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Olá, o endereço do Blog do Antonio Carlos Miguel mudou. As novas postagens estarão em https://g1.globo.com/musica/blog/antonio-carlos-miguel/
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Com blocos e escolas campeãs a postos para este sábado de pós carnaval, os estragos do último furacão momesco continuam expostos no Rio graças à (parcial) greve dos garis. Expostos e boiando em alguns pontos, graças às águas de março que começam após um dos verões cariocas mais secos em décadas. Imagino que o prefeito não repita o erro do governador, que, três anos atrás, tentou jogar a população contra os bombeiros. São os garis que garantem a excelência da Comlurb, caso raro de empresa pública eficiente e admirada, e eles merecem salários melhores, sim.
Esbarrei no interrobang que ilustra este post em série de (ótimos) artiguetes encomendados pela revista “Intelligent Life” a escritores sobre sinais de pontuação: vírgula, exclamação, interrogação, ponto e vírgula, reticências (que uso agora para seguir)… Como se percebe, o interrobang é uma junção dos sinais de exclamação e interrogação e, como nos conta o texto de Rosie Blau, teria sido criado no início do século XX para tentar expressar a mistura de surpresa e dúvida mas não emplacou.
Mas uso do interrobang para me surpreender questionar com aqueles que chamam os garis de porcalhões. Esses somos nós cariocas, espalhando lixo pela cidade sem consciência.
Enquanto isso, ao fundo, “Choro nº 5, Alma brasileira”, de Villa-Lobos, nas mãos (e pulmões, pés) do Projeto B, que entrou a esmo no iTreco e me leva a selecionar para reouvir na íntegra o precioso “A viagem de Villa-Lobos”, disco lançado há cerca de cinco anos pelo grupo instrumental paulistano.
Aproveitei mais um efêmero reinado de Momo para navegar musicalmente sem rota definida, trilha sonora entrando a esmo a partir dos diversos playlists espalhados por diferentes iTrecos, entre computador, celular, tocador digital… De novo, apenas algo que baixei por curiosidade, “The soul of all natural things”, um folk-new age de uma senhora de 70 anos, Linda Perhacs, californiana que vive como dentista e volta à música 44 anos depois de lançar “Parallelograms”, disco de folk-psicodélico ignorado na época e que foi descoberto por gente como Devendra Banhart, Sufjam Stevens e a dupla francesa do Daft Punk. Após as recentes muitas doses algo folk de Beck e David Crosby tentei embarcar “na alma de todas as coisas naturais” mas tudo soou velha new age demais.
Mas, nesse Dia Internacional da Mulher, um disco de outra mulher de 70 anos também ligada ao folk, a canadense Joni Mitchell, entrou a esmo e caiu bem, “Shine”. É de 2007 e na época não me empolgou. Com esse atraso de sete anos percebo que mais por minha falta de sensibilidade, já que as canções são bacanas, brilham mesmo. Então, que mulheres, homens e demais seres, porcalhões ou não.
PS: antes que puxem o meu pé, e usando de recurso que vai acabar, sim, Roberta Joan Anderson foi muito além do folk, incluindo trabalhos com Charles Mingus. Na única vez que passou pelo Brasil, Joni Mitchell foi levada a um show de Rita Lee no Rio, em meados nos anos 1970, fase Tutti-Frutti, e não gostou. Soou rock demais para ela, já flertando com o jazz; enquanto Rita só se reinventaria musicalmente na dupla com Roberto de Carvalho.
Compositor, jornalista, escritor, roteirista, apresentador de TV, produtor e curador musical, empresário da noite, cronista político… a lista de atividades nas quais o paulistano mais carioca do mundo Nelson Motta já se meteu é imensa. E não para por aí. Nos últimos anos, ainda cada vez mais presente na cultura brasileira, como provam os musicais sobre Tim Maia (baseado na biografia que escreveu sobre o Síndico) e Elis Regina. Nelson chegará aos 70 anos em outubro envolvido em novos roteiros, livros, músicas, as colunas “globais” que mantém às sextas tanto na TV quanto no impresso – destas, quase sempre discordo ideologicamente. Por exemplo, por que ficar batendo em cachorros mortos como Fidel e Chávez/Maduro quando é tanto ou mais horroroso manter a Base de Guantánamo e o bloqueio a Cuba?
Não entramos nesse tema no encontro que tive com ele na última quinta-feira. Era reunião focada em assunto profissional, Nelsinho (obrigado!) me botando na cara do gol de projeto ainda em negociação. Mas delicioso fim de tarde, com o sol se escondendo atrás do Morro Dois Irmãos, com as habituais preliminares e saideiras de quem se conhece há quase quatro décadas. Ainda me lembro do primeiro contato, por volta de 1976, quando ele dirigiu um musical com Marília Pêra e a então banda de Lulu Santos. Chegamos a esse show Julio Barroso e eu, então, iniciante fotógrafo e e coeditor da revista “Música do Planeta Terra”, que o depois Gang 90 Julio fazia na época bancado pelo pai industrial. Logo, Julio se tornaria o genial doidão de plantão no coletivo avant la lettre que Nelson Motta comandou a partir de fim dos anos 1970.
Mas saí da rota, já que disso também não falamos na tarde/noite de quinta. O lead perdido é esse: Nelson Motta celebra 70 anos em outubro com disco-tributo e documentário no qual revisita parte de sua obra musical.
Como contou nessa quinta, antes de trocar o carnaval por uma semana de folga em Portugal, até o momento, nove faixas e seus intérpretes já estão certos. O CD sairá pela Som Livre e as sessões nos estúdios vem sendo documentadas para um programa de TV que também irá ao ar perto da data redonda, com direção de Tatiana Issa (codiretora do filme sobre os Dzi Croquetes) e Guto Barra (codiretor do filme que virou série no Canal Brasil “Beyond Ipanema”, mapeando a música brasileira ao redor do mundo).
