Pessoas com mercadorias saqueadas de uma loja empurram carrinhos de compras ao longo de uma rua depois de protestar contra uma reforma nos planos de pensão do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) em Managua, na Nicarágua — Foto: Jorge Cabrera/Reuters
O presidente nicaraguense Daniel Ortega continuava sob pressão nesta segunda-feira (23), apesar de ter revogado a reforma do sistema previdenciário que desatou uma onda de violentos protestos, saques e choques com a polícia, deixando ao menos 24 mortos.
O Conselho Superior da Empresa Privada (COSEP), que foi aliado de Ortega em seus 11 anos no poder, manteve a convocação de uma marcha contra o governo para esta segunda, enquanto os estudantes que iniciaram os protestos insistem que não interromperão seu movimento.
Manifestantes vão às ruas contra o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, nesta segunda (23) — Foto: Alfredo Zuniga/AP
Governo desiste de leis que causaram onda de protestos na Nicarágua
No domingo, tentando aplacar a revolta generalizada, Ortega anunciou a revogação da reforma no sistema de pensões.
Depois de mais de quatro dias de confrontos entre manifestantes e forças de segurança, as piores em seus 11 anos de governo, Ortega anunciou que revogou as reformas em um encontro com líderes empresariais.
Sergio Ramírez recebe Prêmio Cervantes e dedica a manifestantes mortos na Nicarágua — Foto: Juan Carlos Hidalgo/Pool via REUTERS
O Instituto Nicaraguense de Seguro Social (INSS) tomou uma decisão "revogando a resolução anterior, de 16 de abril passado, que foi a que serviu como detonadora para que se iniciasse toda esta situação" de protestos, disse Ortega, acusando ao mesmo tempo os manifestantes de agir como membros de gangue.
Naquela data, o organismo de seguridade social reformou o sistema de pensões para aumentar as contribuições de trabalhadores e patrões a fim de dar estabilidade financeira ao sistema previdenciário, gerando o repúdio da população, que foi às ruas protestar.
O Centro Nicaraguense de Direitos Humanos (Cenidh) disse à AFP que confirmou com as famílias das vítimas a morte de 24 pessoas nos protestos, iniciados na quarta-feira.
Entre as vítimas estão estudantes que iniciaram o movimento, policiais e simpatizantes da governista Frente Sandinista - acusados de atacar os manifestantes - e o jornalista Miguel Ángel Gahona, que morreu no sábado atingido por um tiro, quando transmitia pelo Facebook um confronto entre manifestantes e forças de ordem.
Protesto na Nicarágua neste domingo — Foto: AP Photo/Alfredo Zuniga
A revogação da controversa reforma não convenceu a todos na Nicarágua, onde algumas pessoas consideraram que a medida foi tardia.
Ortega anunciou que formará uma mesa de diálogo, com a participação da Igreja católica, para discutir as reformas que deem estabilidade financeira ao sistema de pensões.
Em meio ao clima tenso, a população lotou supermercados e lojas em busca de provisões, e no domingo foram reportados novos bloqueios de ruas e saques em vários estabelecimentos comerciais.
Ortega criticou duramente os manifestantes e os comparou a membros de gangue que semeiam o terror.
"Isso nos obriga a por em nossa agenda o combate às gangues. Combatê-las para que não continuem agindo da forma como agem, que não continuem se matando entre si e que não vão assaltar estabelecimentos", disse Ortega na reunião.
Sua mensagem gerou críticas, em meio à tensão que o país vive.
"Ortega está fazendo uma análise equivocada da realidade. Não pediu perdão pelos mortos, não tomou medidas para cessar a repressão, nem desmobilizar grupos paramilitares e continua ameaçando com o uso da força púbica", disse à AFP o ex-deputado José Pallais.
No sábado, Ortega havia pedido para dialogar com o setor privado para abordar a reforma do sistema de pensões, mas sua mensagem gerou repúdio entre outros setores que se uniram espontaneamente aos protestos por se sentirem excluídos, acirrando ainda mais os ânimos.
O autodenominado movimento OcupaINSS, um dos que iniciou os protestos, queixou-se que o diálogo "deveria incluir as vozes de todos os setores que pediram uma discussão ampla e inclusiva (...) sobre a forma autoritária e sem consultas como as decisões vêm sendo tomadas".
Líderes políticos acreditam que os protestos vão além do descontentamento com as reformas do sistema previdenciário e apontam para a necessidade de uma mudança na direção do país.