O controle em nossas mãos

dom, 04/03/12
por Bruno Medina |

Neste exato momento digito em pleno ar, mais precisamente em alguma área turbulenta situada a milhares de quilômetros do Brasil, a caminho da bela São Francisco. Durante a próxima semana, estarei na cidade para participar do GDC (Games Developers Conference. Trata-se de um gigantesco fórum, que reúne pessoas de todo mundo, interessadas em conhecer e compartilhar projetos que utilizem ferramentas de jogos para viabilizar o engajamento ou mesmo resolver impasses de negócios de maneira lúdica e criativa. Estou nessa porque, faz já algum tempo, me interessei por estudar um pouco mais a matéria, que tem sido, a cada dia, mais e mais introjetada em nossas rotinas; ainda que a gente, muitas vezes, nem se dê conta.

E olha que nāo estou falando só daqueles joguinhos eletrônicos inofensivos que seu irmão mais novo joga online, através de consoles, ou mesmo, smartphones. Os jogos a que me referiro são os que têm sido utilizados por grandes empresas para, por exemplo, selecionar funcionários para postos que precisam ser preenchidos, criar promoçōes para lançamento de novos produtos,  simular situações de risco, ou ainda serem empregados como técnicas alternativas ao aprendizado convencional. Se você ainda é uma daquelas pessoas que pensam que os jogos servem apenas para entreter ou matar o tempo, assista à emblemática palestra que Jane McGonigal ministrou em 2010 numa das sessões do TED. À época, sua pesquisa indicava, pasmem, que mais horas já foram dedicadas pela humanidade ao jogos do que a soma de todo tempo passado em estabelecimentos de ensino. Ainda segundo ela, em média, um estudante norte-americano que estiver agora adentrando uma universidade, já terá gastado mais tempo de sua vida na frente de um videogame do que dentro de uma sala de aula.

Estes dados nāo deixam de ser intrigantes, sobretudo pelo fato de, no mínimo, refletirem que o sistema de ensino em vigor atualmente nas escolas precisa de fato ser revisto, pois, ao que parece,  exclui todo o conhecimento específico adquirido e aprimorado por estes jovens desde sua infância. Uma das principais bandeiras hasteadas por Jane se traduz em uma provocação: a cada ano formam-se exímios especialistas em um campo de conhecimento que nāo temos ainda a menor ideia para que serve! Mas como matar esta charada? Sem muito esforço, consigo pensar em incontáveis atividades profissionais que poderiam se beneficiar do modelo de pensamento desenvolvido por games.

Ano passado, participei da criação de um jogo, concebido a partir de dados extraídos do cenário macroeconômico brasileiro. Com o propósito de auxiliar executivos de grandes empresas a definir estratégias de atuação futura, o jogo era baseado em informaçoēs reais, disponibilizadas num baralho (em cartas). Também tive a chance idealizar um conjunto de atividades com o propósito de amenizar – junto aos funcionários de uma construtora com mais de  5 mil funcionários – os efeitos nocivos e até traumáticos da implementaçāo de um novo sistema ERP. Para minha satisfação, esse projeto foi selecionado para ser apresentado em maio nos Estados Unidos, durante um congresso de soluções relacionáveis ao problema; uma palinha do que ando fazendo, para quem pensa que eu passo os dias flutuando numa boia dentro da piscina quando o Los Hermanos nāo está fazendo shows, rsrs!

