A resposta de Thatcher a Fernando Collor:”Não! Não! Não! Não conte comigo nem com o governo britânico!” (A FHC, ela diria que mandato de 4 anos é “ridículo”)

seg, 08/04/13
por Geneton Moraes Neto |
categoria Entrevistas

Fiel ao apelido que ganhara, a “Dama de Ferro” Margareth Thatcher já deu uma “bronca” num presidente brasileiro.

O presidente era Fernando Collor de Mello.

Recém-eleito para a Presidência da República, ele fez um “tour” de apresentação pelos gabinetes de governantes europeus. Queria apresentar seus planos. Uma das audiências era com a então primeira-ministra britânica. Collor propôs a ela uma alternativa para que a dívida externa dos países “emergentes” fosse reduzida.

A reação de Thatcher foi fulminante.

Quando perguntei a Fernando Collor – já ex-presidente – qual foi o comentário mais surpreendente que ele ouviu de um governante estrangeiro, nos anos da presidência, ele descreveu, assim, a cena com Thatcher:

“O mais surpreendente comentário que ouvi foi feito pela senhora Margareth Thatcher, no momento em que eu, presidente eleito mas ainda não empossado, visitava chefes de estado dos principais países, para comunicar que eu haveria de encerrar a moratória e, assim, inserir novamente o Brasil no contexto internacional e nos fluxos comerciais.

Para que a reinserção acontecesse, eu precisava de certa condescendência por parte dos credores, porque, assim, poderíamos reafazer nossas contas e regularizar nossa dívida. Eu tinha uma tese que, afinal, saiu vitoriosa: a redução da dívida de todos os países emergentes em 30%. Era algo que já se comentava. Os Estados Unidos acabaram encampando essa ideia dentro do chamado Plano Brady, em função do secretário do Tesouro americano à época, Nicholas Brady. Todos tinham simpatia em relação à ideia. 

Quando chegou o momento de expor o assunto no encontro com a senhora Thatcher, ela disse: “Desculpe, mas não entendi o que o senhor falou….”. Pensei comigo mesmo: “Meu inglês não deve estar tão eficiente….”. Repeti tudo. A senhora Thatcher, então, me disse: “Deixe-me ver se entendi corretamente. O senhor quer dizer que, por exemplo, o senhor me deve 100, mas, em vez de pagar 100, quer pagar 70. É isso ? “. Respondi: “É exatamente isso!”. A senhora Thatcher respondeu: “O senhor me desculpe. Isso é uma brincadeira! Isso é uma brincadeira ! Não, não conte comigo nem com o governo britânico. Não! Não ! Não! Se o senhor deve 100, o senhor tem de pagar 100! Poderemos discutir como o senhor vai pagar, mas dever 100 e querer pagar 70, negativo! Comigo o senhor não conta!”.

Por coincidência., quando fiz pergunta parecida ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, ele citou, também, o nome da então primeira-ministra Thatcher como autora de um comentários mais “surpreendentes” que ele teve a chance de ouvir de um dirigente estrangeiro:

“Nós estávamos na Embaixada do Brasil, num almoço com Margareth Thatcher. Era a Dama de Ferro. A certa altura, ela me pergunta : “Quanto tempo dura o mandato de um presidente no Brasil ?”. Eu disse: “Quatro anos”. Ela riu: “That´s ridiculous!” ( “É ridículo”). Em quatro anos, ninguém faz nada! Não é possível! “. Pensei : meu Deus do céu, será que não dá para fazer nada? Eu estava no começo do mandato….”

——-

PS: A íntegra de nossas entrevistas com os ex-presidentes Fernando Collor, Itamar Franco, José Sarney e Fernando Henrique Cardoso foi publicada no livro “Dossiê Brasília: os Segredos dos Presidentes” / Editora Globo

 

 

 

COLLOR DIZ QUE, QUANDO ESTAVA NA PRESIDÊNCIA, RECEBEU PROPOSTAS DE “POLÍTICOS” PARA FECHAR O CONGRESSO NACIONAL E CONFIRMA: PARTE DAS SOBRAS MILIONÁRIAS DA CAMPANHA PRESIDENCIAL FOI USADA PARA FINANCIAR CANDIDATOS EM 1990

sáb, 12/12/09
por Geneton Moraes Neto |
categoria Entrevistas

O locutor-que-vos fala passou os últimos dias mergulhado na Operação Collor. Primeiro, viajei a Brasília para gravar uma entrevista exclusiva com o ex-presidente. Depois, mergulhei numa ilha de edição para preparar o DOSSIÊ  GLOBONEWS – que será reprisado neste domingo às cinco da tarde e na segunda-feira, às sete da noite. Ao todo, foram vinte e quatro horas de edição. Ao contrário do que almas ingênuas possam supor, fazer TV dá um trabalho desgraçado.Ponto.Parágrafo.

O ex-presidente faz revelações na entrevista. Diz, por exemplo, que recebeu propostas para fechar o Congresso Nacional e divulgar dossiês secretos sobre adversários – dois gestos extremos para tentar escapar do impeachment.

Descreve como surgiu a ideia de bloquear parte dos saldos das contas correntes e das contas poupança de milhões de brasileiros,uma medida de impacto fortíssimo logo no primeiro dia de governo: tudo surgiu quando Collor, ainda não empossado, presenciou uma troca de idéias entre dois economistas sobre qual seria a maneira mais rápida de estancar a inflação. Os economistas eram Mário Henrique Simonsen e André Lara Resende.

