A vida não é filme

ter, 29/04/08
por Bruno Medina |

gimme-shelter_cartaz.jpgA polêmica envolvendo as – hoje consideradas polêmicas ­ imagens e falas de John Lennon inevitavelmente levanta uma outra questão, que atinge sem piedade todos produtos culturais a que temos acesso. O que nossos olhares contemporâneos perderam e ganharam a partir desta incansável cultura da mídia e da imagem? Qual é o saldo? Ou ainda, por que será que tratamos com tanto estranhamento o fato de imagens de um astro terem sido relegadas ao anonimato por longas décadas a despeito de terem sido registradas por uma câmera de vídeo? Por que nos tempos atuais isso é exceção e não regra?

Dada a sua presença tão insistente ­ – e ao mesmo tempo vulgar, comum -, soa até redundante questionar como tem sido nossa convivência com as câmeras (de vídeo, de celular, fotográficas etc). De uma década para a outra a diferença entre tornar-se ou não famoso passou a ser, com freqüência, determinada pelo posicionamento de uma câmera. Assimilamos que elas estão por toda parte, sim. Mas suas lentes ganharam uma ambigüidade sem igual: uns as encaram como potencialmente ameaçadoras. Afinal, nenhuma intimidade está a salvo das câmeras diminutas e lentes de longo alcance. Outros têm nas câmeras a única possibilidade de escaparem da “prisão do anonimato”. O que virá depois disso?

Let it be ou Let it bleed

O ano de 1970 é singular no que se refere a imagens que rendem discussões acaloradas. Em meados daquele ano foi lançado Let it be , o quinto filme feito pelos Beatles, com imagens capturadas no ano anterior nas gravações do que viria a ser o último álbum do quarteto. Quando foi lançado John, Paul, Ringo e George já não dividiam mais os mesmos palcos e “Let it be”, ­ o filme, foi considerado o registro imagético do fim da banda.Se algum supersticioso quisesse lançar mão de uma teoria arriscada associando a expressão “let it…” a mau agouro, teria não só este caso, mas o do excepcional “Gimme shelter”, que documentou a turnê americana de 1969 dos Rolling Stones, dirigido por Albert e David Maysles, e por Charlotte Zwerin. Os irmãos Maysles, coincidência ou não, já haviam filmado os Beatles alguns anos antes, e lançaram “Gimme shelter” – cujo nome foi inspirado numa das faixas do igualmente excepcional LP dos Stones “Let it bleed” – exatamente no mesmo ano que “Let it be” se tornava público.

A turnê de Mick Jagger teve um desfecho trágico, em que as câmeras, como hoje é difícil crer, não tiveram nenhuma interferência. O show realizado no autódromo Altamont, na Califórnia, transformou-se em cena de guerrilha depois que integrantes dos Hell’s Angels, ironicamente contratados para garantir a segurança ­ espancaram fãs numa seqüência de violência sem igual que culminou em morte.

A câmera neste episódio, tal como ideologicamente foi pensado pelo cinema direto, conseguiu flagrar displicentemente e de maneira desapercebida o desenrolar das ações de barbárie. O cenário não se fez, ou se desfez em razão de sua existência.

Hoje, ao contrário, é impossível distinguir se a câmera capta uma atuação ou se a atuação só acontece em função da câmera, tantos são os escândalos que envolvem os “artistas” que povoam os youtubes da vida. Perdemos a espontaneidade? Em meio a tantas questões ainda sem respostas resta chamar atenção para a saída no mínimo inusitada que encontraram os gangsta rappers, fazendo pastiche da própria violência exaltada em suas letras, rimando-a entusiasticamente com suas glamourosas limusines, ao lado de não menos glamourosas mulheres, e ostentando buquês de dólares por boulevards da América. Personagens de si mesmos?

O Santo Graal

sex, 25/04/08
por Bruno Medina |

cdf309606f_lennon04242008.jpgEm meio à celebração dos quarenta anos de lançamento do “Álbum Branco”, um inesperado convidado – com potencial para se tornar aquele indesejável penetra que rouba a festa – mobiliza beatlemaníacos e jornalistas culturais do mundo todo. O enredo da história promete assumir contornos ainda mais folhetinescos caso, nos próximos capítulos, o nome de Yoko Ono esteja mais uma vez associado ao da coadjuvante-vilã da trama. O protagonista não se trata de um qualquer, tampouco um ilustre. São as cerca de nove horas de imagens inéditas que captam opiniões e a intimidade de um dos casais mais polêmicos do século XX.

