Filtrado por André Trigueiro Remover filtro
  • A China que eu respirei

    André Trigueiro com máscara durante visita à ChinaÉ muito pior do que mostravam todas as reportagens que havia lido a respeito. Mais impressionante até que as imagens fortes (fotos e vídeos) que acessei antes da viagem. E quando meus três companheiros de jornada (duas produtoras e um cinegrafista) começam a relatar poucas horas depois de nossa chegada a Pequim os mesmos sintomas que eu (olhos secos, garganta irritada e nariz entupido) percebi que se tratava de uma experiência que merecia o devido registro.
     
    Tão impactante quanto essa imersão em uma densa e constante nuvem de fuligem, fumaça e material particulado sobre 150 milhões de pessoas que vivem na região norte da China - especialmente na capital Pequim, onde moram 20 milhões - foi testemunhar as respostas (pouco efetivas) da população a essa tragédia ambiental sem precedentes na História da China.
     
    Enquanto o governo declarava “guerra à poluição”, prometendo medidas que atenuassem os impactos da queima de carvão (o mais poluente de todos os combustíveis fósseis responde por 80% da matriz energética chinesa), dos grandes poluidores industriais e da circulação de automóveis (aproximadamente 1 milhão de novos veículos são licenciados por mês na China), os chineses recorrem aos paliativos possíveis como o uso de máscaras, a compra de filtros de ar para ambientes fechados e consultas regulares aos aplicativos que disponibilizam de hora em hora a concentração de materiais particulados no ar que se respira.
     
    Dependendo do nível de poluição, as próprias escolas são obrigadas a confinar os alunos em salas de aula e ambientes internos da instituição para evitar o contato direto da garotada com esse ar saturado de veneno. Flagramos esse confinamento durante visita a uma escola com 1.100 alunos nos arredores de Pequim. Nenhum dos alunos entrevistados por mim se sentia à vontade em permanecer durante 8 horas seguidas dentro da escola, em ambientes fechados, sem poder ficarao ar livre, nem na hora do recreio. Pior, eles já pressentiam que quando voltassem para casa provavelmente os pais manteriam a "proteção indoor" com seus filtros de ar funcionando a plena carga.

    Usina termelétrica na China

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

    No ano passado, quando algumas cidades chinesas foram obrigadas a emitir um alerta vermelho -– nível máximo de poluição do ar -– o mundo acompanhou horrorizado a dura realidade experimentada por milhões de pessoas naquele país que foram obrigadas a inalar uma concentração de poluentes descrita pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como 26 vezes acima do limite do razoável.  
     
    Vários especialistas daquele país resaltam que a degradação da qualidade do ar não é exclusividade dos chineses, e lembram os exemplos de Londres, Los Angeles e Pittsburg que consumiram tempo (e preciosos recursos) em projetos de despoluição que ainda não foram totalmente resolvidos. Mas é consenso na China,– onde o número de mortes prematuras causadas a cada ano pela péssima qualidade do ar pode chegar a 500 mil,– que medidas urgentes precisam ser tomadas na direção de um modelo de desenvolvimento mais limpo e sustentável.
     
    Correndo contra o tempo, o país mais populoso do mundo, o que mais polui o planeta (e mais emite gases de efeito estufa) se tornou líder mundial em energia solar e eólica, e em tecnologias visando reduzir não só a poluição mas a dependência das térmicas a carvão. Também investem em projetos de reflorestamento e várias outras iniciativas estratégicas, que levem em conta não apenas a economia do país, mas também a saúde e o bem estar dos chineses.
     
    Há uma nova revolução cultural em curso e ela está sendo acompanhada de perto pela Humanidade. O "livrinho vermelho" dá lugar ao manual verde de sobrevivência.    
     
    É isso que vamos mostrar a partir da próxima segunda-feira, 28 de julho, no Jornal da Globo (e depois em dois programas especiais no Cidades e Soluções, da Globo News) num projeto realizado em parceria com o Globo Natureza.
     
    Vale a pena conferir! 

  • Aos brasileirinhos

    Criança chora vendo a goleada da Alemanha sobre o Brasil

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

    Depois da acachapante, surpreendente e dolorosa derrota para a Alemanha - cujo placar de 7 x 1 jamais ocorreu em uma semifinal na História das Copas - muitos brasileirinhos estão se deparando pela primeira vez com o gosto amargo de uma gigantesca decepção.