O disco oferece um recorte contemporâneo de sua eclética produção, nas mãos e bocas de Laila Garin & Ipanema Lab (“Noturno carioca”, parceria recente com Erasmo Carlos), Ed Motta & Daniel Jobim (“Coisas do Brasil”, da safra com Guilherme Arantes), Maria Gadú (“Você bem sabe”, que fez com Djavan), Lenine & Cristina Braga (“Certas coisas”, da parceria com Lulu Santos), Silva (“Marina no ar”, outra com Guilherme Arantes), Ana Cañas (“Perigosa”, que escreveu para as Frenéticas com Rita Lee e Roberto de Carvalho), Gaby Amarantos & João Brasil (“Dancin’ Days”, com Ruban), Max de Castro (“Areias escaldantes”, mais uma com Lulu) e a jovem fadista Cuca Roseta (“Apaixonada”, parceria com Ed Motta).
Um álbum vai ser pouco para cobrir cinco décadas de música. Entre os que ficaram de fora está o parceiro de seus primeiros sucessos, Dori Caymmi, com quem escreveu, entre outras, “Saveiros” e “O cantador”. Além de Dori e dos citados acima, a heterogênea lista de compositores com quem Nelson trabalhou vai da primeira parceira, Wanda Sá, a Guinga, passando por Cláudio Zoli, Carlos Dafé, Arrigo Barnabé, Eduardo Gudin, Max de Castro, Marcos Valle, Dé Palmeira, Lee Marcucci, Wander Taffo, Dom Charles, Guto Graça Mello, Reinaldo Arias, Roberto Menescal…
Nada mal para quem só despertou para a música na adolescência bossa-novista, como contou no livro “Noites tropicais (Solos, improvisos e memórias musicais)”: “Eu não gostava de música. Só as de carnaval, nas chanchadas da Atlântida. O rádio era para futebol e programas humorísticos. Com 13 anos, meus maiores interesses eram literários, esportivos e sexuais. A música, pelo menos a que se ouvia no rádio e nos discos, era insuportável para um adolescente de Copacabana no final dos anos 50”.
Como tantos jovens brasileiros de sua geração, Nelson foi convertido por João Gilberto e as canções de Tom & Vinicius e companhia. E logo se enturmou e mostrou serviço, tanto que em 1967, aos 23 anos, já estava confortavelmente instalado na foto que peguei para ilustrar essa crônica: Nelson é o jovem de gravata, copo na mão direita, cigarro na esquerda, no meio de um time de sonhos da canção brasileira. Segundo a legenda no “Songbook Nelson Motta” (Lumiar Editora, 2004), ela foi feita durante uma reunião na casa de Vinicius de Moraes para o carnaval daquele ano, com o anfitrião e, entre outros, Edu Lobo, Tom Jobim, Torquato Neto, Caetano Veloso, Capinam, Paulinho da Viola, Zé Keti, Eumir Deoadato, Olivia e Francis Hime, Luiz Eça, Dori Caymmi, Chico Buarque, Luiz Bonfá, Braguinha….
Bom carnaval para todos!
Em minha carta de intenções ao retomar esse blogquasedeliriosentimusical havia o propósito de comentar mesmo que brevemente qualquer título novo que chegasse às minhas mãos. No mínimo, listaria nomes de álbum, artista, gravadora, como costumava fazer no blog que mantive entre 2003 e 2010 no site de “O Globo”. Tal item acaba de ser revogado por decisão do que batuca essas teclas. A partir de agora, só o que me estimular, para o bem e para o mal, será comentado. Entre os objetivos, diminuir o volume de música que escuto por obrigação.
Portanto, para não frustrar artistas, gravadoras, assessores, amigos que enviaram o lote abaixo, promovo a tal raspa que também pode servir de guia para quem insistir em me enviar coisas como…
Tina Turner e seu “novo” disco, “Love songs” (Parlaphone/Universal). Nada pessoal, ela tem seu lugar no pop, mas a fase solo dos anos 1980 aqui reunida é musicalmente datada, num soul-rock de arena intragável. O CD é mais um fruto da recente incorporação à Universal do catálogo fonográfico da EMI, enquanto o braço editorial foi para a Sony. Até o momento, a fórmula parece ser coletâneas com sucessos, fisgando os compradores de CD que restam.
Outra coletânea da parceria, “Eu e você” reúne fonogramas de Sylvia Telles tanto da Universal quanto da EMI e pode ser boa introdução à cantora que foi uma das vozes fundadoras da bossa nova e partiu cedo, num desastre de carro em 1966. Não é o meu caso, tenho muitos dos discos de Sylvia, portanto, dispenso coletâneas em geral.
Ainda no pacote da Universal um título novo, em CD e DVD, gravado em junho de 2013 num hotel na Barra da Tijuca , mas que também beira o intragável: “Um barzinho, um violão / Novelas anos 80, Vol. 2” (selo Zecapagodiscos). O elenco vai de Michel Teló (em “Faltando um pedaço”, de Djavan) a Zeca Pagodinho (em “Tempo de Don Don”, de Nei Lopes), todos recriando canções que fizeram sucesso em novelas globais. Da mesma forma que aconteceu com o gasto formato “acústico”, de “um barzinho e um violão” ficou só o nome, já que outros instrumentos se somam no palco do salão de convenções, entre percussão, acordeom, guitarra, ukelele… Com raras exceções, novas versões que nada acrescentam a sucessos efêmeros ou clássicos.
Nesse carnaval, melhor rodou o DVD “Ao vivo” (Canal Brasil/DaLapa) da carnavalesca o ano todo Orquestra Imperial. O Teatro Rival está longe de ser o palco adequado para a gravação de um show mas a edição, alternando imagens do cotidiano de viagens e ensaios da troupe, cria um mosaico em sintonia com a autêntica e anárquica musicalidade que sai das caixas de som. Bom para o carnaval, incluindo a marchinha de Jorge Mautner: “Na matemática do meu desejo eu sempre quero mais um, mais um beijo”.
