Fragmentos de um coração partido

seg, 25/04/11
por Bruno Medina |

25.04.11 – “Na próxima semana a gente ia completar 1 ano de namoro. Sinceramente, é até difícil acreditar que tenhamos ficado tanto tempo juntos… por mais que minhas amigas me alertassem, por mais que eu mesma soubesse, preferia não enxergar. Acho que era por comodismo, sei lá, medo de ficar sozinha de novo. Afinal, o que eu e ele tínhamos em comum? Um cara autocentrado, mimado, orgulhoso e nada afetivo. Tenho certeza que mereço mais do que isso. Já foi tarde! Terminamos por telefone mesmo, e o melhor é que nem fiquei na fossa.”

63 dias antes – “Hoje tenho certeza de que os seres humanos não foram feitos para lidar com o amor. Digo por experiência própria. Trata-se de um sentimento utópico, totalmente idealizado e em completa anacronia com o tempo em que vivemos. Dividir o mesmo teto com um namorado é, sem dúvida, a maneira mais rápida e eficiente de aniquilar qualquer traço de admiração que se tenha por ele. Dá próxima vez que me envolver com alguém, vou tentar me imaginar disputando o banheiro com o sujeito antes de ir pro trabalho, às 7 da manhã. Taí uma dica infalível para evitar se arrepender mais na frente”.

117 dias antes – “Confesso que às vezes tenho vontade de jogar tudo pro alto. Por que eu tenho que lutar por esse amor sozinha? Concordar com tudo que eu digo pra não brigar definitivamente não parece ser a receita de uma relação saudável. A sensação é que desse jeito estamos apenas ganhando tempo. A pergunta é: tempo pra que? Resta saber se ainda há algo nisso tudo que valha o sacrifício. As coisas precisam melhorar, e rápido.”

175 dias antes  – “Gosto de acreditar que é preciso agarrar com unhas e dentes o que se deseja de verdade. Acho que com o amor também é assim. A rotina, os pequenos desentendimentos, a correria do dia a dia, são algumas das armadilhas capazes de nos confundir. Nestas horas parece que tudo vai mal, mas acho que é só impressão. Apesar de saber que a grama do vizinho sempre parece ser mais verde, estou convicta de que não somos diferentes de tantos outros casais que conhecemos. No fundo, o que importa mesmo é que nos amamos, e é isso que sempre faz valer a pena.”

231 dias antes – “Graças a Deus já passei da idade de pensar que o relacionamento ideal é um conto de fadas. Afinal o amor real, o que se pretende pra vida inteira, é um sentimento que se constrói tijolo por tijolo e apesar das divergências. Quando há diálogo, compreensão e, sobretudo, respeito ao outro, não existe dificuldade que não possa ser superada. É por pensar assim que tenho certeza de que quero ficar com ele por muitos anos ainda!”

296 dias antes – “Nossa, eu não sabia como era bom estar apaixonada! Essa sensação indescritível de ficar que nem boba, com frio na barriga só porque vi o nome dele na minha caixa de e-mail. O melhor é perceber através das pequenas coisas que ele também está sentindo isso. Pode ser um pouco cedo pra dizer, mas acho que nunca tive tanta afinidade com alguém como estou tendo agora. Ele me entende de um jeito que parece conseguir ler meus pensamentos.”

359 dias antes – “Acho que ontem a noite conheci o homem da minha vida.”

Zé Pequeno

seg, 18/04/11
por Bruno Medina |

Faz uns bons 4 anos, na esquina da rua onde moro estabeleceu-se uma casa de sucos, daquelas ao melhor estilo carioca, que exibem frutas frescas nas prateleiras e servem sanduíches naturais preparados na hora até o fim da noite. Lembro bem de como, na época de sua inauguração, o comércio foi recebido com curiosidade e entusiasmo pela vizinhança, visto que não havia nada sequer parecido com aquilo nestas cercanias. É claro que não demorou muito para que me tornasse um dos mais assíduos frequentadores do lugar, sobretudo nas noites dos dias de semana, antes quase sempre fadadas a terminar em refeições pouco inspiradas, baseadas na mistura aleatória dos ingredientes encontrados na despensa.

As visitas, praticamente diárias, acabaram por determinar que em poucos meses eu já conhecesse pelo nome toda a equipe que trabalha na lanchonete e, em especial, impulsionaram minha amizade com o Ed, um paraibano sorridente e conversador que anota os pedidos endereçados à cozinha. Ao longo desses anos, não houve assunto que não tenhamos abordado em torno daquele balcão, de futebol a política, passando por espiritualidade, música, filosofia, novela, criação dos filhos e até carreira profissional.

A relação protocolar cliente-atendente foi com o tempo se transformando, até o ponto de assegurar-me a condição de VIP, ou seja, ter direito a pedir meu lanche apenas por “o de sempre”, não pagar taxa nas entregas em domicílio e até receber informações privilegiadas sobre os pratos do dia. Quando, por exemplo, o Ed diz “melhor escolher outro sanduíche” eu acato, sem nem perguntar o por quê.

Para minha surpresa, no entanto, recentemente um acontecimento impensável obrigou-me a reavaliar nossa relação. Na última quinta-feira sentei-me, como de costume, na quina do balcão; ao me ver chegar, Ed logo perguntou: “o de sempre?”. Respondi com a cabeça que sim. A TV exibia imagens de Muricy Ramalho sentado no banco de reservas, e então eis que Ed aplica sem misericórdia uma punhalada certeira e definitiva no âmago de nossa já duradoura amizade: “Tu sabia que o Muricy foi pro Santos ganhar R$ 600 mil por mês, hein RODRIGO?”

