Integrantes da Comissão Nacional da Verdade estão em Marabá, no sudeste do Pará, até esta terça-feira (16) para coletar depoimentos de testemunhas e vítimas da ação dos militares durante a Guerrilha do Araguaia, movimento armado contra a ditadura militar organizado pelo PCdoB e reprimido pelo Exército, entre 1972 e 1975, naquela região e em parte do estado do Tocantins.
O ex-soldado do Exército, Guido Alves, narrou para os membros da Comissão os momentos que presenciou na “Casa Azul”, imóvel do antigo Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER), que funcionava a base de comando de operações do Exército na época da Guerrilha. Segundo testemunhas, guerrilheiros presos e moradores da região que davam apoio ao movimento armado eram levados para o local para serem torturados e mortos.
para tortura de guerrilheiros e moradores do
sudeste do PA durante a Guerrilha do Araguaia.
(Foto: Reprodução/Tv Liberal)
"Vários fatos marcaram, tanto que quando a gente era escalado para cá, a gente pedia a Deus a noite toda: 'Senhor, não deixa eu ser escalado para a DNER não'. E no dia, publicava para o DNER e a gente sabia que ia voltar para cá novamente, ver o que a gente não queria ver", relembrou o ex-militar.
O agricultor Pedro Matos do Nascimento lembra com detalhes os dias em que ficou preso na “Casa Azul”. Ele foi preso pelo Exército em 1973, acusado de apoiar os militantes políticos durante a Guerrilha do Araguaia.
"Eu fiquei três dias aqui, passando uma fome de cachorro. A mim mesmo, de pancada, não houve tortura, mas eu assistia às torturas ali", contou.
Os depoimentos podem ajudar a Comissão Nacional da Verdade na elaboração de documentos sobre a Guerrilha do Araguaia, além de possivelmente esclarecer a localização dos desaparecidos no conflito.
"Isto vai ajudar todos aqueles que procuram por justiça, reconhecimento e reparação dos danos que sofreram", declarou Pedro Dallari, da coordenação da Comissão Nacional.
A equipe foi até Marabá acompanhada pela Comissão Estadual da Verdade, que deve ouvir ainda camponeses e índios que foram vítimas durante o período.
"Os camponeses que foram atingidos sem nem saber o que acontecia; os índios que foram obrigados a servir como guias na mata atrás dos guerrilheiros, enfim, ampliar um pouco a visão que já se tem a respeito dos fatos aqui no Araguaia”, detalhou Egídio Sales Filho, membro da Comissão Estadual da Verdade.
Ainda nesta terça a Comissão Nacional visita um cemitério onde podem ter sido enterrados militantes políticos na localidade. Em seguida, testemunhas serão ouvidas no auditório da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa).