O Kyiv Pechersk Lavra, ou monastério das cavernas, é um marco arquitetônico em Kiev — Foto: Getty Images/BBC
Desde então, Kiev tenta controlar seu destino, muitas vezes sem sucesso, sob a sombra de seu maior e mais poderoso vizinho.
Uma minoria significativa da população tem o russo como sua primeira língua, particularmente nas cidades e no leste industrializado.
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Odessa, cidade de grande importância turística, tem um admirado centro histórico — Foto: Getty Images/BBC
A relação de Kiev com Moscou influenciou a política interna ucraniana desde o início do século 21.
No final de 2004, após protestos contra irregularidades na eleição presidencial vencida por Viktor Yanukovich, próximo ao Kremlin, o pleito foi anulado.
Em uma nova votação, o oposicionista Viktor Yushchenko sagrou-se vencedor, no processo que ficou conhecido como Revolução Laranja.
Anos depois, uma nova revolução levaria o país a mais uma vez confrontar a interferência russa. Viktor Yanukovich voltou ao poder em 2010, quando foi eleito presidente, após o grupo que nasceu da Revolução Laranja ter sido abalado por disputas internas e denúncias de corrupção.
No final de 2013, Yanukovich rejeitou um acordo de associação com a União Europeia e tentou reaproximar o país de Moscou.
A medida levou a enormes protestos de rua que envolveram choques violentos com as forças de segurança. Yanukovich deixou Kiev e exilou-se na Rússia.
A crise levou à invasão da região da Crimeia pela Rússia, que anexou o território, alegando laços históricos. Rebeldes apoiados por Moscou declararam a independência das províncias de Donetsk e Luhansk, no leste da Ucrânia, conhecidas conjuntamente com a região de Donbas, o que não foi reconhecido pela comunidade internacional.
A tensão com Moscou e o conflito no leste ucraniano continuaram, até que em 2021 a Rússia parecia estar prestes a invadir a Ucrânia, com grande poderio militar estacionado próximo à fronteira. O presidente russo, Vladimir Putin, exigia um compromisso da Otan, a aliança militar ocidental, de que a Ucrânia nunca se tornaria membro da organização, o que foi rejeitado pela aliança.
A história ucraniana, que inclui a maior tragédia nuclear do planeta, ocorrida em 1986 em Chernobyl, também reúne eras de glória, que geraram marcos arquitetônicos em suas cidades. Kiev é reconhecida por sua bela paisagem urbana, marcada pelos domos de suas igrejas históricas — o berço da nação está associado ao crescimento do cristianismo ortodoxo no Oriente.
No século 21, a Ucrânia ganhou destaque em algumas modalidades esportivas, como futebol e tênis.
LÍDER
Presidente: Volodymyr Zelensky
Zelensky era conhecido de um programa de TV quando se tornou presidente — Foto: Getty Images/BBC
A primeira vez que Volodymyr Zelensky ganhou fama foi ao interpretar um presidente fictício num programa humorístico de televisão da Ucrânia. Com essa experiência, sua vitoriosa campanha presidencial enfatizou vídeos em redes sociais, com conteúdo leve, em detrimento dos tradicionais comícios e discursos detalhando programa de governo.
Como fazia seu personagem de TV, Zelensky promoveu uma mensagem contra corrupção e o poder de oligarcas, embora ele própria tenha ligações próximas com Ihor Kolomoisky, dono do canal 1+1, em que seu programa aparecia.
Kolomoisky, que em 2015 se desentendeu com o então presidente Petro Poroshenko, tem vivido no exterior devido a inúmeras investigações sobre seus negócios na Ucrânia. Ele deu forte apoio ao presidente Zelensky durante a campanha. Com seu passado de artista, seu discurso leve e o apoio de Kolomoisky, Zelensky foi eleito no pleito de março e abril de 2019, aos 42 anos de idade.
Em seu discurso de posse, disse que colocar um fim à insurgência apoiada pela Rússia no leste do país, que suspendeu a autoridade de Kiev sobre as províncias de Donetsk e Luhansk, seria sua prioridade.
Pouco depois, em julho de 2019, seu partido, Servo do Povo, venceu as eleições parlamentares, o que deu a Zelensky também o controle do Legislativo. Durante a crise com a Rússia no final de 2021, ele visitou tropas ucranianas postadas próximas à fronteira, diante do risco de uma invasão de forças russas.
MÍDIA
A mídia ucraniana adotou de forma unificada uma pauta patriótica, depois da anexação da Crimeia pela Rússia e o início do conflito armados nas províncias separatistas do leste.
A Ucrânia proibiu a transmissão da programação dos principais canais de TV da Rússia. Em troca, as áreas sob controle da Rússia ou de separatistas proibiram a transmissão por redes pró-Kiev. As autoridades do país também bloquearam o acesso na internet a alguns populares sites russos e redes sociais da Rússia.
A TV domina o cenário de mídia, com o setor liderado pelas principais redes privadas. Muitos jornais publicam edições tanto em ucraniano como em russo.
