Folia para quem precisa de folia

seg, 27/02/12
por Bruno Medina |

Pronto, acabou-se o Carnaval; tempo de guardar fantasias no alto do armário, de cuidar dos calos nos pés, de negociar com os amigos de apagarem do Facebook aquelas fotos queimando seu filme e de passar pelo menos uma semana tomando água de coco intercalada com chá de boldo, para tentar recuperar o fígado exaurido. Mais do que isso, finalmente é chegado o momento de levar a sério 2012, o ano que inicia-se a partir desta semana… colocado assim pareceu um fardo, tipo bronca de mãe. Mas é preciso encarar os fatos o quanto antes: a verdade é que folia mesmo, da boa, só daqui a 12 meses. Foi pensando naqueles que acham que não irão resistir a um período tão extenso de realidade e sobriedade que o Instante Posterior compilou uma série de exercícios e atividades capazes, se não de curar, ao menos de amenizar os efeitos nocivos da abstinência do Carnaval no ambiente de trabalho. Portanto sacode a poeira e engole o choro, porque a folia só termina quando você desiste dela.

 

DICAS PRÁTICAS PARA OS ABSTINENTES DO CARNAVAL

 

Bloco Imaginário: durante o horário de almoço, reúna em torno de uma mesa 4 ou 5 colegas e peça para que narrem os detalhes de um hipotético desfile de bloco, de forma que cada relato influencie os rumos da história a ser criada coletivamente. Funciona mais ou menos como um jogo de RPG, mas sem dados ou gnomos… se bem que…

 

Carnaval Mudo: convoque os colegas a vestirem por baixo dos trajes profissionais uma peça de fantasia e combine de fingirem que estão dançando sempre que o chefe virar de costas.

 

Trio elétrico portátil: essa atividade é um pouco mais ousada, assim sendo, exige bastante perícia dos praticantes. Pegue emprestado com a turma da faxina um daqueles carrinhos de limpeza que transporta pelas salas da empresa baldes e esfregões. Quando o momento for oportuno, suba no topo do carrinho e cante baixinho uma música da Ivete Sangalo ou do Chiclete com Banana, pedindo aos colegas que empurrem o veículo até o fim do corredor.

 

Concurso de Fantasias Improvisadas: convide os colegas para, dentro do prazo de 5 minutos, confeccionarem fantasias utilizando apenas itens disponíveis na sala. Vale colocar a lixeira virada na cabeça, fazer colar com tripa de clips emendados, desenhar uma maquiagem no rosto com caneta esferográfica e o que mais a imaginação determinar! O “folião” mais criativo vence.

 

Baile Individual: utilize o depositório de folhas já utilizadas na impressora como matéria-prima para a fabricação de serpentinas (cortando tiras fininhas com tesoura ou estilete) e de confetes (removendo aquelas bolinhas que ficam no fundo do furador de papel). Ao fim do dia, quando houver um volume significativo, vá até o banheiro e jogue tudo sobre a própria cabeça.

 

Office Drinks: bem, para quem o Carnaval representa apenas dias e noites de bebedeira ininterrupta, uma alternativa é encher uma garrafa de vodka com água, espremer um limão dentro de um copo descartável e colocar um daqueles screensavers bem loucos pra rodar na tela do computador, simulando os efeitos do álcool no cérebro. Uma segunda alternativa é pedir para um colega girá-lo em torno do eixo de sua cadeira e depois sair com o copo na mão em direção ao elevador do prédio, sem deixar, é claro, o conteúdo despejar.

 

Apuração de Notas Pessoais: supondo que o quadro de funcionários de sua empresa correspondesse a uma Escola de Samba real, avalie os colegas, relativizando os quesitos tradicionais aplicáveis às agremiações. Ex: melhor comissão de frente (precisa explicar?), pior alegorias e adereços (pochete, blusa laranja com listras marrons), melhor conjunto (sujeito simpático, inteligente e bom profissional), e por aí vai.

