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Olá, o endereço do Blog do André Trigueiro mudou. As novas postagens estarão em https://g1.globo.com/natureza/blog/mundo-sustentavel/
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É atávica e ancestral a rejeição que temos ao lixo e aos excrementos.
Uma herança do reino animal, onde o instinto de sobrevivência parece soar um alarme toda vez que nos aproximamos de algo que ameaça nossa saúde e integridade.
É natural que seja assim.
Ainda que tantos seres humanos ainda vivam perigosamente em áreas saturadas de lixo e esgoto – não por opção, que fique claro – esta é uma aberração que afronta a civilização e deveria constranger os governantes.
A paralisação dos garis no Rio de Janeiro durante o carnaval expõe várias questões que extrapolam a tumultuada negociação por melhores salários de uma categoria historicamente mal remunerada e alvo de preconceitos em todo o país.
Pode-se dizer que o não recolhimento dos resíduos por alguns poucos dias na segunda maior cidade do Brasil inspira várias reflexões importantes e oportunas para todos nós
Será que apenas os garis têm a nobre função de zelar pela limpeza pública? De que maneira tanto lixo foi parar nas ruas? Qual a nossa responsabilidade nessa história?
A Política Nacional de Resíduos Sólidos, regulamentada em 2010 e com plena implementação prevista para este ano, estabelece que essa responsabilidade é compartilhada, ou seja, começa com a indústria que gera o produto (no caso do carnaval, boa parte dos resíduos encontrada nas ruas foi de material de propaganda, embalagens e latinhas dos patrocinadores do evento), alcança o varejista que comercializa o produto, o consumidor que faz uso do produto e a Prefeitura (a quem cabe institucionalmente a função de organizar as rotinas da coleta/transporte e destinação final do lixo). Em resumo: o gari é fundamental, mas não está sozinho nessa história.
Já reparou que greve de gari costuma durar menos do que as paralisações de médicos, professores e outras categorias profissionais? A razão é simples: ninguém suporta tanto lixo acumulado nas ruas. O nível de impaciência é proporcional ao desconforto causado pelos fortes odores, pelo volume de moscas, baratas e ratos, e materiais de diferentes tamanhos e consistências espalhados pelo vento ou pela chuva.
Infelizmente, é forçoso reconhecer que só quando os garis cruzam os braços a cidade se dá conta compulsoriamente do espetacular volume de lixo que gera todos os dias. Tangibiliza-se o que parecia invisível. Valoriza-se o que parecia desimportante. Enquanto o lixo é coletado e levado para longe, todos nos refugiamos nos efeitos inebriantes de uma cidade onde a montanha de resíduos (no caso do Rio de Janeiro são aproximadamente 10 mil toneladas de lixo por dia) não é uma questão relevante. Quando interrompe-se a coleta (pelo motivo que for) aquele alarme ancestral soa alto o suficiente para gerar imensa repulsa. Para uma cidade como o Rio de Janeiro onde tantos ainda jogam lixo displicentemente nas ruas, onde o desperdício de materiais é acintoso, onde a taxa de coleta seletiva é medíocre, onde o consumismo é voraz, a percepção do resultado de tudo isso é (ou deveria ser) pedagógica.
Foto: Matheus Rodrigues/ G1
Este verão ainda nem acabou, mas já marcou seu lugar na História. Não apenas por ser dos mais quentes, mas por revelar o quanto ainda precisamos fazer para lidar melhor com os chamados “eventos extremos”. Vejamos algumas situações:
1) O verão mais quente das últimas décadas no Brasil (em São Paulo, foi o janeiro mais quente dos últimos 71 anos) e as ondas de frio recorde no hemisfério norte podem ser fenômenos climáticos mais frequentes e intensos daqui para frente. É o que apontam os relatórios recentes do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU). Convém conhecer melhor esses estudos e incorporá-los ao planejamento estratégico dos países.
2) Segundo o Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC), das 10 temperaturas mais quentes registradas no mundo no dia 31/12/2013 em todas as 4.232 estações meteorológicas acessadas pelo INPE, 9 aconteceram aqui Brasil : Joinville (SC) apareceu no topo do ranking com sensação térmica de 57ºC. O Rio de Janeiro ficou em segundo com 51ºC. Estamos efetivamente inseridos na geografia dos eventos extremos e essa não é uma boa notícia. Importa fazer chegar essa informação aos tomadores de decisão.
3) Desde 2009, todos os picos de consumo de energia no Brasil vêm acontecendo na parte da tarde (entre 14h39 e 15h41) e não mais no início da noite. Essa mudança de padrão é atribuída ao uso intensivo de aparelhos de ar-condicionado e ventiladores para enfrentar o calor no momento mais quente do dia. Como boa parte desses equipamentos desperdiça energia, é preciso exigir dos fabricantes padrões mais elevados de eficiência desses e outros produtos, que precisam ser certificados de acordo com os mais rigorosos protocolos. Não fazer isso significa premiar o desperdício.