A Cidade das Artes tem um palco perfeito para a gravação de um show, como prova “Homenagem a Tom Jobim” (Universal/Gionva), com o encerramento da turnê do 24º Prêmio da Música Brasileira protagonizada por Adriana Calcanhotto, João Bosco, Roberta Sá, Zélia Duncan e Zé Renato. Nos arranjos, Jaques Morelenbaum teve como diretriz a fidelidade, até na instrumentação, reunindo uma formação similar à da Banda Nova que acompanhou Tom em sua última década de vida. O resultado é respeitoso, jobiniano.
Não faltam novas e boas cantoras de samba, e se Marienne de Castro nem é tão nova assim, confirma em “Colheita” (Universal) o quanto boa continua. Mesmo que influenciada demais por Clara Nunes, ainda mais após o tributo “Um ser de luz” que lançou no ano passado. Se falta alguma identidade, sobram timbre, alcance, técnica, divisão… Nos quesitos técnicos a baiana é nota 10.
Elzira E tem identidade, compensando as notas mais baixas nos tais tecnicismos. Em “O que vim fazer aqui” (Traquitana) a cantora, compositora e violonista ainda conta com a presença de Itamar Assumpção, coautor de dez das 12 faixas, entre inéditas (“Norte”, “Chuva no deserto”, “Conversa mole” e uma sem título, a faixa-bônus, voz e dub a partir de um conto de Itamar) ou regravações. A formação é de uma banda pop, assim como o caminho seguido pelos arranjos para violões, guitarras, baixo e eventuais violoncelo e viola de arco. Sem percussão ou bateria, mas com ritmos marcados.
Em “Amigos” (independente) o compositor, instrumentista e arranjador carioca Sidney Mattos comemora 45 anos de carreira com repertório instrumental quase todo inédito e 100% autoral. Cercado de duas dúzias de amigos que se alternaram através das 12 faixas, ele prova que tem combustível para mais.
Para fechar em instrumental autoral, “Êxodo” (independente), do Entrevero Instrumental, é de uma leva mais antiga e acabei comentando de passagem, mas desde então tem frequentado o CD player. É um surpreendente quinteto de um jazz brasileiro e sulista com instrumentação interessante: acordeom (Diego Guerro), saxofone (Jota P Barbosa), bateria (Filipe Maliska), baixo (Rodrigo Moreira) e violão de sete cordas (Arthur Boscato). Três dos instrumentistas se alternam como compositores de nove dos dez belos temas. A longa “Sono”, que inicialmente parece contradizer seu título com um riff algo hard bop mas depois abre lugar para oníricos desenhos de acordeom, é um dos destaques. Ao lado de “Dununojé”, esta fechando o disco com a escaleta de Hermeto Pascoal; ou “Palaciana” (com vocais do outro convidado do Entrevero, Filó Machado) e o quase frevo “Folha negra”. No site oficial (https://www.entreveroinstrumental.com/), onde “Êxodo” está disponível para download, vejo que o grupo estreou em 2010 com “Siri al Presto”. Desse, irei atrás.
Bom carnaval!
Já entramos na tarde de sábado, dá para ouvir ao longe o esquenta do bloco Simpatia É Quase Amor, mas as últimas horas foram de Beck a… Byrds.
Com alguma simpatia e doses de reserva, acompanho a carreira de Beck desde “Odelay”, o incensado disco de 1996 que transformou o rapaz de 26 anos num dos caras do pop. Beck David Campbell, que então já tinha três outros álbuns lançados, é em certo sentido como Prince (Rogers Nelson), multitalentoso e disperso. “Morning phase” (Fonograf/Capitol), que terá lançamento oficial nesta segunda-feira (24), reforça minha simpatia, tem muito do talento de Beck, agora focado num folk psicodélico. O novo disco caiu na rede em fins de janeiro e desde o dia 16 de fevereiro pode ser ouvido por streaming neste site. Completando duas décadas de carreira discográfica – “Mellow gold”, sua estreia, é de 1994 -, o folk sempre foi uma das referências de Beck, mesmo que numa relação de amor e ódio, ao lado do antagônico hip-hop. E, claro, do rock. Em 1989, quando trocou sua Los Angeles natal por Nova York, como contou em entrevista recente, ele tanto frequentava a cena alternativa (The Melvins, Nirvana, Jon Spencer) quanto a de veteranos do folk como Dave Van Ronk e Ramblin’ Jack Elliott.
Coincidentemente, os dois últimos, influentes figuras da cena folk dos anos 1950 e 60, estão presentes em muitos trechos do livro de Ben Sidran que me sequestrou, lido num iPad de primeira geração, ainda sem câmera e meio que largado. Van Ronk (descendente de irlandeses no Brooklyn, apesar do nome holandês) foi uma das referências de Bob Dylan e, agora, também dos irmãos Coen para o filme “Inside Llewyn Davis”), assim como Ramblin’ Jack Elliott (nascido Elliot Adnopoz no Brooklyn), que muito antes de Robert Allen Zimmerman trocou de nome, pegou um violão e foi para as estradas também inspirado em Woody Guthrie - aquele cujo violão trazia a frase “Esta máquina mata fascistas” .
Mas como a capa já explicita, o folk de “Morning phase” é ensolarado, psicodélico, remete aos fins dos 1960, início dos 1970, da mesma forma que “Croz” (Blue Castle Records), o novo do velho David Crosby que também anda hospedado aqui em casa. No disco novo de Beck, o violão acústico conduz as canções, com eventuais vinhetas orquestrais arranjadas por seu pai, David Richard Campbell, e além de Crosby (“Heart is a drum” parece sair de um disco de Crosby, Stills & Nash) há ecos de Simon & Garfunkel (na pastoral “Turn away”), Donovan (em “Don’t let it go”), The Band (em “Country down”).