 

Bateria Minimalista: canetas, copos descartáveis, latas de lixo vazias, porta-lápis e o que mais for passível de produzir algum som podem e devem ser utilizados como instrumentos de uma legítima bateria. Reúna um grupo para assumir a percussão minimalista, invente um  samba enredo e desfile até o último andar do prédio pela escada de incêndio.

 

Ficou faltando alguma coisa? Bom, se alguém tiver sugestões nessa linha, por favor -e pelo bem das almas aflitas e carentes por um resquício de folia, não hesitem em dividi-las conosco através da seção de comentários. Quem se animar e resolver colocar em prática as dicas, fotografe e envie para

[email protected] que eu publico.

Botando o bloco na rua

sex, 17/02/12
por Bruno Medina |

 

Sapatos de Tróia

seg, 13/02/12
por Bruno Medina |

Possivelmente, há quem discorde, mas gosto de pensar que, para alcançar a genuína felicidade, qualquer pessoa precisa encontrar apenas três coisas na vida: um amor de verdade, um trabalho digno e um boa loja de sapatos. Os dois primeiros itens da lista, como se sabe, são conquistas com as quais, cedo ou tarde, esbarra-se em alguma esquina do caminho, diferente do terceiro, bem mais raro e passível de configurar-se como uma busca incessante capaz de perdurar toda uma existência. Antes de prosseguir, é preciso fazer uma ressalva, sob o risco de comprometer o entendimento deste texto; para os homens, a definição de bom sapato consiste em algo bem diferente do que para as mulheres.

Enquanto elas costumam seduzir-se por peças exclusivas, essencialmente belas e que combinem de maneira específica com cada peça de seu guarda-roupas, eles procuram por calçados resistentes, versáteis e confortáveis. A título de ilustração, o representante típico do gênero masculino, caso pudesse, teria um único par de sapatos, que lhe serviria tanto para uma escalada quanto para uma cerimônia de casamento, ainda que fosse a dele próprio. Para encurtar a história, faz uns quatro anos, encontrei uma loja de sapatos para chamar de minha. Como não poderia deixar de ser, ao longo deste período, a descoberta tem me proporcionado incontáveis momentos de satisfação, estes mesmos que, sempre quando possível, procuro estender aos amigos e parentes, na forma de presentes ou tão somente recomendações de compra.

Pois bem, na última vez em que estive na referida loja para substituir uma sandália – que de tanto usar já tinha carimbad0 o formato dos meus dedos na sola – finalmente consegui levar também um sapato para minha mulher. Explico: apesar de presenteá-la com um desses incríveis sapatos ser um antigo desejo meu, isto ainda não havia acontecido, sobretudo por nunca ter batido os olhos num modelo que se parecesse com ela, e que, por consequência, poderia não proporcionar uma experiência a altura da estima que tenho pela marca. É mais ou menos parecido com quando convidamos alguém para assistir ao show de nossa banda preferida justo no dia em que o vocalista está com um baita resfriado. A espera, no entanto, valeu a pena, afinal os sapatos agradaram em cheio, tanto que decidimos marcar a estreia simultânea saindo para jantar.

Após um breve passeio pelo shopping, já sentados no restaurante, percebi que minha mulher volta e meia repetia o estranho gesto de remexer as pernas e olhar por baixo da toalha da mesa. Quando indagada sobre o porquê do intrigante comportamento ela, a princípio, desconversou, mas acabou confessando que os sapatos novos, aqueles incríveis, estavam matando-na! Ao que parece, a forma cedeu muito mais do que seria aceitável, sendo que, a cada passo, a parte traseira descolava de seu calcanhar e roçava a pele, criando uma dolorosa e latejante bolha que só fazia aumentar. Não bastasse a enorme decepção e a cara de tacho com que fiquei ao constatar que o sapato dos sonhos havia se transformado em pesadelo, ainda era preciso encarar a via crúcis que correspondia ao trajeto de volta para casa.

Penalizado pela situação e me sentindo culpado pelo tremendo presente de grego, cavalheiro que sou, resolvi me redimir através de uma proposta um tanto quanto pitoresca; como usamos números parecidos, ofereci trocarmos de sapatos. Calçar sapatos de mulher nem representaria um desafio tão grande se, entre o restaurante e o meu carro, não houvesse um Baixo Gávea apinhado de gente. Então, meus amigos, pela luz que me ilumina, eis que lá estava eu, cruzando o reduto da boêmia carioca, em pleno sábado à noite, vestindo um sapato feminino verde bandeira, e torcendo muito, mas muito mesmo, para não ser reconhecido por ninguém. Como um verdadeiro “Moisés fashion”, atravessei humilhado aquele mar de gente sem olhar para trás, na esperança de que a agilidade fosse recompensada com a manutenção do meu anonimato. Acontece que enquanto eu tentava deixar o local do crime sem chamar a atenção de potenciais testemunhas, minha mulher encontrava-se em meio a um surto descontrolado de riso, que me obrigava a arrastá-la pelas calçadas, chamando ainda mais atenção e retardando nosso deslocamento. A esdrúxula cena foi percebida por um grupo de meninas sentadas na varanda do Braseiro, para as quais tentei fazer parecer que anunciávamos uma peça teatral estilo besteirol, aos moldes de “Por Falta de Roupa Nova Passei o Ferro na Velha” ou mesmo uma ação promocional de lançamento de uma nova bebida energética. Não colou.

Para lembrar-me desta degradante passagem, neste que foi seguramente um de meus dias mais inglórios, fotografei os pés apenas, porque um retrato que revelasse algo mais do que isso seria por demais embaraçoso. Olhando para trás, talvez meu maior ressentimento se deva a um fato totalmente compreensível frente às circunstâncias: custava minha bermuda e minha blusa estarem combinando com o sapato!?

Se meu “Fusca” falasse…

seg, 06/02/12
por Bruno Medina |

Meu nome é Bruno Medina, tenho 33 anos, sou casado, músico, cronista, leonino, pai de dois filhos e feliz proprietário de um Mondeo vermelho 1996. O tom autoconfessional deste início de texto justifica-se a partir de uma recente constatação que fiz, a de que a trajetória deste carro, na verdade, se confunde com a minha própria. “Uma banheira sobre 4 rodas, de contornos ultrapassados e com valor de mercado comparável ao de um bom computador”, seria uma descrição fidedigna, muito embora eu prefira considerá-lo apenas como um bom e velho amigo. “Mas por que falar do carro justo agora, depois de 15 anos?”, perguntaria o intrigado leitor. A resposta é simples; cansado de relegar este caso de amor à clandestinidade, resolvi assumi-lo publicamente e, assim, libertar-me do constrangimento e do martírio que a sociedade insiste em querer me imputar.

Mas comecemos do começo: segunda metade da década de 90, economia interna estabilizada, Real bombando, prosperidade à vista após um longo e tenebroso período de crises no país. Mais ou menos na época em que parte de vocês ainda trocava figurinhas do Pokemón durante o recreio, a Ford decide lançar também no Brasil seu carro mundial, o Mondeo, que havia alcançado vendas expressivas na Europa e nos Estados Unidos. Fabricado na Bélgica (?!), este luxuoso sedan, espaçoso e confortável, com motor 2.0, 16 válvulas e 127 cv de potência, assim que chegou, logo chamou a atenção do meu pai, que resolveu comprá-lo de presente para minha mãe. Nestes primeiros anos, a rotina do carro era um tanto sonolenta, suponho, visto que não deixava a garagem mais do que uma ou duas vezes por semana, a título de cumprir um ou outro compromisso da minha mãe, assumidamente uma entusiasta da vida a pé.

Chegava a dar pena ver o carrão criando teias de aranha na vaga, sendo que, do alto dos meus 18 anos, tudo o que mais desejava era por as mãos naquele volante, o que só foi acontecer de fato no ano seguinte, na ocasião de um churrasco de aniversário que um colega de faculdade organizou em Niterói. Lembro-me como se fosse hoje da sensação de conduzir o Mondeo pelo vão central da ponte, aludindo à célebre cena de “Titanic” em que Leonardo DiCaprio abre os braços sobre o oceano azul e dispara, “I’m the king of the world!” (desculpem, era um referência forte naqueles idos…). Após este primeiro contato, a vida seguiu o rumo previsto; tive um Gol, um Golf , um Escort e um Astra, e o Mondeo continuou sendo o veículo bissexto da minha mãe. Não demorou muito mais para que a família percebesse que o carro nunca teria a utilidade pensada, entretanto, ao colocá-lo à venda, meu pai se deu conta de que o automóvel que o havia fascinado anos antes tinha se tornado um retumbante fiasco comercial no Brasil, e que o preço sugerido pelo mercado era simplesmente um acinte aos seus reconhecidos atributos.

Estávamos em 2004, e eu acabara de torrar todas as minhas economias –inclusive meu carro– na compra da casa em que atualmente moro. Sem um tostão e a pé, uma vez que o Mondeo continuaria desfrutando do ócio habitual, tive a ideia de pedi-lo emprestado por um período, mais precisamente, até que conseguisse recompor as finanças. Estes devem ter sido os dias mais atribulados de sua existência, afinal, de manhã o bicho carregava com desenvoltura minha mudança ou o material empregado na reforma do recém adquirido lar, à tarde dava um pulo no estúdio onde gravávamos o “4” e, à noite, ainda esticava na Lapa ou no Baixo Gávea. Dois anos de muito trabalho se passaram e, ao fim da turnê do disco, consegui comprar um novo carro. A essa altura, transparecendo seus 10 anos, o Mondeo já havia sido substituído por um modelo muito mais jovem na garagem dos meus pais, restando ao bravo sedan algo ainda pior do que o tédio de seus primeiros anos de vida: o exílio na casa de praia da família, na Região dos Lagos. Por intermináveis três anos o carro permaneceu esquecido sob uma capa de plástico, bateria e pneus arriados, ao sabor da implacável salinidade do vento marinho, sem ninguém ao menos para virar-lhe a chave de vez em quando.

Agora tendo mulher e filho, era nítida a demanda por um segundo veículo na casa, e quem consegue adivinhar a ideia que tive? Olhando para trás, a iniciativa de resgatar o Mondeo de seu calvário praiano me parece estar muito mais associada à tentativa de evitar que ele se esvaísse em ferrugem do que propriamente à demanda por um possante com suas características. Um banho de oficina para reparar os estragos causados pela corrosão e a imobilidade e, desde então, pode ser visto pelas ruas do Rio rodando em nível de cruzeiro. Faz uns dois meses, não sei por quê, encasquetei que a melhor maneira de trazê-lo em definitivo para o século 21 seria envelopa-lo de cinza fosco, imaginando que o processo serviria, ao menos, para encobrir o desgaste natural de sua lataria. Serviço já pago, mudei de opinião e cancelei tudo: submetê-lo a esta “maquiagem” seria comparável a preencher as rugas de expressão do rosto com botox. Que me perdoem os demais carros, mas este aqui tem orgulho das marcas que o tempo deixou. Até segunda ordem seguiremos juntos, apesar da implicância de minha mulher, do desdém dos manobristas, do riso contido dos frentistas e do olhar curioso de alguns motoristas quando o sinal fecha.

Sempre que alguém tenta crescer pra cima de mim e do Mondeo, sorrio e lembro dos meus 18 anos, e do Leonardo DiCaprio, gritando, “I’m the king of the world!”. Aliás, como diz o conhecido ditado, quem é rei nunca perde a majestade!



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