Choque de realidade
Nas duas semanas de mezzo férias numa praia no norte da ilha que abriga Floripa, mesmo conectado, apenas dava uma passada pelas manchetes de jornais e revistas on line, sem nada que me tirasse da sensação de fora do mundo.
Foram dias de sol e calor, quase iguais aos que imperam no Rio desde a virada do ano, e muito calor humano, revendo familiares e amigos. Até, na noite de domingo, ao chegarmos em casa, sermos surpreendidos pelas mortes brutais de Eduardo Coutinho e Philip Seymour Hoffman, e, em outra porrada para cinéfilos, as acusações da filha adotiva de Woody Allen. Também no domingo, aos 81 anos, partiu Nonato Buzar, compositor, cantor e produtor com uma obra que merece mais atenção.
Desde então, mais choques de realidade: do menor suposto delinquente preso no poste e espancado por “justiceiros” à impressão de que as UPPs continuam fazendo água, enquanto a criminalidade avança pelas ruas da cidade. A previsão é de que o sol e a seca não darão trégua tão cedo ao Rio, que, apesar de tudo, continua lindo como no “Aquele abraço” de Gil. Com tanta notícia pesada a vontade é de esquecer as tréplicas a alguns dos comentários sobre minhas ponderações sobre a superestimada e cansada geração roqueira dos anos 1980. Mas, como prometi, aqui vai, mais ou menos em ordem de chegada.
Oi, Sílvio Veloso, o RPM realmente não me empolgou na época, e muito menos três décadas depois. Comercialmente, pode ter sido a banda certa no momento certo por alguns meses, mas o sucesso e a megalomania subiram às cabeças deles. Paulo Ricardo, a quem conheci cerca de três anos antes do sucesso do grupo, então colaborando para revistas de música nas quais eu também trabalhava (como “Som Três” e “Pipoca/Mixtura Moderna”), sempre foi inteligente, articulado, bonitão, mas tais quesitos não resultam necessariamente num grande músico, compositor ou cantor. Quanto ao livro de Gerson Conrad sobre os Secos & Molhados, que, uma década antes, teve sucesso similar mas era muito melhor que o RPM, ainda não li e vou procurá-lo.
Olá Jefferson, Renato e José Luiz, que foram curtos e grossos em suas iradas mensagens, escrevi o que penso, esse também é meu papel por aqui e gosto se discute. Sintam-se a vontade para argumentos mais consistentes em defesa da volta caça-níquel do Ira! e do pastel de vento que foi essa geração.
Já Eumesmo segue linha parecida e sugere que eu vibre com as voltas do Pink Floyd para tocar “The wall”. Na verdade, desse período eu era mais King Crimson, e o que restou do PF ou os shows de Roger Waters não me tirariam de casa. Mas, ainda gosto de muita coisa que o quarteto inglês gravou, da fase com Syd Barrett à com David Gilmour.
Marciello e Cristiano questionam minha crítica à atual postura direitista de Lobão e dizem que é fruto de minha tendência esquerdista. Pois bem, ele é bobão por nas últimas décadas ter trocado sua música rala pelos factóides idem. Mira na polêmica pela polêmica, sem argumentos, mas tem se dado bem , conseguido espaço na mídia e nas livrarias muito além do que ganharia com a produção musical das duas últimas décadas. Será que Caetano Veloso ainda acha que “Lobão tem razão”, como cantou em “Zii e zie”?
O comentário de Presidente parece ser mais dirigido a Blanch van Gogh (que, por sinal, diz que sua banda, Cogumelo Plutão, não seria da década de 90, e sim dos anos 00), questionando seus elogios ao grupo Noahs. De minha parte, gostei do clipe que compartilhei mas ainda não achei tempo para ir atrás de mais gravações de meus conterrâneos catarinenses. E também pretendo conferir os gaúchos da banda Hesh, sugestão de Thaís Azambuja. Mesmo que o rock não esteja entre as minhas prioridades, surpresas sempre podem pintar por aí.
Patrícia Aguiar aproveitou a “polímica” (copyright Ezequiel Neves) dos 80 para questionar post mais antigo, sobre o “dispensável” trabalho do niteroiense Alex Crow, que ela e várias amigas acham maravilhoso. Bom para Crow, que poderá voar mais alto e assim me obrigar a rever minha opinião.
Por fim, e por enquanto, o carioca Alexandro Raposo morou quatro anos em Floripa e garante que minha cidade natal ainda lembra o Rio antigo e, hoje, “é o melhor lugar do Brasil para ser viver”. Sim, a ilha tem encantos de sobra, mas sua geografia privilegiada (praias, lagoas, morros, mata virgem) não aguenta mais tanta gente, tantos carros… No dia em que fomos visitar um amigo belga que costuma trocar o inverno europeu por temporadas na paradisíaca praia de Pântano do Sul, no sul da Ilha, levamos duas horas e meia de carro num trajeto que seria para uma hora no máximo.
PS: batuquei essas mal traçadas ao som de “Mil e uma noites de Bagdá”, um dos “três tons de Jorge Mautner“, a caixinha que a Universal botou nas lojas reunindo os três primeiros álbuns do cantor e compositor carioca. O disco é de 1976 e ainda mantém seus encantos jocosos, mesmo que não supere o anterior, de 1974, que traz pérolas como “Sambas do animais”, “Cinco bombas atômicas”, “Maracatu atômico”, “Matemática do desejo”… Depois, contarei mais sobre esses primeiros de Mautner e os outros 11 títulos (a maioria inéditos) que me aguardavam.