A sinopse: O ano era 1970. Entre os dias 8 e 11 de fevereiro, poucas semanas antes do bombástico anúncio do fim dos Beatles, Tony Cox (ex-marido de Yoko) e sua câmera integram o rol de seletos em uma das propriedades de Lennon na Inglaterra. Sua tarefa era filmar aquele cotidiano.

A polêmica: O jornal britânico “The Daily Mail” alardeou recentemente a notícia de que as lentes flagram John falando abertamente sobre sua relação com as drogas, fumando maconha e planejando incrementar um chá que seria servido a Richard Nixon com LSD. As cenas são descritas como “íntimas e sem barreiras”. Há também o registro antológico de composições de sucesso tais como “Remember” e “Mind games”. Num outro momento, o músico, então com vinte e nove anos, sentencia sem hesitação o fim da banda. Nada triviais as imagens, é fato.

Para um dos produtores, dada a relevância do conteúdo, o documentário teria para os fãs dos Beatles importância comparável a do Santo Graal. A essa altura você deve estar se perguntando quando poderá assistir a essa preciosidade, mas é aí que reside um porém; tudo dependerá do parecer dado pela corte de um tribunal de Boston onde no próximo dia 30 a ação que ameaça a estréia do filme irá a julgamento.

Contrária ao lançamento do suposto documentário, a viúva de Lennon alega propriedade autoral sobre as vinte e quatro fitas originais e responde ao processo movido pela “World Wide Video”, que afirma ter adquirido a posse do material há oito anos, quando Cox supostamente teria transferido, numa transação de um milhão de dólares, seus direitos comerciais para a distribuidora americana.

Mas que razões teria o ex-marido de Yoko para guardar a sete chaves por trinta anos o raro e valioso conteúdo que tinha em mãos? Mais um elemento para a novela: Cox temia que, ao tornar públicas as imagens, uma possível retaliação do casal pudesse fazê-lo perder a guarda da filha que teve com Yoko, que inclusive aparece no filme. Por esse motivo pai e filha rodaram o mundo anônimos durante as duas últimas décadas.

E a saga continua. Em 2001, logo depois de adquiridas, as fitas foram roubadas por um homem que posteriormente aceitou devolver as cópias e os originais para os executivos da WWV. O documentário deveria ter sido lançado no ano passado sob o título de “3 Days in the life”, mas os advogados de Yoko impugnaram a primeira exibição argumentando que sua cliente havia comprado o material de um homem que se dizia funcionário da empresa.

Antes que se decida a quem pertence o tesouro ­ – se é que pertence a alguém -, outro personagem é apresentado: a vítima.

Nós somos as vítimas; inevitavelmente sairemos prejudicados pela disputa. Caso a justiça interceda a favor da viúva de John Lennon, é provável que nunca se tenha acesso aos registros. Se por outro lado, a razão fica com World Wide Vídeo, sabe-se lá que edição e montagem do material iremos conhecer.

Diante do impasse, resta ponderar, por exemplo, se Yoko tem ou não direito de preservar a privacidade ­ sua e de John Lennon, privando gerações de fãs desse registro tão significativo… ou se a WWV tem ou não direito de manipular e exibir essa privacidade, sobretudo se considerarmos que, infelizmente, o maior afetado não está mais aqui para opinar.

Os descobrimentos

ter, 22/04/08
por Bruno Medina |

brunomedina22042008.jpg22 de abril de 2008. Exatos quinhentos e oito anos após a chegada das primeiras caravelas, coloco em xeque o conceito de “descobrimento”. Calma, não pretendo questionar o pioneirismo das naus portuguesas ao ancorarem em nosso extenso litoral, nem argumentar a favor da teoria de que nada havia a ser descoberto, afinal por séculos os índios, blá, blá, blá…

Tampouco pretendo classificar ­ sob a alegação da riqueza de sua diversidade cultural – nosso país como não passível de ser resumido ou descoberto, aliás, esse texto nem é sobre o Brasil! No dicionário Aurélio se encontram vinte e quatro significados para “descobrir”, e isso dá uma idéia da amplitude de sentidos que podem ser associados a palavra.

