Antes mesmo de encerrar as comemorações pelos dez anos de poder, o PT vê o cenário político brasileiro mudar repentinamente. O que valia um mês atrás, já não vale mais. Nesse turbilhão que virou a política brasileira depois dos protestos de junho, aliado ao fraco desempenho da economia, o PT já teme estar colocando em risco o patrimônio político-eleitoral construído dos últimos anos.
Foi esta avaliação que levou o ex-presidente Lula a um encontro a sós com a presidente Dilma Rousseff terça-feira passada. O partido tem duas preocupações: com os rumos da economia e com a condução da política. Dois pontos muito sensíveis a esta altura do mandato e que podem ter reflexos eleitorais importantes para o partido. Até aqui, o PT enxergava o favoritismo de Dilma Rousseff na disputa do ano que vem e se preocupava com a composição dos palanques estaduais e, mais ainda, com as chapas para o Senado. Tudo mudou depois que centenas de milhares de pessoas foram às ruas protestar, sem que o partido estivesse à frente da convocação dos brasileiros. Isso nunca havia acontecido. O PT considerava seu maior patrimônio a capacidade de mobilização da sociedade. As manifestações de junho jogaram essa convicção abaixo.
Diante disso, Lula saiu em campo. De tanto ouvir queixas de correligionários – de dentro e de fora do governo - ele decidiu conversar com a presidente. Foi direto ao Palácio do Planalto. Ao contrário de outras ocasições, ele não recorreu a intermediários e nem quis mandar recado. Foi pessoalmente.
A petistas, contou que sua preocupação número um é com a economia. Quando a economia vai bem, a política entra nos trilhos. Mas se a economia desanda, a política também. Neste momento, para Lula, segundo petistas, é importante que o governo Dilma recobre a confiança, a credibilidade perdida nos últimos meses. A inflação não tem dado trégua, o crescimento está baixo e o governo não se comunica bem com os agentes econômicos.
Paralelamente a isso, o ex-presidente avalia que a presidente Dilma precisa repactuar a relação com o PMDB, abrir o diálogo e, principalmente, ouvir mais os aliados, demonstrando capacidade de construir o palanque para a sua reeleição. Do contrário, analisa, os partidos podem se dispersar para outras candidaturas e criar mais dificuldades para o PT em 2014. Ao mesmo tempo, a própria presidente se queixa do PT, que tem se aliado a grupos no Congresso e imposto derrotas importantes ao governo, como, por exemplo, no caso do projeto de distribuição dos royalties do petróleo. Na volta à Câmara, o projeto deixou de ser votado pois tudo indicava derrota do governo.
Depois do governo, o PT
Se com o governo as coisas não vão bem, o PT também faz reflexões internas e busca identificar as falhas.
– O PT sempre teve a contemponaneidade como sua principal característica. Com o passar dos anos nossa agenda caducou e não fizemos outra – afirma um senador petista, analisando com preocupação o cenário eleitoral para o partido.
Desde 2011, o PT estava ciente de que era preciso construir uma nova agenda. Uma ampla pesquisa feita pela Fundação Perseu Abramo, ligada ao partido, mostrou que a grande maioria dos brasileiros reconhecia que melhorara de vida ao longo dos governos petista. Mas quando a pergunta era “graças a quem?” ,90% responderam que isso se deu por esforço próprio. Portanto, não havia mais aquele sentimento de dívida para com o partido – sinal de que precisava uma nova agenda.
– Lula era como um livro de auto-ajuda; Dilma é a realidade. Além disso, não ouve ninguém… . Em certo período, o PT despertou a esperança no brasileiro e, pelo estilo de Lula, ampliou isso – reclamou outro petista.
A esta altura, os petistas identificam três áreas do governo que precisam “dar uma guinada”: a economia, a articulação política e a área de comunicação. Diante do diagnóstico, um grupo de senadores pretende ir nos próximos dias para um encontro com Lula a fim de ouví-lo sobre o que fazer. “Nós não vamos lá para reclamar. Ele já sabe quais são os problemas; o que queremos é saber se ele já tem um caminho, afinal, é nosso principal líder”.
Mesmo com tantas dificuldades no relacionamento com a presidente Dilma, os petistas foram orientados a não mais falar no “volta, Lula”. Um deles explica que Dilma tem o direito de se candidatar à reeleição e, trocar o nome do candidato é repetir uma estratégia que não deu certo no Rio Grande do Sul, quando o PT retirou a candidatura à reeleição de Olívio Dutra e preferiu lançar Tarso Genro. O resultado foi a derrota. Hoje, alguns petistas avaliam que a candidatura à reeleição de Dilma é um risco; e com Lula, seria uma convicção da vitória.
– Há um grande temor quanto ao patrimônio do PT. A instabilidade é geral – disse outro petista.
Para alguns petistas, a crise do partido hoje é semelhante à de 2005, quando estourou o caso do mensalão. Naquela ocasião, analisa um petista, o partido ficou imobilizado por quatro meses e não conseguiu dar uma resposta sobre o envolvimento de seus dirigentes na denúncia do mensalão. “Poderia, naquele momento, ter dito que era crime eleitoral. Sem tomar posição e sem tomar providência contra seus integrantes, o partido acabou se igualando aos demais, quando em certo momento foi um partido diferente”, analisou o petista.
Agora, diz o petista, o partido precisa se reaproximar dos movimentos sociais e recuperar bandeiras. Ao se tornar governo, analisou um parlamentar, o PT foi sendo empurrado para teses mais conservadoras que nunca foram do partido. “Em nome da governabilidade, fomos perdendo movimentos sociais e teses da atuais”, disse, numa referência ao debate na eleição sobre aborto, por exemplo.