Adiante, diz, com todas as letras, que parte das sobras da campanha presidencial de 1989 foi usada para financiar a campanha de candidatos que apoiavam o governo nas eleições de 1990.

O Fernando Collor de 2009 – um senador de sessenta anos de idade – faz críticas ao Fernando Collor de 1989, um presidente eleito com quarenta anos: diz que simplesmente não se deu conta de que, num regime como o brasileiro, “um presidencialismo de coalização”, é impossível governar sem o Congresso Nacional. Collor tratou mal deputados e senadores. Resultado: quando estourou a crise que terminou lhe custando o mandato, os parlamentares lhe deram o troco. Funciona assim.

O ex-presidente confirma:  já terminou de escrever mas não pretende publicar agora o livro-bomba que,segundo ele, provocará “impacto” na política brasileira. O livro “Crônica de um Golpe” traz a versão de Collor sobre a crise política que terminou no impeachment.

Num site hospedado fora do Brasil, Collor publicou  um pequeno trecho do livro. Lá, ele diz, por exemplo, que o então deputado Ulysses Guimarães, um dos comandantes do PMDB, de início ofereceu-lhe apoio, porque não via o impeachment como uma saída para a crise. Mas, logo depois, teria mudado de posição, porque foi informado de que,com o afastamento de Collor, o vice,Itamar Franco também deixaria o poder. A Presidência da República seria, então, ocupada por um nome eleito pela Câmara dos Deputados para cumprir o restante do mandato. De acordo com a versão de Collor, Ulysses teria, enxergado,aí, a chance de se tornar presidente. Passou,então, a apoiar o impeachment. Menos de quinze dias depois do afastamento de Collor, Ulysses morreria num acidentede helicóptero, numa viagem entre Angra dos Reis e São Paulo. O corpo sumiu no mar. Jamais foi encontrado.

Um trecho do livro inédito de Fernando Collor:

 ”0 vice-presidente (Itamar Franco), que retirei do ostracismo na política mineira, organizou um governo a que chamou cinicamente de ” republica dos senadores” -recompensando com cargos e sinecuras exatamente aquele que me julgariam mais tarde”.

“Causou-me especial emoção a solidariedade que recebi do deputado Ulysses Guimarães, naquele período duro de expectativa. Dr. Ulysses me visitou e me privilegiou com conselhos muito utéis, para enfrentar os dissabores que já não eram poucos e que se agravariam dali em diante. Todo o tempo assegurou-me o seu apoio – e o daqueles que o seguiram – afirmando que votaria contra o impeachment.

Como demonstração de seu afeto, presenteou-me com um dos seus livros , no qual apôs solidária dedicatória. 0 seu comportamento mudaria quando se iniciaram as articulações para garantir a tomada do poder, através de um golpe de mão. Prometeram-lhe que o vice-presidente renunciaria logo após a minha condenação pelo Senado e, assim, ocorrendo a vacância do cargo, ele,Dr. Ulysses, finalmente cumpriria o sonho de exercer a Presidência da República eleito pelo Congresso, para cumprir o restante do meu mandato. Seu trágico desaparecimento jogou uma pá-de-cal na operação”.

Um trecho da gravação feita no Senado para o DOSSIÊ GLOBONEWS – a única entrevista que o ex-presidente deu para a TV a propósito dos vinte anos da histórica eleição de 1989: 

DUAS PROPOSTAS NO PALÁCIO DO PLANALTO:  FECHAR O CONGRESSO NACIONAL E DIVULGAR DOSSIÊS SECRETOS DE ADVERSÁRIOS DO GOVERNO

GMN: Qual a proposta mais surpreendente que o senhor recebeu quando estava no Palácio do Planalto ?

FERNANDO COLLOR: “Recebi de várias fontes – de origens as mais diversas – as sugestões mais esdrúxulas. Dentro deste rosário de sugestões, a mais “singela”  seria a do fechamento do Congresso. Diziam-me: “Fecha o Congresso!”- como quem diz “fecha esta porta”.Eu dizia: “Mas vocês se esquecem de que sou o primeiro presidente eleito pelo voto popular depois de quase trinta anos de submissão a um regime autoritário.Não posso trair as minhas convicções, não posso fazer isso”.

 GMN: O senhor pode revelar de quem partiu a sugestão de que o senhor fechasse o Congresso?

 COLLOR: “Não.Não posso – até porque não foi somente de uma pessoa”.

Eram políticos?

COLLOR: “Eram políticos,políticos…E outras propostas as mais descabidas e esdrúxulas. É aquela questão das “ideias”. Todo mundo chegava com uma ideia achando que era uma inovação. E eu as repelia a todas, sem me permitir acalentar, por um segundo que fosse, tal procedimento”.

 GMN: Em algum momento, o senhor, que foi eleito com voto popular, teve a tentação de fechar o Congresso para escapar daquele processo?

 COLLOR: “Não.Eu jogo duro. Sou um jogador que joga pesado, duro,vigoroso,mas com as cartas na mesa e obedecendo as regras do jogo, incapaz de fazer uma coisa dessa natureza, como fui incapaz de também cair na tentação de outras sugestões que me chegavam,como a de deixar publicar dossiês do Serviço Nacional de Informações (SNI), extinto por mim num dos atos que assinei no primeiro dia de governo. Os dossiês estavam ali, à disposição, para que os soltássemos. Não permiti que nenhum desses dossiês fosse colocado seja para imprensa, seja para quem quer que fosse”.