Os parágrafos seguintes podem e devem ser relacionados com o post anterior, em que explicitei – em meu nome e de muitos, creio eu – a preguiça em relação a essa necessidade de nos mantermos atualizados sobre tudo que acontece em torno. Ao levar o tema adiante em pensamento, concluí o que agora me parece bastante óbvio; ao nos empenharmos tanto em descobrir o que muitas vezes nem mereceria ser investigado, deixamos de enxergar o que de fato importa.

Escrever periodicamente nesse espaço é um privilégio porque me força a exercitar essa capacidade de extrair da essência. Quando aqui me sento para encontrar a página sempre em branco, muitas vezes preciso recorrer aos mecanismos que desenvolvi para organizar o que se passa em minha cabeça.

Pois bem, nesse 22 de abril me descubro apreensivo, mas de uma forma extremamente otimista. Pelo prenúncio da paternidade cada vez mais próxima, pelos novos e imprevisíveis rumos conseqüentes da idéia do programa que criei, e por essa outra relação profissional através da música que nasce a partir do encontro com a Adriana.

Prestes a completar 30 anos percebo a dimensão do que ainda está por vir e como só a juventude pode justificar a tolice que é pensar conhecer os caminhos a serem trilhados. É certo que as possibilidades são muito mais numerosas do que os significados atribuídos ao verbete “descobrir” no dicionário.

Um bom amigo certa vez disse que um disco, um livro, um quadro ou qualquer outro objeto de arte, a grosso modo, nada mais são do que fotografias do artista num determinado momento. Obviamente não terei a petulância de reivindicar a relação desse texto com qualquer forma de arte, mas gostaria de pensar que ele ao menos me possibilitou obter alguma forma de registro, a tal fotografia, mesmo que seja uma 3X4.

Quem sabe daqui a uns anos ler essas linhas me sirva como um mapa, capaz de remeter à sensação desses dias? Na data que a escola nos ensinou ser do descobrimento, proponho uma subversão, uma distorção do foco usual: o que merece, ou melhor, o que deveria, ser descoberto? A câmera está apontada para você.

Operação Tartaruga Cultural

sex, 18/04/08
por Bruno Medina |

tartaruga1.jpg

Salvo algum engano, se não me falha a memória faz aproximadamente quatro meses que não piso numa sala de cinema. Assim sendo não assisti a nenhum dos filmes indicados, bem como a nenhum dos vencedores do último Oscar. Também não consigo lembrar quando foi a última vez que entrei numa loja de discos para adquirir ou apenas conhecer algum lançamento. Em se tratando de música, o que de novo chegou até mim veio apenas através da internet, e não foi muito.

Mas como fazer confissões de tamanha gravidade sem se sentir culpado? Como me perdoar por fechar os olhos para o que aí está? Seria no mínimo leviano alegar em minha defesa falta de tempo ou de oportunidade que justificasse tamanha indiferença ao presente, afinal esta “fase” em que me encontro é fruto de uma convicção ou, se preferirem, de uma saturação.

Em outras palavras, iniciei uma espécie de “operação tartaruga cultural”, algo de efeito prático semelhante àquelas temíveis paralisações da Receita Federal que, de tempos em tempos, entopem os portos de containeres, os aeroportos de passageiros enlouquecidos e quase fecham completamente as fronteiras do país. Agora para que alguma novidade do gênero cultural receba minha atenção, tem que esperar na fila. E não adianta mandar chamar o gerente nem deixar reclamação desaforada por escrito, estou exercendo meu
direito de greve.

Cansei de ser informado, antenado, ligado nas tendências, trend, hype ou qualquer coisa assim, isso dá trabalho demais! Estou farto de ser bombardeado com o resumo do melhor da última semana, do último minuto, com as apostas de “não sei lá quem” do que vai bombar amanhã.

Não quero conhecer primeiro o projeto solo do primo do amigo do baixista da banda norueguesa que vai ser o assunto preferido dos moderninhos no ano que vem. Me inclua fora dessa! Meu HD está cheio, sobrecarregado de tanta novidade, meu sistema operacional está lento e estou desfragmentando, fechando para balanço.

