Bombeiros procuram por vítimas de rompimento da barragem em Bento Rodrigues, em Mariana — Foto: Márcio Fernandes/Estadão Conteúdo
As negociações do novo acordo de reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem da Samarco, em Mariana, na Região Central de Minas Gerais, foram suspensas, segundo o Ministério Público Federal (MPF). A tragédia ocorreu em novembro de 2015 e deixou 19 pessoas mortas.
A previsão era de que a repactuação, discutida há anos, fosse concluída nesta terça-feira (5), mas as tratativas não avançaram por causa da divergência entre o valor oferecido pela mineradora e suas acionistas, Vale e BHP, e o montante solicitado pelo poder público.
"A gente acabou de ser comunicado da completa suspensão das negociações. [...] A resposta das empresas ao pedido de valores calculados dentro dos estudos sobre os danos ao Rio Doce foi extremamente abaixo do que se esperava. Ainda houve uma tentativa de verificar se haveria uma contraproposta, mas me parece que esse comunicado de hoje representa o final de qualquer possibilidade de acordo", afirmou o procurador da República Carlos Bruno Ferreira da Silva.
Conforme apurado pelo g1, as empresas ofereceram cerca de R$ 40 bilhões, enquanto o poder público reivindica aproximadamente R$ 120 bilhões.
De acordo com o procurador, diante da suspensão das negociações, a expectativa é de julgamento das ações civis públicas já ajuizadas para a reparação dos danos.
Inicialmente, duas ações principais requerendo a condenação das empresas foram ajuizadas. Ao longo dos últimos anos, a Justiça desmembrou o processo em 12, por temas como saúde e moradia, instaurando uma ação para cada um deles. Nenhuma foi julgada até agora.
Em outubro, as instituições de Justiça solicitaram o julgamento antecipado de parte das ações, que pedem aproximadamente R$ 100 bilhões das mineradoras. O montante seria aplicado em ações de reparação de danos individuais homogêneos dos atingidos e de danos coletivos – parte do dinheiro seria destinado ao poder público para medidas de compensação.
"Fazer um acordo traz várias vantagens, a primeira é garantir a pacificação do conflito. Quando se faz acordo não há mais recurso, enquanto a decisão judicial pode ser recorrida. [...] Me parece que o judiciário tem todas as condições de tomar as decisões necessárias para que a gene possa começar efetivamente, depois de oito anos, a reparação do Rio Doce", disse o procurador.
Em nota, o governo de Minas Gerais lamentou que as negociações tenham sido paralisadas, sem data prevista de retorno, "em virtude da recusa das empresas responsáveis pelo rompimento, Vale, BHP e Samarco, em apresentar uma nova proposta financeira, conforme calendário previamente estabelecido".
Segundo o estado, as mineradoras propuseram "valores insuficientes para a devida reparação do Rio Doce".
"Infelizmente, as empresas não têm se mostrado dispostas a efetivamente reparar uma tragédia que já completou oito anos, tirou a vida de 19 pessoas e deixou profundos danos socioambientais e econômicos para além da região diretamente atingida, impactando o Estado mineiro, o Espírito Santo e o país".
Segundo o desembargador federal Ricardo Machado Rabelo, do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), que conduz as negociações, as rodadas da mesa de repactuação foram suspensas "em razão da proximidade do fim de ano e do recesso forense" e novas rodadas serão "agendadas para o início de 2024".
Já a Advocacia-Geral da União (AGU) afirmou que "tem envidado esforços para uma solução célere para o caso e que possibilite a adoção de medidas adequadas de reparação socioambiental dos danos causados".
O que dizem as empresas
Em nota, a Samarco afirmou que "permanece aberta ao diálogo e segue participando das negociações da repactuação do acordo, conduzidas pelo Tribunal Regional da 6ª Região (TRF6), a fim de avançar em uma solução definitiva e consensual, baseada em critérios técnicos, ambientes e sociais".
A BHP disse que "está absolutamente comprometida com as ações de reparação e compensação relacionadas ao rompimento da barragem".
A Vale declarou que "está comprometida com a repactuação e tem como prioridade as pessoas atingidas".
Relembre
A barragem de Fundão rompeu em 5 de novembro de 2015, em Mariana, e causou o maior desastre ambiental da história do país.
Cerca de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração destruíram comunidades e modos de sobrevivência, contaminaram o Rio Doce e afluentes e chegaram ao Oceano Atlântico, no Espírito Santo. Ao todo, 49 municípios foram atingidos, direta ou indiretamente.
Para o MPF, as ações de reparação executadas nos últimos anos pela Fundação Renova, entidade criada com esse objetivo, foram insuficientes. Por isso, há anos, as instituições de Justiça, os governos federal, de Minas Gerais e Espírito Santo e as mineradoras negociam um novo acordo.
Destroços de casa no antigo Bento Rodrigues — Foto: Rafaela Mansur/ g1
Plano para rompimento de barragens
A Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) lançou o Plano de Preparação e Resposta ao Rompimento de Barragens para orientar e definir ações a serem executadas na área da saúde, em âmbito estadual e municipal, em caso de tragédias.
O documento foi apresentado nesta segunda-feira (4), oito anos depois do rompimento da barragem da Samarco, em Mariana, e quase cinco anos após a tragédia com a barragem da Vale, em Brumadinho, na Grande BH.
O plano inclui diretrizes e estratégias em dois eixos: preparação e resposta. De acordo com cadastro da Agência Nacional de Mineração (ANM), Minas Gerais tem 345 barragens de mineração, sendo que três estão em nível 3 de emergência.
"Os cenários de rompimento de barragens já enfrentados em Minas Gerais corroboram com a necessidade de atuação antecipada e planejada do setor saúde, para que os efeitos de um possível acidente não afetem ou afetem minimamente a população vulnerável", diz um trecho do documento.