Esta última, country até no nome, também remete ao mais obscuro The Flying Burrito Brothers, grupo country-rock no qual estava Gram Parsons antes de ser chamado para os Byrds, que àquela altura já tinham expulso Crosby…
Crosby poderia ter morrido após o clássico dos clássicos do folk psicodélico “If I could only remember my name” que lançou em 1971. Talvez fosse cultuado hoje como alguns dos folkies que partiram cedo (do britânico nascido na Birmânia Nick Drake ao americano Gram Parsons). Não faltaram chances, ele afundou nas drogas de todos os tipos, fez um transplante de fígado em 1994, passou um ano preso por porte de armas (que ainda adora) e drogas (heroína, cocaína, álcool, das quais se livrou, voltando recentemente à maconha, como contou em entrevista para a “Rolling Stone”). “Croz”, após 20 anos sem um disco solo, prova que Crosby também sobreviveu artisticamente. Belas e suaves camadas de vocais, cordas (guitarra, bandolim, dobro…), teclas, percussão que gravou com um grupo de músicos liderados por James Raymond, multi-instrumentista, co-produtor e filho (que só reencontrou homem feito). Com pontuais participações, como as de Mark Knopfler (guitarra em “What’s broken”) e Wynton Marsalis (solo de trompete na viajante “Holding on to nothing”).
Na quase recaída folk dessa semana, “Cedar & fire”, EP independente com cinco faixas já no iTunes do trio Noahs, também soa bem. Dois irmãos, Murilo (voz e violão) e Danilo Brito (baixo), que na adolescência viveram algum tempo no Canadá, mais o produtor, vocalista e multi-instrumentista Bruno Bastos. Brasileiros mas cantando em inglês, com influências, como me conta Danilo em mensagem, do “indie folk de Of Monsters and Men, Mumford & Sons e The Lumineers”. Não acompanho a cena folk contemporânea e tais referências me soaram como David Crosby, The Band, Van Morrison (de “Astral weeks”). Ou seja, os Noahs são realmente interessantes.
Para fechar (enquanto troco os três discos digitais por uma versão vagabunda em CD de “Fifth dimension”, dos Byrds) já devorei as 502 páginas virtuais de “There was a fire”, no qual o compositor, cantor, arranjador Ben Sidran tenta explicar a força dos judeus na música dos EUA e é leitura apaixonante para quem se interessa por música. Entre os senões, a ausência de qualquer menção a Laura Nyro, a cantora e compositora de Nova York, também de família judia, que ao surgir no início dos anos 1960 encantou tanto a Stephen Sondheim quanto a Bob Dylan, então de universos opostos na música. Aliás, sobre Dylan, ao listar suas influências, Sidran bota entre eles o “judeu-alemão” Bertolt Brecht. Mas o dramaturgo alemão era filho de protestante e católica, mesmo que detestado pelos nazistas por seu marxismo. Detalhe que em nada tira o interesse do livro de Sidran.
Anunciada para as 20h30m, a avant-première do projeto Nivea Viva o Samba começou quase duas horas depois. Àquela altura, a parcela etílica dos convidados para o boca livre no Vivo Rio já estava calibrada, em meio ao espoucar de espumantes que não paravam de ser abertos nas mesas. Gente que, com raras exceções (o craque Junior, Mart’nália…) nada parecia ter com o samba. Mas, aparências à parte, todos caíram nele. E como as apresentadoras da noite, Marieta Severo e Silvia Buarque, contaram, esse show será apresentado ao ar livre, em algumas cidades brasileiras, celebrando o gênero que é a melhor tradução musical do Brasil. Bom para o samba, que, coincidentemente, também será o homenageado, em maio, na 25º edição do Prêmio da Música Brasileira. Por sinal, tem mais samba hoje, 19 de fevereiro, no mesmo Vivo Rio, esse em show coletivo para a Mangueira, com Chico Buarque no meio.
De volta ao de ontem à noite, elenco, repertório, produção são impecáveis. Alcione, Martinho da Vila, Roberta Sá e Diogo Nogueira juntos na abertura com “A voz do morro” de Zé Keti e depois se alternando em números individuais, eventuais duetos, trios, novamente juntos no fim com “Isso aqui o que é” de Ary Barroso, e também no bis, com “Canta, canta minha gente” de Martinho e “O que é, o que é?” de Gonzaguiha.
Eles são acompanhados por grande banda (com naipes de percussão, cordas, metais, vocais), arranjos do cavaquinista Alceu Maia, e se há um porém é o tom orquestral e de exaltação que se mantêm durante as duas horas. Sim, a ideia é exaltar o samba, mas faltou alguma dinâmica e diversidade à longa sequência, quase sempre nessa pegada eufórica. Algo que a diretora Monique Gardenberg poderá afinar até a abertura da turnê. No roteiro (de Hugo Sukman) e nas interpretações não faltam estímulos para o encantamento: ”Eu samba mesmo” (Roberta Sá), “Casa de bamba” (Martinho), “Sou eu” (Diogo reafirmando o quanto é bom esse samba da safra recente de Chico), “O mundo é um moinho” (Alcione), “Conto de areia” (Alcione e Roberta)…
Não li e não pretendo ler a Sininho “encapavejada”. Segundo fonte confiável, um “ex-tudante” de História que um ano antes das manifestações de junho/julho de 2013 decidiu trocar os bancos da escola pelas ruas e costumava encontrar Elisa Quadros nesses atos, ela é uma das muitas jovens que como ele tentam fazer História. Se vão conseguir é outra história. Pouco mais sei sobre Sininho, mas transformá-la em líder ou porta-voz de black blocs é demais. Assim como passa dos limites a manipulação detonada pela trágica morte do cinegrafista da Band, com a tentativa de ligar Marcelo Freixo aos dois infelizes que acenderam o rojão fatal. Estes, presos com rapidez tão rara que permite suspeitas, teorias conspiratórias, estão sendo usados e abusados.