RELAÇÕES COM O BRASIL
No final do século 19 e início do século 20, o Brasil recebeu milhares de imigrantes ucranianos. A comunidade de descendentes está hoje concentrada no Estado do Paraná, onde vivem cerca de 80% dos brasileiros de ascendência ucraniana, que totalizam cerca de 600 mil pessoas. Na Ucrânia, segundo o Itamaraty, vivem cerca de 300 brasileiros.
O Brasil reconheceu a independência da Ucrânia logo depois de sua declaração, ainda em dezembro de 1991. As relações diplomáticas foram oficializadas em fevereiro de 1992, com a embaixada ucraniana sendo aberta em Brasília no ano seguinte, e a brasileira instalada em Kiev em 1995.
Os presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva realizaram visitas oficiais à Ucrânia, em 2002 e 2009, respectivamente, e o Brasil recebeu três visitas de chefes de Estado ucranianos, em 1995, 2003 e 2011.
Um projeto espacial conjunto dos dois países foi lançado em 2003, prevendo a utilização do Centro de Lançamentos de Alcântara, no Maranhão, pelo foguete ucraniano Cyclone-4 para o lançamento de satélites.
Segundo o Itamaraty, a crise e consequentes conflitos iniciados em 2013 reduziu significativamente o comércio entre os dois países e afetou o acordo espacial. O Brasil acabou decidindo retirar-se do projeto, que foi extinto em 2019.
As exportações brasileiras, que em 2012 haviam atingido US$ 624 milhões, perderam fôlego até somarem US$ 111 milhões em 2019. O fluxo comercial total caiu de mais de US$ 1 bilhão antes dos conflitos para pouco mais de US$ 200 milhões em 2019, com o Brasil mantendo sempre um superávit.
Em dezembro de 2020, em evento em Kiev, representantes dos governos brasileiro e ucraniano assinaram um memorando de entendimento para o comércio no setor de Defesa.
Em janeiro de 2022, o Itamaraty divulgou uma nota sobre as tensões entre Rússia e Ucrânia, dizendo que o Brasil apoiava "uma solução mutuamente satisfatória" e que uma solução para crise só viria "por meios pacíficos", com a implementação dos chamados Acordos de Minsk para a região leste da Ucrânia.
LINHA DO TEMPO
Algumas datas importantes da história da Ucrânia:
Século 9 - A fundação do Kievan Rus, primeiro grande Estado eslavo oriental, dá início a um período histórico para a região, em que Kiev ganharia projeção internacional. O relato tradicional, motivo de debate entre historiadores, atribui a criação de Kievan Rus ao semilendário Oleg, um líder viking (ou varangianos, como são chamados os vikings que seguiram para o oriente) soberano de Novgorod. Oleg tomou a cidade de Kiev, na atual Ucrânia, que se tornou a capital de Kievan Rus devido a sua localização estratégica no rio Dnieper.
Século 10 - A dinastia Rurik é estabelecida, e o governo do príncipe Vladimir, o Grande (príncipe Volodymyr, em ucraniano), marca o começo de uma era de ouro. Em 988 Vladimir abraça o cristianismo ortodoxo e inicia a conversão de Kievan Rus ao rito bizantino, dessa forma definindo o curso do cristianismo no Oriente.
Século 11 - Kievan Rus atinge seu auge sob Yaroslav, o Sábio (grande príncipe de 1019 a 1054), com Kiev tornando-se o principal centro político e cultural do Leste Europeu.
1237-40 - Os mongóis invadem os principados de Rus, destruindo várias cidades e encerrando o poder de Kiev. Os tatars (como ficaram conhecidos os invasores mongóis) estabelecem o império da Horda Dourada no sul da Rússia, e o khan (líder) da Horda Dourada torna-se o líder supremo dos príncipes russos.
1349-1430 - A Polônia e, mais tarde, a Comunidade Polonesa-Lituana gradualmente anexam a maior parte do que é hoje o oeste e o norte da Ucrânia.
1441 - O canato da Crimeia retira-se da Horda Dourada e conquista a maioria do sul da Ucrânia.
1648-1657- Levante cossaco contra a autoridade polonesa estabelece o Hetmanato, considerado na Ucrânia a base para o moderno Estado independente.
1654 - O Tratado de Pereyaslavl dá início ao processo de transformação do Hetmanato em um Estado vassalo da Rússia.
1772-1795 - A maior parte do oeste da Ucrânia é absorvida pelo Império Russo por meio das divisões da Polônia.
Século 19 - Um renascimento cultural nacional leva ao desenvolvimento da literatura ucraniana, além de educação e pesquisa histórica. A região conhecida como Galícia, adquirida durante a partilha da Polônia, torna-se um centro de atividade política e cultural ucraniana, pois a Rússia proíbe o uso da língua ucraniana em seu território.
1917 - Um conselho central Rada (Rada significa Parlamento) é estabelecido em Kiev após o colapso do Império Russo.
