A Batalha do Peru

qua, 18/12/13
por Bruno Medina |

– Dá uma olhada aqui, rascunhei um plano…

– Boa!

– A gente chega na sua mãe às 6h, deixa os presentes na árvore, interage um pouco…

– Peraí, por que a gente vai na casa da minha mãe primeiro, e não na da sua?

– Bom, eu pensei que seria melhor assim por causa da logística, é mais perto daqui, né?

– Mas na noite de Natal não tem trânsito, amorzinho, não faz sentido isso.

– Mas não é só o trânsito, amorzinho, tem outro motivo também…

– E qual seria esse motivo, Eduardo?

– A gente precisa de qualquer jeito comer a sobremesa na casa da minha mãe, sério. Vai rolar aquela torta de nozes que não leva ovo na massa, sabe? Ela vai ficar muito chateada se a gente não estiver lá quando abrir a torta.

– Se é assim, saiba que a minha mãe vai fazer aquele musse de castanha portuguesa, que tem que descascar e amassar uma por uma. Dá o maior trabalho, não podemos fazer essa desfeita.

– Renata, vamos ser sinceros, os seus pais vão estar cochilando no sofá bem antes da meia-noite, eles odeiam jantar tarde!

– Eduardo, vamos ser sinceros, os seus priminhos vão querer abrir os presentes às 7 da noite. Não é óbvio que a gente tem que ir na casa da sua mãe antes?!

– Ok, vamos na casa da minha mãe antes, mas não se esqueça de que, quando a gente chegar, seu tio Emerson vai estar bêbado, fazendo aquela brincadeira inconveniente do pintinho molhado.

– Putz, o pintinho molhado, tinha esquecido disso…

– Pois é, já eu não tenho como esquecer, né? Lembra do que aconteceu no Natal de 2010?

– Ai, você também é fresco, hein… É só uma piada sem graça. E a sua mãe, que bebe escondida na cozinha e que, no ano passado, falou que eu não ia caber na camisola que você me deu de presente?

– Mas você há de convir que ela estava certa, né, Renata? Tanto é que você precisou trocar.

– Que grosso!

– Grosso não, ué, você estava gordinha mesmo…

– Olha só, Eduardo, é melhor a gente resolver essa pendenga logo, antes que o Natal como um todo vá pro buraco.

– Tá bom, pra encerrar a discussão: eu voto na casa da sua mãe primeiro porque eu não gosto de musse de castanha portuguesa.

– Mas você até repetiu no ano passado!

– Eu estava fingindo, tanto é que raspei o segundo pote na privada do lavabo.

– Ah é? Eu voto na casa da sua mãe primeiro porque aquela torta de nozes é uma bomba de calorias e é SECA por dentro.

– Seca não!

– É seca sim, assim como o Peru à Califórnia e aquela farofa, também seca, que mais parece a areia da Praia de Malibu.

– E aquele tender repleto de cravos que a sua tia Neide leva? O molho é sempre aguado e, como se não bastasse, eu o-dei-o cravo!

– Legal, faz o seguinte então: pede pra vagabunda da sua irmã fazer uma salada decente, ao invés de levar aquelas folhas de alface picadas com pepino, milho e kani por cima.

– Você chamou minha irmã de vagabunda?

– E do que devo chamar alguém que leva pra ceia de Natal uma salada daquela, pior do que a que vende aqui no supermercado?

– Então você também fala pra cínica da sua prima Rosana que tem que botar pelos menos umas lascas de bacalhau naquele ‘Batatalhau’ dela.

– Só se você falar pro seu primo Denis que o vinho que ele for levar tem que custar mais do que R$10…

– Olha só, Renata, eu acho melhor a gente parar por aqui. Não é possível que não exista um jeito civilizado de resolver essa questão!