Não concordo com o uso da violência mas o fenômeno dos black blocs é parte do problema. Boa parte sem representatividade no mundo contemporâneo, a maioria da periferia, é gente que usa do quebra-quebra como um rito de passagem ou uma catarse.
E é bom lembrar que o despreparo da igualmente violenta polícia militar jogou mais combustível na fogueira. Estado de guerra que esvaziou as manifestações sem que as mudanças pedidas pelo povo na rua tenham começado a acontecer. Para ficar num só exemplo, os transportes públicos continuam precários. Portanto, na cidade do Rio o pavio do morteiro também foi aceso pelo aumento para os ônibus concedido em janeiro pelo prefeito Eduardo Paes.
Como já escrevi por aqui, com o quadro político partidário brasileiro e as regras do jogo, há pouca chance de melhoras com as eleições para presidente, governador e câmaras federais e estaduais que se aproximam, mas a democracia ainda é o menos pior.
Em meio ao tiroteio verbal dos últimos dias, parabéns pela postura (e pelas ideias) para o delegado Orlando Zaconne, com quem cheguei a cruzar no “Globo”, no início dos anos 1990 – eu já um veterano jornalistamusical chegando e ele trocando o jornalismo pelo curso de Direito e o trabalho como policial.
Parabéns também para Gregório Duvivier e demais cabeças da Porta dos Fundos.
Trilha sonora dos últimos dias? Nada que remeta a esse post. “Liquid spirit”, do cantor e compositor de jazz Gregory Porter; e “Croz”, do cantor e compositor de “hippie-pop” David Crosby.
De volta ao Circo Voador, onde há quase um ano o show “Abraçaço” estreara, Caetano Veloso deu na noite desta sexta início à saideira da fase “Cê”. Pelo que contou esta semana ao “Globo”, é uma despedida que deve se estender por todo 2014, incluindo turnês na Europa e nos EUA ao lado de seus azeitadaços escudeiros desde 2006, Pedro Sá (guitarras), Ricardo Dias Gomes (baixo e teclados) e Marcelo Callado (bateria).
O show agora lançado em DVD e CD continua certeiro, em repertório que traz quase a íntegra do disco de mesmo nome com pontuais pontes com canções de diferentes períodos, quase sempre numa linha de passe – “Triste Bahia” emendada a “Estou triste”; “Escapulário” antes de “Funk melódico”…
Independentemente do formato que usa para embalar suas canções, o disco de estúdio que fechou a trilogia com a BandaCê reafirmou o compositor fora de série que Caetano é: “Vinco”, “A bossa nova é foda”, “Um abraçaço”, “Parabéns”, “Quando o galo cantou”, “O império da lei”…
Estavam todas no show, que terá segunda dose na noite deste sábado no qual termina o horário de verão, o que, suponho, deverá acarretar outro atraso. Esse, aliás, foi o senão de ontem, numa maratona que pode transformar o prazer em suplício. Apesar de marcado para as 23h, Caetano subiu ao palco passados 20 minutos da meia-noite, quando parte da plateia já reclamava. “Eu me atrasei, peço desculpas”, contou ele mais para o fim da jornada madrugada adentro, numa das poucas vezes em que conversou.
Momentos antes, uma unidade do público quase desabou, o mesmo que agora batuca nesse teclado. Baixa de pressão em meio ao transe oswaldiano de “No Pão de Açúcar de cada dia, dai-nos Senhor, a poesia de cada dia” com o trecho guitar free jazz hero de “Funk melódico”. Avisei a K que o mundo estava rodando – mais pelo efeito de uma cerveja de trigo com guaraná que bebera praticamente sozinho ainda em casa, combinado a um dia intenso que começara lá pelas 7h30, mais outra long neck dos bares do Circo e ainda um rolezinho sob a tenda – e fui atrás de um local para me sentar. Quase numa reta, fora da lona abafada, encontrei um tablado no qual, deitado no colo de K, dei de cara com a lua cheia que tentei iphotografar. Duas ou três canções que ouvi sem olhar e continuaram me abraçando sonoramente, para em seguida voltarmos aos limites da lona e até ensaiarmos alguns passos de dança. Entre as novidades, no bis, uma que Caetano pretendia guardar para o sábado mas disse não ter resistido, “Quero voltar pra Bahia” . ”I don’t want to stay here, I want to go back to Bahia” no refrão à la Joel Santana… Sucesso que já era ingênuo na época em que foi lançado por Paulo Diniz, mas, quatro décadas depois, mantém seu apelo sentimental – como teve “Debaixo dos caracóis do teu cabelo” , que o ex-colega no clube Procure Saber Roberto Carlos fez também inspirado pelo exílio londrino.
Sim, o trânsito na Lapa estava um caos, reflexo das mudanças nas vias do Centro – amanhã, o Mergulhão da Praça XV será fechado, em mais uma etapa das obras na área do Porto –, tanto que quando K e eu chegamos no Circo já era a hora Thelonious Monk. Enquanto passava das 2h30 quando finalmente recuperamos o carro, estacionado longe. A Lapa ainda fervia, ruas e bares lotados, bandos de travestis, mendigos dormindo nas calçadas, crianças abaixo de 10, turistas, locais… Entre as lições, ir para a próxima experiência noturna na Lapa de metrô, e voltar de táxi – aliás, por que fechar o metrô tão cedo até nos fins de semana?
