Começou a temporada da decoração em São Paulo!
Vimos hoje no quadro um apanhado geral dos ambientes de duas importantes mostras que abriram, concomitantes, na cidade. A já tradicional Casa Cor e a sua “concorrente” numa versão mais elitista, a Mostra Black.
Sei que muitos de vocês vão me dizer que essas mostras são completamente desconectadas da realidade da maioria de nós. E isso é a pura verdade, vou ter que concordar com vocês. Vemos ambientes enormes, classudos, cheios de produtos caros e referências inatingíveis. A pergunta que a gente deve se colocar é: “Como visitar ou apreciar estes ambientes e conseguir extrair deles soluções e ideias para as nossas casas, já que são tantas vezes tão distantes do que vamos poder fazer?”.
Em defesa dessas mostras vale lembrar que elas estão para a decoração assim como as passarelas estão para a moda. Quantas vezes já não vimos roupas absurdas em modelos quase raquíticas nos desfiles e mesmo assim conseguimos ver ali um conceito, uma ideia, que se não podia ser completamente aproveitada, tinha uma luzinha no fim do túnel que nos iluminava para alguma situação corriqueira da vida cotidiana?
Da mesma forma, nas mostras de decoração estamos vendo, acima de tudo, conceitos. Nem sempre os conceitos ficam muito claros, mas em vários casos é bem fácil extrair o espírito do ambiente de forma que possamos reproduzi-lo em moldes bem diferentes e numa outra escala. Por que todos hão de convir que uma sala de mais de 200m², ou um quarto maior ainda, poucos de nós temos ou teremos nesta vida.
Como alguns de vocês devem saber, tenho novamente um ambiente na Casa Cor deste ano. Pode parecer um pouco estranho eu ter uma leitura crítica com relação a algumas posturas do evento e ao mesmo tempo participar dele… mas não é! Estou tentando, lá dentro, mostrar um caminho diferente.
Este ano, meu ambiente é um restaurante e, portanto, não fala diretamente para um estilo de morar. Minto, fala sim. Fala de um estilo de ocupação, uma linha mais respeitosa com o espaço existente e com a realidade que se impõe.
A dimensão do espaço é palaciana, eu sei. Mas como é um restaurante – na verdade uma versão bem diferente de restaurante, logo explico – este grande salão se torna bastante adequado. Se vocês notarem, vão reparar que o espaço físico que ocupamos foi deixado exatamente como ele é. A Casa Cor ocupa um edifício tombado no Jockey Club de São Paulo: são vários andares e marquises ocupados pela mostra, anualmente transformados em cenário para a atuação de vários profissionais desfilarem seu jeito de conceber um modo de morar.
A diferença que tento apresentar nesse projeto tem justamente a ver com este termo: cenário. Claro que a decoração sempre cria uma ambientação, que pode ser caracterizada pelo seu aspecto cenográfico, sempre. Mas eu sempre acho mais interessante quando ao invés de pensarmos no conceito de cenário, partimos para a noção de apropriação do espaço.
Cenário me remete ao teatro e a vida, apesar de às vezes parecer um drama mexicano ou uma tragédia grega, é bem mais real e deve ser bem mais calcada no que existe. A proposta talvez seja de uma menor busca da ilusão. Veja que no nosso ambiente, as instalações elétricas, hidráulicas e de gás estão todas aparentes. Não há forro de gesso escondendo nada disso. Aproveitamos os canos para pontuar cores no ambiente que foi todo pintado em tons de cinza – uma escolha que buscou transformar o clima do ambiente a partir de um recurso muito simples, a pintura de parede. Quer coisa mais prosaica do que transfomar um cômodo pintando as suas paredes? rs
O ambiente dispõe de quatro ilhas e seis mesas, todas alinhadas – daí o chamamos de One Table, pois praticamente só há “uma” longa mesa mesmo no ambiente, intercalada pelas ilhas com fogões e coifa, onde quatro chefes de cozinha finalizam a refeição dos 40 sortudos, que vão frequentar o restaurante naquela noite.
Trata-se de uma experiência também inusitada, um ambiente diferente com uma proposta de refeição igualmente diferente.
Repare que as cadeiras que usamos no ambiente são todas diferentes umas das outras. Elas são antigas, reformadas e recondicionadas para o uso – os famosos móveis de reuso que tanto divulgamos com uma das saídas sustentáveis para a decoração das nossas casas.
A intenção era justamente mostrar que um ambiente pode ficar bonito e elegante usando cadeiras diferentes, todas antigas e usadas. Fazer desmoronar uns conceitos bobos que ainda temos de que tudo tem que ser novo para ser legal. E o melhor jeito de fazer isto é demonstrando em um ambiente. A prova concreta de que é possível, ainda mais estando na Casa Cor, que querendo ou não, é uma chancela, um carimbo de qualidade.
Notem que a iluminação foi feita quase toda usando elementos muito simples de instalações elétricas aparentes. Eletrocalhas e conduletes são dispostos de formas diferentes como suporte dos spots de luz direcional ou mesmo para conceber 16 lustres que estão enfileirados no corredor interno e no terraço exterior do lounge gourmet.
Olhem para o piso também! No salão interno temos piso de madeira e tacos de Ipê original do edifício, que foi todo recuperado pela nossa equipe. Tivemos inclusive que encontrar antigos tacos de Ipê e cortá-los no tamanho certo para completar uma boa parte que estava faltando.
No terraço, o piso original já não estava mais lá, agora há uma cerâmica feiosa, mas que por ser patrimônio do Jockey, mantivemos. Só que ali tem uma ideia bem interessante: usamos piso de laminado melamínico azul adesivado sobre a cerâmica. Não precisamos demolir nada, o laminado tem menos de 3 milímetros de espessura, não criou desnível algum e ainda mudou completamente a cara do lugar.
Nossa maior preocupação neste projeto era em respeitar o edifício tombado. A cor das janelas e portas, por exemplo, é original. Sim, este verde super na moda foi escolhido há mais de 70 anos para estampar as fachadas do Jockey Club.
Notou que as geladeiras foram cobertas por grandes imãs divertidos? Já pensou em renovar a sua antiga geladeira cobrindo ela toda com imãs? Solução bem mais barata e inusitada, garanto que seus amigos vão te copiar! rs
Claro que nenhum de nós vai ter uma cozinha, ou sala de jantar, ou mesmo casa do tamanho colossal deste ambiente. Nem somos todos donos de restaurante, portanto a inspiração não precisa ser uma associação direta.
Mas vejam quantas ideias conceito temos neste ambiente e que podem ser exportadas para a remodelação da sua casa: piso em fórmica, instalações aparentes de elétrica e hidráulica, cores nos detalhes, azulejos estampados ou adesivos ou ímãs para mudar a cara das coisas com intervenções simples, móveis de reuso, lustres feitos com restos de instalações elétricas, e por ai vai… Se vocês fuçarem nas fotos e em vários outros ambientes da Casa Cor e da Mostra Black, certamente vão encontrar ideias que possam ser levadas para as suas casas em que tenham que ser literais e iguais. Aproveite as inspirações e transforme a sua casa com consciência!
Clique aqui e veja o vídeo da reportagem exibida no Jornal Hoje.