A Vida por um Fio
Este post se inicia com a proposição de um exercício que certamente soará tão hipotético quanto absurdo para a maioria dos leitores: como seria passar um ano inteiro sem acessar a internet? Faça um esforço e tente imaginar que a leitura deste texto corresponde a sua última interação com a web pelos próximos 365 dias, e que, ao término do último parágrafo, você não poderá obter notícias, pesquisar informações, visitar redes sociais, realizar compras ou sequer enviar e receber e-mails. Será que você, ou qualquer pessoa, consegue realmente supor todas as consequências, implícitas e explícitas, desse ato na própria vida? Foi esta dúvida que motivou Paul Miller, editor sênior do portal The Verge, a enveredar-se por um caminho que nenhum homem ousou antes trilhar, rumo a insólita experiência de desconectar-se. Completamente.
No início do ano passado, Paul tinha 26 anos e considerava-se, como tantos de seus contemporâneos, um hamster girando na roda da hiperconectividade. Ele era um usuário assíduo da internet desde os 12 anos e sentia que seu desenvolvimento como indivíduo e profissional misturava-se com a evolução da web, de uma maneira tão intrínseca que tornava-se impossível dissociar a pessoa que havia se tornado da que poderia ter sido, caso a internet não existisse. Por algumas vezes pensou em restringir os acessos, mas logo percebeu que não possuía disciplina suficiente para isso. A incapacidade de levar o plano adiante o fez perceber a gravidade de sua condição, sentenciando que optasse por uma alternativa mais radical: às 23h59 do dia 30 de abril de 2012, ele desplugou o cabo ethernet de seu laptop e escondeu o smartphone no fundo de uma gaveta, com o único propósito de mergulhar de cabeça na busca por si mesmo, no já distante e pouco familiar mundo não-virtual.
Ainda vivenciando os primeiros dias de sua nova realidade, Paul relata ter se dado conta de algo de suma importância, mas que nunca lhe pareceu tão óbvio; quando eventualmente sentia-se um pouco entediado pela ausência da internet, sem poder refugiar-se como de costume na esfera digital, preenchia o vazio com afazeres analógicos, tais como andar de bicicleta, reciclar roupas velhas do armário ou sair de casa para encontrar os amigos. Nos 3 meses iniciais, perdeu 8 quilos sem desejar emagrecer, escreveu metade de um romance e teve sua capacidade de concentração sensivelmente expandida, chegando a ler 100 páginas numa única sentada, um assombro se comparado ao empenho que a leitura de apenas 10 páginas exigia em outros tempos. Estes eram indícios de como a dedicação desmedida à internet coibia ações mais construtivas – ou até prazerosas – em outros campos.
Ao deixar para trás sua obsessão pela web, Paul esperava deparar-se com pensamentos do tipo “hoje usei um mapa de papel e foi hilário” ou “alguém tem uma cópia off-line do Wikipedia?”, mas sua previsão não poderia estar mais longe de se concretizar. Acontece que boa parte de nós, ele inclusive, se esqueceu de que existem alternativas bastante razoáveis para a maioria dos processos que migraram para a internet. Ainda que quase sempre sejam mais rápidos e práticos agora, isso não significa necessariamente que havia algo de errado com a forma com que se davam antes.
Sem a distração do smartphone, passou a sentir-se mais consciente do momento presente, o que, por consequência, levou-o a perceber os benefícios de abandonar sua costumeira zona de conforto social. Num encontro com a irmã, tornou-se claro como a relação entre ambos fora sistematicamente atrapalhada através dos anos pela incapacidade dela em conseguir sua plena atenção, constantemente dividida com algum aparato tecnológico. De maneira geral, Paul diz ter recuperado a percepção da importância de dedicar-se a cada interação, seja com um parente ou um livro, uma constatação um tanto óbvia, mas que parece ter se diluído frente ao universo de sobreposições de tarefas e sensações possibilitado pela internet. Como exemplo, mencionou que o trabalho de ler 100 e-mails por dia nem se compara ao de responder uma dúzia de cartas por semana, ou seja, no modelo em que estamos inseridos hoje, é fácil se envolver com atividades consideradas árduas, mas que dispõem de pouco significado emocional.