    De repente o mundo pareceu não fazer mais sentido.

    Toda a idealização construída a partir da avalanche de anúncios publicitários apresentando nossos jogadores como super-heróis, da exaltação dos valores da pátria com o "coração na chuteira" e com o hino à capela no gogó, da auto-imagem de "país do futebol", de único pentacampeão do mundo, de terra encantada de craques que pariu Pelé (o maior de todos), em meio a tudo isso, o chão ruiu em sete partes e nos precipitamos em um abismo cuja queda é especialmente dolorosa para os mais jovens.

    Tal como se deu no episódio da trágica morte dos "Mamonas Assassinas", quando muitos pais se depararam com a dura tarefa de explicar para seus filhos (talvez muito mais cedo do que desejassem) o que é a morte, para onde seus ídolos foram ou porque aquilo havia acontecido, agora também faltam palavras para emprestar sentido à derrota mais humilhante da história da seleção brasileira.

    Pois bem, se a dor dessa experiência é uma realidade sensorial incontestável, é preciso encará-la com sabedoria, abrindo espaço para sua manifestação em casa ou na escola. Compartilhar esse sentimento dolorido, perceber que há outros sofrendo e reparar como cada um, a seu modo, enfrenta isso é algo que dilui o desconforto e ajuda a seguir em frente.

    Em algum momento - e dependendo da situação - torna-se importante diluir a importância e significado dessa derrota terrível diante de tantas outras dores do Brasil e do mundo. Reportar o que acontece fora das quatro linhas no espaço demarcado por uma atividade esportiva (sim, o futebol além de imprevisível e injusto é apenas um esporte) nos permite revelar um mundo onde há dores muito mais difíceis de suportar.

    Guerras, crueldade, escravidão, miséria, fome (entre outras tragédias pessoais ou coletivas nesse mundão de Deus) podem ser evocadas para que as coisas sejam colocadas nos seus devidos lugares: por mais amargo que tenha sido o sabor do "chocolate" alemão, temos todas as condições de digeri-lo, aprender algo com essa experiência e seguir adiante fortalecidos. Já parou para pensar quantos no mundo trocariam de bom grado suas dores por esta, causada por uma decepção esportiva?

    Todos preferíamos ganhar da Alemanha ou pelo menos perder de forma digna. Não foi possível. Agora, é hora de socorrer as principais vítimas dessa "tragédia nacional", como muitos analistas  se referem a esse episódio: os brasileirinhos que aprenderam a cantar o hino com a seleção.

    (Foto: Euricles Macedo)

  • A Copa Verde do Brasil

    Vista do Mineirão antes da partida entre Brasil e Chile

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

    Fizemos 3 perguntas para o principal responsável pelo projeto brasileiro de tornar a Copa de 2014 a “Copa das Copas” na área da sustentabilidade.

    Cláudio Langone é engenheiro químico, consultor em gestão ambiental e sustentabilidade, Coordenador da Câmara Temática Nacional de Meio Ambiente e Sustentabilidade da copa 2014, do Ministério do Esporte.

    1) A Copa da Alemanha em 2006 foi a primeira a preocupar-se com um legado ambiental. A Copa do Brasil fez algo diferente nesse sentido?
    Cláudio Langone: O Brasil estruturou sua Agenda de Sustentabilidade com base nas lições aprendidas na Alemanha e África do Sul, que tiveram representação em seminários promovidos pela Câmara Temática Nacional de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Copa 2014.

    O diferencial do Brasil se deu primeiramente no sistema de governança montado para a estruturação da Agenda, com participação dos atores envolvidos na CTMAS e na criação de Câmaras Locais de Sustentabilidade.

    Nos projetos desenvolvidos, destacam-se como diferenciais o fato de termos a primeira Copa em que todos os estádios passaram por processos de certificação em construção sustentável. Além disso, são pioneiros a iniciativa de promoção de produtos orgânicos e sustentáveis e o fornecimento de alimentação orgânica aos voluntaries, a inclusão de catadores de materiais recicláveis, o Selo Baixo Carbono - mecanismo de arrecadação de créditos de carbono para a compensação das emissões da Copa, e a abordagem da Campanha Passaporte Verde, voltada à sensibilização do turista para práticas conscientes (a campanha foi desenvolvida na África do Sul, mas foi totalmente reformulada, com foco na utilização de ferramentas digitais e interativas).