Sendo sincero, só assisti a “Tropa de elite” faz uns dois meses e, “Cheiro do ralo”, nesta semana. Por que não posso escolher “quando”? Por que tem que ser sempre “agora? A agilidade na informação tornou-se uma síndrome, uma ambição vazia, uma busca sem propósitos que resulta em conhecimento raso, e por isso inútil. Tenho saudade dos especialistas, dos detalhistas, hoje todo mundo sabe um pouco de tudo, e isso é mau.

Experimente se permitir não saber, ou descobrir ao seu tempo. Pode parecer que esse post é um manifesto em defesa a alienação ou que cause a impressão de que não há nada mais a ser descoberto. Pelo contrário, isso é uma tentativa de assegurar que “o novo” receba a atenção devida, para que daqui a duas décadas não tenhamos a sensação de que essa época não deixou suas marcas.

Estou certo de que os louros de uma geração muito se devem também ao tempo apropriado de maturação e fixação de seus conceitos. Proponho uma pausa, olhar um pouco para os lados ao invés de só seguir adiante. Afinal, como disse Belchior numa velha canção “…o novo sempre vem…”.

Miss Biônica

ter, 15/04/08
por Bruno Medina |

bionica.jpgDevo admitir que todo ano me surpreende o fato de sempre haver mais uma edição do concurso Miss Brasil. Remonta a Martha Rocha e às célebres duas polegadas que a desviaram de se consagrar a mulher mais bonita do universo ou, na melhor das hipóteses, a Vera Fisher e seu título nacional de 1969, o tempo em que ser miss Brasil alavancava algum tipo de notoriedade.

Como todos bem sabem o meio mais eficiente de se iniciar uma carreira artística promissora continua sendo mesmo arrumar um namorado famoso. Se não funciona sempre, no mínimo há de se reconhecer que boa parte das apresentadoras que atualmente figuram na televisão brasileira obtiveram fama através desse caminho.

Cabe registrar que minha implicância se restringe ao concurso, que nada tenho contra as moças, inclusive nutro até uma simpatia por Natália Guimarães -vencedora do ano passado- que, além de ser lindíssima, me pareceu saber ostentar seu título com dignidade e discrição. Sua postura fez jus às mulheres que melhor souberam vestir aquela faixa, e até seu envolvimento com Aécio Neves nos remeteu saudosamente à época em que a união entre belas mulheres e políticos não culminava em escândalos.

Natália Anderle, miss Rio Grande do Sul, eleita miss Brasil no último domingo, ontem era entrevistada no programa de rádio que eu ouvia no carro, detido por um nó que se deu no entroncamento entre as avenidas Chile e Rio Branco. Intimidado por um rebanho de taxistas que mais se assemelhavam a aves de rapina, varrendo com os olhos as calçadas e o céu em busca da primeira gota da chuva que se anunciava, ouvir as declarações de Natália me parecia ser a trilha sonora ideal para a ocasião.

A Natália deste ano não é mais bonita do que a Natália do ano anterior, e nem parece ter a sensibilidade da veterana no que se refere as opiniões. Dizia algo sobre agora ser a porta-voz (??) de um povo trabalhador e da responsabilidade que terá ao servir de exemplo para tanta gente. Taí, acabei de descobrir o que tanto me incomoda nos concursos de miss: elas costumam ser entrevistadas.

Pode se dizer que a miss Brasil 2008 não iniciou seu ciclo com tanta sorte quanto sua antecessora, pois em seu segundo dia de trono, já se têm notícias do ônus da beleza que conquistou os jurados. Segundo fontes especializadas, na conta da moça constam as próteses de silicone -nos seios e no bumbum- a plástica no nariz, a lipoaspiração, a remoção cirúrgica de duas costelas para afinar a cintura e o sorriso encapado de porcelana. Pô, assim até eu viro miss!

O atual conceito de beleza é tão estrito, deturpado e, por vezes, até nocivo à saúde (vide essa moda de remover as costelas e tantas outras síndromes) que os concursos de beleza deveriam adaptar suas regras afim de se certificar que as candidatas não se tornem mulheres biônicas para ter alguma chance de vencê-los. Não sou contra os adventos da estética, mas tudo tem limite. Natália Anderle disse que se considera um exemplo para muita gente. Faltou especificar de que exatamente.

