encontrar (no Japão há cidades em que elas são raríssimas) e nem por isso há sujeira nas ruas. Nessas cidades, o cidadão reconhece a parte que lhe cabe em relação ao lixo que gera, e não se importa de transportar consigo o resíduo até que seja possível descartá-lo de forma segura.

Apenas para dar um exemplo da situação limite a que o Rio chegou: na Avenida Rio Branco, uma das mais movimentadas da cidade, existem 100 cestas coletoras de cor abóbora, daquelas que chamam a atenção de longe. Ainda assim, são abandonados no chão 580 quilos de lixo por dia. Uma equipe de 16 garis é obrigada a varrer as calçadas da Rio Branco quatro vezes por dia.

O mesmo acontece em outras importantes vias públicas da cidade como a Avenida Nossa Senhora de Copacabana (4 toneladas/dia), Rua Coronel Agostinho, em Campo Grande (1,5 tonelada /dia), Avenida Presidente Vargas (780 kg/dia) e Estrada do Portela (435 kg/dia).

O que passa despercebido pela maioria das pessoas que jogam sem cerimônia seus resíduos no chão é que esse simples gesto tem um impacto importante sobre o orçamento do município. Apenas no ano passado, foram gastos R$ 600 milhões com toda a logística que envolve a limpeza das calçadas e a retirada de lixo das praias. Se fosse possível reduzir em apenas 15% o volume de lixo despejado no lugar errado, o dinheiro economizado seria suficiente para construir , segundo cálculos da própria Comlurb, 1.184 casas populares, 30 Clínicas da Família ou 22 creches modernas como são os espaços de desenvolvimento infantil (EDIS).

Sem a colaboração cidadã de parte expressiva dos moradores da cidade, a Comlurb vem demandando cada vez mais recursos públicos. O orçamento de R$ 1,2 bilhão já é o quinto maior do município. Um absurdo, considerando que o crescimento dos gastos ocorre em grande parte por displicência de quem suja a cidade.

E vem sujando cada vez mais.

O ano de 2013 já começou com um novo recorde em sujeira nas praias. 768 toneladas de lixo foram recolhidas das areias, um aumento de 19% em relação ao ano passado. Depois veio o carnaval, e no embalo dos blocos, mais um recorde de sujeira. 1120 toneladas de lixo, um crescimento de 12% em relação ao ano anterior. Para completar a situação, o Rio de Janeiro foi escolhido em fevereiro a nona cidade mais suja do mundo, numa lista de 40 dos mais importantes destinos turísticos do planeta. Vexame internacional.

A aplicação de multas não resolve o problema, mas pode inibir bastante a recorrência deste lançamento indiscriminado de resíduos no lugar errado. Tal como aconteceu quando se decidiu aplicar multas mais salgadas nos motoristas que fossem flagrados sem o cinto de segurança, ou mais recentemente nos condutores embriagados, há um efeito didático poderoso quando o que está em jogo é o risco de prejuízo financeiro.

Se o bolso continua sendo a parte mais sensível do ser humano, é por aí que se deve buscar a “consciência” do cidadão em favor de uma sociedade melhor e mais justa.

 

Links de reportagens exibidas sobre o assunto:

Jornal da Globo (9/4/13)

RJTV 1ª edição (9/4/13)

RJTV 2ª edição (9/4/13)

Reduzir IPI de carro é miopia econômica

seg, 01/04/13
por andre trigueiro |
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Assim que o governo anunciou mais uma prorrogação de IPI reduzido para carros zero, acessei o site do Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) para checar o tamanho atual da frota automobilística brasileira. Os dados são públicos e podem ser verificados no link https://www.denatran.gov.br/frota.htm

Por nosso país circulam oficialmente (dados consolidados de fevereiro/2013) mais de 43 milhões de automóveis (43.085.340), sendo que a maioria absoluta desses carros se concentra nas regiões metropolitanas. A situação é mais preocupante nas três principais capitais da região Sudeste, a mais rica e densamente povoada do país. São Paulo (4.858.630 de automóveis), Rio de Janeiro (1.764.089) e Belo Horizonte (1.059.307) ostentam números que devem soar como música para os economistas de plantão em Brasília, mas que representam um gigantesco obstáculo para a mobilidade urbana e para a qualidade de vida não apenas dessas, mas das principais cidades brasileiras.

De acordo com o relatório “Metrópoles em números: crescimento da frota de automóveis e motocicletas nas metrópoles brasileiras 2001/2011” (https://observatoriodasmetropoles.net/download/relatorio_automotos.pdf), do Observatório das Metrópoles, o número de automóveis em todas as 12 metrópoles do país dobrou de tamanho neste período (aumentou de 11,5 milhões para 20,5 milhões). Já as motocicletas passaram de 4,5 milhões para 18,3 milhões em apenas dez anos.

O estudo revela que as metrópoles brasileiras reúnem aproximadamente 44% de toda a frota do país. Nesta década, registrou-se um aumento de 8,9 milhões de automóveis, aproximadamente 77,8%. Em média, foram adicionados mais de 890 mil veículos por ano. “As metrópoles brasileiras têm enfrentado nos últimos anos o que podemos chamar de uma ‘crise de mobilidade urbana’, resultante, sobretudo, da opção pelo transporte individual em detrimento das formas coletivas de deslocamento”, afirma o relatório. ”Um sistema eficiente de mobilidade é essencial para o acesso ao mercado de trabalho, à educação, ao consumo e ao lazer, ou seja, é uma condição fundamental para a construção do chamado bem-estar humano”, conclui o responsável pelo estudo, Jaciano Martins Rodrigues, doutor em Urbanismo (PROURB/UFRJ) e pesquisador do INCT/Observatório das Cidades.

Em artigo publicado nesta coluna, em setembro do ano passado (https://g1.globo.com/platb/mundo-sustentavel/2012/09/19/dez-razoes-para-levar-a-serio-o-dia-mundial-sem-carro/), resumi em 10 tópicos as razões pelas quais deveríamos considerar a multiplicação indiscriminada de carros no Brasil um risco real para a economia, a saúde, o bem-estar social, o clima e o direito constitucional de ir e vir. 

É evidente que a produção de automóveis responde a uma demanda da sociedade que ainda considera o carro um dos principais sonhos de consumo. Há também uma participação importante no PIB (5%) e na geração de empregos (131,7 mil funcionários). 

O que nos parece urgente é a reflexão sobre a conveniência de o governo renovar incentivos fiscais (renúncia adicional de R$ 2,2 bilhões em impostos de abril a dezembro de 2013) a um setor da economia já bastante próspero e lucrativo, sem que se considerem os – cada vez mais notórios – impactos negativos dessa medida.

É óbvio que os economistas do Ministério da Fazenda que assinam a prorrogação do IPI reduzido para carros zero julgam ser esta uma medida fundamental para manter a economia aquecida. Contudo, parece também evidente que os argumentos em sentido contrário são igualmente consistentes e robustos. Há que se ter coragem para debater outras soluções em favor da geração de mais emprego e renda. Especialmente em programas de governo vinculados à expansão dos meios de transporte públicos de massa.

Tal como se dá na luta contra microorganismos nefastos à nossa saúde, há limites para o uso de antibióticos. A redução do IPI para carros não pode ser usado como um medicamento de uso contínuo. Com as vias progressivamente congestionadas, o corpo está à beira de um colapso. Está mais do que na hora dos economistas refazerem as contas enquanto o paciente respira.

 

 



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