    Nossa Agenda teve como característica um foco em ações positivas, que extrapolassem a lógica da mitigação de impactos, e trabalhassem na articulação entre meio ambiente, inclusão social e geração de renda. Por isso, é uma iniciativa multisetorial, que envolveu vários ministérios e secretarias nas áreas de meio ambiente, esporte, turismo, agricultura, desenvolvimento social, e outros.

    2) A certificação ambiental dos estádios contou com recursos do BNDES (R$400 milhões por projeto), mas, ainda assim, na maioria das arenas o selo obtido foi "Prata" (terceiro mais importante em uma escala de quatro da certificadora LEED). Não poderíamos ter um melhor desempenho nesse quesito?
    Cláudio Langone: A exigência de certificação das Arenas foi uma decisão voluntária do governo brasileiro, como  condição para o financiamento do BNDES. O Brasil não direcionou para um selo específico, mas todos os projetos brasileiros optaram pelo selo Americano LEED, que estava mais organizado no Brasil. A decisão de exigir a Certificação Básica se deu em função de que a maior parte dos estádios brasileiros passaram por processos de reforma. Nessa situação, fica bastante diminuída a margem de manobra dos projetistas para a escolha dos quesitos a serem contemplados nas obras. A obtenção dos certificados Ouro e Platina em geral se dá em projetos novos, em que se tem possibilidades de incluir itens como o preparo da área onde vai se localizar o projeto, e incluir na origem quesitos que não teriam como ser escolhidos em reformas de edificações. No Brasil, mesmo em estádios com fortes restrições como o Mineirão e o Maracanã, tombados pelo Patrimônio Histórico, foi possível obter a Certificação.

    O Mineirão tornou-se o segundo estádio do mundo a receber a certificação Platinum. Deve-se ressaltar também que o GBC adotou para a certificação das arenas uma norma que foi estruturada para edifícios, o que gerou algumas necessidades de adaptação pontuais. A partir da experiência brasileira, o GBC decidiu que será feita uma norma LEED especificamente para arenas esportivas.

    O nível Prata é uma certificação alta para projetos de reforma.  As principais questões abordadas nas arenas brasileiras se deram em:
    - medidas no processo construtivo, como a reciclagem do entulho de demolição na própria obra e reaproveitamento como material de base, gerando significativa redução de custos;
    - itens de projeto, como captação de água da chuva para irrigação e limpeza, iluminação e ventilação natural, torneiras e vasos sanitários inteligentes, sistemas de coleta seletiva etc.

    Embora alguns itens sejam mais caros na fase de construção, eles levam a uma diminuição dos custos de manutenção das arenas, por exemplo, nas contas de água e luz.

    Para dar efetividade ao esforço feito na certificação, a FIFA e o governo brasileiro promoveram em 2013 um curso de capacitação dirigido aos operadores das Arenas em gestão da sustentabilidade.

    Embora o padrão exigido pelo BNDES tenha sido o de certificado Básico, a maioria das arenas conseguirá o nível Prata. Já temos o Mineirão certificado Platina e esperamos que o Estádio Nacional de Brasília atinja o nível Ouro nesta etapa, chegando também a Platina até o final de 2014, com a instalação da usina Solar de 2,5 MW.

    3) Qual será o legado ambiental desse Copa no Brasil? O que ficará depois do evento?
    Cláudio Langone:Estádios - Como legado, o Brasil será o país com o maior número de Arenas certificadas. Além disso, o processo de certificação dos estádios será um indutor de novas práticas de sustentabilidade na construção civil, já que todas as grandes construtoras brasileiras participaram da construção dos estádios. E, em função das políticas de compras locais, os fornecedores de materiais de construção incorporaram matérias primas certificadas ao seu portfólio, como tintas, solventes, cimento, revestimentos, aço, torneiras e vasos sanitários inteligentes.
    Orgânicosa campanha Brasil Orgânico e Sustentável, organizada pelo governo federal em parceria com a Associação Brasil Orgânico e Sustentável, criada especialmente para esse fim, é uma campanha permanente e terá continuidade.
    Coleta Seletiva e inclusão de catadores – em várias Cidades Sede da Copa, tanto a Coleta Seletiva quanto a contratação de catadores estão sendo feitas pela primeira vez, e o sucesso da experiência abre espaços para sua incorporação como política pública. Além dos investimentos específicos na Operação Copa, o BNDES abriu linha de financiamento denominada Cidades da Copa, que beneficiou com recursos de doação as cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Porto Alegre e Curitiba para estruturar de forma permanente a coleta seletiva com inclusão de catadores, num montante de 120 milhões de reais. Outras 4 sedes estão em processo de consulta – Cuiabá, Salvador, Fortaleza e Manaus.