 GMN: Quem sugeriu a divulgação de dossiês do SNI para constranger seus adversários obviamente foi um dos seus aliados. Eram parlamentares, era algum ministro?

 COLLOR: “Ex-parlamentares que não haviam sido reeleitos em 1990. Como alguns tinham vários mandatos já cumpridos, talvez por isso conhecessem essas estranhas daquele serviço tenebroso que era executado pelo SNI”.

GMN:Os dossiês comprometiam adversários do senhor ?

COLLOR: “É. Falei: “Deixem-me ver o que é isso. Mandem trazer os dossiês”. Já que as pessoas me falavam, mandei trazer alguns. Tive a certeza de que havia tomado a decisão correta quando extingui o SNI. Meu Deus do céu: de segurança do Estado e de informação estratégica para o presidente, os dossiês não tinham nada. Eram só fofocas e futricas”.

 GMN:A eventual divulgação desses dossiês poderia servir para desmoralizar seus adversários ?

COLLOR: “É. Sem dúvida, sem dúvida, no mínimo os constrangeria”.

GMN:O senhor já disse que não cogitou da possibilidade de fechar o Congresso para escapar do processo de impeachment. Mas o senhor admite que esta medida poderia eventualmente ter um respaldo popular já que o senhor tinha sido eleito pelo voto do povo?

COLLOR: “A questão do respaldo popular é difícil de a gente poder peremptoriamente afirmar, porque a gente sabe o sentimento da população varia de acordo com as circunstâncias. Não podemos esquecer que a mesma mão que aplaude é a que apedreja.O que eu entendia e respondia a essa interlocução dizendo: “Entendo que o que você pretende dizer,no fundo,é que você não concorda com a ação dos representantes que estão lá no Congresso –e não em relação à instituição Poder Legislativo”.

 O DIA EM QUE AOS BRASILEIROS NÃO ATENDERAM AO PEDIDO DO PRESIDENTE E NÃO FORAM ÀS RUAS VESTINDO VERDE E AMARELO: “PERCEBI QUE HAVIA PERDIDO A PRESIDÊNCIA”

 GMN: Quando enfrentava uma onda de denúncias, o senhor fez um discurso veemente em que pediu à população que se vestisse de verde e amarelo.Mas os manifestantes se vestiram de preto.Ali,o senhor sentiu que perdeu a capacidade de mobilizar apoio?

COLLOR: “Sem dúvida.Aquele foi o momento em que percebi que eu havia perdido a Presidência.Era uma solenidade bonita, um momento em que eu estava assinando atos que beneficiavam os taxistas. Havia muitos taxistas na ala oeste do Palácio do Planalto, exatamente aquela que fica mais próxima do Congresso.Estava apinhada de gente.O presidente do Banco do Brasil,o da Caixa, o ministro da Economia, muitos com uma fita verde e amarela na mão. Eu disse ao locutor que conduzia os trabalhos: “Eu não falarei.Falam os que estavam programados,como o representante do grupo de taxistas, o presidente da Caixa. Encerrada a solenidade, me dirigi para o elevador, quando então o pessoal começou a gritar; “Fala, Collor!Fala!Fala!”. Veio,então, o presidente da Caixa Econômica: “Presidente, não deixe de falar para este pessoal….Todos querem ouvir uma palavra sua”. Voltei. “Que saiam no próximo domingo de casa, com alguma peça de roupa numa das cores da nossa bandeira. Que exponham nas suas janelas toalhas, panos, o que tiver nas cores da nossa bandeira, porque assim,no próximo domingo, estaremos mostrando onde está a verdadeira maioria”.

 GMN:O senhor se arrepende de ter feito aquela convocação ?

 COLLOR: “Eu me arrependo. Aquilo foi uma atitude temerária. É o que se chama de cutucar a onça com a vara curta.Ali,talvez por eu estar sob uma pressão muito grande,eu quisesse,no fundo, saber logo qual seria o desfecho de tudo aquilo. Porque foi um processo de tortura. Então, eu disse: “Com isso, ou a gente vai se afirmar nas ruas ou então se a gente se sentir abandonado nesse processo, eu já sei que não tenho mais forças para pode lutar. E ai, quando no domingo as informações começaram a chegar de que as pessoas estavam se vestindo de preto ao invés de verde e amarelo, eu disse: “A Presidente está perdida”. Dentro de mim, caiu exatamente esta compreensão de que,ali, o jogo estava perdido”.

GMN:A idéia de convocar a população para que todos fossem às ruas de verde e amarelo partiu inteiramente do senhor? Nenhum assessor sugeriu?

 COLLOR:“Aquilo foi de inopinado,naquele momento,naquele instante”.

GMN:O senhor diria que este foi o grande erro político na condução daquele processo, naquele momento ?

 COLLOR:“Sem dúvida, sem dúvida. Isso foi um erro tático seriíssimo”.

 GMN:O senhor tinha a ilusão de que contaria com o apoio popular naquele momento?

 COLLOR:“Tinha”

 GMN:O que é que levava o senhor a acreditar ?

 COLLOR:“O que me levava a acreditar era que a vinculação minha com o povo era muito forte.Mas, naquele momento, se ele não estava contra mim, impregnado pela torrente que o noticiário fazia desaguar pelas manhãs, tardes e noites, eu imaginava que pelo menos o povo estivesse neutro,na dúvida.”Eu estou em dúvida”. E, estando em dúvida,não tomaria uma posição”.