Ao longo dos meses, Paul acredita ter se adaptado à vida desconectada, o que, no entanto, não o impediu de constatar, no final de 2012, que pouco a pouco havia abandonado alguns bons hábitos adquiridos no período, entregando-se a novos vícios off-line. A crise agravou-se durante uma visita feita a sobrinha que mora em outro estado, quando descobriu que ela atribuía sua prolongada ausência no Skype à falta de vontade de conversar. Soma-se a isso o fato de uma grande amiga ter se mudado para a China, o que os levou a perder o contato por completo. A essa altura, definitivamente, ele havia se dessincronizado com a vida. Temendo não conseguir levar seu experimento até o fim, mês passado Paul esteve numa conferência que reunia teóricos da web. Seu objetivo era contrastar a opinião daqueles que acreditam que a internet permeia tudo com a de quem optara por estar à margem dela. Após conversar com alguns palestrantes, foi preciso dar o braço a torcer e concluir que a internet era apenas o meio para onde canalizava as questões com as quais não sabia lidar na vida real. Em suas palavras: “Eu queria descobrir o que a internet estava fazendo comigo para que eu pudesse revidar. Mas a internet não é uma busca individual, é algo que fazemos uns com os outros. A internet é apenas o lugar onde as pessoas estão”.
Para quem ficou curioso com o desfecho da saga de Paul, vale dizer que toda a experiência foi registrada e transformada num documentário.
O que me chamou a atenção em especial nesta história foi a oportunidade de conhecer as impressões de alguém que se dispôs a cruzar em definitivo a tênue fronteira pela qual transitamos, com maior ou menor desenvoltura, todos os dias. Diferente de alguém que se exila num retiro espiritual ou num barco que navega ao redor do mundo, o desafio de Paul era estar off-line mesmo inserido num contexto em que o convite a conectar-se é permanente. Pelo visto, o resultado obtido com o projeto aponta para o fato de que ainda somos nós, seres humanos, que estamos por trás dos gadgets utilizados, e que são nossas angústias, receios e frustrações que ditam como a internet deve ser. Funcionaria menos como uma força impessoal que se apodera de tudo e mais como um espelho das nossas próprias mazelas. Ao imputar à internet a responsabilidade por tudo que não conseguia ser, para, em seguida, se dar conta de que a vida sem ela pode ser tão frustrante quanto, Paul saciou a curiosidade de muita gente que provavelmente se vê na mesma condição que ele. E a sua, também?
Eu teria que ser criopreservado pra aguentar.
Muito boa essa experiência, confesso que me fez repensar toda a minha rotina e tentar imaginar como seria passar pela mesma situação. Gostei!
Eu tive uma experiência semelhante. No final do ano passado me dei conta de que estava viciada em redes sociais. Tentei limitar o acesso algumas vezes mas nunca fui bem-sucedida. A decisão só se concretizou com as festas de Natal e Ano Novo. Antes de viajar exclui minha conta do Facebook. Com as férias e longe de casa não houve problema em ficar sem rede. Avisei aos amigos mais próximos e outros, depois de um tempo começaram a me ligar. Sem Face, passei a aproveitar muito mais as pequenas coisas do cotidiano e intensifiquei os laços com as pessoas mais chegadas. Em vez de mandar recados online ou curtir postagens, arrumei tempo para conversas longas ao telefone e encontros pessoais. Valeu muito a pena. Já são cinco meses sem redes sociais.
Acredito que é disso que todos nós precisamos!
Hoje é bem frequente as pessoas nos restaurantes (principalmente aqui no centro do Rio), almoçarem ao mesmo tempo que usam o smartphone. E a noite nos bares, nem se fala. Acho isso horrível quando se está com outro na sua frente.
Uso bastante a rede, e não consigo me imaginar sem isso, tanto pelas facilidades de comprar/pagar contas, por exemplo, como a interação social. Mas como já diz o ditado velho: tudo demais é veneno.