    A Campanha Passaporte Verde foi totalmente reformulada para a Copa 2014, e terá continuidade sob a coordenação dos Ministérios do Turismo e Meio Ambiente e do PNUMA. A nova marca e ferramentas desenvolvidas em função da copa 2014 serão adotadas globalmente pelo PNUMA.

    Compensação e Mitigação de Emissões – o trabalho feito pelo Brasil nessa área foi reconhecido pela UNFCC como um novo paradigma em termos de grandes eventos. Além disso, um dos principais saldos do trabalho foi a criação de capacidade nas Cidades Sede para a produção de inventários de emissões e definição de políticas de mitigação.

    Legado para 2016 – um dos legados mais importantes da Agenda de sustentabilidade da Copa é que grande parte dos esforços e estratégias desenvolvidos para 2014 poderão ter rebatimento na Agenda de Sustentabilidade dos Jogos olímpicos, pois envolvem os mesmos atores institucionais.

  • Estádios da Copa são sustentáveis?

    Maracanã avermelhado no jogo entre Espanha e Chile

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     


    Pisca na tela do computador a mensagem enviada de Washington (curiosamente redigida em português) assinada por Jacob Kriss, “Especialista em Mídia” da USGBC – United States Green Building Council – uma das mais importantes certificadoras ambientais do mundo.

    “U.S.Green Building Council (USGBC) anuncia certificação LEED para seis estádios da Copa do Mundo”, diz o título do release.

    LEED são as iniciais de “Leadership in Energy & Environmental Design”, a certificação ambiental para edificações da USGBC, “presente em mais de 150 países”. Ao todo são analisados sete quesitos da construção, e para cada item avaliado há uma pontuação correspondente. Quanto mais pontos acumulados, mais importante será o selo.

    No caso do LEED, são quatro os selos: “Platinum” (o que acumula mais pontos); “Ouro”, “Prata” e “Bronze” (o que reúne a pontuação mínima para a certificação).

    Pois bem, a curiosidade é imediata: qual terá sido a pontuação dos novos estádios (ou arenas,como queiram) construídos ou reformados no Brasil especialmente para a Copa?

    Segundo o release de Washington, dos seis estádios, cinco (Maracanã/RJ, Fonte Nova/Salvador, Mineirão/BH, Arena da Amazônia/Manaus e Arena Multiuso/Salvador) obtiveram o selo “Prata”. A Arena Castelão/Fortaleza aparece com a estranha designação “Certificado LEED”, que não parece propriamente uma categoria de selagem.

    Selo “Prata” (penúltimo em importância no ranking da certificadora) para cinco dos seis estádios certificados no Brasil é notícia boa ou ruim?

    Boa, se considerarmos que as intervenções feitas não tem precedentes para este gênero de construção no Brasil (redução no consumo de água e energia,destinação inteligente do entulho, uso de materiais recicláveis, aproveitamento energético do sol e do vento, etc).

    Ruim, se entendermos que o custo elevado das novas arenas (ou estádios, como queiram) poderia justificar projetos mais arrojados e sustentáveis. Vale lembrar que o BNDES disponibilizou R$ 400 milhões em uma linha especial de crédito para cada empreendimento que tivessem selo verde “por avaliação de uma certificadora reconhecida internacionalmente”. Não foi por falta de dinheiro que deixamos de ter estádios com selo “Platinum” ou “Ouro”.

    Minha opinião: se tem dinheiro público envolvido, e se os recursos do BNDES pretendiam justamente estimular a qualificação do padrão construtivo dos novos estádios, o avanço foi muito tímido. “Dá pro gasto”, dirão alguns, pouco ou nada incomodados pelo fato de o selo “Prata” (terceiro em importância numa escala de quatro) ter predominado nas classificações. “Perdemos uma boa oportunidade”, dirão outros, preocupados com um legado pós-Copa mais contundente na área da construção civil.

    Saímos da inércia. Mas a marcha ainda é lenta.

  • Esta imagem te constrange?