 O EX-PRESIDENTE CONFIRMA:  PARTE DAS “SOBRAS” DA CAMPANHA PRESIDENCIAL DE 89 FOI USADA PARA FINANCIAR CANDIDATOS NAS ELEIÇÕES DE 1990  

 GMN:Um dos coordenadores da campanha do senhor à presidência disse que ouviu de viva voz do tesoureiro da campanha, PC Farias, que as sobras de campanha seriam em torno de 52 milhões de dólares.Onde foi parar tanto dinheiro?

COLLOR: “As chamada sobras de campanha foram objeto do escrutínio do Ministério Público, Polícia Federal e do próprio Supremo Tribunal Federal. Tudo isso consta dos processos que foram movidos contra mim e dos quais fui abosolvido”.

GMN:Mas todos sabem que nas campanhas eleitorais brasileiras,em geral, há uma contabilidade paralela, o chamado Caixa Dois, que não passa, obviamente,pelo controle da Justiça Eleitoral. A pergunta é: que informação concreta o tesoureiro PC Farias deu ao senhor sobre as sobras de campanha?

COLLOR:“Naquele momento da eleição,a legislação não previa,como hoje prevê, esta série de medidas e de pontos que devem ser observados quanto às contribuições oferecidas à campanha de um determinado candidato, até porque não havia campanha presidencial.Não houve a preocupação de se estabelecer critérios objetivos e plausíveis para que esta contabilidade fosse feita. Então, o que aconteceu é que os recursos iam chegando. Só me dava conta de que os recursos chegados eram suficientes ou não em função da disponibilidade que eu tinha do avião que eu tinha do avião para me deslocar e dos carros de som para falar.Quando eu chegava ao hangar para viajar – e aconteceu algumas vezes, no primeiro turno – ,o gerente vinha e me dizia: “Ah, não pode, porque vocês estão devendo aqui não sei quanto”.  Eu sentia que os recursos da campanha não estavam chegando na medida das necessidades. Já no segundo turno foi uma loucura total”.

GMN:O senhor não tem  ideia de quanto sobrou?

COLLOR:“….Esses valores: em torno de cinqüenta e poucos milhões”.

 GMN:O senhor tem ideia do que aconteceu com esse dinheiro?

 COLLOR:“Não. Não tenho ideia”.

GMN:Uma das versões é de que este dinheiro teria sido enviado para fora do Brasil e administrado por PC Farias. O que é que o senhor diz dessa versão?

COLLOR:“Não sei. Não saberia dizer. Somente ele próprio. O que sei é que parte desses recursos foi aplicada nas eleições de 1990. Houve eleições para governadores, deputados, senadores. Parte desses recursos serviram para ajudar os candidatos que apoiavam o governo na eleição que ocorreu em novembro de 1990”.

 O LIVRO INÉDITO VAI PROVOCAR IMPACTO?   “AH,SIM. E QUE IMPACTO….”

 GMN: Por que é que o senhor continua guardando no fundo das gaveta o livro que escreveu sobre aquele período ? Quem são os alvos desse livro?

COLLOR:“Quando levei ao ministro Thales Ramalho alguns capítulos para que ele folheasse e dessa uma opinião,ele  depois de uma leitura, tirou os óculos meneando a cabeça e disse: “Presidente, isso não pode ser publicado!”. As pessoas todas estão aí,vivas, têm seus parentes, têm isso, têm aquilo. Para que criar uma situação tão desagregadora como essa? O que passou passou ”.

Verifiquei que ele tinha razão. Em alguns momentos, depois disso, eu colocava o disquete no computador: por curiosidade, ia lendo. Numa primeira vez,comecei a fazer correções, sempre atenuando.Mas me lembrei do que ele também falou nessa conversa.Disse-me: “O que acho importante é que o senhor coloque isso e escreva para que não se vá a emoção do momento – que tem de ficar registrada para que os pósteros possam entender a emoção que o dominava logo após o seu afastamento e entendam dentro dessa ótica”. Eu, então, disse: não, não vou mais reler. Vou deixar como está, para atender ao aconselhamento do ministro Thales Ramalho”.

 GMN:Quando,afinal,o senhor vai publicar esse relato?

COLLOR:“Não tenho a menor ideia”.

GMN: Mas o senhor tem certeza de que vai criar um impacto na política brasileira ?

 COLLOR:” Ah,sim. E que impacto…..”

 OS BASTIDORES DO BLOQUEIO DAS CONTAS CORRENTES E DA POUPANÇA NO “PLANO COLLOR”:  ASSIM SURGIU A IDÉIA

 GMN:Durante a campanha,o senhor dizia que o candidato do PT é que iria tomar medidas drásticas. Iria mexer na poupança. Mas o senhor é que terminou mexendo. O senhor estava mentindo para conquistar votos?

