O Palácio do Planalto escalou dois ministros para reagir publicamente a uma outra decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso. Na segunda-feira (12), o ministro liberou parte do indulto natalino do presidente Michel Temer, mas excluiu condenados por crime de colarinho branco.
A reação do Planalto veio na voz de dois ministros. O da Justiça, Torquato Jardim, e o da Secretaria de Governo, Carlos Marun. Convocaram a imprensa para pontuar o que chamaram “equívocos do ministro Luís Roberto Barroso”. Na segunda-feira, Barroso decidiu aprovar parte do indulto natalino, mas com restrições.
Podem sair da cadeia os presos que cometeram crimes sem grave ameaça ou violência e que cumpriram um terço da pena. A condenação não pode ter sido superior a oito anos de prisão. Barroso manteve suspenso, por inconstitucionalidade, o indulto para os chamados crimes do colarinho branco como corrupção, lavagem de dinheiro e a associação criminosa.
Barroso apontou que “carece de legitimidade corrente um ato do poder público que estabelece regras que favorecem a concessão de indulto para criminosos do colarinho branco. Isso porque, ao invés de corresponder à vontade manifestada pelos cidadãos, o decreto reforça a cultura ancestral de leniência e impunidade que, a duras penas, a sociedade brasileira tenta superar. Em manifesta falta de sintonia com o sentimento social - e, portanto, sem substrato de legitimidade democrática - o decreto faz claramente o contrário: dá um passe livre para corruptos em geral”.
O decreto estava suspenso desde o fim de 2017; houve muitas críticas. Uma delas, da procuradora-geral da República, Raquel Dodge: “Foi o indulto mais generoso dos últimos 20 anos”.
E com esse argumento ela pediu a suspensão do decreto, alertando para o risco de impunidade para condenados por corrupção porque poderia beneficiar presos da Lava Jato.
O ministro da Justiça disse que Barroso não poderia ter modificado o decreto presidencial.
“Se inconstitucional a opção, suspende-se. Se é interpretável que o faça conforme a Constituição, porém, não cabe legislar em substituição”, afirmou Torquato Jardim.
O ministro da Secretaria de Governo fez uma ameaça direta: disse que estuda retomar o mandato de deputado para pedir o impeachment de Barroso. Ressaltou que não falava em nome de governo de si próprio.
“Eu analiso a possibilidade me licenciar da minha função de ministro de estado, retornar ao meu mandato para apresentar uma solicitação de responsabilização do ministro Barroso por conduta indevida na condição de guardião da Constituição”.
O senador Randolfe Rodrigues, da Rede, considerou inadmissível a ameaça de Marun contra um ministro do Supremo.
“É uma ameaça não somente ao ministro do Supremo Tribunal Federal. É uma ameaça à aplicação da Justiça. É uma ameaça ao Judiciário. É uma ameaça a toda a magistratura do país. Imagina se já vira moda qualquer investigado, qualquer réu, logo em seguida utiliza-se do poder que tem para ameaçar o juiz que está investigando. Seria o fim da aplicação da Justiça no Brasil”.
O ex-presidente do Supremo Carlos Ayres Britto explica que o poder constitucional do presidente para conceder indulto a condenados não é ilimitado.
“Conceder indulto é uma coisa. Julgar da validade jurídica da concessão do indulto é outra coisa. No limite pode mesmo ir para o Poder Judiciário. Indulto não é cheque em branco, não corresponde à noção antiga de poder discricionário, isento de exame por outro poder”.
Ayres Britto afirmou também que não pode haver perdão para crimes do colarinho branco.
“Aqueles crimes contra o sistema financeiro, por exemplo, aquelas condutas ilícitas que a própria Constituição tem como improbidade administrativa, os crimes de corrupção em geral. Eu acho que corrupção sistêmica no âmbito de organização criminosa, eu acho que essas delituosas são incompatíveis com a ideia de indulto. A própria Constituição, pelo modo gravíssimo como reage à perpetração dessas ilicitudes, pré-exclui a ideia de aplicação de indulto”.
A decisão final sobre a validade do decreto de indulto ainda terá que passar pela análise de todos os ministros do Supremo.
Na noite desta terça-feira (13), a advogada-geral da União, Grace Mendonça, pediu à presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, que o plenário dê logo a palavra final sobre o indulto.