4) Verão de calor intenso combinado com falta de chuva ameaça o abastecimento de água nas cidades e a produção de energia a partir das hidrelétricas. Quando o nível dos reservatórios cai, as companhias de abastecimento oferecem descontos para quem economiza água e organizam racionamentos escalonados. É o que se espera delas. Já no setor elétrico, “economia” e “racionamento” de energia são palavrões. Desde o apagão de 2001, sucessivos governos se esmeram em garantir toda a energia de que a população necessita, sem qualquer orientação em favor do consumo consciente ou da eficiência energética. Fontes do governo me confirmaram que o entendimento prevalente é o de que ações nesse sentido poderiam ser confundidas como sinais de fraqueza de quem não consegue eliminar por completo o risco de apagões e que, por isso, “pede ajuda à população”. Um absurdo completo.
5) Diversificar a matriz energética é algo importante e urgente. Mas o Brasil ainda derrapa na execução de projetos. É o que o acontece, por exemplo, com a energia do vento. O país já soma 144 parques eólicos prontos, mas 48 deles não estão ainda interligados ao sistema por falta de linhas de transmissão. Seriam 1.265 megawatts a mais, o suficiente para abastecer Salvador. Segundo a Associação Brasileira de Energia Eólica, 12 destes parques entram em operação este mês e outros 16 em março. Até lá, nos viramos com o que temos. Em relação ao futuro, a própria ANEEL admite que dos 42.750 MW de projetos outorgados de várias fontes (hidrelétricas, térmicas, eólicas) para entrar em operação entre 2014 e 2020, 6.455,1 MW (15% do total) simplesmente não têm previsão para entrar em operação por problemas diversos. Esses projetos que ninguém sabe dizer quando estarão concluídos produziriam energia para quase 26 milhões de pessoas.
6) Já se foi o tempo em que os reservatórios cheios de água garantiam o consumo de energia do país por até três anos seguidos sem chuvas. Hoje isso não passa de 5 meses. Desde a década de 1990 tem sido mais fácil licenciar e construir hidrelétricas sem barragens, com menos áreas alagadas e impactos ambientais. Entretanto, sem novos reservatórios de grande porte, o Brasil perdeu a capacidade de estocar água da chuva como fazia antes. Ficamos mais vulneráveis e abrimos caminho para as fontes sujas, que são mais caras e poluentes. Neste verão sem chuvas, o ONS autorizou a compra de 11.500 MW de energia das termelétricas, que é quase o que produz uma Itaipu (14.000 MW). Pergunta-se: sujar desse jeito a matriz energética seria a única alternativa que temos para compensar a perda dos reservatórios? Não teríamos outras opções menos impactantes para o bolso e o meio ambiente?
7) No país campeão mundial de água doce, a hidroeletricidade continua sendo uma vantagem estratégica. Mesmo não sendo mais possível construir usinas com grandes reservatórios por conta dos impactos ambientais, o potencial estimado de produção é de 250 mil megawatts. Hoje exploramos apenas um terço disso (80 mil MW). O horizonte de investimentos aponta para as bacias hidrográficas da Região Amazônica. Um relatório da Coppe/UFRJ financiado pelo Banco Mundial indica que as maiores usinas hidrelétricas em construção hoje no país (Jirau, Santo Antônio e Belo Monte) podem não produzir toda a energia prevista porque foram planejadas levando-se em conta a média das chuvas das últimas décadas. Só que o padrão de chuvas está mudando. Já não está na hora dos tomadores de decisão levarem mais a sério esses estudos que medem a mudança do ciclo das chuvas?
8 ) Há quase dois anos o Brasil decidiu acertadamente regulamentar a microgeração de energia, ou seja, deu sinal verde para que qualquer cidadão pudesse produzir energia em pequena escala, desde que de fonte limpa e renovável, interligado à rede de distribuição. No final do mês, a conta de luz traria em valores monetários a diferença entre o que o cidadão gerou para a rede e o que consumiu da rede. Dependendo do que for gerado, é possível obter excelentes descontos ou até não pagar mais a tarifa de luz. A intenção da medida era estimular as pessoas a participarem ativamente da geração de energia reduzindo os custos do governo com grandes usinas e linhas de transmissão. Só que os Estados decidiram cobrar ICMS sobre essa energia gerada a partir do esforço de cada cidadão. Apenas Minas Gerais e Tocantins abriram mão desse imposto abusivo e imoral. Dependendo da distribuidora de energia, cobram-se ainda PIS e COFINS. É assim que se mata uma boa ideia.
9) Precisamos incorporar ao planejamento urbano o conceito de “cidade resiliente”, ou seja, aquela que se protege de maneira inteligente das mudanças climáticas. É a agenda da “adaptação”. Se as mudanças climáticas já estão ocorrendo, é preciso prevenir tragédias e desastres com investimentos pontuais em setores estratégicos. O desconforto térmico causado por temperaturas elevadas pode ser atenuado com mais áreas verdes, menos “ilhas de calor”, mais áreas disponíveis para o banho seguro com a despoluição de praias/rios e lagoas e estímulos a construções sustentáveis (greenbuilding) nais quais se explore ao máximo sistemas de ventilação cruzada, telhados verdes e outras técnicas que atenuam o desconforto térmico.
