Paulo Freire é patrono da educação brasileira desde 2012 — Foto: Acervo/TV Globo
A frase do pedagogo pernambucano Paulo Freire citada pelo candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em entrevista ao Jornal Nacional, na quinta (25), é do livro "Pedagogia da Esperança: um reencontro com a Pedagogia do Oprimido". Nele, o educador que virou uma referência mundial sobre educação fala sobre a necessidade do diálogo entre minorias para combater quem os oprime.
No livro, Freire afirma "que só uma política radical, jamais, porém, sectária, buscando a unidade na diversidade das forças progressistas, poderia lutar por uma democracia capaz de fazer frente ao poder e à virulência da direita. Vivia-se, porém, a intolerância, a negação das diferenças. A tolerância não era o que deve ser: a virtude revolucionária que consiste na convivência com os diferentes para que se possa melhor lutar contra os antagônicos".
Na entrevista do Jornal Nacional, Lula citou o educador ao afirmar que aprendeu a conversar, a negociar com os contrários.
"Tem uma frase do Paulo Freire que é fantástica, que eu utilizei para mostrar aos militantes do PT para falar da entrada do Alckmin: de vez em quando a gente precisa estar junto com os divergentes para combater os antagônicos. E agora nós precisamos vencer o antagonismo do fascismo, da ultradireita", afirmou (veja vídeo abaixo).
Lula cita frase de Paulo Freire durante sabatina do Jornal Nacional
De acordo com o historiador Dimas Brasileiro, pesquisador de 38 anos que integra a Cátedra Paulo Freire, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), o livro de Freire é um apelo pelo diálogo democrático. Ele cita como exemplo um debate que ocorreu na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, no início dos anos 1970.
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"Paulo Freire estava nos Estados Unidos no auge dos movimentos das identidades, dos movimentos sociais, movimentos identitários de gênero, movimento negro, movimento dos imigrantes. E inicialmente esses movimentos tinham dificuldade em dialogar entre si. E ele faz um apelo por um diálogo entre esses movimentos", explicou o historiador.
Segundo Dimas Brasileiro, o educador pernambucano vinha sendo convidado por universidades, movimentos sociais e governos do mundo todo para falar sobre "Pedagogia do Oprimido", um dos seus trabalhos mais conhecidos.
Livro 'Pedagogia da Esperança', de Paulo Freire — Foto: Reprodução/TV Globo
Freire, então, reforçou a importância do diálogo entre as minorias e lembrou que, apesar de diferentes, estes grupos tinham uma luta em comum.
"Que é a luta contra os opressores, né? Que os colocam em lugares de exclusão, de desigualdade. Então essa luta, que é uma luta divergente, tem como como foco o mesmo grupo, que é antagônico a eles, que os oprime, que os exclui. Que é uma luta contra essa opressão", afirmou o historiador.
Dimas Brasileiro disse que algumas pessoas questionaram o apelo feito por Paulo Freire. "Como ele poderiam estar juntos né? E o Paulo Freire diz 'nós somos divergentes, mas nós temos um campo antagônico a enfrentar'. O patriarcado, uma elite descomprometida, irresponsável com essas questões. Como se fosse um apelo por uma luta pela democracia que comportaria todas essas lutas".
Patrono da educação
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Considerado subversivo pela ditadura militar, o pernambucano ficou exilado por 16 anos e escreveu mais de 30 livros, traduzidos para vários idiomas (veja vídeo acima). A principal obra dele, "Pedagogia do Oprimido", lançada em 1968, é o único livro brasileiro que consta na lista dos 100 títulos mais solicitados nas ementas de cursos de universidades dos Estados Unidos, do Reino Unido, da Austrália e da Nova Zelândia.
Apesar de Paulo Freire ter o título de patrono da educação desde 2012, uma iniciativa popular que contou com 20 mil assinaturas, em 2017, e um projeto de lei de 2019, de autoria do deputado Carlos Jordy (PSL-RJ), tentaram transferir a condição de patrono da educação brasileira para José de Anchieta, padre jesuíta canonizado pelo papa Francisco em 2014.
Criticada pelo governo Bolsonaro, que atribui a ela o baixo desempenho escolar do Brasil em avaliações da qualidade da educação nacional, a metodologia freireana de alfabetização prioriza as necessidades práticas de cada grupo que participa do aprendizado.
É uma teoria pedagógica ligada ao dia a dia das pessoas e que vai além do objetivo de ensinar a ler e escrever, buscando possibilitar uma conscientização crítica dos alunos sobre a realidade e a sociedade.
A permanência do pensamento de Paulo Freire, mesmo após a sua morte, em 1997, é comprovada pela atualidade de diversas declarações educador. Mesmo ditas no século passado, várias frases do patrono da educação brasileira ainda trazem ensinamentos e lições pertinentes para a realidade atual do país e da educação brasileira.