Pela lente da gente

Por Aline Midlej

Aline Midlej é apresentadora do Jornal das Dez, na GloboNews


Mattia Villardita, que se veste de Homem-Aranha para visitar crianças no hospital, se encontra com o Papa Francisco — Foto: Reprodução/Instagram

Impossível discordar do presidente norte-americano Joe Biden. A quinta-feira foi um dia triste para a liberdade de imprensa no mundo, com o fechamento de um jornal de Hong Kong que noticiava o autoritarismo das autoridades chinesas. No Brasil, o baque foi duplo, com mais uma colega jornalista atacada pelo presidente. Atacada por fazer perguntas.

Os jornalistas do "Apple Daily" faziam perguntas para Pequim havia 26 anos em suas corajosas reportagens. Questionavam a falta de autonomia que sufoca desejos nesta ilha antes autônoma no sudoeste da China.

Também conhecida como um grande centro financeiro, bem que podia receber uma ajudinha do Homem-Aranha e com as bênçãos do Papa Francisco, claro. Ele esteve com o pontífice no Vaticano, essa semana, num encontro incomum que chamou a atenção.

Vídeo: Homem-Aranha aparece em audiência com o papa

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O homem por trás da máscara era o jovem Mattia Villardita, um herói de fato. Aos 27 anos, se dedica a animar crianças internadas em hospitais pediátricos com seu personagem.

A paisagem de arranha-céus de Hong Kong já facilitaria a missão do super-herói, com passagem obrigatória pelo bairro operário de Mongkok. Foi lá, na última quinta-feira, que a comoção democrática surgiu em forma de fila, com centenas de pessoas passando a noite ao relento, para comprar a última edição impressa do jornal "Apple Daily".

Última edição do jornal 'Apple Daily' foi publicada em Hong Kong em 24 de junho de 2021 — Foto: Tyrone Siu/Reuters

A tiragem foi de 1 milhão de exemplares. Quem conseguiu um deles o exibia como um troféu pelas ruas. Notícias das agências davam conta de um clima de tristeza, de um certo horror, mas também de resiliência.

A publicação jornalística mais popular de Hong Kong teve seus bens congelados e alguns dos seus dirigentes presos por meio de uma nova lei de segurança nacional imposta pela China, e que entrou em vigor no ano passado. A legislação foi uma resposta aos protestos que tomaram conta da ilha desde 2019, pedindo soberania.

Mas o que faria o Homem-Aranha nestas terras áridas para quem ama a liberdade de ser e pensar? Seria uma ação realmente especial, que poderia começar pelas casas dos mais de mil funcionários do jornal que acabaram desempregados com essa ação da ditadura chinesa.

O Homem-Aranha chegaria com buquês, inspirado pelos indígenas acampados em Brasília. Após um violento protesto com feridos na última terça-feira, eles entregaram flores aos policiais na Câmara dos Deputados. Os parlamentares votavam um polêmico projeto de lei que altera a demarcação de terras dos povos originários do país.

Foi bonito. Por onde passasse em Hong Kong, ele deixaria uma dose da sua força e coragem para a resistência resistir.

E falando em Congresso, por aqui também estamos às voltas com votações que pretendem alterar a nossa lei de segurança nacional, uma herança traiçoeira da ditadura militar, adorada pelos mesmos que mandam jornalistas calarem a boca.

Depois dessa visita a Hong Kong, o Homem-Aranha bem que podia dar uma passada por aqui. Em solo brasileiro podia espalhar sua empatia pelos gabinetes da capital federal. Se vier ao Rio de Janeiro, prometo chinelo Havaianas e muito desejo de democracia e liberdade de imprensa.

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