10) Eventos extremos como esse merecem respostas rápidas das autoridades. É preciso definir novos protocolos de emergência quando a temperatura subir muito, orientando a população a eventualmente não sair de casa em certos horários ou mesmo dispensando a necessidade de seguir para o trabalho. A sensação térmica de aproximadamente 50ºC levou a Secretaria de Educação de Santa Catarina a adiar o início das aulas nesta semana de fevereiro em vários municípios. Diversos órgãos públicos pelo Brasil já dispensaram o uso de paletó e gravata de seus funcionários. No Rio de Janeiro, servidores municipais foram autorizados a usar bermudas até o joelho. O benefício alcançou também os motoristas de táxi. No caso dos motoristas de ônibus, a liberação depende de cada empresa. No futebol, a parada técnica para hidratação dos jogadores é respeitada em alguns campeonatos estaduais. No Rio, entretanto, isso não é o suficiente para aplacar o desconforto dos jogadores que disputam partidas no estádio de Moça Bonita, em Bangu (um dos lugares mais quentes do Brasil) às 17h, horário de verão. Como se vê, precisamos avançar muito na direção de uma sociedade que responda com inteligência aos chamados eventos extremos.
Em 2013 chegou a fatura do Código Florestal: depois de sucessivas quedas, a taxa de desmatamento voltou a subir (28%) e tudo leva a crer que as regras complacentes aprovadas no Congresso estejam por trás desse número. Também chegou a fatura da política equivocada do governo em favor do transporte individual (eliminação do IPI para carros 0Km combinada com preço subsidiado da gasolina) que agravou o colapso da mobilidade urbana em praticamente todas as capitais brasileiras (inclusive Brasília, famosa por seu uma cidade “planejada”, e Curitiba, incensada mundo afora como a “capital da sustentabilidade”). As históricas manifestações de rua de junho foram motivadas inicialmente pelo péssima qualidade do transporte público. Em resumo: o nó das cidades nunca foi tão ostensivo.
2013 foi um ano especialmente ruim para as comunidades indígenas, com dezenas de mortes em conflitos abertos com fazendeiros e posseiros. De quebra, o governo se esmera em dificultar ao máximo o processo de regularização de novas reservas, mudando a legislação vigente e esvaziando ainda mais o poder da já combalida FUNAI.
Três anos depois da maior tragédia ambiental do país, quando um dilúvio de proporções bíblicas provocou 900 mortes na região serrana do Rio, milhares de pessoas continuam morando em áreas de risco sem que as obras prometidas (contenção de encostas, desassoreamento de rios,etc) tenham sido feitas. Um vexame. Ou será crime de omissão? O verão promete.
O Brasil abriu caminho para a exploração de gás não convencional (shale gas) sem protocolos de segurança definidos para o fracking (fracionamento hidráulico), método arriscado e polêmico para a obtenção do gás em grandes profundidades, ameaçando o lençol freático. A ANP (Agência Nacional do Petróleo) organizou apenas uma audiência pública para tratar do assunto, agiu de forma açodada e temerária, na contramão da transparência e do interesse público.
Em 2013 cresceu o prestígio das bicicletas como modal de transporte, das construções sustentáveis e da reciclagem do lixo (em cidades como SP e RJ foram anunciadas metas usadas e inéditas de reciclagem até 2016). Há mais empresas preocupadas em reduzir suas respectivas pegadas ecológicas. Há mais governos locais interessados em promover um desenvolvimento mais limpo e ético (é o caso do programa “Municípios Verdes”, em curso no Estado do Pará, com resultados mensuráveis na direção de projetos que geram emprego e renda sem desmatar ou poluir os rios). Entretanto, merece registro o fato de o Brasil ainda permanecer atolado num oceano de matéria orgânica infecto-contagiosa. Os indicadores oficiais de saneamento básico continuam equivalentes aos de países da África subsaariana.
Em 2014 teremos uma copa do mundo que não será lembrada no futuro como uma “copa verde”, tal como foi a da Alemanha em 2006. As autoridades também deverão justificar no ano que vem as razões pelas quais as Olimpíadas de 2016 não chegarão perto dos Jogos de Sidney (2000) ou de Londres (2012) enquanto modelo de evento sustentável. Promessas feitas para o COI, como a de ” despoluir em 80% a Baía de Guanabara” não serão cumpridas no prazo estabelecido.
Teremos eleições para presidente e governador, e salvo alguma surpresa, os candidatos vão se referir apenas “protocolarmente” aos temas ambientais, fazendo juras de amor ao assunto sem que as palavras proferidas correspondam aos atos efetivamente realizados até então. Difícil prever o quanto a presença da ambientalista Marina Silva na chapa de Eduardo Campos poderá determinar ajustes importantes na campanha do atual governador de Pernambuco e de seus colegas candidatos. O tempo dirá.
Fukushima continuará vazando radioatividade no Japão. O sol continuará sendo a fonte limpa e renovável que mais cresce no mundo. E o mais poluente de todos os combustíveis fósseis, o carvão mineral, com o preço muito barato, continuará inspirando investimentos na direção do atraso.
