War in Rio
Sob o sugestivo título de “War in Rio”, o designer carioca Fábio Lopez batizou sua mais recente criação, que, mesmo sem planos de comercialização, tem dado o que falar. Trata-se de um jogo de tabuleiro – aos moldes do antológico “War” – cuja área de atuação não é o mapa-múndi, mas sim a cidade do Rio de Janeiro, subdividida em favelas e territórios dominados por facções criminosas.
Bope, Comando Vermelho, Milícias e Polícia Militar – entre outros grupos que se enfrentam pelas ruas da cidade na vida real- no tabuleiro criado por Fábio, substituem os exércitos sem nome do jogo original. Talvez o maior desconforto gerado por “War in Rio” seja o fato de sugerir que policiais, bandidos e policiais-bandidos representam forças equivalentes, numa óbvia constatação de que as questões conseqüentes da violência na cidade não se restringem a dois lados de uma mesma moeda; a divisão entre mocinhos e bandidos simplesmente não contempla todas as possibilidades.
Já há quem diga que o jogo é uma apologia ao crime, que incita a violência e se baseia numa lógica semelhante à utilizada pelos traficantes. Em entrevista concedida ao Globo Online, Fábio se defende alegando que sua intenção não era ofender ninguém, mas sim provocar a discussão sobre o incômodo de se viver numa cidade em conflito. Diz também que o “War” original é vendido em lojas de brinquedo e ninguém o considera uma apologia
à guerra. Faz sentido.
Acusações semelhantes foram disparadas contra o cartunista André Dahmer quando, inspirado pela idéia surgida no Iraque, resolveu criar, no início desse ano, o Rio Bodycount, uma versão carioca do site que contabiliza o número de vítimas fatais de nossa guerra. É impressionante como toda vez que a sociedade civil dá provas da alarmante banalização que acometeu os atos criminosos no Rio de Janeiro – o que na prática é uma postura semelhante à assumida muitas vezes pelas entidades oficiais – alguma autoridade vai a público registrar seu repúdio (vide o acontecido com Tropa de Elite). José Mariano Beltrame, Secretário de Segurança Pública do RJ, já se manifestou contrário ao jogo.
Parece-me que continuar negando a existência do conflito não o torna menos nocivo a população. Subjugar a força que se opõe ao aparato do Estado é hipócrita e só nos afasta de uma possível resolução do problema, ou deveríamos achar normal que viaturas policiais perambulem pela cidade com fuzis apontando para o lado de fora? O noticiário nos informa a todo o momento de vias fechadas por decorrência de tiroteios e traficantes que possuem armas suficientemente poderosas para derrubar helicópteros, se isso
não caracteriza uma guerra…
“War in Rio” possui uma grande falha: ter deixado de designar peões para representar os moradores da cidade, na tentativa diária de cruzar fronteiras estabelecidas pelo crime sem se tornarem as próximas vítimas. O blog do jogo contém textos explicativos e merece uma visita. Eu se fosse o Fábio me empenharia em encontrar uma maneira de comercializar o jogo, interessados não vão faltar. Quem sabe um dos tabuleiros não acaba parando nas mãos dos responsáveis pelas políticas de segurança da cidade? Praticar um pouco de estratégia cairia bem.