    Torcida do Japão limpa arquibancada da Arena Pernambuco após jogo

    Os caras vêm do outro lado do mundo para ver a seleção japonesa disputar uma Copa no Brasil. Perdem o jogo de estreia de virada para a Costa do Marfim e, para surpresa (talvez a expressão mais correta seja perplexidade) dos brasileiros presentes na Arena Pernambuco - e tantos outros torcedores de sabe lá quantas nacionalidades pelas redes sociais -, resolvem, ao final da partida, espontaneamente, coletar o próprio lixo no estádio.

    Munidos de sacolas plásticas azuis - levadas por eles para esse fim - os japoneses se esmeraram em deixar impecavelmente limpas as partes do estádio ocupadas pela torcida nipônica.

    Não foi uma ação de marketing, flash mob ou exibicionismo barato.

    Foi apenas a expressão de uma cultura admirável, onde o senso comum indica o gerador do resíduo como o principal responsável pela sua destinação final.

    Em outras palavras: não importa se a Arena Pernambuco dispõe de uma equipe de limpeza que deixará o estádio limpo após a partida. Para quem veio da Terra do Sol Nascente, essa questão é absolutamente irrelevante. Quem suja deve limpar. Simples assim.

    Quantos de nós se surpreendeu com esse gesto?

    Quantos seríamos capazes de fazer a mesma coisa, principalmente depois de uma derrota de virada na estreia da Copa?

    Foi um ippon moral.

  • Um dia importante

    Desde que o Dia Mundial do Meio Ambiente foi instituído há 42 anos - durante a 1ª Conferência da ONU sobre Meio Ambiente, em Estocolmo - o dia 5 de junho vem servindo de pretexto para diferentes ações (mais ou menos sustentáveis) que ocorrem nesta época do ano para reforçar o suposto compromisso de governos, empresas, instituições de ensino, organizações civis e religiosas em favor da vida no planeta.

    Tal como se dá com outras efemérides como o Dia da Mulher, do Negro, do Índio, entre tantas outras datas impregnadas de um sentido quase subversivo (que tenta desconstruir a cultura dominante em favor de outros valores considerados mais modernos e ajustados a um novo desenho de civilização), o Dia do Meio Ambiente tenta soar como o "grilo falante" que constrange os que, por ignorância ou má fé, realizam escolhas que atentam - em maior ou menor escala - contra a capacidade da Terra nos suprimir do essencial: água limpa, solo fértil, ar puro.

    É curioso - quase engraçado - testemunhar o esforço com que grandes poluidores realizam campanhas milionárias nesse período tentando "esverdear" a própria imagem, como se os recursos investidos para esse fim fossem suficientes para apagar rastros de desonestidade e miopia gerencial.

    Na era das redes sociais, quem investe mais em publicidade do que em reengenharia (maquiando ou supervalorizando resultados na área ambiental) fica exposto a campanhas voluntárias que denunciam o "greenwashing" e se viralizam com a força de um tsunami.

    Mudar é uma palavra que assusta. Em tempos de crise ambiental sem precedentes na História da Humanidade, não mudar deveria assustar muito mais. Se ainda não mudamos no ritmo e na escala desejados, é porque nem todos os que compreenderam o senso de urgência que deveria reger esta gigantesca "concertación" planetária se deram conta do chamado "custo da inação". Fazer como sempre se fez (business as usual) é a senha para o desastre, a ruptura, o colapso que determinaremos na capacidade dos ecossistemas proverem a nossa espécie daquilo que retiramos sistemática e violentamente sem pensar no amanhã.

    Gerar emprego e renda sem exaurir os recursos naturais não renováveis. Fazer a conta de trás para frente, observando se o planejamento econômico considera os limites da Terra. Corrigir o rumo antes que seja tarde. Nossa espécie tem muitos defeitos, mas não viemos ao mundo para nos autodestruir. Enquanto o ecocídio for um risco, o Dia Mundial do Meio Ambiente continuará cumprindo uma função importante no calendário.

    Confira aqui o programa Cidades e Soluções sobre Sustentabilidade e Política. Meio Ambiente dá voto?

Autores

  • André Trigueiro

    Pós-graduado em gestão ambiental pela COPPE/UFRJ e professor de jornalismo ambiental da PUC RJ. É jornalista da TV Globo e comentarista da Rádio CBN. Aqui, fala sobre os principais desafios e entraves do desenvolvimento sustentável e preservação.

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André Trigueiro fala sobre sustentabilidade e meio ambiente.