O autoplágio

sex, 11/04/08
por Bruno Medina |

repetition_warhol2.jpgRecentemente tenho sido acometido por um sentimento recorrente e um tanto peculiar; o medo de me repetir. Pelas minhas contas já são quase 100 posts publicados neste espaço, somados aos quase 3 anos de atividade do blog anterior. O pior é que se algum dia, por descuido, a memória me trair, o autoplágio estará devidamente registrado nos temidos “arquivos virtuais”.

Durante o processo de maturação de uma idéia a ser desenvolvida, há vezes em que percebo já ter escrito anteriormente sobre algo semelhante e paro. Há também aquelas vezes em que penso estarem os assuntos todos embaralhados, e outras em que fico na dúvida sobre o ineditismo do que pretendo propor.

Um leitor apressado em seu julgamento poderia me condenar à aposentadoria, afirmar categoricamente que estou acabado, que a fonte secou. Nada disso. Depois de muito pensar, cheguei a conclusão de que essa impressão é a melhor coisa que poderia me acontecer.

A convicção de estar emaranhado nas próprias palavras, nos próprios pensamentos, de sentir freqüentemente uma sensação de familiaridade, é a prova factual de que consegui constituir um universo ideológico, uma espécie de coerência involuntária comigo mesmo. Seria isso o que chamam de “estilo próprio”?

Lembro-me de que no primeiro post desse blog (podem recorrer aos arquivos!) reportei um certo desconforto em me apresentar como escritor. Um ano se passou e ainda sinto o mesmo, mas esse tempo já foi suficiente para concluir que essa designação nunca irá soar confortável.

Creio ser uma tarefa difícil para qualquer pessoa perceber aquilo que a caracteriza, afinal existe algo pior do que ser imitado por alguém e concluir que existe um consenso coletivo sobre sua personalidade o qual você desconhecia? Logo no início desse texto estão presentes o que parecem ser duas marcas registradas: o uso da palavra “peculiar” e o ponto e vírgula. Para mim é “peculiar” notar e escrever sobre isso porque nunca foi minha intenção me associar, por exemplo, ao uso do ponto e vírgula.

Não existe nenhuma razão para tal, além do simples fato de eu considerar essa uma forma simpática de separar sentenças. Agora, no entanto, percebo que o uso dessa pontuação já me acompanha desde as redações da faculdade. Acho que era para impressionar os professores.

Penso cá com meus botões sobre essa tênue linha que separa a definição de um estilo próprio, de uma marca, e o autoplágio. A discussão dá pano pra manga, até porque qualquer forma de plágio deveria ser inversamente proporcional à autoralidade. Rolling Stones, por exemplo, depois de mais de 40 anos em atividade; estilo próprio ou autoplágio? Quem mais? Digam vocês!
Vou parando por aqui, não sei porque esse texto está soando terrivelmente
familiar…

Sorte ou Azar

ter, 08/04/08
por Bruno Medina |

niquel-medina.jpgSorte ou Azar não é um jogo -pelo menos não um cujas regras sejam de prévio conhecimento. É uma sucessão de fatos reais vivenciados por mim durante o
último final de semana. O propósito deste texto é explicitar a ambigüidade
inerente ao conceito de sorte ou azar quando aplicado aos acontecimentos
da vida cotidiana de quem vive no Rio de Janeiro.

Sábado, pouco depois da meia-noite – O exaustivo vôo diurno que me trouxe
de Lisboa finalmente toca o solo brasileiro. Combalido pelos efeitos do fuso-horário
-agravados pela curta permanência do outro lado do Atlântico- tudo que mais
quero é minha cama. Antes do merecido descanso, no entanto, é preciso cruzar
a Linha Vermelha. Poucos são os motoristas que por necessidade ou falta de
juízo se atrevem a passar pela linha expressa em dia e horário de tão pouco
movimento. Felizmente chego são e salvo em casa. Penso que tive sorte (SORTE).

Domingo, pouco depois das onze – Estou de carro com minha mulher no cruzamento
da rua Farani com Praia de Botafogo. Um vendedor de bananadas se aproxima
e me mostra a pistola que leva por baixo da blusa. Ele pede meu celular
(AZAR).