– Ímpar…

Um clichê chamado Brasil

qua, 11/12/13
por Bruno Medina |

“O Brasil não é um país para principiantes”, assim sentenciou Tom Jobim, num de seus não raros lampejos de genialidade. A máxima – possivelmente uma das mais brilhantes definições que já se fez sobre este imenso e complexo território ao sul do Equador – resiste ao tempo sem maiores esforços, uma vez que, por razões que me parecem um tanto óbvias, continua bastante atual. A bem da verdade, entender a essência de um país, seja este país qual for, na prática significa navegar num sem fim de clichês e preconceitos; afinal, por definição, qualquer definição (inclua-se aí a do Tom) consiste numa tentativa de se tomar a parte pelo todo, de sintetizar a diversidade – no caso, a de um povo – sob a ótica parcial de um único ponto de vista.

Seguindo a linha de pensamento sugerida, como é de notório conhecimento, todo inglês é irônico e bebe até cair, todo americano acha que Buenos Aires é a capital do Brasil e se alimenta apenas de junk food, todo francês gosta de queijo e é antipático, e todo japonês é apaixonado por tecnologia e Bossa Nova. Mas e quanto aos brasileiros? Quais das características habitualmente a nós atribuídas nos fazem realmente justiça?

Bom, se a intenção aqui é evitar generalismos, arrisco o palpite de que a resposta mais adequada para esta capciosa pergunta passaria ao largo da tradicional dobradinha samba e futebol, certo? Porque, se é inegável que sabemos festejar como ninguém, convenhamos, também não seria incorreto dizer que eis aqui um povo que sabe contornar desafios com muita criatividade e arregaçar as mangas para fazer acontecer, contanto, claro, que não seja durante o período do carnaval, que é sagrado e começou como festa religiosa, embora hoje em dia seja um pouco mais “liberal”. Mas ai de quem disser que não somos sérios, a menos que a crítica tenha partido de um dos nossos, porque aí, de repente, a gente até concorda.

Pois, como bem disse o Tom, compreender esse controverso país e sua gente não é tarefa fácil mesmo para quem nasceu aqui, até porque, visto que nossa cultura é ainda relativamente jovem se comparada a outras nações, encontra-se em pleno processo de conformação e, portanto, em constante mutação. Assim sendo, qualquer possível conclusão sobre o tema equivale a descrição do que enxerga quem olha para uma fotografia, ou seja, um instantâneo que captura o momento, mas que não serve ao propósito de elucidar o que veio antes ou o que virá logo em seguida.

E foi justamente uma fotografia de quem somos atualmente o que nos ofereceu esta semana o Facebook, ao divulgar uma lista com os 10 assuntos mais comentados pelos brasileiros na rede em 2013. Antes que se atire a primeira pedra, cabe observar que de fato não se trata de um estudo científico, apenas uma estatística com fins meramente ilustrativos: “mas então por que eu deveria pensar que é possível concluir algo sobre o povo brasileiro a partir do que se fala numa rede social?”.

Digamos que se a referida lista fosse realmente uma foto, ela seria bastante fidedigna, uma vez que, segundo uma pesquisa divulgada pela Reuters em junho deste ano, à época, nada menos do que 76 milhões de brasileiros possuíam perfil nesta comunidade virtual, o que corresponde a cerca de 90% de quem acessa a internet, ou 1/3 da população total do país. Posto que não se questiona a representatividade da amostra, chega de suspense, vamos à lista. Em 2013, os temas que mais interessaram aos brasileiros foram:

Carnaval, Futebol, Papa e Mensalão. Somos ou não somos um perfeito clichê?

Sobre como não enlouquecer durante as compras de Natal

qua, 04/12/13
por Bruno Medina |

Todo ano é a mesma coisa: basta virar a folhinha do mês de dezembro no calendário e o Natal chega rasgando, trazendo à reboque a adoção compulsória do espírito natalino, as famigeradas ‘caixinhas’, onipresentes em todos os estabelecimentos comerciais, o constrangimento no amigo oculto da firma, os quilos a mais associados à comilança de panetone e rabanada, o trânsito – inexplicavelmente caótico – e por último, mas não menos importante, as temíveis compras de presentes. Se você acha tudo isso muito divertido, pode parar por aqui, esse texto não é pra você. Mas se, como eu, você é uma daquelas pessoas que chegam a ter pesadelos com shoppings centers lotados e listas intermináveis de presentes (que consomem metade do orçamento do ano e na qual figuram parentes que você só encontra mesmo no Natal), nas próximas linhas será possível encontrar algumas dicas que visam atenuar o desgaste provocado por esta inevitável jornada rumo à insanidade e ao consumismo desenfreado.