Depois do fracasso da COP-19 na Polônia, a próxima conferência do clima será no Peru em 2014 e se não houver avanço consistente, chegaremos em Paris em 2015 (ano limite para a definição de um acordo global vinculante) como avalistas daquele que talvez seja o maior impasse diplomático da História do multilateralismo com graves consequências para a Humanidade como um todo, especialmente os mais pobres.
Feliz ano novo? Depende de nós.
Fenômeno climático mais previsível do mundo: chuva. Dever de casa mais elementar dos governantes: abrir caminho para a água da chuva. Certo? Não para quem tem a função de planejar o crescimento das cidades. A julgar pelo que vimos nas últimas horas no Rio de Janeiro, segunda cidade mais rica do Brasil, um dos mais importantes mandamentos da administração pública não vem sendo seguido à risca: “Para cada nova obra, providenciar sistemas de drenagem compatíveis”.
Como construir a Via Binário (alternativa ao Elevado da Perimetral inaugurada há dois meses) sem rotas de fuga para a água da chuva?
Outra: como autorizar o aparecimento do mais novo bairro da cidade no Recreio dos Bandeirantes (Pontal Oceânico) sem se dar conta de que as construtoras estavam aterrando ilegalmente os canais de drenagem (abertos da década de 1930) em uma das áreas mais vulneráveis a enchentes do Estado do Rio? (veja a reportagem)
Por que a Fundação Rio Águas (braço da Prefeitura que deveria acompanhar a situação dos rios da cidade e o correto escoamento da água da chuva) conta com apenas 15 fiscais para verificar como os empreendedores privados realizam suas obras em todo o município?
É claro que uma chuva torrencial como a de ontem é capaz de causar estragos em qualquer grande cidade do planeta. É evidente que a falta de educação de parte dos moradores (que jogam lixo no chão, nos rios, etc) agrava a ocorrência de enchentes.
Mas as prefeituras, com o perdão do trocadilho, não podem “chover no molhado” quando o assunto é enchente.
A cada um, a responsabilidade que lhe compete.
“Se os países do mundo andam em ritmo muito lento, as cidades podem ir mais rápido”. Este bem que poderia ser o lema do C-40 (Cities Climate Leadership Group), grupo que reúne as mais importantes cidades do mundo comprometidas em buscar soluções para as mudanças do clima que afetam todo o planeta.
Impacientes com a morosidade da ONU em coordenar ações em nível global para o enfrentamento do problema, prefeitos de 58 cidades (São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba são as únicas do Brasil) compartilham conhecimento, experiências e contabilizam até o momento 4.734 ações em diferentes frentes (aumento das áreas verdes, menos automóveis, mais transporte público e ciclovias, reciclagem de lixo, apoio às construções sustentáveis etc).
À frente do C-40, o prefeito de Nova Iorque, Michael Bloomberg (que será sucedido no cargo pelo democrata Bill de Blasio), veio ao Brasil durante a Rio+20 para anunciar aquela que talvez tenha sido a maior notícia do evento. Enquanto os chefes de Estado reunidos no Riocentro se esforçavam em sorrir para a foto oficial sem nenhum resultado importante, Bloomberg anunciava no Forte de Copacabana a meta coletiva das cidades de reduzir 1,3 bilhão de toneladas de gases estufa até 2030 – com medidas mensuráveis e comprováveis – o equivalente às emissões de Canadá e México juntos no mesmo período. Foi o maior feito da história da organização até hoje.
Se fosse possível reuni-las em um único país, as cidades do C-40 seriam o mais rico do mundo (18% do PIB) e o terceiro mais populoso (544 milhões de pessoas). Prefeito não remunerado – por opção – de Nova Iorque, o milionário Bloomberg colocou dinheiro de sua própria fundação e de outras igualmente importantes, como a Fundação Clinton, para estruturar administrativamente a organização e deixar o C-40 em melhores condições de navegabilidade para seu sucessor nesse grupo, o prefeito do Rio, Eduardo Paes. É a primeira vez que um prefeito de um país em desenvolvimento assume o cargo.
“É uma prova de que o Rio de Janeiro está em evidência”, me disse Paes ao voltar de Nova Iorque, onde esteve com Bloomberg para acertar detalhes da passagem do bastão. Mesmo sem tempo suficiente para cuidar de todos os problemas da segunda maior cidade do país, Paes terá que dar conta a partir de fevereiro (quando assume oficialmente o cargo) de uma estrutura que mobiliza 70 funcionários, dois escritórios (um em Nova Iorque, outro em Londres) e U$ 30 milhões de orçamento anual.
Já há pelo menos uma discordância entre Bloomberg – que continuará liderando o comitê diretor da instituição – e o novo presidente do C-40. “Bloomberg acha que devemos aceitar o convite da ONU para marcar presença da Conferência do Clima que acontecerá em 2015 em Paris. Eu ainda não estou convencido disso”, diz Paes, que não esconde o ceticismo em relação aos rumos do multilateralismo. “Tenho medo de ser engolido pela ONU”, confessa o prefeito, preocupado em abrir caminho para que as cidades possam captar recursos diretamente do Banco Mundial e de outros órgãos de fomento internacionais que só costumam negociar diretamente com os países.