Dez segundos depois – Conseguindo manter relativa tranqüilidade, percebo que
esqueci meu telefone em casa carregando, e isso me conduz ao inconseqüente
alívio de pensar que, dessa forma, fui poupado de perder todos os meus contatos,
mas, sobretudo, evitei um enorme aborrecimento burocrático para reaver a
linha. O telefone já não vale muita coisa e ainda por cima está completamente
mordido pelo Oscar, mas isso o ladrão não tinha como saber (SORTE).

Dez segundos depois – O rapaz pede então todo o dinheiro da carteira, cinqüenta
e cinco reais (AZAR).

Cinco segundos depois – O sinal abre e ele me manda seguir. Terminou tudo
bem (SORTE).

Quinze segundos depois – Segui por não mais do que 200 metros e me deparei
com o que uma pessoa em minha situação mais deseja encontrar: uma viatura
da Polícia Militar. Saltei do carro e expliquei ao policial o que havia ocorrido.
Ele anotou na palma da mão as características do bandido e saiu caminhando
em direção à fatídica esquina. Havia se passado pouco mais do que um minuto
do momento do assalto e é claro que nem sempre se tem a sorte de encontrar
a polícia com tamanha rapidez. Ficamos ao lado da viatura apenas esperando
o desfecho promissor (SORTE, MUITA SORTE).

Dez minutos depois – O policial retorna, e perguntamos se havia encontrado
o assaltante. Ele responde, sem cerimônia alguma, que não havia ido até o
local indicado, mas que iria ligar para que um colega fosse averiguar. Pode
ser apenas impressão, mas me parece que o ideal nesse caso seria não permitir
que o assaltante fosse muito longe. De nada adiantou contatar a polícia com
tanta agilidade (AZAR, MUITO AZAR).

Cinco segundos depois – O policial acrescenta que assaltos naquela esquina
são muito comuns. Inevitável a curiosidade sobre o porquê de sua viatura
não estar, então, estacionada justo ali. A essa altura o ladrão provavelmente
já estava em sua casa, ou gastando o dinheiro que havia roubado de mim. Sou
mais um número que escapa as estatísticas de violência na cidade (AZAR).

Pelas minhas contas essa foi a quarta vez que fui assaltado desde 1993. Na
média, uma ocorrência a cada três anos e meio. Em comparação a outros conhecidos
até que não estou tão mal (SORTE OU AZAR?).

Para terminar este texto de forma positiva posso dizer que até agora nem
eu nem ninguém da minha família teve dengue (SORTE, MUITA SORTE).

Navegar é preciso

sex, 04/04/08
por Bruno Medina |

boatvela.jpgOlá. Este é o primeiro post do Instante Posterior que escrevo estando fora do Rio. É, também, o primeiro post deste blog escrito de fora do país. Mais precisamente do outro lado do Atlântico, direto de minha estimada Lisboa, cidade onde por tantas ocasiões já estive.

Lisboa continua a mesma, com sua boa comida, suas ruas íngremes que escorrem para as margens do Tejo, suas praças e monumentos imponentes e esse mosaico que tão bem mistura a tradição européia a outros aspectos familiares àqueles que habitam o Rio de Janeiro. Confesso que já até perdi a contas de quantas vezes estive por aqui; sete, oito, não sei.

O mais interessante é, no entanto, constatar que cada nova visita que se deu acrescentou um detalhe, pequeno que seja, ao painel de sensações relacionada a essa bela cidade e as ótimas lembraças que guardo de minhas passagens anteriores. Há, porém, apenas uma coincidência que pode ser destacada: em todas as ocasiões, sem exceção, vim parar aqui através da música.

Dessa vez não é diferente. Desde o final da turnê do “4″ já se vai um ano e quatro meses. Durante esse tempo mergulhei em outras atividades (talvez a principal delas tenha sido aquele programa que idealizei), trabalhos que não se relacionavam com música diretamente. Como o que foi dito na ocasião do anúncio do recesso do Los Hermanos, uma pausa para nos dedicarmos a outras atividades.

Não era esse o combinado? Pois bem, dito e feito, assim fiz. Mas a estrada cobrou o preço pelos 10 anos vividos intensamente. A rotina diária em casa me servia como um sapato dois números menores. Ter os teclados por perto me possibilitou sim praticar e fazer gravações, aprender a mexer nos softwares, mas faltava alguma coisa, afinal desde de junho passado eu não havia tocado junto com ninguém.