 COLLOR: “Não! Não estava mentindo. As primeiras reuniões que fazíamos com a equipe econômica,o principal algo, até porque eu havia colocado isso muito insistentemente durante a campanha, era que nós só teríamos uma única chance de debelar a inflação.Nós iríamos debelá-la num ipon – um golpe de lutas marciais em que a luta termina pela perfeição do golpe dado. Nessa luta contra a inflação, eu dizia: “Vamos dar um ipon na inflação, vamos acabar com ela”. Isso gerou um compromisso muito forte, já que era algo que atormentava o cotidiano da população brasileira de forma muito presente, muito acintosa. Íamos por um caminho para ver como isso poderia acontecer de forma rápida, enveredávamos por outro. Mas nesse vai-e-vem não encontrávamos nenhuma medida plausível para que ficasse claro que com esse tal do ipon, uma medida econômica que fosse rápida, pudesse ser estancado o processo inflacionário. Comecei,então, a ouvir economistas e pessoas do mercado para saber deles a opinião que tinham sobre as alternativas dispostas para que estancássemos este processo. Um desses encontros me marcou bastante porque dele participaram o ex-ministro Mário Henrique Simonsen, o economista André Lara Resende e, naquela época, o homem de mercado Daniel Dantas. Convidei o professor Simonsen e ele se fez acompanhar desses outros dois brasileiros. Em nossa conversa, perguntei: Como é que o senhor acha, ministro, que o governo nosso pode debelar a inflação rapidamente?”. E ele ficava conjecturando, pensando em  voz alta, intercalado por comentários ora de André, ora de Daniel.Todos chegavam a uma mesma conclusão: quando terminavam de engendrar um raciocínio, diziam :”Mas isso, com liquidez de que o mercado hoje dispõe, é impossível. Não dá, não dá”.  André é que chegou e disse:”Mas ministro, há uma saída:  estancar essa liquidez”. Usava uma palavra mais suave para aquilo que acabou sendo feito pelo meu governo.Vira-se André e diz: “Ministro, isso pode ser politicamente difícil de fazer ou impossível de fazer, mas tecnicamente não é a saída? “.  O ministro disse:”Tecnicamente é a saída, mas não vamos nem adentrar mais nesse assunto, porque politicamente isso é inviável “.

Aquilo me marcou: o  ministro dizendo que tecnicamente era a saída, mas politicamente era inviável. Porque dificilmente um governo poderia implementar aquilo sem que houvesse uma comoção nacional – e com desdobramentos até imprevisíveis. Começou a se formar dentro de mim a idéia de que teríamos de fazer, junto com o congelamento de preços, uma enxugada nessa liquidez.Nunca nos passou pela cabeça atingirmos a poupança.Nos passou pela cabeça,num primeiro momento, nós irmos em cima dos chamados “títulos ao portador”. Mas o mercado é muito esperto.Começou a haver um movimento de capitais saindo dessas aplicações de títulos ao portador e indo em direção à conta corrente e à poupança. Não houve outra maneira que não o de generalizar o chamado “bloqueio dos ativos” , algo que aconteceu pela primeira na história econômica mundial”.

 GMN:Se o candidato Luís Inácio Lula da Silva tivesse vencido a eleição de 89 e tivesse bloqueado e a poupança e as contas correntes,o que é que teria acontecido com ele? O senhor acha que ele se sustentaria no poder?

COLLOR:“Vou me valer de um depoimento dado pelo hoje senador Aloísio Mercadante – que procurou a então ministra e disse: “Zélia, esse era o programa dos nosso sonhos. Só que tínhamos uma certeza: se Lula tivesse sido eleito e ele implementasse estas medidas, nós não teríamos condições de manter o governo. O governo cairia””.

GMN:Para ser bem direto: bloquear as contas correntes de milhões de brasileiros foi uma loucura ?

COLLOR: “Aquele foi um gesto que eu diria tecnicamente amparado – tomando  o depoimento não somente do ministro Mário Henrique Simonsen mas também dos próprios integrantes da equipe econômica que se formava -, mas um ato de um voluntarismo muito grande e de coragem,sobretudo”.

 GMN: A decisão, em última instância, foi do senhor?

COLLOR:”Sem dúvida, a decisão,em última instância,foi minha”.

 AS DENÚNCIAS DO IRMÃO : “DETERMINANTES” PARA O IMPEACHMENT

 GMN:Pedro Collor, o irmão que fez denúncias contra o senhor, escreveu que o senhor na presidência foi derrotado por sua própria megalomania. O senhor foi um megalomaníaco na Presidência?

 COLLOR:”Não. Não. Talvez o termo esteja seguramente mal colocado. Carrego comigo aquela questão de perfeição, organização, ordem, disciplina. Pode ter achado serem atitudes megalômanas,mas não”

GMN:O senhor é “predestinado,inteligente, carismático,comunicativo, demagogo,irresponsável,ambicioso, vingativo e ganancioso”, segundo palavras textuais de Pedro Collor, publicadas em livro. Se não fossem as denúncias de Pedro Collor, o senhor acha que teria concluído o mandato?

 COLLOR:“Não sei.Não saberia dizer…”

 GMN:Como é que o senhor avalia o impacto daquelas denúncias no fim do governo Collor?

 COLLOR:“Tiveram um impacto muito forte, sem dúvida. Aquilo foi determinante para que eu sofresse o impeachment e fosse afastado do cargo para o qual fui eleito por trinta e cinco milhões de eleitores”.

O MOMENTO DA VOTAÇÃO DO IMPEACHMENT: ENQUANTO O PAÍS ACOMPANHAVA A VOTAÇÃO, COLLOR FICAVA SOZINHO NO GABINETE PRESIDENCIAL

GMN:Por que, ao contrário do que se esperava, o senhor decidiu ficar sozinho no momento em que a Câmara dos Deputados votava o pedido de impeachment?