Duplamente exposto (por ser prefeito da cidade-sede dos Jogos Olímpicos de 2016 e agora presidente do C-40), Paes admite que o Rio precisa avançar muito em várias áreas. “Ainda sofremos com a incapacidade de nos planejar. Há problemas em relação à ocupação das encostas, drenagem urbana, uma pressão imobiliária excessiva”,reconhece.
Apesar de tudo isso, o Rio recebeu há duas semanas em Barcelona o prêmio de “Cidade mais inteligente do ano” (World Smart City 2013) por algumas iniciativas reconhecidas internacionalmente. As restrições à circulação de automóveis, a expansão das linhas de BRT, a aplicação de multas para quem joga lixo no chão e a revitalização da zona portuária são algumas das medidas que levaram Michael Bloomberg e o ex-presidente Bill Clinton (a Fundação Clinton apóia o C-40) a comunicar a Paes, ainda em novembro do ano passado, o interesse em tê-lo à frente da organização pelos próximos três anos.
Entre os novos desafios, o prefeito do Rio deseja incrementar a participação das cidades dos países pertencentes aos BRICS (China, índia, Brasil, Rússia e África do Sul) no C-40 e contar com o apoio de mais empresas e fundações que ajudem o grupo a crescer.
Da “cidade maravilha, purgatório da beleza e dos caos”, para o C-40 foi um salto importante para o Rio, que aos olhos do mundo, é uma síntese do Brasil. Não faremos a Copa do Mundo mais sustentável que já se viu (nem o Maracanã representa o que há de mais avançado em design ecológico). Os Jogos 2016 não serão os mais verdes da História e a cidade ainda é uma das mais desiguais do planeta, com indicadores preocupantes de mobilidade urbana e saneamento básico. Que a avalanche de obras em curso ajude a mudar essa realidade. À frente do C-40, a bola está com o Rio.
Petróleo é atividade de risco. Não há tecnologia capaz de conter totalmente vazamentos, eles acontecem com freqüência e alcançam algumas das mais importantes empresas do setor. Segundo o Ibama, são registrados, em média, 20 a 30 vazamentos por ano no Brasil. Eles devem ser reportados pelas próprias empresas operadoras – sem isso acontecer, ninguém fica sabendo.
Tanto o governo quanto a Agência Nacional do Petróleo (que para muitos são a mesma coisa) reconhecem suas limitações estruturais e logísticas para realizar hoje um monitoramento adequado dessas operações em alto-mar.
O país aprovou em 2000 a Lei nº 9966 que dispõe sobre “a prevenção, o controle e a fiscalização da poluição causada por lançamento de óleo e outras substâncias nocivas ou perigosas em águas sob jurisdição nacional”. Passaram-se 13 anos e ainda não regulamentamos o Plano Nacional de Contingência (PNC) estabelecendo com clareza as responsabilidades de todos os setores envolvidos em caso de acidente (companhias de petróleo, ANP, Marinha, órgãos ambientais, Defesa Civil, etc) para que possam agir de forma inteligente e coordenada.
O consórcio vencedor de Libra – a joia da coroa com reservas estimadas entre 8 e 12 bilhões de barris de petróleo – entra no jogo sem que essas regras básicas tenham sido ainda definidas. A mais preciosa reserva petrolífera do Brasil se transformará nos próximos anos em um paliteiro de poços em águas ultraprofundas, o que torna toda a logística tanto de exploração quanto de remediação de vazamentos muito mais onerosa e complexa. As condições de temperatura e pressão tornam esse ambiente extremamente hostil a qualquer operação que demande manobras precisas e urgentes.
Como o Brasil deverá triplicar a produção de petróleo na próxima década, há motivos reais de preocupação. Por mais sofisticados que sejam os protocolos de segurança de cada empresa reunida no consórcio – a bem da verdade, algumas delas são severamente criticadas por suas atuações desastrosas em outros países, principalmente no continente africano – há que se aprender com a História recente dessa indústria.
A BP era reconhecidamente uma das empresas mais comprometidas do mundo com sustentabilidade até se tornar responsável pela maior tragédia ambiental da História dos Estados Unidos em abril de 2010. Durante quase três meses, após a explosão de uma plataforma no Golfo do México (com 11 mortos), a companhia tentou em vão conter a sangria de aproximadamente 780 milhões de litros de óleo cru.
Além de provocar violentos impactos sobre o turismo, a pesca e os ecossistemas marinhos, a BP ainda é alvo de ações judiciais nos Estados Unidos e no México. O governo Obama também foi muito criticado por revelar-se despreparado para enfrentar situações como essas.
Um ano e meio depois, a empresa americana Chevron foi responsável pelo vazamento de 3.700 barris de petróleo no Campo do Frade, no litoral fluminense, a partir de uma manobra inadequada de perfuração a cargo da Transocean, a mesma operadora envolvida no megavazamento da BP. Investigações da Polícia Federal e da ANP concluíram que o acidente poderia ter sido evitado se os mais elementares procedimentos de perfuração fossem respeitados.