1918 - A Ucrânia declara sua independência. A declaração é seguida de uma guerra civil, em que vários governos rivais disputam o controle de parte ou todo o território ucraniano.
1932 - Milhões morrem numa crise de fome provocada pela campanha de coletivização de Josef Stalin, conhecida na Ucrânia por Holodomor.
1939 - O lado ocidental da Ucrânia é anexado pela União Soviética como parte do pacto de não-agressão entre Moscou e a Alemanha Nazista.
1986 - Um reator da usina nuclear de Chernobyl explode, enviando fumaça radioativa para a Europa. Esforços desesperados são feitos para conter o danificado reator sob uma cobertura de concreto.
1991 - A Ucrânia declara sua independência depois que um fracassado golpe contra o presidente soviético Mikhail Gorbachev levou ao fim da URSS.
1994 - Na eleição presidencial, Leonid Kuchma sucede Leonid Kravchuk e conduz uma política de abertura controlada ao Ocidente, mantendo uma aliança com a Rússia.
1996 - Nova Constituição, democrática, é adotada, e o hryvnia é adotado como nova moeda.
2000 - A usina nuclear de Chernobyl é fechada, 14 anos depois do acidente. Estimativas apontam que, ao longo dos anos, mais de 10 mil pessoas possam ter morrido na Europa em consequência do vazamento de radiação, que também afetou a saúde de milhões de pessoas.
2002 - Em maio, o governo anuncia sua decisão de solicitar formalmente sua filiação à Otan, a aliança militar ocidental.
Revolução Laranja e crises
2004 - Em novembro, o líder da oposição, Viktor Yushchenko, convoca protestos em massa contra os resultados da eleição presidencial, sob suspeita de fraude e que dava a vitória ao candidato pró-Rússia Viktor Yanukovych. A Suprema Corte anula o resultado. Em dezembro, Yushchenko torna-se presidente depois de vencer o novo pleito. As relações com a Rússia deterioram, levando a frequentes disputas sobre suprimento de gás e taxas sobre uso de gasodutos.
2008 - Em outubro, a crise financeira internacional leva a uma queda da demanda global por aço, um dos principais produtos de exportação da Ucrânia, causando um colapso dos preços. O valor da moeda ucraniana despenca, e investidores estrangeiros deixam o país.
2010 - Em fevereiro, Viktor Yanukovych é declarado vencedor do segundo turno da eleição presidencial. Em junho, o Parlamento aprova uma lei, enviada por Yanukovych, que encerra as ambições do país de fazer parte da Otan.
2013 - Após o governo abandonar os planos de assinar um acordo de associação com a União Europeia, em novembro dezenas de milhares de pessoas tomam as ruas em protesto. Segundo os manifestantes, o governo cedeu a pressões da Rússia.
2014 - Em fevereiro, as forças de segurança matam pelo menos 77 manifestantes em Kiev. O presidente Yanukovych é afastado pelo Parlamento e foge para a Rússia. A oposição assume o poder.
2014 - Em março, forças russas invadem e anexam a Crimeia, iniciando a maior crise entre Oriente e Ocidente desde o fim da Guerra Fria. O presidente russo, Vladimir Putin, diz que a anexação é justificada pela ligação histórica da região com a Rússia. EUA e União Europeia impõem duras sanções contra Moscou. Em abril, grupos armados pró-Rússia tomam partes das províncias de Donetsk e Luhansk, que formam a região de Donbas, no leste da Ucrânia. Kiev lança operação militar em resposta à insurgência.
País dividido
2015 - Com a Ucrânia dividida, Alemanha e França costuram um acordo de cessar-fogo para a região de Donbas, em negociações realizadas em Belarus.
2016 - A economia ucraniana retorna a um período de frágil crescimento, após dois anos de turbulência.
2017 - Em julho, um acordo de associação entre a Ucrânia e a União Europeia é ratificado. Entra em vigor em 1º de setembro.
2018 - O Patriarca Ecumênico de Constantinopla concorda em permitir que a Ucrânia estabeleça sua própria Igreja Ortodoxa, independente de supervisão eclesiástica russa.
2019 - O humorista de televisão Volodymyr Zelensky vence o segundo turno da eleição presidencial contra o incumbente, Petro Poroshenko. Ele assume o cargo em maio, e dois meses depois seu partido, Servo do Povo, vence as eleições parlamentares. Em setembro, Rússia e Ucrânia trocam prisioneiros capturados na tomada da Crimeia por Moscou e no conflito em Donbas.
2019 - Em outubro, a Ucrânia é envolvida no debate americano em torno do impeachment do presidente Donald Trump, acusado de pressionar Kiev para que investigasse o futuro candidato democrata à Casa Branca Joe Biden.
2022 - Com tropas russas e ucranianas postadas próximo à fronteira dos dois países, governos ocidentais demonstram apoio a Kiev e ameaçam Moscou de forte retaliação caso uma invasão ocorra.