 COLLOR: “Naquele momento, eu estava absolutamente só. Eu me lembro de que fiquei no meu gabinete sozinho, à noite já, somente com a luz em cima da minha mesa acesa.  Vez por outra, um rumor ecoava da Câmara dos Deputados, onde se votava o meu afastamento. E eu ali, só,naquele silêncio, esperando.Por fim, ouvi um pipocar de gritos e vivas e de manifestações de regozijo e alegria. Em seguida, carros passando defronte ao Palácio do Planalto e buzinando, como se fosse uma festa, um grande acontecimento”.

 GMN:O senhor pode revelar o que é que passava pela cabeça do senhor quando saía do Palácio do Planalto pela última vez ?

 COLLOR (depois de um suspiro profundo):“É um turbilhão de coisas, um turbilhão de vontades,planos,ações,reações-  um momento muito tumultuado, muito confuso”.

 GMN:Por que é que o senhor decidiu que a solenidade (em que foi notificado oficialmente sobre a abertura do processo de impeachment)  fosse transmitida pela  TV e aberta a todo mundo?

 COLLOR: “Porque eu queria que todo mundo presenciasse uma pantomima.Isso foi uma farsa,um jogo de farsantes,um jogo subalterno, sujo,inóspito,sempre. Que fique registrado por aqueles que escrevem a História. Porque eu faço a História, vocês escrevem a História. Que fique registrada a grande farsa em que se transformou esse afastamento, comemorado em cantos e loas como uma demonstração da vitalidade da nossa democracia,quando,ao contrário,a fragilidade nossa democracia. Demonstrou o quão frágeis são as nossas instituições.E como é importante ter uma grande e ampla reforma política: atores que votaram e me levaram para fora da presidência da República não poderiam nem teriam condições morais, éticas e de caráter de participarem daquela votação. Basta ver a fisionomia e os ditos que cada um pronunciava para as câmeras de televisão, para se ter notícia da grande patomima em que se transformou este processo de impeachment”.

GMN:Com sessenta anos de idade, qual é a grande crítica que o senhor faz ao Fernando Collor de quarenta anos, o mais jovem presidente da República eleito no Brasil?

 COLLOR:“A grande crítica que faço é à pouca capacidade que tive de perceber que ninguém governo sem uma base parlamentar sólida. Dentro desse presidencialismo de coalizão em que estamos inseridos – um  sistema político inteiramente ultrapassado e defasado, daí eu defender com ênfase o sistema parlamentarista –  ninguém pode pode governar sem o Congresso. Disso não me dei conta o suficiente, embora alertado por companheiros e amigos como Luís Eduardo Magalhães, Ricardo Fiúza, Humberto Souto,o senador Ney Maranhão, uma plêiade de deputados e senadores que sempre me alertavam para a necessidade de compor esta maioria parlamentar.Isso,sem dúvida nenhuma,foi o ponto principal,o ponto nevrálgico: ao não dar a devida atenção, fez com que eu incorresse no grande erro que cometi no meu governo”.

GMN:O senhor entrou para a história política do Brasil por dois grandes motivos: primeiro, por ter sido o primeiro presidente eleito pelo voto direto depois do regime militar. Segundo, por ter sido o primeiro a ser afastado num processo de impeachment.O senhor hoje tem a sensação de ter jogado fora uma grande oportunidade histórica?

COLLOR:“Ah, sem dúvida que sim. O presidente mais jovem das Américas e também o presidente mais jovem da história do Brasil.Sem dúvida,foi uma pena que tivessem acontecido aqueles eventos que culminaram com o meu impeachment. Lamento profundamente. Impechment que ocorreu em função da pouca maturidade que eu tinha”.

GMN:O senhor disse que chegou a pensar em suicídio nos meses seguintes ao impeachment e até gravou uma fita com uma mensagem que seria deixada para a família.O senhor guardou esta fita?

 COLLOR: “Está guardada”.

 GMN: Chegou a ouvi-la depois?

 COLLOR: “Não”

GMN:O senhor tem lembrança do que passou pela cabeça do senhor no exato momento em que assinou a renúncia à Presidência da República?

COLLOR: “O ato da renúncia foi assinado na Casa da Dinda, na madrugada do dia em que o Senado iria iniciar o meu julgamento político. Isso foi logo em seguida a um jantar, em que reuni os senadores e alguns deputados que estavam nos apoiando e nos sustentando até então, para combinarmos o que poderia acontecer no dia seguinte.Quando terminou o jantar – e teríamos número para evitar o impeachment – , não sei por que, mas alguma coisa bateu na cabeça. Pensei: “esse pessoal vai trair”. Já tinha ocorrido na Câmara, por que não no Senado? Eu aí disse: não. Eu vou renunciar para tentar evitar a suspensão dos meus direitos políticos”.

OS BASTIDORES DE UMA ELEIÇÃO HISTÓRICA : A OPERAÇÃO MONTADA PARA ESCONDER O FILHO DE UM CANDIDATO, A CONFISSÃO DE UM TESOUREIRO DENTRO DE UMA PISCINA – E UM DIÁLOGO ENTRE UM EX E UM FUTURO PRESIDENTE

sáb, 07/11/09
por Geneton Moraes Neto |
categoria Entrevistas

A Globonews levou ao ar a entrevista que o locutor-que-vos-fala gravou,em Maceió, com um homem que foi testemunha privilegiada dos bastidores da primeira eleição direta para presidente realizada no Brasil depois do fim do regime militar (reprise nesta segunda,às três e meia da tarde). Faz exatamente vinte anos que o Brasil foi às urnas para decidir o jogo entre Collor e Lula. Deu Collor na cabeça.