Como me disse certa vez em uma entrevista o professor da COPPE/UFRJ, Segen Estefen – um dos coordenadores da parceria estratégica da universidade com a Petrobras para vencer os imensos desafios tecnólogicos que a companhia tem pela frente na era do pré-sal: “O Brasil não deve ser apenas referência na exploração de petróleo em águas ultraprofundas. Devemos ser também referência em segurança na exploração dessa riqueza”.
Por enquanto, nada sugere que estejamos firmes nesta direção.
O clima é de “tensão pré-sal”.
Como você reagiu às informações divulgadas hoje pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU?
Aliás, teve algum interesse em ler? Porque isso já diz muito da nossa postura diante do maior desafio do milênio: o que fazer diante da maior crise climática da História da Humanidade que, segundo a corrente majoritária dos cientistas, é agravada por nossos hábitos, comportamentos, estilos de vida e padrões de consumo?
Este é um momento que será lembrado no futuro.
Tal como se dá hoje em alguns lares alemães, onde jovens estudantes que aprendem na escola sobre o nazismo indagam os mais velhos em casa sobre o que fizeram quando eclodiu o holocausto contra os judeus e a perseguição sistemática também a homossexuais, ciganos e deficientes físicos.
“De que lado o senhor estava vovô(ó)? Qual foi a sua escolha”?
Voltando para o relatório do IPCC. De que lado você está hoje? Em que acredita? Quais os valores que regem a sua conduta como cidadão, consumidor e eleitor?
Existem diferentes respostas ao alerta climático. Talvez valha a pena reconhecer a sua.
Há os que torcem intimamente para que tudo isso seja um grande engano e não haja necessidade de preocupar com o futuro por conta dos eventuais excessos do presente. É a tribo do “business as usual”, dos que se refugiam na “zona de conforto”.
Há os que pegam carona nas teses – todas desclassificadas pelo IPCC – dos autodenominados “céticos”, que tentam desconstruir a ideia de que o planeta está aquecendo e de que é preciso agir rápido. O assunto já foi tratado nesta coluna em um post anterior.
Há ainda os egoístas que só pensam em si mesmos e não se sensibilizam por qualquer causa coletiva, de qualquer natureza. “Se eu vou morrer mesmo, que diferença faz? Quero aproveitar ao máximo”. Do ponto de vista moral é um desastre. Uma das grandes conquistas da nossa espécie é a noção de que devemos sim nos preocupar com nossos rastros, as nossas pegadas, o nosso legado para as gerações futuras. Sem essa bússola ética, não há salvação para a Humanidade.
Há também os massacrados pelas manchetes apocalípticas que não encontram forças para reagir, e sucumbem diante de algo que consideram inevitável. “De que adianta agora fazer alguma coisa? A situação tá braba”. Estes são vítimas da mídia sensacionalista, que informa sem o devido cuidado de reportar as saídas da crise, o que podemos fazer para atenuá-la no curto prazo e resolvê-la num futuro mais distante.
Há ainda os que procuram fazer algo, por menor que seja, em resposta à consciência que reclama atitude. “Eu procuro fazer a minha parte”. Ou ainda os que transcendem o perímetro das miudezas do dia-a-dia e se lançam na direção de um movimento mais amplo, normalmente em redes, acionando canais de comunicação que se articulam globalmente em favor de campanhas, boicotes, abaixo-assinados virtuais, cobranças contra governos e empresas, etc.
É evidente que as grandes decisões precisam vir dos governos (políticas públicas que reduzam as emissões de gases estufa e promovam os investimentos necessários para nossa adaptação a um planeta mais quente, com mais eventos extremos, mudança do ciclo da chuva, elevação do nível dos mares etc) e das grandes empresas (inovação tecnológica e eficiência energética reduzindo drasticamente as emissões de CO2) num cenário onde a economia de baixo carbono parece ser o cenário mais óbvio.
Mas somos nós que escolhemos os governantes e temos a opção de pressioná-los ao longo dos mandatos. Somos nós que consumimos produtos e serviços e temos a opção de exigir dos empresários o que nos pareça mais justo e ético.
E aí? Qual a sua escolha?
Foi a segunda vez que visitei a Alemanha a trabalho. Tanto em 2006 (durante a primeira Copa do Mundo “verde” da História) quanto agora, quando registramos para o Jornal da Globo a “virada energética” do país (1ª reportagem da série vai ao ar na próxima quinta-feira, 26/9), fui arrebatado por uma cultura em que a sustentabilidade parece ter sido assimilada como um estilo de vida que inspira as principais escolhas feitas pelos alemães no dia-a-dia.
Abaixo, neste despretensioso álbum de viagem, compartilho algumas imagens (não esperem deste fotógrafo de ocasião o esmero de um profissional) que dizem muito a esse respeito.
1 – De vento em popa
Não é exagero dizer que a Alemanha se transformou em um gigantesco paliteiro de aerogeradores. Quem viaja pelo país se depara a todo instante com esses modernos cataventos compondo as paisagens. Os alemães geram hoje mais energia com o vento do que nós por aqui com a hidrelétrica de Itaipu. E ainda obtém lucros importantes com a venda de equipamentos e know-how a países interessados nesta fonte limpa e renovável de energia, como o Brasil.
