André Bahia estudava uma média de cinco horas por dia, além do tempo que ficava na escola — Foto: André Bahia/ Arquivo pessoal
O estudante norte-mineiro André Bahia, de 18 anos, conseguiu alcançar nota mil na redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). O jovem morador de Janaúba, no Norte de Minas, é um membro do seleto grupo de 55 candidatos que conquistaram o feito, entre 4,1 milhões de textos corrigidos. Ele relaciona o resultado à boa formação que recebeu desde criança e revelou ao G1 técnicas que desenvolveu para prestar a prova.
Bahia conta que deixou de ser adepto dos rascunhos e faz os textos à caneta na lauda oficial da prova, por conta do grande número de questões objetivas cobradas pelo Enem. O rapaz apenas lista citações e dados que pretende inserir na redação em uma folha separada. Segundo ele, foram estas informações as peças-chave para que conseguisse tirar nota total. Ele procurou reunir na mente estatísticas e citações sobre temas variados, que ele chama de “coletânea de dados socioculturais”.
“O Enem cobra em um dia 90 questões e uma redação. Se eu fizesse o rascunho e para depois copiar tudo de novo não daria tempo de eliminar as provas objetivas. Com muito treino, consegui sentir segurança para escrever direto à caneta. Escrevia só esqueleto antes, com isso meu texto ficou padronizado. Com a prática, já defini quais conjunções uso em cada parágrafo e como desenvolver. Listar conjunções é uma boa dica, além de formar na mente uma coletânea de dados socioculturais, que reúne citações de filósofos, citações de cientistas, estatísticas. Para qualquer tema cobrado, tenho pelo menos duas opções”, explica.
Como não tinha rascunhos do texto oficial, André tentou reescrever a redação para que fosse corrigida por professores do colégio onde estudou. Avaliando o texto não oficial do rapaz, os profissionais de humanas da cidade acreditavam que ele ia alcançar uma média que variasse entre 950 e 960 pontos. Por isso, o aluno afirma ter ficado bastante surpreso.
“Eu não tinha o texto em mãos, mas sai da prova curioso e resolvi refazer mais ou menos a mesma ideia. Mostrei para alguns professores e me deram uma média de 960, nem eles achavam que eu fosse alcançar o total. Pode ser que na hora ‘H’ eu não tenha cometido alguns deslizes, por isso tenha causado essa diferença. Como eles disseram que eu iria tirar essas notas, não esperava mesmo fechar. Fiquei muito surpreso”, afirma.
Preparação
A professora de redação da escola particular de Janaúba, Camila Guimarães, conta que o bom resultado do aluno foi consequência da trajetória disciplinada que percorreu durante os anos. “André é um aluno excelente em todas as áreas. Começou a se preparar no ensino fundamental. Já no ano passado ele prestou a prova como treinante e havia tirado 960 na redação”, relembra.
Camila diz ainda que houve um trabalho interdisciplinar para que os alunos tivessem técnicas de escrita desenvolvidas, associando a uma bagagem de conhecimentos gerais para que pudesse discorrer sobre temas cobrados. “Durante 2018, intensificamos atividades com a turma para que todos eles pudessem melhorar as notas. Foi um trabalho interdisciplinar, que promoveu essa melhora. Não treinar só escrita, mas conhecimentos gerais. Fizemos treinamentos de redações em sala com tempo cronometrado, atividades extraclasse para estimular a turma. Além do André que tirou nota mil, tem vários outros que tiraram 960, então foi uma média muito boa”, comenta a professora.
Trajetória escolar
Aluno nota mil no Enem estudou durante toda a vida escolar no mesmo colégio — Foto: André Bahia/ Arquivo pessoal
André Bahia se formou em uma escola particular de Janaúba, e estudou no mesmo local desde os dois anos de idade. Filho da diretora do colégio, ele conta que sempre se sentiu acolhido pelos profissionais e colegas, mas que também era cobrado por ter como mãe a coordenadora.
“Eu tenho uma formação muito boa desde educação infantil. Meus professores são amigos de fato. Tiro dúvidas por WhatsApp, sempre me senti em casa. Ao mesmo tempo, ser filho da diretora ajuda muito e atrapalha muito. Os professores naturalmente pegam no pé, minha mãe acompanha as notas de muito perto, então cobra mais. Por outro lado, é muito bom. A própria escola é muito boa, convivo com as pessoas desde os dois anos de idade”, diz o estudante.
Sobre a formação técnica, Bahia diz que nunca se mudou de escola e não procurou cursinhos específicos, apenas aulas online. Ele chegou a competir várias olimpíadas de matemática e conhecimentos gerais da rede de apostilas adotada pelo colégio, além de projetos extracurriculares da escola. “Não fiquei atento só ao conteúdo da escola. Eu assistia vídeo aulas, me matriculei em cursos online de redação, às vezes pegava propostas que via na rede e pedia aos professores para corrigirem, não fiquei na zona de conforto”, comenta André.
Sobre o tempo diário de estudo, André se considera normal. Conta que chegava da escola, almoçava, e não abria mão do cochilo depois do almoço. Costumava se assentar em frente aos cadernos por volta das 14h e parava, no máximo, às 19h. O jovem diz que não deixou de se dedicar aos esportes, de namorar e sair com os amigos, por exemplo.
O aluno conta ainda que não abrir mão do que gosta de fazer foi justamente o que o ajudou a superar a ansiedade, que o atrapalhou por alguns momentos. “Eu sempre tive ansiedade. Fico nervoso e em estado de apreensão. No Enem desse ano, nos quinze primeiros minutos eu travei. Pensei que era tudo ou nada, a prova da minha vida. Cheguei a ficar muito ruim, fui fazendo uma questão por uma, até que me soltei. O bom para não deixar esse sentimento atrapalhar é praticar exercício físico para relaxar, dormir bem, namorar, sair com os amigos, fazer o que gosta de fazer sem deixar de ser responsável”, afirma Bahia.
André participava do time de handebol com amigos e não abriu mão de atividades que gosta durante período de estudos — Foto: André Bahia/ Arquivo pessoal
A mãe do rapaz e diretora escolar, Elisabeth Cristina Bahia, conta que o coração fica a mil por saber que o filho dela está entre os 55 melhores do Brasil. Ela relembra com emoção a trajetória do estudante e diz ter orgulho dos desafios pessoais que ele superou com disciplina.
“André é muito disciplinado, e sempre se cobra muito, é extremamente preocupado e ansioso. Quando ele era criança, o pai teve um infarto dentro de casa e ele viu aquele contexto. Eu penso que na construção da história de vida dele, foi algo que marcou. Quando ele entrou no primeiro ano do ensino médio e vimos que ansiedade estava além do normal, procuramos tratamento homeopático. A médica conseguiu mostrar para ele que funcionava e o ajudou a lidar com aquilo. Hoje consegue perceber que se sair e fazer uma corrida fica mais tranquilo, então usa estratégias”, conta a mãe.
Ensino superior
A expectativa, daqui para frente, é de que o garoto reúna aprovações em faculdades públicas do país. André pretende tentar a nota para medicina na UFMG, já prestou prova para segunda etapa de engenharia elétrica na Unicamp, fez o vestibular seriado da Unimontes, em Montes Claros, e também na faculdade pública de Diamantina, a UFVJM. Apesar de todo o desempenho que já mostrou, o rapaz tenta não alimentar expectativas.
“Foi uma alegria muito boa, mas ainda estou contido porque faltam quatro dias para o Sisu abrir. Por ter sido algo tão inédito eu estou feliz, só que com cautela”, brinca.
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