A pilha de CD e DVDs não para de aumentar. Faço parte do dever de casa, conferindo cada novo título, mas o tempo anda escasso para compartilhar aqui nesse blogquasedelírio minhas impressões. Após as férias, o trabalho acumulado ainda sofreu o impacto de acidentes domésticos: queima tanto da bomba d’água (que no período de abastecimento fraco joga da cisterna externa para as caixas na casa) quanto do sistema de aquecimento solar de água. Não que nesse verão de recordes de temperatura a falta de água quente no chuveiro faça alguma diferença, mas a resistência queimada provocou um vazamento do boiler de 300 litros. Segundo o técnico, com quase cinco anos de uso, a tal resistência que eu nem fazia noção da existência tinha durado mais que o dobro de sua vida estimada. A ideia agora é avançar nesse setor e implantar tanto a geração de energia elétrica solar quanto a captação de água de chuva.
Além de trabalhos previstos e imprevistos, há dois dias, quando certa normalidade voltou a reinar, uma canção de Ben Sidran a esmo no iTreco me levou a uma busca sobre o pianista, compositor, cantor que desembocou no seu quarto livro, lançado em 2012, “There was a fire: Jews, music and the American Dream” (algo como “Havia um fogo: Judeus, música e o Sonho Americano”). Desde então, em meio às atividades habituais, a leitura desse iluminador livro tem me acompanhado.
Em síntese, Sidran tenta explicar como e por que 2% da população dos EUA são responsáveis por 80% da produção musical do país. A estimativa algo hiper dimensionada é dele, mas tem muito de verdade. Antes do rock, por exemplo, entre os grandes compositores, Cole Porter era exceção, numa lista de gênios musicais judeus como Ira & George Gershwin, Irving Berlin, Richard Rodgers & Lorenz Hart (& Oscar Hammerstein II), Jerome Kern, Harold Arlen… Coincidentemente, nesse 13 de fevereiro, a Ascap (espécie de ECAD nos EUA) comemora seu centenário. A página de música do site NPR traz hoje uma boa reportagem sobre como surgiu e como funciona até hoje a American Society of Composers, Authors and Publishers. Reproduzo a abertura.
Há cem anos, o compositor italiano de ópera Giacomo Puccini almoçava com Victor Herbert, o principal compositor americano (mas nascido em Dublin) nesse gênero. Até que a banda no restaurante começou a tocar temas do então sucesso de Herbert, “Sweethearts”. Puccini ficou abismado, como lembra agora o compositor Paul Williams, atual presidente da Ascap: “Ele disse a Victor Herbert, ‘Por que você não está editando essa música? Você poderia ser pago por ela, na Europa nós recebemos’”.
Como se sabe, Herbert gostou da ideia, convidou outros colegas, incluindo John Philip Sousa, Irving Berlin, e fundou a Ascap em 13 de fevereiro de 1914. A luta foi árdua para convencer a restaurantes, salões de dança e demais usuários de música a pagaram pelo que até então era gratuito, mas o direito foi reconhecido. Até 1940, a Ascap monopolizava esse setor, até, após uma disputa com as rádios (que por oito meses não tocaram música alguma editada na sociedade), surgir a BMI. Sigla de Broadcast Music Incorporated, esta investiu na música country e no rhythm and blues. Como a reportagem da NPR conta, a Ascap tinha o Grande Cancioneiro Americano (Gershwin & Porter e cia) “mas quase perdeu o rock. Chuck Berry, Buddy Holly e (os ingleses) Beatles, todos assinaram com a BMI”.
Segundo Bruce Pollock, autor da história da Ascap, “A friend in the music business”, só em meados dos 1960 eles começaram a perceber que, como se diz, “o rock and roll chegou pra ficar!”. Atualmente, a Ascap tem cerca de 500 mil membros em todos os gêneros musicais e continua brigando pelos direitos desses autores, em campos nunca imaginados por Puccini e Herbert, como o da música por streaming na internet. Então, parabéns pelos 100 anos completados hoje.
Enquanto, em sincronia, o que roda agora no tocador de DVD é “Parabéns” de e com Caetano Veloso. É uma das cinco canções que não entraram no CD “Abraçaço: Multishow ao vivo” (Universal), enquanto o DVD traz esta e mais duas de “Abraçaço”, “Gayana” e “Vinco”, e ainda “Odeio” (de “Cê”) e, como extra, “Um índio” (que renasceu na época da Aldeia Maracanã).
Mas, de volta a “There was a fire”, a presença de judeus também se deu no cinema, na literatura, na música clássica… Sidran conta que se afastara da religião após uma dramática experiência no seu bar mitzvah, só se reaproximando no de seu filho. Hoje, mesmo com dúvidas em relação à existência de um Deus, assume seu judaísmo e diz que seu povo vive nos EUA experiência similar a dos negros trazidos África. Assunto que ele abordara em seu primeiro livro: “Black talk: How the music of Black America created a radical alternative to the values of Western literary tradition” (“Conversa negra: Como a música da América Negra criou uma alternativa radical para os valores da tradição literária do Ocidente”).
Sidran lembra que antes da grande leva de imigração da segunda metade do século XIX (expulsos pelos dos pogroms promovidos pelo Czar Nicolau, na Rússia, época na qual se passa “O violinista no telhado”), os primeiros judeus a desembarcarem na então New Amsterdan (a ilha de Manhattan), em 1654, foram os 23 homens, mulheres e crianças que fugiram de Pernambuco após os portugueses derrotarem os holandeses. Ou seja, judeus quase brasileiros dos tempos da Colônia.
Já passei pela introdução histórica abrangente e por dois dos capítulos musicais (“Ragtime Jews” e “The New York Opera”), e durante a viagem pretendo compartilhar mais por aqui.
Minhas primeiras lembranças de Ben Sidran vem de sua participação em disco de fim dos anos 1960 na Steve Miller Band (na qual também estava Boz Scaggs). Só nos primeiros anos do século XXI – época em que trocava arquivos musicais com amigos na internet – conheci a fundo sua obra solo, inédita no Brasil. Há uns quatro anos, comprei pela Amazon o CD “Dylan different”, curioso e irregular passeio jazzy-rocky pelo repertório de Robert Allen Zimmerman. Por fim por enquanto, outra informação que conta muito sobre Sidran: uma de suas primeiras paixões musicais é o pianista e compositor Horace Silver, este um americano filho de cabo-verdianos, detalhe biográfico que também explica algo sobre o gingado desse gênio do hard-bop.