2 – Com o sol a pino
Faz muito menos sol na Alemanha do que no Brasil. Ainda assim, a quantidade energia solar captada por eles já abastece o equivalente a 8 milhões de residências. A decisão de desligar todas as centrais nucleares alemãs após o acidente de Fukushima (2011) acelerou os investimentos em fontes alternativas. Na foto, a maior usina solar da Europa (feita com equipamentos de última geração) recém inaugurada nos arredores de Berlim, exatamente onde havia antes uma antiga base militar soviética,abandonada após o fim da guerra fria. Imagine uma área equivalente a 212 campos de futebol cobertos de placas fotovoltaicas. Parece uma paisagem futurista. Só que para os alemães, o futuro é agora.
3 – O teto solar do maior mercado de Berlim
A febre de cobrir telhados, lajes ou qualquer superfície plana disponível pegou os alemães de jeito. Foi o que aconteceu também no maior mercado de Berlim. Numa área equivalente a 6 campos de futebol, uma parceria público-privada investiu 6 milhões de reais (valores convertidos para a nossa moeda) num projeto que permitirá a venda da energia excedente para a rede. Perspectiva de lucro em aproximadamente 15 anos. Parece muito para quem só enxerga no curto prazo. Mas no país mais rico e populoso da Europa, a verdadeira riqueza é aquela que se pereniza na linha do tempo baseada em valores sustentáveis.
4 – A cidade mais sustentável do mundo
Freiburg é considerada por muitos a cidade mais sustentável do mundo. Transporte público de massa eficiente e barato, segurança para os ciclistas, estímulos para a construção de habitações sustentáveis (“Vauban”é um exemplo de condomínio sustentável reconhecido internacionalmente) e um histórico de lutas contra a energia nuclear (foi a primeira cidade alemã a banir por lei a construção de usinas atômicas) tornaram Freiburg uma cidade orgulhosa de estar à frente de seu tempo. É também o lugar da Alemanha onde os “verdes” ocupam o maior número de cadeiras no parlamento.
5 – De bicicleta se vai longe
Flagrante da movimentação de ciclistas em uma estação de trem nos arredores de Berlim. Os vagões previamente identificados asseguram o espaço da bicicleta sem estresse. O sistema integrado de transportes abre espaço para as “magrelas”, sem burocracia ou preconceito. É bastante comum vermos idosos andando de bicicleta na Alemanha, se beneficiando também das facilidades de deslocamento nos trens.
6 – Ecodesign
Os modelos construtivos alemães se adaptam rapidamente aos novos tempos. Isso vale todos os gêneros de projetos, de habitação popular a monumentos históricos. Há também as situações em que projetos antigos são retrofitados a partir de soluções sustentáveis. Foi o que aconteceu com a cúpula de vidro do Reichstag (o parlamento alemão) e a cobertura vazada de luz natural do Estádio de Munique.
Hoje é o Dia Mundial da Prevenção do Suicídio. Faz diferença para você? É possível que não. Aliás, essa também é uma data ignorada pela maioria dos veículos de comunicação de massa, que não deverão mencioná-la hoje.
Mas esse é um dia muito importante para a Organização Mundial da Saúde, que estabeleceu essa data e vem tentando – ao que parece sem muito sucesso – sensibilizar jornalistas e comunicadores para a importância do tema. O que está em jogo, segundo a OMS, é abrir espaço nas mídias para informações que podem efetivamente salvar vidas. O tema pode ficar mais em evidência com a notícia que envolve o ex-baixista do grupo Charlie Brown Jr, Champignon, encontrado morto ontem.
Os números da Organização Mundial da Saúde são impressionantes:
- a cada ano, aproximadamente 1 milhão de pessoas morrem em todo mundo por suicídios;
- um crescimento de 60% nos últimos 45 anos;
- para cada caso consumado de suicídio há 20 tentativas;
- embora tradicionalmente o número de suicídios seja maior entre idosos, verifica-se o aumento da incidência de óbitos por esta causa entre os mais jovens.
A informação mais surpreendente, entretanto, é que o suicídio é prevenível em 90% dos casos.
O mais completo estudo da OMS já realizado sobre o assunto (do qual participou o psiquiatra brasileiro, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) e consultor da OMS, José Manoel Bertolote) analisou o histórico de 15.629 suicídios em diversas partes do mundo. De cada 10 casos analisados, 9 estavam relacionados a alguma patologia de ordem mental diagnosticável e tratável, como transtornos de humor (depressão), transtornos relacionados ao uso de substâncias, transtornos de personalidade, esquizofrenia etc. Ou seja, através desse levantamento, foi possível estabelecer “inequivocamente, um elo entre dois grupos de fenômenos: comportamento suicida e doença mental”.
O entendimento dos especialistas é o de que a informação clara e objetiva pode salvar vidas, tal como já acontece em campanhas de prevenção contra doenças sexualmente transmissíveis, tabagismo, câncer, doenças do coração, dengue etc.
O problema é o tabu. Disseminou-se pelas redações a idéia de que toda e qualquer referência a “suicídio” terá o poder de fomentar o aparecimento de novos casos. Não é bem assim. A OMS e a Associação Brasileira de Psiquiatria lançaram manuais especialmente dirigidos aos profissionais de imprensa informando, entre outras coisas, que “dependendo do foco dado a uma reportagem, pode haver aumento no número de casos de suicídio, ou, ao contrário, pode-se prestar ajuda a pessoas que se encontram sob risco de suicídio”.