Pois é. Aparentemente meu amigo de fé, irmão camarada, confidente de todas as horas, Ed, passou os últimos 4 anos pensando que me chamo Rodrigo. “Aquele cara do Los “Germanos”, que mora ali na esquina, tem dois filhinhos e usa barba? Sei sim, é o Rodrigo, tá sempre aqui!”, diria ele a qualquer um que perguntasse por mim. Atentem para a delicadeza da questão, pois, se havia um momento em que era possível contornar esse engano, ele já passou, e faz tempo.

Nessa altura do campeonato, após tanta coisa dita e vivida, não dá pra simplesmente chegar pro cara e dizer: “qualé, mané, meu nome é Bruno! Aproveita e me vê aí o de sempre”. Seria, sei lá, como de repente constatar que seu Canário Belga de estimação é fêmea, ou descobrir que um colega de trabalho é na verdade agente da CIA. Imaginem o climão pós-revelação? A sem gracisse de ambos quanto ao fato dos pilares de nossa intimidade terem sido erguidos sob areia movediça. Não me resta outra alternativa senão sustentar o mal-entendido.

O pior é ter que admitir que esta não é a primeira vez que me passo por Rodrigo. Sendo irmão de um e integrante de uma banda da qual também fazem parte outros dois, não foram poucas, portanto, as vezes que assumi, ainda que involuntariamente, tal alcunha. Outro dia até me peguei pensando se eu teria nascido com cara de Rodrigo, o que por si só revela a iminência de um trauma irreversível. Dá próxima vez que o Ed me chamar pelo nome errado, já tenho ensaiado o que vou dizer:

“Rodrigo é o c……! Meu nome agora é Zé Pequeno, porra!”

Quando 2 e 2 são 5

seg, 11/04/11
por Bruno Medina |

Durante o último final de semana, acompanhei através da imprensa a repercussão de mais uma bem sucedida passagem do U2 por nosso país, dessa vez com a turnê 360o, considerada a mais rentável da história do show bussiness. Em uníssono, jornalistas e fãs da banda que estiveram no Morumbi definiram o que assistiram como “apresentações irretocáveis”, executadas por uma banda cuja atuação beira a perfeição.

Não estou a par dos detalhes técnicos da empreitada, mas de certo ela envolveu uma esquadrilha de aviões cargueiros do tamanho de prédios, abarrotados de equipamentos caríssimos desenvolvidos apenas para esta série de shows, além de um exército de profissionais, dentre os quais seguramente se encontram os melhores do mundo em cada uma das funções exercidas. Como recompensa por tamanho empenho, Bono e seus companheiros podem gabar-se a quem quiserem (incluindo Mick Jagger e Madonna) de estarem a frente deste que pode ser considerado o maior espetáculo da Terra.

Assim como ocorreu em 2006, em 2011 o U2 e sua monumental trupe também não desembarcaram no Rio, o que, de certa maneira, me livrou de uma baita saia justa doméstica, visto que minha mulher, grande admiradora da banda irlandesa, não encontraria neste que vos escreve a companhia ideal para ter ao seu lado na plateia. Vou confessar aqui, baixinho, (afinal quem desejaria contrariar 180.000 espectadores satisfeitos?) que não sou muito afeito a esse tipo de evento. Sendo ainda mais sincero, minha concepção particular de espetáculo – musical ou de qualquer outra natureza – caminha na direção inversa a do conceito de perfeição.

Não trata-se de fazer uma crítica à pirotecnia, ou apologia ao amadorismo e a incompetência, mas sim à espontaneidade e à beleza do… imponderável! Claro que não cabe aqui questionar a relevância ou o valor do U2 como banda, que são notadamente muito grandes; talvez uma discussão muito mais interessante seria a decorrente da seguinte questão: qual o lugar reservado ao “imprevisto” no mundo de hoje, tão planejado?

Também não sei. O que sei é que prefiro assistir aos artistas a quem realmente prezo sem as amarras da excelência, por assim dizer. Para mim, quanto mais à vontade estiverem melhor, ainda que se apresentem sobre caixotes de madeira, iluminados por lâmpadas caseiras, ou que abusem dos drinks tomados antes, no camarim. Se o cara, por exemplo, se empolgar e resolver deixar o set list de lado para tocar uma canção que ouvia na infância, acho incrível. Se errar a letra dessa mesma música três vezes e for aplaudido pela insistência, entendo o assim chamado deslize como prova de que ali, de fato, se deu um momento sincero e, por que não, sublime.

Nesse contexto, a microfonia, a hesitação, o hiato, o desafino, a timidez, enfim, qualquer quebra de protocolo, representa a mais significativa diferença entre ouvir um disco em casa e testemunhá-lo ganhando vida de fato ao vivo, com todos os prós e contras inerentes à experiência. São duas sensações incríveis e muito distintas que, em minha opinião, não deveriam ser confundidas. No palco, por mais que a intenção fosse positiva, nunca reagi muito bem a elogios do tipo “Nossa, o show foi perfeito! Parecia que estava ouvindo um CD”. Tal comentário sempre me levou a concluir que naquela noite havíamos sido meramente competentes.

Aliás, por definição, o show perfeito é aquele que, de tão bom, nos faz chegar em casa com vontade de quebrar o disco do artista, né?



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