Após tantos passeios, retorno ao DVD de CV, que foi gravado em outubro de 2013 no Vivo Rio e é… fodaço. Assim como o show, que, amanhã (sexta) e sábado volta ao Circo Voador, onde estreou em 2012. Sim, a trilogia com a BandaCê se cumpriu. E dá mesma forma que a fase anterior, a orquestral-morelenbaum, já dava sinais de desgaste – mas, há dez anos, fui um dos poucos a gostar de “A foreign sound”, o híbrido mergulho em standards que ia de Irving Berlin a Kurt Cobain. Agora, na fase rock, o anunciado era fechar a tampa com “Abraçaço”. Estou curioso com o que poderá vir por aí, mas a saideira – que continua nos shows de lançamento do ao vivo que prosseguirão – é imperdível. Caetano no tórrido verão carioca.
Bem, o tempo e o espaço estão acabando, e para não dizer que não falei dos outros títulos, listo o que chegou nos últimos tempos.
“Eu maior” (Núcleo Contemporâneo), trilha de um documentário composta e executado por Benjamim Taubkin; “Manso balanço” (ind.), do percussionista, cantor e compositor Joca Perpignan, gravado em Israel, onde ele voltou a morar após temporada brasileira, na qual foi um dos integrantes do grupo Paraphernalia; “Êxodo” (ind.), de um grupo instrumental e autoral de Santa Catarina, Entrevero, com participações de Hermeto Pascoal e Filó Machado; “Mil coisas” (ind.), estreia da cantora e compositora carioca Clara Valente, que mostra boas ideias, bem cercada por Donatinho (teclados), Maurício Pacheco (guitarra, baixo, produção), Bernardo Bosísio (guitarra), Alberto Continentino (baixo), Carlos Malta (flauta); “Paisagem invisível” (ind.), outra cantora carioca estreante e interessante, Andreia Mota, apesar de irregular na sua mistura de clássicos (Wilson Baptista, Jobim, Milton, Nelson Ângelo) e novos compositores; “De normal bastam os outros” (Nova Estação/Eldorado), mais uma tentativa de volta de Maria Alcina; “Reencontro” (Nova Estação/Eldorado), mais uma volta da eventual dupla Ângela Maria & Cauby Peixoto, que rendem bem na quarta idade; “Espelhos: Canções portuguesas” (Camões Instituto), grupo de fado contemporâneo, reunindo lusitanos e belgas; “Nossa bandeira (Ao vivo)” (Pôr do Som), de Cesinha Pivetta, jovem cantor, compositor paulistano de samba; “As melhores marchinhas do carnaval 2014″ (Bolacha), com as finalistas do concurso da Fundição Progresso; “Pixinguinha: Carinhoso” (Universal/EMI), coletânea com Pixiguinha e demais intérpretes de sua obra; “Aquelas canções” (ind.), do pianista, compositor e cantor mineiro Márcio Hallack; “Yusuf” (Universal), coletânea de Cat Stevens, aproveitando a recente turnê pelo Brasil; “Shangri la” (Universal), do jovem cantor e compositor Jake Bugg, mais um novo Dylan; e “Sinatra Duets: Twentieth Anniversary” (Universal), que pode ter alguns momentos, mas, com tanta coisa vital de Frank Sinatra no catálogo da Capitol, agora incorporado, por que esses cansados duetos no canto de cisne de The Voice?
Por fim, três DVDs e um Blu-Ray ainda aguardam vez. “Orquestra Imperial Ao vivo” (Canal Brasil); “Voz talismã Ao vivo” (Canal Brasil), Margareth Menezes; “Clockwork angels tour” (Universal), do grupo canadense Rush; “Homenagem a Tom Jobim” (Universal), turnê do 24 Prêmio da Música Brasileira, com Adriana Calcanhotto, João Bosco, Roberta Sá, Zélia Duncan e Zé Renato.
PS: o nome correto da cantora do CD “Paisagem invisível” é Andreia Mota, como me alertou sua assessora (obrigado!).
O título desse post permite duas acepcções imediatas, pelo menos para brasileiros.
Descarto uma e dou o devido crédito a quem me levou à segunda, também o anfitrião da noite dessa sexta, Vinicius Cantuária. Em relação à descartada, pelo fato de no delicioso e informal jantar de ontem nenhuma entre as cinco mulheres estar despida. E suponho que apenas uma delas seja nativa do Rio, Leilinha, casada desde sempre com o ipanemense Dadi Carvalho - este, um dos eternos meninos cariocas musos de “O leãozinho”, baixista, guitarrista, compositor, ex-Goofies/Novos Baianos/A Cor do Som/bandas de Marisa Monte (há duas décadas e também o quarto tribalista), Jorge Ben Jor (com quem, quatro décadas depois, nunca deixou de tocar, como fará na noite deste sábado em… minha Floripa), Caetano, Barão… Quanto às outras vestidas, eram as cantoras portuguesa Susana Travassos (que clicou o selfie duplo que uso como imagem de abertura) e americana Melody Gardot; e ainda a inglesa Claire, produtora de TV casada com o botafoguense mal iPhotografado abaixo, e minha paulistana Kati Pinto.