Pois bem, o que todo mundo aqui em Sāo Francisco quer entender diz respeito às outras aplicações,  aos métodos provindos dos jogos que podem solucionar grandes problemas de nossa socidade, estes em que as iniciativas convencionais não têm obtido sucesso. Será que um game é capaz de ensinar crianças, de maneira eficiente, sobre a necessidade de preservar o mundo que vão herdar? Será que a partir de um jogo é possível auxiliar um doente crônico a administrar os cuidados com sua saúde, ou a populaçāo de uma cidade a denunciar pequenos delitos e assim contribuir para a segurança de todos? Por último, seria possível utilizar um jogo online para  fiscalizar e colocar os políticos na linha durante as próximas eleições municipais? Difícil? Nem tanto. É só pensar que praticar e se deixar envolver por jogos é uma atividade natural, de caráter essencialmente humano, presente em todas as sociedades de que se tem conhecimento. Numa delas, de que agora não me recordo o nome, há milhares de anos, a obsessāo pelos jogos era utilizada como estratégia de controle populacional, uma vez que, enquanto estavam entretidos nas competições, os habitantes do povoado nāo sentiam fome e, assim, as escassas reservas de alimento eram racionalizadas.

Jogos como estratégia de controle? Não. Como vocês podem constatar, este caso já nāo guarda qualquer semelhança com os dias atuais, muito menos com um joguinho de colecionar amigos, que tornou-se incrivelmente popular ao permitir que as pessoas disponibilizassem detalhes de seus gostos e preferências para um carinha bacana mesmo chamado Mark, que no fundo só pretende ajudar todo mundo a saber o que seus conhecidos andam fazendo.

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10 comentários sobre “O controle em nossas mãos”

  1. Dani disse:

    Aproveita a conferência e traz bastante novidade pra gente :)

  2. Sue disse:

    Oi, Bruno! Sinceramente estava por fora dessas “idéias”, mas achei bacaníssimo! É realmente algo que pode fazer diferença! Estamos vivendo uma era completamente tecnológica e por que não usar isso para fins benéficos socialmente, ao invés só do puro entretenimento? Bacana mesmo! Boa estadia pra você, por ai, e ótima conferência! Nos conte as boas novas depois :}
    Beijoca!

  3. Emerson disse:

    Muito interessante Bruno. Já comecei a pensar em todas as coisas que fazemos em demasia que não são levadas a sério na escola ou no trabalho. Ouvimos muita música também, embora existam áreas em que isto será bem empregado, a maioria dos trabalhos e ou escolas não dão a mínima pra isso… Deve ter muita coisa em que somos bons que ainda permanece subutilizado.

    Jogo bastante Settlers e trabalho com logística, eu sempre indico este jogo para os que trabalho comigo por ter muito a ver com nosso trabalho. Aquilo é logística pura de uma forma divertida. Deve ter inúmeros exemplos deste tipo.

    Excelente texto!

    A Sábia Ignorância:
    https://asabiaignorancia.blogspot.com

  4. Glauco Aguiar da Paz disse:

    Bruno,

    Sou leitor assíduo do instante posterior e fã incondicional do Los Hermanos.
    Preciso da sua ajuda para concretizar um sonho meu, pedir minha noiva em casamento no show do los hermanos em Manaus.

    Se sensibilize com esse coração apaixonado aqui!!

  5. Sue disse:

    Aêêêê Glauco, que liiiiiiiindo isso, cara! Dou maior apoio, ó! Ajuda aêêêê Brunão!

  6. Daniele disse:

    Ahh que lindo meeesmo! vai ser o melhor pedido de casamento de tooodos!

  7. Tati disse:

    Bacana esse post.

  8. Marcos Fabri disse:

    Bruno, escute essa banda: https://www.liquens.com

    acho que vc vai curtir.

    Abraço!

  9. Elder disse:

    Bruno, até Chico Buarque vem tocar em Natal, no teatro Riachuelo.
    Cadê Los Hermanos aqui?

  10. olívia disse:

    tá demais esse post, bruno! nunca ia imaginar que você se interessasse por jogos. meu namorado faz faculdade de design de jogos e eu nunca levei a coisa tão a sério.. pra mim não ia muito além realmente do que eu vejo meu irmão menor jogando online ou nos milhões de aplicativos pra smartphones. mas esse seu questionamento sobre se dá pra usar a metodologia dos jogos pra resolver grandes questões da humanidade eu vou levar comigo e passar a encarar com outros olhos as potencialidades dessa área. conta mais pra gente sobre o GDC!
    beijão!



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