O segundo mandato do presidente Lula começa muito mais com cara de continuidade do que de novidade. Nos dois principais pilares do governo, Casa Civil e Ministério da Fazenda, o presidente Lula pretende manter os atuais ocupantes – Dilma Roussef e Guido Mantega – e não parece com disposição de fazer grandes inovações nem na área administrativa nem na busca de nomes para a equipe. Lula elegeu duas prioridades: na economia, quer “destravar” o crescimento do país; na política, ter uma base de sustentação sólida no Congresso.
O presidente gosta de repetir a máxima do futebol “não se mexe em time que está ganhando”. Assim, ele responde às pressões para que faça logo as mudanças na equipe do segundo mandato e apresente o novo projeto para os próximos quatro anos. Lula ganhou mais força para este discurso com a recente pesquisa DataFolha indicando que ele é o que recebe melhor avaliação entre todos os presidentes do Brasil. Lula está fortalecido pela reeleição, em especial pela votação no segundo turno, mas não tem à sua disposição tantos nomes assim para nomear para o governo.
A esta altura, Lula deve se dedicar a escolher dois nomes: os substitutos de Márcio Thomaz Bastos no Ministério da Justiça e o de Waldir Pires, no Ministério da Defesa. Para a Justiça, há um problema: o PT quer o ministério, especialmente, para comandar a Polícia Federal. Já que deve perder espaço no governo, o partido escolhe ministérios mais estratégicos, entre eles, o da Justiça. E o nome petista pronto para o cargo seria o de Tarso Genro. Isso esbarra na recomendação do atual titular da pasta, Márcio Thomaz Bastos, que prefere alguém distante dos partidos políticos, de preferência um técnico. Esta queda de braço paralisou a sucessão no Ministério da Justiça.
O presidente Lula já teve uma longa conversa com o embaixador Ronaldo Sardenberg, que já ocupou a Secretária de Assuntos Estratégicos e o Ministério da Ciência e Tecnologia no governo Fernando Henrique. Nada se falou sobre o conteúdo dessa conversa, que foi a dois. Mas no Planalto, Sardenberg é apontado como nome forte para o Ministério da Defesa.
A dificuldade do presidente Lula, no entanto, será a de compatibilizar os anseios dos partidos aliados com as possibilidades de divisão de cargos no governo. A cada dia, cresce mais a ansiedade dos aliados e também a expectativa de participação no governo. Isso vai desde o PMDB, que é o maior partido da coalizão até o pequeno PC do B ou ao PSB, partido que sai da condição de nanico para a de partido médio, em função das adesões que tem recebido.
Melhor na política
Do ponto de vista da política, Lula começa o segundo mandato muito melhor do que o primeiro. Em 2003, Lula podia contar com o apoio de apenas três partidos, o PT, PC do B e o PSB que, juntos somavam pouco mais de 120 deputados. Desta vez, são nove partidos aliados (PT, PMDB, PC do B, PSB, PV, PDT, PR, PP e PTB) que, mesmo com as defecções internas, garantem ao Planalto uma base confortável, capaz até de garantir a aprovação de emendas constitucionais. Juntos, eles somam 336 deputados.
No Senado, no entanto, a dificuldade pode ser a mesma. Somando-se todos os partidos aliados, o governo teria 46 votos, o que lhe garante maioria simples, mas não os 49 votos necessários para aprovar emendas constitucionais. Isso, sem contar as defecções que sempre ocorrem e são mais acentuadas no Senado. O PDT é um exemplo. De cinco senadores, pelo menos dois não votariam com o governo- Cristóvam Buarque e Jefferson Peres, por exemplo.
O primeiro teste do governo, no entanto, será na eleição para as presidências da Câmara e do Senado. O presidente Lula tem dito que não vai repetir “erro velho”, como o de deixar dois aliados disputando o mesmo cargo, para não repetir o que aconteceu em 2005 com a eleição de Severino Cavalcanti. A unificação da base em torno de um só candidato tem de ser a prioridade do governo neste primeiro mês do segundo mandato.
Enquanto isso, o governo precisa ir costurando a maioria absoluta no Congresso. Ela é importante porque o principal desafio do segundo mandato será assegurar a aprovação da prorrogação da CPMF e da DRU – a desvinculação de Receitas da União. As duas dependem de emenda constitucional e sua aprovação deve acontecer até 31 de setembro, no caso da CPMF. Uma tarefa que os líderes partidários terão de enfrentar logo no início do governo para colher a aprovação dentro do prazo necessário.
A prorrogação da CPMF é fundamental para o governo porque assegura R$ 32 bilhões de reais. A dificuldade, agora, será garantir a prorrogação sem partilhar esse volume de recursos com os governadores que, agora, terão papel importante nas relações de governo. No primeiro mandato, Lula tinha seis governadores aliados. Agora, eles são 16. E Lula pretende, ainda, demonstrar bom relacionamento com tucanos muitos vistosos – José Serra, governador de São Paulo e Aécio Neves, governador de Minas. A boa relação com os dois esvaziaria, de certa forma, a oposição acirrada que o PSDB pretende fazer no Congresso, especialmente, no Senado, onde Lula já tem dificuldades de sobra.
Cem dias
Na pauta de prioridades do governo, além da prorrogação da CPMF e da DRU, o governo deverá incluir, ainda, duas reformas: a política e a tributária. As duas foram escolhidas pelo Conselho Político como prioridades do Congresso para o início da próxima legislatura. Cada partido ficou de entregar sua proposta no prazo de 45 dias – ou no fim de janeiro – para que o governo possa compilar as propostas e formatar um projeto único, aproveitando o chamado período de “lua de mel” – período em que a oposição ainda está de armas baixas por conta do resultado eleitoral. No entanto, não se vislumbra um consenso sobre reforma política. Diante disso, o máximo que se aposta é que poderá ser aprovada uma forma de cobrança de fidelidade partidária.
Aqui e acolá há quem defenda a forma de financiamento público das campanhas eleitorais, mas este não é um tema que aglutine forças no Congresso. Ao contrário, existem várias propostas distintas – desde a manutenção do sistema de financiamento privado, passando pelo público e ao misto, que é o mais criticado.