Impossível pra mim! Não consegueria vencer essa luta contínua contra si e o resto do mundo.
Pirei! Parabéns amigão!
Olha, eu tive o primeiro contato com a Internet aos 22 anos de idade, em 1997. Então vivi em torno 8000 dias sem internet, o que seriam mais 365?
Eu não sei se eu consigo com a internet….. mas com o celular eu consegui….faz mais de 6 meses que eu to sem cel. ee realmente, as coisas são melhores sem estar preso em um aparelho!
Desafio para poucos, meus amigos. Para poucos.
Não, trabalho com isso ¬¬
Só se a dilma pagar meu salário durante 365 dias eu fico sem entrar nessa porcaria sem dúvidas.
Tem a PAC pros ‘crackeiros’…
Podia ter a PAC pros viciados em computador… eu me internaria de boa… e fikava lah 365 dias tomando suco de uva e ganhando grana… sem gastos
Fiz uma tentativa frustrada de desapego da internet, consegui ficar 3 meses sem qualquer acesso á rede. Achei muito difícil esses dias e parecia que estava em uma ilha deserta, o lado bom que não perdi tempo e fiz algumas produções internas e externas.
Eu acho essa experiência uma bobagem seria como por exemplo parar de andar em veículos motorizados e passar a andar só de bicicleta ou a pé (incluindo ai viagens para outras cidades é claro) ou parar de tomar remédios modernos e só usar remédios caseiros. A internet assim como outros produtos da nossa tecnologia foram criados devido a uma necessidade do ser humano e estão ai para nos ajudar.
Já to até pensando na deprê, muito louco, é praticamente automático, chego ao trampo, ligo o pc,sento na cadeira e acesso meus e-mails (3)..kkkk mas a experiência é mt interessante!
cara difícil de imaginar mais faz refletir, talvez não ficar sem pois é bastante necessário o uso da internet mas com certeza me fez refletir se não seria bom passar menos sem na internet. e me parece uma ótima ideia!
O tato ou relato.
A internet me deixou burro e insensível demais!
A “internet” me deixou burro, muito burro demais
Agora todas coisas que eu penso me parecem iguais
O sorvete me deixou gripado pelo resto da vida
E agora toda noite quando deito é boa noite, querida.
Está velha canção gravada em 1985 pelos Titãs,(Televisão) ano qual eu nasci.
Vem bem a calhar com nossa triste atual realidade do século XXI.
As redes socias impedem que os usuários venham a fazer bom uso de uma ferramenta tão espetacular.
Tornar o uso da internet um vício obsessivo faz com que perdemos a essência do afeto e passamos a compartilhar coisas apenas virtuais. Substituímos o tato por um relato, para suprir a ausência e dizer tudo que é mais bonito ou o que está em evidência. Vivência essa, afetada pela conectividade das pessoas no mundo virtual.
Tornemos nosso mundo mais amoroso, o seu dia bem mais compartilhado.
Passe a curti a vida e não os post.
Tente redescobrir a essência das coisas fora do mundo virtual.
No começo pode parecer chato,mais logo irá se tornar bem legal,
Encontre alguém especial e diga tchau para esse mundo frio e virtual.
Muito bom esse post intrigante também, escrevo um blog e gosto muito de ler seus texto, além de ser fan da banda.
Fiquei 5 dias sem internet e consegui ler dois livros nesse tempo, e a quase 1 ano que não conseguia ler nenhum livro. Então consegui enxergar o quanto a internet em excesso “emburrece“ e consome a maior parte do nosso tempo se não for bem administarada. Adorei o texto, Parabéns!!!
Achei ótimo o relato! Como estou no trabalho agora, pretendo acessar e assistir o documentário quando chegar em casa.
Acho que é uma experiência ótima, e tenho bastante vontade de fazer. Não me sinto viciada em internet, nem passo boa parte do meu dia online, mas às vezes me acomodo em relação às relações com amigos e família. Parece que basta um recado no mural do Facebook ou uma mensagem privada pra estreitar laços, mas nada se compara à um longo telefonema ou a um passeio em um domingo à tarde!