O personagem do DOSSIÊ GLOBONEWS é Cleto Falcão – um dos principais articuladores da candidatura do então governador de Alagoas, Fernando Collor, à presidência da República. Eleito Collor, Falcão chegou a ocupar o posto de líder do partido do governo na Câmara dos Deputados. De volta a Alagoas, hoje é assessor parlamentar da Assembléia Legislativa de Alagoas.

Ninguém dava um tostão furado pela candidatura do então governador de Alagoas,Fernando Collor, quando ela foi lançada. Os empresários deram milhões. Os eleitores deram algo mais valioso: votos. Bom de palanque e de TV, Fernando Collor bateu o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva: 35.089.998 votaram em Collor,contra 31.076.364 que apostaram em Lula.  O resto é história.

O lance mais polêmico da campanha eleitoral de 1989 foi a decisão tomada pela campanha do candidato Fernando Collor de veicular, em rede nacional de TV, no horário de propaganda eleitoral, um depoimento em que uma ex-namorada revelava que o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, escondia a existência da filha que tivera com ela.

A divulgação do depoimento  abalou notoriamente a performance de Lula no segundo e decisivo debate com Fernando Collor. Cleto Falcão diz que havia “pânico” no staff do candidato Collor diante do progressivo avanço de Lula nas pesquisas eleitorais, às vésperas do embate final – o segundo turno. A cúpula da campanha se reuniu, então, para avaliar se a fita gravada com a ex-namorada de Lula seria ou não levada ao ar. “Ninguém foi contra”, diz Cleto. Terminada a exibição privê, Collor disse as seguintes palavras, segundo Falcão : “A fita vai ao ar. Quem quiser ficar comigo fique. Quem não quiser f……-se !”.

Anos depois, em 2005, em entrevista que me concedeu em Maceió, para uma série levada ao ar no Fantástico, Fernando Collor se declarou arrependido. Palavras textuais do ex-presidente:

“Eu diria que não foi algo de bom gosto nem de bom tom. A utilização seria absolutamente desnecessária. Não o faria novamente.Mas, numa campanha eleitoral, no fragor da batalha, com as emoções desencadeadas de forma violenta, é difícil a gente ter uma medida correta dos termos que nós utilizamos e das ações que estaremos por realizar. É preciso levar em consideração o momento em que a decisão foi tomada. De qualquer maneira, sob o ponto de vista racional, em condições normais de tempratura e pressão, sem dúvida nenhuma eu não faria aquilo”. 

O que ninguém sabia, na campanha de 1989, era que o próprio Collor também tinha um filho fora do casamento. O comando da campanha teve de montar uma operação para manter em segredo a existência do menino. Mas o PT soube – e, segundo Cleto, chegou a enviar emissários a Maceió, para checar a história. O problema é que os detetives do PT não descobriram onde estava o menino  ( Collor posteriormente reconheceu a paternidade, num gesto que Cleto Falcão elogia. Fernando James hoje é vereador em Rio Largo, município vizinho de Maceió).  

Trechos da entrevista que a Globonews levará ao ar:

O senhor participou da operação para esconder o filho que o então candidato Fernando Collor tinha tido fora do casamento ?  

Cleto Falcão: “O pessoal do PT – da campanha de Lula – esteve aqui em Alagoas. Rodou, rodou e, na realidade, foi incompetente. Não tiveram a competência de localizar o menino – que morava aqui em Rio Largo, uma cidade vizinha de Maceió. Collor posteriormente reconheceu o menino como filho. Mas, naquele momento em que o PT esteve aqui, nós tínhamos acabado de denunciar Lula porque ele, Lula, tinha uma filha fora do casamento. Imagine se descobrem o menino – e vinha a mesma denúncia. Ia ser um estrago muito grande.Quem ficou encarregado de resolver foi Cláudio Vieira (secretário de Collor) – que o fez com competência. Tirou o menino daqui, com a mãe. Só voltou depois da campanha. Conheci o garoto com Collor já eleito presidente, antes de tomar posse. O garoto e a mãe saíram daqui só no período quente da denúncia que a suposta namorada de Lula fez. Nós passamos a temer que aquele mesma denúncia fosse feita contra a gente”.

O tesoureiro Paulo César Farias faz, dentro de uma piscina, uma confissão sobre as “sobras de campanha” : 52 milhões de dólares 

Um dos segredos mais bem guardados da política brasileira é o que acontece com as chamadas sobras de campanha. Que informação concreta o senhor tem sobre as sobras de campanha do então candidato Fernando Collor de Mello ?

Cleto Falcão: “Ao término da campanha, vim a Maceió para prestar contas das despesas no Rio de Janeiro. Eu havia sido coordenador da campanha no Rio. Estive com Paulo César Farias, tesoureiro da campanha, na residência de praia, onde ele foi assassinado. Ele estava tomando banho de piscina. Fiquei conversando com ele – eu do lado de fora, ele dentro da piscina. Perguntei: “PC, quanto você arrecadou na campanha, na realidade ?”. Ele disse: “134 milhões de dólares”.  Fez uma pausa e disse:”Devem sobrar em torno de 52 milhões””.

O que é que aconteceu com esse dinheiro ? 

Cleto Falcão: “A Polícia Federal, o FBI e a Scotland Yard não sabem. Eu vou saber?”. 

