A verdade sobre o mercado chinês de células-tronco
Não é novidade que a China oferece diversos tratamentos para doenças incuráveis usando o transplante dos mais diversos tipos de células-tronco. Todo mundo já deve ter ouvido falar de alguém que pensou em utilizar algum tipo de medicina regenerativa na China. O argumento mais comum para justificar o procedimento é que, sendo aquele país regido de forma diferente, a abertura para tratamentos experimentais é maior. E dados duvidosos é o que não faltam nos sites dessas empresas para suportar a eficácia desses tratamentos. Pois bem, parece que, depois de muita pressão internacional, a história começa mudar mas ainda pode levar um tempinho para acabar de vez com esse tipo de comércio.
Tratamentos experimentais, como o próprio nome diz, ainda não foram validados cientificamente. Em geral, procura-se recompensar o paciente de alguma forma pela participação. Porém, diversas empresas perceberam o desespero de familiares com doenças graves e decidiram cobrar por tratamentos experimentais, invertendo a ética por trás dos ensaios clínicos. Essa situação acontece com uma frequência exacerbada na China, provavelmente pela falta de regulamentação governamental.
Pois bem, há três meses atrás o ministro da saúde chinês anunciou que iria banir protocolos experimentais usando células-tronco sem comprovação científica. Infelizmente, ainda diversas clínicas operam livremente, basta entrar nos sites de anúncios para tratamentos de Parkinson ou Autismo para se deparar com um negócio milionário. As propagandas mostram casos de sucesso e associam o nome delas a grandes redes de hospitais federais ou mesmo estabelecimentos de renome internacional, dando a impressão de que o negócio tem apoio dessas instituições.
Em 2009, com cerca de 100 clínicas privadas de células-tronco registradas no país, o Ministério da Saúde chinês classificou os tratamentos com células-tronco com a categoria médica de nível 3, ou seja, tecnologias de alto risco. que requerem aprovação e audição técnica antes da implementação comercial. Desde então, nenhuma clínica chinesa conseguiu essa aprovação. Pior, o número de clínicas oferecendo tratamentos aumentou. Em Janeiro, reconhecendo os problemas gerados pela pressão internacional (muitos pacientes pioraram depois dos tratamentos) por exemplo, o governo decidiu agir. Impôs uma série de restrições para a abertura de novas clínicas, exigindo o cadastramento dos tratamentos e declarando que pacientes em ensaios experimentais não deveriam pagar pelo tratamento.
De acordo com um relatório publicado pela revista “Nature” na semana passada, as restrições não causaram grande impacto no comercio chinês: nenhuma empresa se cadastrou de forma regular e ainda são oferecidos tratamentos experimentais com células-tronco para as mais diversas doenças. Na clínica WA Optimum Health Care, em Xangai, por exemplo, oferecem tratamento contra autismo usando células derivadas de tecido adiposo e uma segunda dose adicional de células do cordão umbilical. Tudo pela bagatela de aproximadamente US$ 25 mil. Em Changchun, a clínica Tong Yuan Stem Cell oferece quatro injeções, de células retiradas de fetos abortados, e promete curar o autismo em um ano. O concorrente Beijing Puhua International Hospital’s Stem Cell Treatment Centers, de Pequim, oferece o mesmo, mas com uma injeção extra, só pra garantir…
Todas essas empresas são firmes em afirmar sucesso nos tratamentos, mas nenhuma publicou dados oriundos de ensaios clínicos controlados. O neurologista da Beijing Puhua garante que os sintomas de autismo melhoram logo nas semanas seguintes após primeira injeção e reconhece que não faz controle algum por falta de verba. Vale notar, que no caso do autismo, é consenso entre os cientistas que não existe base cientifica alguma que justifique tratamentos com transplante de qualquer tipo de células no cérebro de pacientes. Não dá pra saber se as células vão sobreviver ao transplante e podem, inclusive, levar a complicações sérias como câncer ou doenças autoimunes.
Enquanto as autoridades chinesas tentam fazer com que as clínicas se cadastrem e demonstrem a eficácia dos tratamentos com ensaios controlados, o mercado de células-tronco continua crescendo e fazendo mais vítimas. Informação continua sendo a melhor arma contra esse tipo de abordagem.