Quando ir às compras

Ao longo dos anos, a incessante busca por um método mais eficiente me levou a experimentar várias estratégias distintas, tais como deixar para comprar tudo no dia 23 – e me submeter à pressão da última hora como forma de agilizar o processo – e o contrário disso, ou seja, começar ainda em novembro, para ter todo o tempo do mundo e a oportunidade de ir às compras diversas vezes. Do alto da minha experiência, vos digo: nem tanto ao mar, nem tanto à terra: o que realmente funciona é escolher uma data no início de dezembro, chegar assim que as lojas abrem e resolver tudo num dia só.

Por quê? Porque no início de dezembro a primeira parcela do décimo terceiro ainda não evaporou (espero), portanto sua percepção de falência iminente não vai, por exemplo, provocar hesitações desnecessárias. No mais, nesta época, sobretudo pelas manhãs, os vendedores ainda não estão impacientes e obcecados por aumentar suas comissões a qualquer custo, esfregando no seu nariz itens pelos quais você sequer se interessou. A bem da verdade, ir às compras 20 vezes que seja não é garantia de encontrar todos os presentes de sua lista. Convenhamos, se você não conseguiu resolver as pendências num único lugar que reúne dezenas de lojas, aceite, o problema pode estar em você.

Aceite o desafio

Dada nossa natural tendência por procrastinar, é bem provável que, inconscientemente, você deixe para o final os presentes mais complicados. Após uma exaustiva maratona de compras, essa é uma circunstância perigosa, visto que seu discernimento estará afetado pelo cansaço e você vai aceitar pagar o triplo do planejado, apenas para chegar mais cedo em casa. Uma maneira de evitar isso é encarar primeiro as pedreiras; presente da mãe, do namorado novo, do marido da prima, não importa, se parece difícil, comece por este e aproveite enquanto ainda tem disposição e o relógio está a seu favor.

Definindo um plano de ação

Como se sabe, o bem estar físico e mental da imensa maioria dos seres humanos passa a estar gravemente ameaçado a partir de 4 ou 5 horas dentro de um shopping, portanto cada minuto é precioso. Jamais aceite companhia de quem quer que seja para fazer compras, afinal, quase sempre os objetivos são muito diferentes e, ao invés de se ajudar, a dupla só bate cabeça e perde tempo. Melhor do que isso é, antes de sair de casa, escrever num papel o nome de todos os presenteados, o que eles te deram no Natal passado (lei da reciprocidade) e, sem pensar muito, uma sugestão aleatória de possível presente. Guarde essas anotações no bolso, para casos de emergência e, se empacar, não se desespere. Basta dar uma olhada na lista e tentar entender o que motivou sua sugestão inicial; quem sabe você não acabou de se deparar com algo parecido e com preço razoável?

A lebre e a tartaruga

Sem dúvida, um dos maiores erros que se pode cometer durante as compras de Natal é o de deixar-se levar pelo otimismo de um bom começo: “Tô indo muito bem, matei 5 presentes em meia hora! Acho que mereço um descanso”. Daí o sujeito se esquece da razão pela qual está ali e passa a se distrair com as vitrines, senta para tomar um café e se entreter com o movimento ou olhar o Facebook no celular. Ledo engano. Assim como na fábula, quem vence a disputa é a tartaruga, vagarosa e perseverante, e não a lebre, ágil e presunçosa. Indo muito mal ou muito bem, tente se ater a uma meta (ex: 3 presentes por hora) e deixe o lazer para o momento em que estiver de fato precisando de uma pausa.

Bom, espero que as dicas sejam úteis. Se elas apenas o deixaram ainda mais angustiado, lembre-se de que os vales presentes foram concebidos para pessoas como você, ou, de repente, agora é uma boa ocasião para resgatar aquele talento especial deflagrado no jardim de infância, de pintar garrafas de vidro e fazer potes de argila como presentes de Natal para amigos e parentes.



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