O dia em que Cleto Falcão testemunhou uma doação milionária de grandes empresários para a campanha de Fernando Collor à Presidência da República 

O senhor foi testemunha ocular de doações feitas por empresários à campanha do então candidato Fernando Collor à presidência. Qual foi a cena mais marcante que o senhor testemunhou nessas negociações ?  

Cleto Falcão: “Uma cena muito marcante foi numa tarde em que fomos a São Paulo para um encontro de Fernando Collor com Antônio Ermírio de Moraes. Nós nos encontramos com ele na casa de José Ermírio de Moraes. Depois de muita conversa, Antônio Ermírio, presidente do Grupo Votorantim, disse que tinha sido chamado pelo presidente José Sarney para disputar a presidência e não teria aceitado porque sabia que tiraria votos do centro e da direita – que era o eleitorado de Fernando Collor.Com isso, ele não queria pagar o preço de estar ajudando a eleger um irresponsável como Leonel Brizola ou um despreparado como Lula. Logo em seguida, ele disse que o grupo tinha uma contribuição a dar à campanha. O irmão de Antônio Ermírio, José Ermírio, passou um cheque para ele. E ele perguntou:”A quem entrego?”.  Fernando Collor disse: “Entregue ao Paulo César”.  Antes de chegar às mãos de PC Farias, o cheque passou por mim, porque eu estava sentado antes do Paulo César.Olhei discretamente o valor. Era o correspondente a três milhões de dólares. Obviamente, saía pelo caixa-dois, porque não houve contabilização nem nada. O cheque não era cruzado. Vinha do caixa-dois”.

Um palpite: as circunstâncias da morte de PC Farias só serão esclarecidas dentro de “vinte ou trinta anos”

O senhor tem dúvidas sobre as circunstâncias da morte do ex-tesoureiro da campanha, PC Farias ? 

Cleto Falcão: “Não é questão de ter dúvidas. Honestamente, acho que por trás do assassinato de PC Farias existe uma história que só será desvendada daqui a vinte ou trinta anos. Eu simplesmente acho que acreditar que Suzana Marcolino pegou um revólver e matou o PC é como acreditar em Papai Noel”. 

O que é que leva o senhor a fazer esta afirmação ? 

Cleto Falcão: “Porque ninguém mata a galinha dos ovos de ouro. O PC sustentava Suzana. Era uma pessoa muito boa para ela. E porque a perícia diz que não havia pólvora na mão de Suzana. Não utilizou o revólver. Agora, como foi e em que circunstância é algo que somente dentro de muitos anos vai ser desvendado e descoberto”. 

A morte de PC Farias pode ter alguma ligação com o destino dado aos 52 milhões de dólares que, segundo ele disse, sobraram da campanha ? 

Cleto Falcão: “Acredito que não. Sem que eu seja um policial do setor de investigação, eu analisaria que o PC era inconveniente para muita gente: para empresários que doaram dinheiro; para pessoas que participaram da campanha e queriam manter aquilo em sigilo. Mas sem nenhuma vinculação com aqueles 52 milhões”.  

Collor tenta, secretamente, se livrar do candidato a vice-presidente,  Itamar Franco: “Toda semana, Itamar tinha um chilique”  ( E o alerta de Jânio Quadros: governo de presidente jovem demais pode dar “merda”)

O senhor tomou parte de uma consulta secreta que foi feita ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para afastar o vice Itamar Franco da chapa do então candidato Fernando Collor. Por que foi feita a consulta ?  

Cleto Falcão: “Porque ninguém agüentava os faniquitos de Itamar querendo renunciar toda semana. Itamar aceitou ser vice-presidente mas toda semana tinha um chilique. Queria renunciar. Fernando – de forma discreta – mandou fazer uma consulta a ministros do TSE para saber se era possível substituir o vice. O TSE informou que não. O vice só poderia ser modificado com a renúncia do próprio vice, num ato de vontade unilateral”.

O senhor foi testemunha de um diálogo entre o então candidato Fernando Collor e o ex-presidente Jânio Quadros, em Roma. O que foi que um disse ao outro ? 

Cleto Falcão: “Famos a um jantar em homenagem a Jânio Quadros. Jânio recebeu Collor com uma certa frieza, porque Jânio, na realidade, queria ser candidato a presidente. Começou, então, a contestar a candidatura de Collor. Dizia que Collor era muito novo : primeiro, ele deveria ser senador, deveria adquirir experiência. E Collor saindo pela tangente. Jânio insistiu na questão da pouca idade. A certa altura, Jânio parou e perguntou: “Quantos anos você tem?”. Fernando disse:””Tenho 39. Vou ter 40 na eleição”.  Jânio fez um ar de surpresa, teatral. Disse: “Muito novo! Muito novo para ser presidente!”.  Fernando disse: “Mas, presidente, gostaria de lembrar que o senhor foi presidente muito jovem, com pouco mais de quarenta anos!”. Jânio – que estava bebendo vinho – virou a taça, deu uma porrada na mesa e disse: “E deu na merda que deu ! E deu na merda que deu!”. 

Jânio Quadros foi presidente com 43 anos. Renunciou apenas sete meses depois de tomar posse. Collor, eleito com 40 anos, também renunciaria, dois anos e meio depois da posse, num gesto extremo para tentar escapar da condenação no Senado. Não escapou. Condenado por “crime de responsabilidade”, passou oito anos impedido de exercer funções públicas. Em 1994, por falta de provas, o Supremo Tribunal Federal o absolveu. 



Formulário de Busca


2000-2015 globo.com Todos os direitos reservados. Política de privacidade