Ao justificar a ideia de um manual, os responsáveis explicam que o objetivo é “fomentar a parceria entre psiquiatras e profissionais da imprensa, com a meta de informar e, sempre que possível, auxiliar a população exposta ou sob risco de suicídio”. Dentre as sugestões propostas, recomenda-se que o suicídio não seja enaltecido nem tomado como ato de coragem, num processo de “romantização” do ato, ou de “heroicização do falecido”; mostrar a história de pessoas que contaram com a ajuda certa na hora certa para evitar o suicídio, enumerar os sinais de alerta de que uma pessoa está em risco de suicídio e o que fazer para ajudá-la, revelar as estratégias de prevenção e ouvir profissionais de saúde mental, entre outras dicas.
Ao vedar toda e qualquer informação sobre suicídio – sob o pretexto de estar fazendo a coisa certa – os veículos de comunicação acabam contribuindo para o agravamento das estatísticas.
Graças a essa enorme desinformação de quem trabalha justamente com notícias, poucos de nós sabemos que o suicídio é caso de saúde pública no Brasil (segundo o Ministério da Saúde) e no mundo (de acordo com a própria OMS). Estima-se que no Brasil aproximadamente 26 óbitos por suicídio sejam registrados a cada dia.
De acordo com a última edição do “Mapa da Violência”, um amplo levantamento das mortes por homicídio, acidentes de trânsito e suicídios no Brasil, a taxa de suicídios no Brasil passou de 4,3 para 5,1 por 100 mil habitantes (na população total) e de 4,9 para 5,1 por 100 mil (entre os jovens). Se no ranking mundial, estamos aparentemente bem situados na posição de nº 73, muito atrás de países como Lituânia, Japão ou Bélgica, alguns estados brasileiros registram taxas extremamente preocupantes de autoextermínio, como Roraima e Rio Grande do Sul. As causas são difusas e ainda estão sendo mapeadas.
“Os suicídios no país vêm aumentando de forma progressiva e constante: a década de 80 praticamente não teve crescimento (2,7%); na década de 90 o crescimento foi de 18,8% e daí até 2011 de 28,3%”, diz o coordenador do Mapa, professor Julio Jacobo Waiselfisz.
Por detrás das estatísticas oficiais, há o problema dos sub-registros – segundo o IBGE, 15,6% dos óbitos em geral não chegam a ser oficialmente registrados – e das subnotificações – de acordo com a Sociedade Brasileira de Psiquiatria, o número correto de suicídios no Brasil pode ser até 30% maior em função do preenchimento impreciso dos atestados de óbitos. Em boa parte dos casos onde se lê “quedas”, “acidentes de trânsito” ou “acidentes com armas de fogo”, o que de fato aconteceu foi suicídio.
Em meio a tantas dificuldades para divulgar a urgência da prevenção do suicídio no Brasil, merece atenção o trabalho realizado há 51 anos pelo CVV.
O Centro de Valorização da Vida realiza um serviço voluntário de apoio emocional e prevenção do suicídio reconhecido como de utilidade pública pelo próprio Ministério da Saúde. Fundado em 1962, o CVV está presente hoje em 18 estados (mais o Distrito Federal) onde mobiliza um exército de 2.200 voluntários que se disponibilizam para ouvir com atenção quem liga procurando ajuda: alguém que deseja conversar, desabafar, compartilhar o que quer que seja. Há também aqueles que pensam em se matar. O voluntário guarda sigilo da conversa e não julga aquele que faz contato.
Pela experiência dos voluntários, a escuta atenciosa já salvou muitas vidas. A experiência do CVV – elogiada por técnicos do Ministério da Saúde como a melhor iniciativa não governamental de prevenção ao suicídio no país – revela os efeitos colaterais de uma sociedade cada vez mais apressada e impaciente, onde a simples oferta de uma escuta amorosa, em boa parte dos casos, faz toda a diferença.
O atendimento se dá pelo telefone 141 (24 horas por dia), ou pessoalmente nos 72 postos existentes no país, ou ainda pela internet através do site da instituição, via chat, VoIP (Skype) e e-mail.
Toda essa estrutura é mantida pelos próprios voluntários, que recebem aproximadamente 1 milhão de ligações por ano.
Uma iniciativa do CVV lançada na última semana de agosto é o movimento “Isso me faz seguir em frente”, onde diferentes pessoas revelam o que as faz querer viver. “Família”, “meus amigos”, “Deus”, “o sorriso do meu filho”, são muitas as respostas, todas interessantes. Qualquer um pode participar da brincadeira compartilhando o que realmente faz toda a diferença em nossas vidas. Afinal de contas, pra que viver?
“Quem não se comunica, se trumbica”, dizia um dos maiores comunicadores do Brasil, o velho Chacrinha.
Quando a informação pode salvar uma vida, por que não fazê-lo?
Ouça o comentário de André Trigueiro sobre este assunto na Rádio CBN