Tipo Exportação

qua, 04/09/13
por Bruno Medina |

No iniciozinho de 2012 – muitos de vocês devem se lembrar – este blog tornou-se o epicentro de uma verdadeira batalha campal por conta de uma suposta carta aberta que escrevi para Michel Teló, através da qual, em tom de sátira, reclamava de sua onipresente “Ai Se Eu Te Pego”, isto justo no momento em que, em tantas outras rodas, debatia-se as dores e delícias causadas pela hiperexposição de um hit que começava a alçar voos mais altos. Amado e odiado em proporções equivalentes pelos argumentos empregados (mentira, os detratores, se não estavam em maior número, ao menos eram bem mais enfáticos), a mim coube amargar o ônus dos que atiram pedras em vespeiros, sobretudo a partir daqueles que enxergaram nos meus comentários traços de ironia, inveja ou elitismo musical. À época, cheguei a me arrepender da infeliz ideia de dizer algo a esse respeito, porque me pareceu que qualquer abordagem do assunto, por mais bem intencionada que fosse, seria igualmente explosiva, dado que, em nosso país, popularidade e sucesso, se combinados numa mesma sentença, parecem configurar um intransponível tabu, mais ainda quando o resultado dessa mistura aponta para além das fronteiras do território nacional.

Na minha opinião, por mais espinhoso que seja, eis um assunto que não pode e nem deve ser ignorado por quem se sinta minimamente identificado com a música brasileira, afinal, é através de artistas como o próprio Michel Teló, Ivete Sangalo, Daniela Mercury e Marisa Monte – para citar apenas alguns dos tantos que alcançaram reconhecimento no exterior –, independente da opinião que se possa ter sobre o trabalho de cada um deles, que nossa cultura se renova e, consequentemente, se ressignifica aos olhos do mundo. Preâmbulo feito, podemos seguir para o verdadeiro tema deste post: Anitta, ou, mais especificamente, a matéria recém-publicada na versão digital da revista Forbes que a indica como aspirante a se tornar a próxima estrela global da música. A favor da carioca Larissa Machado (o nome artístico foi inspirado pela série televisiva de 2001 “Presença de Anita”, protagonizada por Mel Lisboa), pode ser mencionado o fato de seu debut como cantora de funk estar sendo paulatinamente substituído por um estilo que, em tese, teria maiores chances de emplacar internacionalmente, caracterizado pelo encontro de um pop amigável com o legítimo R&B, aos moldes do que hoje é feito por Rihanna e Ke$ha.

Outro trunfo de Anitta estaria na capacidade de transmitir, através de suas letras e aparência, a imagem de uma mulher poderosa, daquelas que se sentem felizes e confortáveis em ser o que são, aspecto que para Priscilla Lemgruber, responsável pelas ações de marketing da cantora, costuma despertar forte identificação junto ao público feminino. Como se os argumentos citados não fossem suficientes para candidatá-la à nova bola da vez, ainda segundo a revista, Anitta preencheria todos os pré-requisitos exigidos pela indústria musical de hoje, onde apelo sexual e talento musical precisam estar balanceados de maneira exata a permitir trânsito livre por filmes e capas de revistas, além do desenvolvimento de uma linha de produtos próprios. Por tudo isso, aos 20 anos, a ex-funcionária da Vale que agora contabiliza mais de 50 milhões de visualizações do vídeo “Show das Poderosas” no Youtube, foi considerada pela Forbes como uma possível discípula de Ivete, que, além de ter o dobro de sua idade, não dominar o idioma inglês e estar associada a um tipo de música muito regional, teria dificuldades em conquistar audiências ainda maiores do que já possuí, até mesmo pela incapacidade de dedicar a atenção necessária à construção de uma carreira internacional sólida, visto que apenas a manutenção de seu império no Brasil lhe exige enorme empenho e parece mais do que o suficiente, tanto em termos profissionais quanto financeiros.

Apesar de ainda não admitir abertamente o provável foco no mercado externo, ao que tudo indica, em breve Anitta deverá dedicar-se aos preparativos para fazer cumprir a profecia da revista, a partir de iniciativas como a retomada de aulas de música e atuação. Entretanto, se quiser mesmo figurar no seleto time de celebridades internacionais do pop, este seria apenas o passo inicial de uma extenuante jornada, cujas possibilidades de sucesso estão atreladas a uma série de decisões estratégicas acertadas, a começar pela escolha dos profissionais que a cercam. Talvez o mais interessante neste caso seja mesmo observar como o mundo da música a cada dia dá provas de ser menos vasto e ostentar menores barreiras, tornando provável a antes impensável circunstância de pertencer a um cantor coreano, cantando em coreano, o título de vídeo mais assistido de toda a história. Neste contexto, cabe a reflexão sobre quais seriam os novos parâmetros de identidade cultural em tempos de globalização ou, quem sabe, sobre qual seria a resposta mais adequada para uma pergunta que parece, a cada dia, mais difícil de ser respondida: o que atualmente se define por música popular brasileira?



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