Após 20 anos tendo Nova York como base para sua carreira internacional, Cantuária faz uma parada estratégica no Rio com Claire e o lindo filhote de 1 anos e 4 meses, Antonio. Que ele chama de Tom, em lembrança de uma de suas paixões musicais. Por sinal, após eventual e esparsamente incluir canções de Jobim na sua grande discografia internacional (mais de uma dezena de títulos), o xará daquele que foi o letrista mais frequente do compositor de, entre tantos clássicos, “Ela é carioca” prepara para um selo japonês um disco só com canções de Tom. Voz, violão e percussão de 12 faixas estão prontas e, enquanto dá os ajustes finais e cumpre a agenda de shows fora do Brasil (onde ainda não foi redescoberto), escreve um livro com tintas memorialistas, “Peladas cariocas”. Peladeiro que é, Vinicius está revisitando os gramados (ou chão batido, areia de praia) por quais passou desde que trocou a Manaus natal pelo Rio, aos 9 anos, no início de 1960. Campos de pelada no Aterro do Flamengo, na Praia de Copacabana, o seleto clube de Armando Nogueira (outro botafoguense, assim como o já citado Dadi), os lendários Caxinguelê (nos fundos do Jardim Botânico), Politheama (de Chico Buarque) e até o Maracanã (naquelas partidas entre craques e artistas).
Mas, após longa digressão, voltemos ao cenário de ontem à noite. Chegando de um passeio de bicicleta com Dadi até o por do sol no Arpoador, após um pit stop no supermercado, Melody Gardot parece uma carioca. Vestido leve sobre o biquíni, pele no bronze perfeito depois de algumas semanas no litoral baiano e no Rio. Para uma americana de passagem, o seu português é mais do que razoável e em alguns momentos nos faz pensar que seja lusitano. Quando pergunto em que ano foi a primeira vez… “Eu sempre conheci o Brasil! Antes mesmo de visitar o país, há uns quatro anos, já ouvia e adorava a música brasileira”, diz a cantora, compositora e instrumentista, que completou seus 29 anos entre nós no simbólico dia de Iemanjá. O que talvez explique o fato de uma das canções de seu último disco solo, “The absence” (algo como “A ausência”, “A falta”) ter o nome “Iemanja”.
“The absence”, lançado mundialmente pela Universal em 2012, pode não ter repetido o impacto de “My one and only thrill” (de 2009), mas foi um simpático passeio por influências lusitanas e latino-americanas, após temporadas que passou entre Lisboa, Buenos Aires e o Rio. Como na atual – que se encerra neste domingo, quando a cantora embarcará de volta ao EUA -, Melody circula sem estrelismo, mergulhando na vida cotidiana, encontrando músicos, fazendo amigos. E na noite dessa sexta, ela não só foi a cozinheira como fez questão de lavar a louça de todos. Saladas de folhas, pera com parmesão, pimentas recheadas de queijo, acompanhando o rosbife de Cantuária – que apenas provei, e aprovei, já que voltei a abolir carne vermelha de meu consumo, influenciado pela mudança de hábito de K e Y.
Mesmo com o jornalista em mim, nada anotei ou gravei. Só agora, tentando ser um Truman Capote com algum delay (que, como aprendi no filme com Philip Seymour Hoffman, nunca fazia anotações, mas assim que chegava à máquina de escrever mais próxima registrava o que conversou e viveu), compartilho algo da delicious night.
Melody já tem canções para um novo disco em andamento, que será completado com os músicos com que trabalha em Los Angeles, mas ainda não sabe quando será lançado (“Isso é com a Universal, que cuida dos negócios, eu fico com a criação”), nem quem fará produção e arranjos. Em “My one and only thrill” (totalmente autoral, com exceção de “Over the rainbow”) foram, respectivamente, Larry Klein e Vince Mendoza. Baixista de jazz com Freddie Hubbard, Klein também foi produtor (e marido) de Joni Mitchell, Herbie Hancock, Walter “Steely Dan” Becker e da brasileira Luciana Souza (com que se casou em 2006). Mendoza, também compositor, tem no seu currículo trabalhos com Gary Burton, Björk, Elvis Costello, Pat Metheny, Joni Mitchell…
O disco que revelou ao mundo melodias, letras e voz de Melody me remeteu a “Lady in Satin”, mas ela diz nunca ter ouvido o derradeiro LP em vida de Billie Holiday. Não que, como tantas novas cantoras de jazz e pop, ela tenha timbre parecido ou tente imitá-la, mais pelos arranjos de cordas e pelas composições que remetem a standards, até nos títulos: a de abertura, “Baby I’m fool” (que chegou a tocar em novela global), por exemplo, soou-me como uma referência a “I’m a fool to want you”, que também abria o de Billie, e é uma das raras composições de Frank Sinatra (em parceria com J. Wolf e J. Herron).
Já em “The absence”, a produção foi de Heitor Pereira (guitarrista brasileiro radicado nos EUA e que assinava Heitor TP quando trocou o grupo de Ivan Lins pelo Simply Red do britânico Mick Hucknall) e entre os músicos estão Yamandu Costa e Hamilton de Holanda.
Como disse na abertura, é simpático na sua fusão pop-jazz-luso-brasileira-argentina, mas, como também comentei ontem com a autora, sem a força de “My one and only thrill” (título que bate-bola com outro standard, “My one and only love”). Não sei se por educação, Melody concorda com a minha opinião.
Também educadamente, a estrela sem estrelismo pediu a K para não ser fotografada. Mas, no fim da noite, pedi a Susana Travassos carona em seu selfie duplo. A jovem fadista é outra dedicada brasilianista. Estreou em 2008 com “Oi Elis” e há cinco anos desembarcou no Brasil para shows com Zeca Baleiro. Desde então fez muito mais, transitando por São Paulo – incluindo o disco “Tejo Tietê”, em dupla com o compositor e violonista paulistano Chico Saraiva -, Belo Horizonte e até Vitória da Conquista – na atual temporada, que começou em fins de dezembro, ela e Saraiva passaram dias na casa do compositor Elomar no sertão baiano.
Muito mais conversamos, histórias que continuam, mas é tarde e eu me alonguei demais.
PS: para quem me acompanhou até aqui, The Goofies foi o primeiro grupo de Dadi, aos 13 anos, influenciado por Beatles, Stones, Kinks…