Foi mais ou menos a essa altura que defini como prioridade absoluta novamente estar no palco com outros músicos e viajar, havia decidido que isso precisava voltar a fazer parte da minha vida, mesmo que fosse apenas por hobby. Dias depois dessa decisão recebi um telefonema que me deixou bastante feliz e surpreso.

Era o amigo Domenico (+2, Orquestra Imperial e tantas outras bandas) convidando para que me juntasse a ele e a outros dois músicos incríveis (Marcelo Costa e Alberto Constantino) na banda que irá acompanhar a Adriana Calcanhotto em sua próxima turnê.

Aceitei o convite de imediato, pensando que seria um prazer trabalhar com alguém por quem tenho o mais sincero respeito e admiração. Adriana e eu já estivemos juntos em algumas ocasiões, sendo as últimas duas participações nos show do Los Hermanos no final de 2006, uma no Rio e outra em Salvador.

Os que têm boa memória vão se recordar que gravamos uma faixa do disco “Cantada” lançado em 2002, e, antes disso, tocamos uma música dela, “Esquadros”, no “Luau MTV”, em 2001. Não sei exatamente onde essa história começou, mas sinto que estaremos juntos dando continuidade a ela.

Bom, hoje, aqui em Lisboa, começa a turnê e tenho a maior satisfação de convidá-los a presenciar essa nova etapa da minha vida. O show está muito bonito e estamos até tocando uma música que é velha conhecida de vocês. Vale muito a pena conferir. Agora me vou pois as queijadinhas e os pastéis de nata do “pequeno
almoço” me aguardam.

p.s.: mudando radicalmente de assunto, ambas as gatinhas já têm novos lares.
Podem estar certos de que fizemos ótimas escolhas.

Ainda sobre as gatinhas

ter, 01/04/08
por Bruno Medina |

medina.jpgAgradeço imensamente a todos os interessados em adotá-las que nos enviaram e-mails. Posso dizer que estamos bem perto de escolher aqueles que irão levá-las para casa. Dezenas de pessoas no procuraram, inclusive muitas de fora do Rio, inclusive um cara querendo adotar um cachorro de grande porte (???) e fico bastante comovido ao perceber a mobilização ocorrida em torno dessa causa, de filhotes abandonados, que é tão comum nas grandes cidades.

Que a minha história sirva como exemplo de que pequenas ações – que não custam quase nada – podem fazer grande diferença, afinal sempre existe um abrigo, um vizinho ou um amigo à procura dos bichinhos.

Durante os últimos dias precisei aprender a desempenhar a improvável posição de tutor, interpelando os candidatos sobre suas intenções e condições. É necessário saber diferenciar a empolgação momentânea da real capacidade de se dedicarem a outras vidas que passarão a depender totalmente daqueles que as adotarem.

Acredito que ninguém faça por mal, mas é preciso ter consciência de que qualquer animal de estimação demanda algum nível de sacrifício. Certa vez li uma reportagem sobre o expressivo número de animais que eram abandonados na porta de um determinado abrigo na zona norte do Rio.

Cachorros lindos, comprados por pequenas fortunas em lojas de shopping, provavelmente
por terem se tornado a raça da moda, ou mesmo objeto do capricho de algum irresponsável. Crianças também costumam insistir para terem bichinhos, mas cabe aos seus pais julgarem se tanta vontade não irá se esvair quando surgir o próximo lançamento da indústria de brinquedos.

Há também aqueles que presenteiam seus entes queridos com animais de estimação, nesse caso cabe se certificar de que a ótima intenção na teoria, na prática, não represente um verdadeiro presente de grego. Por conta disso não hesitaremos em fazer algumas perguntas e assim nos assegurarmos de que as gatinhas estarão em boas mãos.

Creio que até o final dessa semana ambas já terão encontrado seus novos lares. Enquanto isso não acontece, aproveito para curtir os momentos divertidíssimos de interação entre elas e o Oscar. A princípio ele estranhou as insólitas presenças no que até domingo era seu reino. Aos poucos aceitou dividir o espaço e agora até toma conta delas. Apesar do tamanho as duas já andam com desenvoltura pelos cômodos da casa, se penduram nas coisas, rolam…

Passado o episódio, quando sentirmos saudade, ajudará pensar que elas estarão por aí, alegrando a vida de alguém.



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