Não foi o primeiro embate entre Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski no julgamento da Ação Penal 470, o mensalão. Mas, sem dúvida, foi o mais alto momento de tensão no plenário do Supremo Tribunal Federal nesta temporada. A discussão entre eles chegou ao ponto de a sessão ser encerrada e outros ministros entrarem em campo para apaziguar os ânimos. Joaquim e Lewandowski deixaram o plenário, mas a discussão continuou no Salão de Chá dos ministros. Do plenário era possível ouvir o áspero diálogo.
Joaquim Barbosa ficou irritado com a condução do voto de Lewandowski, que questionava a aplicação da lei de 2003, de punição à corrupção, uma lei mais rigorosa, para a sentença do ex-deputado Bispo Rodrigues. E se exasperou quando o colega pediu o adiamento da discussão para ter tempo de formar sua convicção. Para Barbosa, a análise dos recursos não serve “para arrependimento”, disse, já surpreendendo o plenário. Ele insistia que a condenação do ex-deputado havia sido decidida por unanimidade do plenário e, por isso, não cabia rediscutir o assunto.
- Joaquim Barbosa: Vossa excelência compôs um voto e agora mudou de ideia.
- Ricardo Lewandowski: Para que servem os embargos?
- Joaquim Barbosa: Não servem para isso, para arrependimento, ministro. Não servem.
O decano Celso de Melo entrou em campo para tentar acalmar os dois, mas Joaquim foi mais longe e disse que o trabalho dos ministros é concluir o julgamento e não “fazer chicana”.
- Celso de Mello: Eu ponderaria ao eminente presidente que, talvez, conviesse encerrar trabalhos e vamos retomá-los na quarta-feira começando especificamente por esse ponto. Isso não vai retardar.
- Joaquim Barbosa: Já retardou. Poderíamos ter terminado esse tópico às 15 para 17h.
- Ricardo Lewandowski: Presidente, nós estamos com pressa do quê? Nós queremos fazer Justiça.
- Joaquim Barbosa: Nós queremos fazer nosso trabalho, e não chicana, ministro.
- Ricardo Lewandowski: Vossa excelência está dizendo que estou fazendo chicana? Eu peço que vossa excelência se retrate imediatamente.
- Joaquim Barbosa: Eu não vou me retratar, ministro.
Joaquim encerrou a sessão, e os ministros formaram dois blocos. Gilmar Mendes acompanhou Lewandowski. Toffoli e Carmen Lúcia já haviam saído. No plenário ficaram Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Luiz Fux, que ao longo do julgamento mediou algumas vezes outros embates entre Joaquim e Lewandowski. Luís Roberto Barroso se uniu ao grupo. Marco Aurélio estimulando Fux a ponderar junto a Joaquim para moderar no comando da sessão. Celso de Mello disse ao grupo. “Há coisas que não precisa dizer”.
Esse embate demonstra claramente uma divisão no Supremo no julgamento desta ação penal. A tensão vista hoje era esperada em outro momento – na análise dos pedidos de acolhimento dos embargos infringentes, que, na prática, permitem alterar o resultado do julgamento. O embate de hoje veio mais cedo do que o esperado.
Antes de começar a sessão, o ministro Celso de Mello admitia que o plenário do STF estará dividido no debate sobre os embargos infringentes. Ao mesmo tempo, refez os cálculos sobre o tempo de duração dessa nova etapa e disse que poderá ser concluído ainda neste mês. E afirmou:
- Teoricamente, a lei permite que, contra um acordão que julgue embargos de declaração, possam ser apostos novos embargos de declaração. E comentou sobre o direito a tantos recursos:
- O tribunal pode reconhecer que há abuso no direito de recorrer, e o abuso no direito de recorrer traz uma série de consequências.
Ao longo da sessão desta quinta-feira, antes da altercação entre Joaquim e Lewandowski, era possível notar um ambiente de conduzir esta etapa do processo sem alterações – sem o acolhimento dos embargos de declaração.
Os advogados dos réus percebiam isso e lamentavam a ausência do ministro Teori Zavascki . Para eles, Zavascki poderia reabrir a discussão sobre os embargos de declaração.
O mais novo ministro da Corte, Luís Roberto Barroso, chegou a falar da “dureza da pena” aplicada à ex-secretária Simone Vasconcelos, também ré no processo, e afirmou que em seu julgamento ela seria considerada “ré colaboradora”, como, aliás, reivindicava a defesa. “Mas não estou aqui para comentar videotape”. Assim, indicou que não iria questionar decisões tomadas pelo plenário no momento em que ele não integrava a casa.
O embate entre Joaquim e Lewandowski já transbordou e retrata a divisão que há no plenário a respeito desse julgamento. Mas, pelo menos um ministro, Marco Aurélio Mello, condenou publicamente a discussão entre eles. Marco Aurélio disse que o ambiente de hoje “afeta a credibilidade da Corte” e há que se ter cuidado “para não descambar para o lado pessoal”.